Dormindo em pé Pesquisa feita com 43 mil pessoas mostra que mais da metade da população brasileira apresenta problemas na qualidade do sono Jornal da Tarde - 21/03/07 LOLA FELIX, lola.felix@grupoestado.com.br O brasileiro é ruim de cama. Uma pesquisa feita com cerca de 43 mil pessoas, durante a II Semana Brasileira do Sono - realizada em julho passado nas principais capitais brasileiras - mostra por que imagens como a que está ao lado são tão comuns em ônibus e metrôs. O resultado final da pesquisa só será publicado em meados de abril, mas as preliminares mostram que 53,9% da
população apresentam problemas na qualidade do sono. Quase metade dos brasileiros (43%) apresenta sinais de cansaço durante o dia. A Academia Brasileira de Neurologia (ABN)também não fechou os olhos para o problema e resolveu criar hoje, no Dia Nacional do Sono, a campanha 'Bom Sono! Uma questão de saúde. O objetivo do evento, que será realizado em nove cidades do País, é mostrar que um bom sono é uma questão de saúde. Os endereços da campanha podem ser consultados no site da ABN. Um sono de má qualidade não reflete apenas no cansaço pelo resto do dia. Outros efeitos incluem acidentes domésticos, automobilísticos e no trabalho, irritabilidade e alteração da memória. A memória se restaura e se consolida durante o sono profundo, diz a neurologista especialista em sono Andrea Bacelar, presidente da Sociedade Brasileira de Neurofisiologia Clínica do Rio de Janeiro. O ronco, um dos sinais de um sono problemático, pode até destruir casamentos. Um estudo feito recentemente pela Associação Britânica de Ronco e Apnéia do Sono diz que 85% dos 2 mil adultos entrevistados dizem que o ronco prejudica a vida conjugal. O mesmo estudo diz que a pessoa que dorme ao lado de quem ronca perde duas horas de sono por noite. Para muitos casais, é motivo suficiente para iniciar uma briga no café da manhã. Uma noite mal dormida pode ser causada por diversas razões. A mais comum é a insônia, a incapacidade de iniciar ou manter um sono satisfatório. Outros motivos são o sono insuficiente (culpa, principalmente, das duplas jornadas de trabalho), a síndrome da apnéia obstrutiva, os transtornos de humor, e a síndrome das pernas inquietas. Os distúrbios de sono costumam atingir as mulheres com mais freqüência, e costumam piorar com a idade. No entanto, nem as crianças estão livres deles. Aqueles bocejos exagerados durante o dia, segundo explica o coordenador nacional da Campanha do Sono, o neurologista Gilmar Fernandes do Prado, costumam surgir somente após meses ou anos do distúrbio de sono. Isso acontece porque a pessoa vai tendo uma redução nos neurotransmissores cerebrais responsáveis pela vigília, diz Prado. Em casos irreversíveis, pode haver uma degeneração em uma região do cérebro responsável pela ativação do estado de alerta. Um bom sono depende de diversos fatores, externos e internos. Eles podem incluir desde a qualidade do colchão até os hábitos alimentares da pessoa. Os tratamentos para um sono de má qualidade, atualmente, são muitos, e
dependem do distúrbio que o causa. Para a insônia, por exemplo, o melhor é a terapia cognitivo-comportamental aliada ao uso de medicamentos. SONO DE QUALIDADE Não use a cama para discutir ou pensar em problemas. Ela deve servir apenas para o sexo e para o sono Na hora de dormir, visualize, mentalmente, um lugar relaxante, como uma praia ou um campo Leia um livro difícil. Você poderá desistir de todo o enigma e partir para o sono em instantes Pratique a respiração abdominal. Inspire lentamente, enchendo a barriga, e depois expire Se não consegue parar de pensar em problemas, mentalize uma tela branca, na qual você escreve suas preocupações. Em seguida, apague-as Evite o consumo de cafeína horas antes de ir dormir Faça alongamento e massagens relaxantes, se necessário OS DISTÚRBIOS Insônia: dificuldade de iniciar ou manter o sono ou de despertar antes do horário desejado Síndrome da Apnéia Obstrutiva do Sono: obstrução da via aérea ao nível da garganta, levando a uma parada da respiração que dura em média 20 segundos. Após a parada no fluxo de ar, a pessoa emite um ronco característico Síndrome das pernas inquietas: Afeta cerca de 7% da população e se caracteriza principalmente por uma profunda sensação desagradável nas pernas, nos ossos e, às vezes, como se fosse uma coceira ou friagem, choque, formigamento e, eventualmente, dor Sono insuficiente: decorrente do comportamento do indivíduo, que voluntariamente reduz seu período de sono Mulheres sofrem mais de insônia
Cara a cara Andrea Bacelar, PRESIDENTE DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE NEUROFISIOLOGIA CLÍNICA DO RIO DE JANEIRO Por que o brasileiro dorme mal? Já se sabe de antemão, por conta de outras pesquisas e queixas ouvidas em consultório, que isso acontece por vários motivos. O principal deles é a insônia. De 20% a 40% dos brasileiros apresentam esse problema, que se caracteriza pela dificuldade de iniciar ou manter o sono. Quais são os outros? A segunda causa mais comum é o sono insuficiente, ou seja, a pessoa não dorme mais porque não pode. Isso acontece bastante nas grandes cidades, especialmente por causa da dupla jornada de trabalho, estudos noturnos e por causa da internet dentro de casa. Outro fator que prejudica o sono são os transtornos de humor, como a síndrome depressiva e a ansiedade generalizada. Qual é o maior problema quando se pesquisa o sono a fundo? A síndrome da apnéia obstrutiva do sono. Caracterizada pela parada da respiração e causada por alimentação irregular, falta de exercício, abuso de álcool e tranqüilizantes, ela afeta quase 5% da população e até 30% das pessoas acima dos 50 anos de idade. Fatores externos contribuem para os brasileiros dormirem mal? Sim. As causas ambientais influem muito na qualidade do sono. É preciso ter uma cama própria para dormir bem. Além disso, o calor pode fazer a pessoa despertar muitas vezes. Aglomerados também predispõem a um sono ruim. Por que as mulheres têm mais insônia do que os homens? Geneticamente, elas têm uma predisposição maior. Além disso, o binômio insônia-depressão é comum. Mulheres têm três vezes mais insônia do que os
homens e o fato de elas terem ido para o mercado de trabalho sem deixar as funções domésticas, com certeza, contribui para isso. Pessoas que dormem mais são tidas como preguiçosas. É verdade? Não, significa que precisam de mais horas para se sentirem restauradas. http://txt.jt.com.br/editorias/2007/03/21/ger-1.94.4.20070321.47.1.xml