ORGANIZAÇÃO TECNOLÓGICA DO TRABALHO DA EQUIPE DE SAÚDE DE UMA UNIDADE HOSPITALAR DE ATENDIMENTO ÀS URGÊNCIAS E EMERGÊNCIAS * Estela Regina Garlet 1 José Luís Guedes dos Santos 2 Maria Alice Dias da Silva Lima 3 Introdução: O trabalho na unidade de emergência contém uma especificidade que a distingue dos demais serviços de saúde: a assistência deve ser realizada de forma imediata, além de eficiente e integrada. Esse local caracteriza-se pela exigência de amplo conhecimento técnico por parte dos trabalhadores, habilidade profissional e emprego de recursos tecnológicos (DESLANDES, 2002). Sendo assim, a unidade de emergência é o local do hospital preparado para o atendimento de pacientes criticamente enfermos, com potencial risco à vida (MAGNAGO, 2002). Nesse sentido, acredita-se que o sucesso da assistência prestada em unidades de emergência tenha relação direta com a interação entre os recursos humanos e tecnológicos, aliado à organização do processo de trabalho empregado para a sua realização. Vários estudos já realizados a respeito das unidades de emergência no Brasil (LUDWIG, 2000; ROSA, 2001; MAGNAGO, 2002; VIEIRA, 2005; LIMA e ERDMANN, 2006) apontam que o processo de trabalho nessas unidades está organizado mais para suportar as conseqüências da demanda do que propriamente produzir a finalidade do seu trabalho. Objetivo: Esta pesquisa tem como objetivo analisar a organização tecnológica do trabalho da equipe de saúde de uma unidade hospitalar de atendimento às urgências e emergências um hospital público do * Nota prévia do Projeto de dissertação intitulado Organização tecnológica do trabalho da equipe de saúde de uma unidade hospitalar de atendimento às urgências e emergências de um hospital público do interior do estado do Rio Grande do Sul. 1 Autora/Relatora. Enfermeira. Mestranda em Enfermagem pelo Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Membro do Grupo de Estudo em Saúde Coletiva (GESC)/UFRGS. E-mail: estelagarlet@hotmail.com. Avenida Integração, 2290, Pinhal Grande, 98150-000, Fone: (55) 32781197 e 99791005. 2 Enfermeiro. Mestrando em Enfermagem pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Membro do Grupo de Estudos em Saúde Coletiva (GESC). 3 Doutora em Enfermagem. Professora Associada da Escola de Enfermagem da UFRGS. Pesquisadora do GESC/UFRGS.
interior do estado do Rio Grande do Sul. E, específicos: a) descrever a organização do trabalho para o atendimento às urgências eemergências; b) identificar as concepções dos profissionais que atuam nos serviços de emergência sobre o seu processo de trabalho. Metodologia: A abordagem qualitativa de pesquisa foi utilizada como referencial teórico-metodológico (MINAYO,1997). A investigação assumiu uma característica de Estudo de Caso, na qual o objeto de pesquisa é analisado profundamente. Trata-se de um estudo da particularidade e da complexidade de um caso singular (STAKE, 1998), para compreender sua atividade em circunstâncias importantes de todo contexto do trabalho em uma unidade de emergência. O espaço de pesquisa foi à unidade de emergência de um hospital do interior do estado do Rio Grande do Sul. A escolha desse serviço como campo da pesquisa deveu-se ao fato de ele fazer parte de um hospital público, universitário tendo, dessa forma, uma grande rotatividade de atendimentos e também por ser o único que oferece atendimento de alta complexidade para região centro-oeste do Estado do Rio Grande do Sul. A coleta dos dados foi realizada por meio da observação livre por amostragem de tempo e entrevista semi-estruturada com os profissionais que atuam nesta unidade de emergência. O estudo abrangeu os trabalhadores que atuam na equipe de emergência que prestam assistência aos indivíduos adultos: médicos, residentes, doutorandos, acadêmicos de medicina, enfermeiros, técnicos de enfermagem, auxiliares de enfermagem, bolsistas de enfermagem, acadêmicos de enfermagem, fisioterapeuta, nutricionista, secretária, recepcionista e vigilantes. A análise dos dados constituiu-se em três etapas: ordenação, classificação dos dados e análise final (MINAYO, 2000). Os princípios éticos foram respeitados, de forma a proteger os direitos dos envolvidos na pesquisa, considerando-se os aspectos apontados por Goldim (2000). Resultados: A atenção às urgências e emergências passa a ser regulamentada pelo Ministério da Saúde a partir de 1999. Nessa data foram estabelecidos os princípios e as diretrizes dos Sistemas Estaduais de Urgência e Emergência, as normas de funcionamento, a classificação e os critérios para habilitação dos serviços que devem participar dos Planos Estaduais de atendimento às urgências e emergências, quais
sejam: regulação médica de urgência e emergência, atendimento pré-hospitalar fixo, atendimento pré-hospitalar móvel, atendimento hospitalar, transporte interhospitalar, além da criação dos núcleos de educação em urgência, que visa à capacitação de recursos humanos da área (BRASIL, 2006). O Regulamento Técnico dos Sistemas Estaduais de Urgência e Emergência preconiza que os serviços sejam providos de acolhimento com triagem classificatória de risco e atendimento subseqüente, conforme a necessidade do caso. Nos casos de demanda inadequada o regulamento preconiza que ocorra o redirecionamento para a devida inserção no SUS ou para o prosseguimento do tratamento (BRASIL, 2006). Entretanto, mesmo com os avanços recentes em termos normativos, a atenção às urgências ainda reúne muitas das fragilidades encontradas no SUS. Muitas vezes é na atenção às urgências e emergências que aparecem de forma mais clara essas fragilidades, que são denunciadas pela deficiência na atenção primária, ausência de leitos, falta de recursos humanos para realização do trabalho e, por fim, baixa qualidade no atendimento ao usuário. De acordo com, Cecílio (1997, p.474) é necessário que novas tecnologias de trabalho e gestão capazes de viabilizar um Sistema de Saúde comprometido com a vida das pessoas sejam pensadas a partir das necessidades e desejos dos usuários. Por outro lado, percebe-se que as unidades de emergência têm se organizado, mesmo que de forma impositiva pelo Sistema, a fim de dar conta das necessidades dos usuários que procuram esses serviços. Resta-nos refletir, a respeito da organização tecnológica dessas unidades e sua relação com a verdadeira finalidade do trabalho nas unidades de emergência, tendo como referência o trabalho das equipes no exato momento de sua realização. O fato é que, a organização atual dos serviços de emergência tem trazido conseqüências desfavoráveis à prática assistencial dos trabalhadores que enfrentam dificuldades em garantir um atendimento com qualidade e resolutividade aos usuários que chegam a esses serviços. Muitas vezes, esses profissionais deparam-se com conflitos de natureza técnica e ética, provocados por problemas relacionados ao processo de trabalho, o que se identifica em situações de superlotação e na deficiência de recursos humanos. Partindo dessas reflexões, entende-se que a
organização tecnológica do trabalho em saúde merece destaque, em especial nas unidades de emergência, tendo em vista a complexidade do trabalho nessas unidades e a necessidade da realização de um trabalho coletivo, dinâmico e integrador para garantir a qualidade da assistência prestada ao usuário do serviço, bem como para melhorar a satisfação do profissional com o objeto do seu trabalho. De acordo com Cecílio (1997), o modelo assistencial idealizado pela população ainda é o da atenção médico-hospitalar, centrada no atendimento médico. O hospital representado pelas unidades de emergência, apesar de superlotado, impessoal e atuando sobre a queixa principal, aparece como local que reúne um somatório de recursos da medicina oficial, quais sejam: consultas, remédios, procedimentos de enfermagem, exames laboratoriais e internações, enquanto as unidades básicas oferecem apenas a consulta. Para Marques (2004) a maioria da população, incluindo os trabalhadores de saúde, ainda acredita que é a estrutura hospitalar que oferece maior segurança e resolutividade aos pacientes. A respeito das concepções de trabalhadores e usuários sobre a atual organização dos serviços de emergência, Cecílio (1997) diz que os profissionais de saúde têm consciência que o seu trabalho é inadequado e que, da mesma forma os usuários reconhecem que o atendimento recebido é paliativo e insatisfatório, entretanto ambos continuam participando desse processo. Conclusão: Torna-se então necessário estimular reflexões sobre a organização do trabalho em unidades de emergência, no sentido de pensar como esse poderia ser planejado para prestar uma assistência adequada às reais necessidades dos usuários. Palavras chave: Emergência, Serviços Médicos de Emergência, Organização e Administração. Área temática: Organização e Gestão do Trabalho Referências
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