Motores de tração em corrente alternada: Estudo do desempenho na CPTM Introdução Os motores de tração são os equipamentos responsáveis pela propulsão dos trens. Sua falha implica na diminuição do desempenho operacional dos mesmos, levando ao não cumprimento da viagem contratada pelos usuários. Em conseqüência disso, a composição pode ser retirada de operação, gerando transtornos à operacionalidade do sistema e aos usuários. O motor de tração de corrente alternada utilizado em ferrovia metropolitana é uma tecnologia que está em operação desde 1999 e até então não haviam parâmetros de avaliação de desempenho deste equipamento, nem tampouco especificação para aquisição. A motivação e o objetivo para a realização deste estudo, deve-se ao fato do ineditismo da utilização da tração elétrica por corrente alternada nos trens metropolitanos da CPTM e do Brasil. Na CPTM atualmente há 56 trens unidades em operação com esta tecnologia e mais 76 em fabricação, o que implica que a utilização do motor em corrente contínua será minima com tendência á extinção na frota operacional da CPTM. As figuras 1, 2 e 3 e 4 mostram os trens da CPTM que possuem esta tecnologia. Fig. 1 - Trem 2000
Fig 2. - Trem 3000 Fig.3 - Trem 2070 Fig.4 Trem 7000 Fundamentos tecnológicos Os motores de tração utilizados pela CPTM são do tipo indução com rotor gaiola. Este tipo de motor é o de construção mais simples, o que o torna mais robusto e conseqüentemente confiável, pois este tipo de máquina é desprovida de
elementos de contato móvel. Além destas vantagens, este tipo de máquina possui um rendimento melhor que uma máquina de corrente contínua equivalente. O motor é formado pelo estator, que é a parte fixa da máquina e que é alimentada pelo controlador de tração, e o rotor, que é a parte girante, onde será produzida a força mecânica para movimentar o trem. As figuras 5 e 6 mostram respectivamente o estator e o rotor deste motor. Figura 5 Detalhe dos estatores dos motores dos trens 3000 e 2000 Figura 6 Detalhe dos rotores dos motores dos trens 3000 e 2000 Para operação como motores de tração, a característica natural do motor de indução não é apropriada para a carga de tração ferroviária. Devido a isto, o motor de corrente contínua foi largamente usado até que a possibilidade de utilização do motor de indução fosse possível. As características dos motores de corrente contínua atendem quase que perfeitamente a carga de tração ferroviária,
que é o elevado torque a baixas velocidades e mudanças constantes de velocidade do motor com métodos relativamente simples. A utilização de motores de indução só foi possível com o controle de tensão e freqüência separados, o que implica num controlador complexo denominado inversor VVVF (variable voltege variable frequency). Este tipo de controlador é necessário, devido à característica Conjugado x Velocidade do motor de indução ser limitada, pois o conjugado de partida é pequeno e as correntes de partida são elevadas quando se opera com freqüência fixa, como mostra a figura 7. Fig. 7 - Curva característica do motor de indução Estes motores possuem outra característica importante na sua operação, o escorregamento, que é a diferença entre a rotação do campo girante produzido pelas correntes do estator e a rotação mecânica do rotor. Esta diferença determina o conjugado para a operação do motor em tração elétrica. O escorregamento também é determinante na forma de operação do motor, ou seja, se o funcionamento é motor ou gerador. A operação será como motor quando a velocidade do rotor for menor que o campo magnético girante, fazendo
com que o escorregamento seja positivo. Já para a operação como gerador, a velocidade do campo magnético girante passa a ser menor que a velocidade do rotor, tornando o escorregamento negativo. Este comportamento é demonstrado pelas equações abaixo: f m = f e f r para motor f = f + m e f r para gerador Esta característica traz uma vantagem, que é a operação com frenagem através dos motores do trem. Não que os sistemas anteriores não executassem esta operação, mas no caso do inversor, que é o equipamento que aciona estes motores, a frenagem é executada através da mudança dos tempos de acionamento dos semicondutores do inversor, sem o acréscimo de contatores ou chaves eletromecânicas para executar esta função. A frenagem através dos motores elétricos transforma a energia cinética do trem em energia elétrica através dos motores, que durante esta operação se transformam em geradores. Esta energia pode ser devolvida para o sistema elétrico ou dissipada na forma de calor através de resistores. Este processo mostra as seguintes vantagens: Menor utilização do sistema pneumático, economizando pastilhas e outros componentes do sistema de freio; Colabora com a precisão da operação do trem, pois a frenagem será controlada pelo próprio controlador de tração. Economia de energia elétrica, pois a energia gerada pelo trem em frenagem pode ser absorvida por um trem que esta acelerando ou de partida de uma plataforma. Outra possibilidade é a devolução de energia elétrica para a concessionária de energia.
Para se obter a característica F x V necessária para a tração, o esforço máximo deve ser mantido constante durante a partida e para que esta operação se concretize, o fluxo magnético Φ m deve ser mantido constante. Este fluxo é mantido constante até a freqüência nominal da máquina, e a partir deste ponto aumenta-se a velocidade do motor mantendo a potência constante com o enfraquecimento do fluxo magnético como mostrado na figura 8. A relação que determina a velocidade deste motor pode ser expressa da seguinte forma: 120 f n = P e (1 s) Onde: n: rotação mecânica do motor em rpm f e : freqüência de alimentação do estator P: nº de pólos do motor s: escorregamento do motor O torque disponível na ponta do eixo do motor pode ser expresso pela seguinte equação: T = K φ 1 m I r Sendo: φ m = K 2 V f e e Onde T: torque K1 e K2: constantes de construção da máquina Ve: tensão de alimentação do estator fe: freqüência de alimentação do estator Φm: fluxo magnetizante Ir: corrente rotórica que depende da carga
Figura 8 - Características de operação de um motor de indução operado por inversor de freqüência O acionamento dos motores de tração é executado por um equipamento denominado inversor VVVF (variable voltage variable frequency). Este inversor é o responsável pela conversão da forma de energia contínua para alternada. O inversor converte a corrente contínua proveniente da eletrificação da via em corrente alternada através de uma técnica denominada modulação por largura de pulso (PWM). Esta técnica consiste no controle do tempo de acionamento e
desligamento de semicondutores controlados. O controle adequado deste tempo sintetiza uma forma de onda altenada na freqüência desejada para operação do motor. Análise do desempenho Para a análise dos motores, partimos dos seguintes parâmetros, onde entendemos que sejam os mais importantes para o estudo proposto: Potência dos motores: Nesta análise foi comparada a potência nominal dos motores com o desempenho real em operação comercial afim de determinar a potência eficaz do trem. Aquecimento dos motores: Nesta análise foi compararado o aquecimento real dos motores com a classe de isolação determinada em projeto. Os dados para os parâmetros mencionados acima foram obtidos através do monitoramento da operação do trem em horário comercial, mais precisamente no horário considerado de pico, cuja condição de operação é a mais severa para o desempenho do trem. Os dados foram comparados com cálculos teóricos e características técnicas dos motores, afim de constatar como está o dimensionamento dos mesmos, ou seja, se estão de acordo com a condição de trabalho a que estão submetidos. O quadro resumo abaixo mostram as potências em kw: Trem 2000 Cálculo em 50 km/h Medição em 50 km/h Cálculo referido em 80 km/h Medição referida em 80 km/h Potência desenvolvida 1814,74 1573,80 3033,61 2518,05 Potência no motor 115,74 100,37 193,47 160,59 Potência Eficaz 124,8 220,39
Trem 3000 Cálculo em 58 km/h Medição em 58 km/h Cálculo referido em 80 km/h Medição referida em 80 km/h Potência desenvolvida 873,58 738,92 1238,59 1018,97 Potência no motor 111,43 94,25 157,98 129,97 Potência Eficaz 70,12 183,08 O resultado final da potência eficaz mostrou que os motores estão trabalhando abaixo da potência nominal, ou seja, não haverá comprometimento do desempenho em razão da potência dos motores. Com relação ao aquecimento, o mesmo foi monitorado e constatado que as temperaturas atingidas pelos motores não ultrapassaram 55% da temperatura nominal de isolação do motor. Além dos parâmetros comparados acima, serão apresentadas as duas principais anomalias de funcionamento ocorridas nos motores objetos deste estudo e as soluções utilizadas: Queima dos rotores dos motores 6 RIA 4555 utilizado no trem série 2000. Esta queima foi provocada pelo desperndimento dos materiais metálicos das pontas das barras do rotor, fazendo com que o pacote magnético girasse livre dentro da máquina, provocando a ruptura da isolação e consequentemente à terra, danificando o motor. Ruído nos motores 1 TB 2016 0GB02 utilizado no trem série 3000. O ruído neste motor foi provocado pela circulação de correntes nos rolamentos, neste caso no rolamento do acoplamento com o redutor. Este efeito é agravado pela utilização de inversores de frequencia, fazendo com seja necessária a utilização de rolamentos isolados eletricamente em relação ao estator do motor. Quando esta isolação não é eficaz, há o
comprometimento destes rolamentos podendo causar um travamento do motor. O motor de indução aplicado à tração elétrica necessita de alguns cuidados na fase de projeto e manutenção, tais como: Deve ser previsto o dispositivo de monitoramento da temperatura dos motores, visto que o aquecimento é maior que os motores de corrente contínua. Os rolamentos destes motores devem ser isolados eletricamente, para que não sejam afetados pelas harmônicas dos inversores, pois caso isto aconteça, aumenta-se muito o risco da falha do rolamento, levando ao travamento do motor. O processo de construção mecânica deve ser rigoroso em relação à montagem do motor, a fim de evitar queimas devido a quebras ou fissuras nas bobinas destes motores. Conclusões O estudo do desempenho mostrou que a utilização dos motores de tração em corrente alternada trouxe algumas vantagens, tais como: Menor custo de manutenção, pois o periodicidade de intervenção da manutenção é muito maior em relação ao motor de corrente contínua. Maior confiabilidade, pois esta máquina não possui contatos móveis e o comutador do motor de corrente contínua, o que minimiza a chance de ocorrer uma falha. O sistema de controle para este motor pode otimizar o esforço de tração, ou seja, o motor irá girar o necessário para tracionar o trem, reduzindo as patinagens.
Proporciona a frenagem quase que total do trem, fazendo com que o controle de desaceleração seja mais preciso. Porém há alguns fatores que podemos entender como desvantagem: O alto investimento para aquisição dos inversores de tração e do sistema de controle. A complexidade da técnica de controle, o que requer mão de obra técnica especializada. Mesmo com estas desvantagens, o motor de tração de indução já se estabeleceu como modelo a ser utiizado em tração elétrica. O motor de corrente contínua ainda fará parte do dia-dia dos técnicos de tração elétrica por muito tempo, mas para projetos novos, as inovações já são uma realidade. Referências Bibliográficas Souto, Fabrício Matos; Franceschini, Edmar Osvaldo; Silva, Jorge Aurélio Machado; Estudo do desempenho dos motores de tração em corrente alternada nos trens da CPTM. Trabalho de conclusão de curso (Especialização em Tecnologia Metro-Ferroviária). Escola Politécnica da Universidade de São Paulo EPUSP. Maio/2007 Autor deste artigo: Fabricio Matos Souto é engenheiro eletricista, pós graduado em Tecnologia Metroferroviária e Administração Industrial pela EPUSP. Engenheiro de Manutenção do Departamento de Manutenção do Material Rodante das linhas 8 e 9 da CPTM. Fabricio.souto@cptm.sp.gov.br