III-072 CONTRIBUIÇÃO PARA O ESTUDO E AVALIAÇÃO DA RELAÇÃO CARBONO NITROGÊNIO NA COMPOSTAGEM Juliana Pinto Mota (1) Engenheira Civil pela Universidade Federal da Paraíba em 1999; Mestre em Engenharia Civil, sub-área Engenharia Sanitária e Ambiental pela Universidade Federal da Paraíba em 2002. João Tinôco Pereira Neto Engenheiro Civil pela UFMA; M. Sc. em Engenharia Sanitária pela UFPB; Ph.D. em Engenharia Sanitária e Ambiental (1987) pela Universidade de Leeds; Professor Titular da Universidade Federal de Viçosa (UFV); Consultor em Resíduos Sólidos de vários Órgãos Nacionais e Internacionais; Profissional Agraciado com a Comenda do Meio Ambiente pela OAB. Beatriz Susana Ovruski de Ceballos Bioquímica pela Universidade Nacional de Tucumán Argentina; Mestre em Microbiologia e Imunologia pela Escola Paulista de Medicina (SP); Drª em Microbiologia Ambiental (USP-SP). Profª Adjunta do DEC/CCT/UFPb. Coordenadora do Mestrado de Engenharia Civil; Chefe do Laboratório de Saneamento AESA/DEC/CCT/UFPb. Francimara Costa de Souza Engenheira Sanitarista pela Universidade Federal do Pará em 2000; Mestre em Engenharia Civil, sub-área Engenharia Sanitária e Ambiental pela Universidade Federal da Paraíba em 2002. Endereço (1) : Rua Maria de Lourdes Crispim Lima, 297 - Bairro Universitário Campina Grande - PB - CEP: 58109-095 - Brasil - Tel: +55 (83) 333-2848 - e-mail: jupmota@yahoo.com RESUMO A matéria orgânica putrescível da massa de resíduo sólido urbano tem forte efeito poluidor, devido à produção de gases e chorume quando não se submete este resíduo a um tratamento adequado. Um tratamento adequado é a compostagem, que é um processo de baixo custo, alta simplicidade operacional e grande eficiência. Geralmente a fração orgânica dos resíduos sólidos urbanos já se encontra em condições favoráveis para o processo, não sendo necessário se fazer correção dos fatores que influenciam na sua biodegradação. Porém, com o objetivo de avaliar a interferência da relação C/N no processo de compostagem foram montados dois experimentos adicionando-se serragem à fração orgânica dos resíduos sólidos urbanos nas seguintes proporções: 30 e 15%. Foi verificada a possibilidade de adição deste resíduo nas proporções determinadas sem causar prejuízos a compostagem e simultaneamente efetuar o tratamento de dois materiais. PALAVRAS-CHAVE: Compostagem, resíduo orgânico, serragem, relação C/N. INTRODUÇÃO No Brasil cerca de 65% do resíduo urbano é composto de matéria orgânica, a qual é responsável pela produção de chorume e gases que poluem o meio ambiente quando o lixo é disposto de maneira inadequada. Uma solução eficiente e de baixo custo para o tratamento da fração orgânica é a compostagem, que é um processo de reciclagem da matéria orgânica, através da qual se produz um composto orgânico passível de ser utilizado na agricultura como fertilizante orgânico e condicionador de solos, entre outras vantagens. Segundo PEREIRA NETO (1987), compostagem é um processo aeróbio controlado, desenvolvido por uma população diversificada de microrganismos, de tratamento e estabilização de resíduos orgânicos para a produção de húmus. O processo compreende duas fases: fase de degradação ativa, onde ocorrem as reações bioquímicas de oxidação mais intensas e fase de maturação, onde ocorre a humificação da matéria orgânica previamente estabilizada. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 1
Por ser um processo biológico, a compostagem é afetada por diversos fatores que possam influenciar na atividade microbiológica. Dentre estes, destacam-se: teor de umidade, temperatura, aeração, concentração de nutrientes, tamanho das partículas e ph. Quanto à concentração de nutrientes, o carbono e o nitrogênio são os principais, pois estes são necessários ao crescimento dos microrganismos (PEREIRA NETO, 1987). Segundo KIEHL (1985) os microrganismos absorvem os elementos C e N em uma proporção de trinta partes de carbono para cada parte de nitrogênio, sendo os limites 26/1 e 35/1 considerados por este autor como as relações C/N mais recomendadas para uma rápida e eficiente compostagem. Segundo DE BERTOLDI et al. (1983) a relação C/N ótima no início do processo de compostagem é de 25/1. Entretanto PEREIRA NETO (1989) cita que a relação C/N inicial mais favorável ao processo está entre 30 a 40/1. O resíduo orgânico urbano, por ser bem diversificado, apresenta em sua composição, nutrientes em proporções favoráveis para a sua degradação, não sendo, portanto necessária a correção da relação C/N para a compostagem deste resíduo. Porém este estudo tem como intuito verificar a interferência desta relação no processo de compostagem (tempo de compostagem e qualidade do composto) no caso dos resíduos que apresentam uma relação C/N elevada. MATERIAIS E MÉTODOS Foram montados e monitorados dois experimentos, com diferentes relações C:N obtidas com a mistura de serragem à fração orgânica do RSU nas proporções: 15 e 30% em peso de serragem e um experimento testemunho, contendo apenas a fração orgânica do resíduo urbano. Para estes experimentos adotou-se o processo LESA de compostagem, no qual a aeração é realizada através do reviramento manual da massa de compostagem. De acordo com a mistura e as proporções, as pilhas foram designadas pelas seguintes siglas: a. : pilha composta por 30% em peso de serragem e 70% de resíduo orgânico; b. : pilha composta por 15% em peso de serragem e 85% de resíduo orgânico; c. : pilha constituída por resíduo orgânico urbano (experimento testemunho) As pilhas de compostagem foram monitoradas durante 90 dias através da determinação de parâmetros físicos (temperatura e densidade), físico-químicos (teor de umidade, ph e teor de sólidos voláteis) e químicos (concentração de carbono orgânico total, nitrogênio, fósforo, potássio e ácidos húmicos) e bacteriológicas (estreptococos fecais). RESULTADOS Com a adição da serragem, a relação C/N do material no início da compostagem passou de 21:1 a 73:1 no caso da e a 51:1 na. As pilhas quando recém montadas apresentavam temperaturas próximas à ambiente (28ºC) e atingiram a faixa termofílica (40 a 60ºC) em um período de 24 a 48 horas. As pilhas e mantiveram as temperaturas na faixa termofílica por um período de 60 a 65 dias, o qual evidencia que apesar do material apresentar uma relação C/N alta no início da compostagem a fase de degradação ativa nos dois experimentos ocorreu dentro do período esperado (70 a 90 dias), não comprometendo o tempo de compostagem (FIGURA 1). O teor de umidade da ficou abaixo da faixa desejada (em torno de 55%), variando de 25 a 48% durante todo o processo. Este fato ocorreu provavelmente devido às elevadas temperaturas, na faixa de 70ºC, registradas nesta leira durante a fase de degradação ativa e que devem ter proporcionado excessiva liberação de vapor d água em proporções maiores do que à água fornecida durante os reviramentos. Porém, apesar do baixo teor de umidade, a leira apresentou uma boa redução de sólidos voláteis, de 49%. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 2
8 7 Temperatura média (ºC ) 5 3 Fase Termofílica Fase Mesofílica 1 0 5 11 17 23 29 34 39 45 51 57 63 69 74 80 FIGURA 1: Variação da temperatura nas pilhas de compostagem. De fato, o teor de sólidos voláteis apresentou uma redução satisfatória durante o processo de compostagem em todos os experimentos, variando de 39 a 49%. Segundo a bibliografia especializada, um processo de compostagem eficiente deve apresentar uma redução média de 40% do teor inicial de sólidos voláteis. Os experimentos onde houve adição de serragem (FIGURA 2) apresentaram valores considerados discrepantes no teor de sólidos voláteis devido à heterogeneidade da mesma, ocorrendo em algumas amostras um acréscimo quando deveria ocorrer um decréscimo deste teor. Este fato induz a acreditar que o material utilizado para a pesquisa deveria ter sido mais homogêneo (serragem proveniente de um único tipo de madeira), para evitar que cada amostra apresentasse composição de madeiras diferentes. Dias 10 8 % S. V. 0 7 14 21 28 35 42 49 56 63 70 77 84 91 Dias FIGURA 2: Variação do teor de sólidos voláteis nas pilhas de compostagem ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 3
O ph não sofreu influência significativa pelo aumento da relação C/N, e apresentou comportamento típico dos processos de compostagem, iniciando o processo na faixa ácida (5,7 a 6,1) e chegando ao final na faixa alcalina (7,5 a 9,1). A relação C/N, objetivo do estudo, apresentou uma redução satisfatória em todos os experimentos, variando de 47% a 67,70%. Embora a e a tenham chegado ao final do processo com uma relação C/N superior a 15/1 (FIGURA 3), estas apresentaram uma boa redução, de 67,70 e 62,40% respectivamente. O composto da apresentou uma relação C/N de 19/1, valor tolerável para composto orgânico segundo a Legislação do Brasil (IPT, 2000). 8 7 5 C/N 3 1 0 30 Dias 60 90 FIGURA 3: Variação da Relação Carbono/Nitrogênio Todos os experimentos apresentaram aumento gradual dos nutrientes nitrogênio, fósforo e potássio, com exceção do experimento testemunho, onde ocorreu uma perda de nitrogênio de 26% ao longo do processo, provavelmente por volatilização da amônia proporcionada pela alta temperatura associada a meios alcalinos. Entretanto, chegou ao final do processo com teores de nutrientes satisfatórios, com teor de nitrogênio acima do valor mínimo especificado pela ABNT (0,9%), teor de fósforo entre 0,16 e 0,4 os quais estão inseridos em uma faixa de baixa concentração (segundo KIEHL (1985) valores < 0,5) e teor de potássio com valores entre 0,5 e 1,3 inseridos numa faixa de média concentração (0,5 e 1,5% segundo o mesmo autor). Foi determinado o teor de ácidos húmicos ao longo da compostagem. Os resultados mostraram, que ao longo do tempo, apenas a teve um aumento significativo de 190%. Nos demais experimentos não foram constatados os aumentos esperados com a humificação do material. Provavelmente esse resultado foi devido a falhas no método de determinação, visto que inicialmente se obtiveram valores altos para materiais não humificados, os quais certamente não correspondem à realidade. De acordo com EGREJA FILHO (1993), o método utilizado para a extração dos ácidos húmicos (método desenvolvido pela International Humic Substance Society IHSS), extrai também proteínas, carboidratos e lignina, levando a interpretações errôneas dos resultados. O processo de compostagem se mostrou eficiente quanto a sanitização do material em todos os experimentos, os quais chegaram ao final do processo com uma contagem de estreptococos fecais inferior a 100 UFC/g. As pilhas que continham serragem na sua composição apresentaram uma maior eficiência quanto a sanitização, evidenciando uma contagem de estreptococos fecais inferior a 100 UFC/g no 49º dia na PLSR (30%) e no 56º dia na. A apresentou contagem de estreptococos fecais inferior a 100 UFC/g após o 70º. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 4
CONCLUSÕES Verificou-se que a adição de serragem nas proporções testadas (30 e 15%), não prejudicou a eficiência da compostagem, podendo assim, este processo de tratamento da fração orgânica dos RSU ser uma solução eficiente também para o tratamento de resíduos de marcenarias. O composto produzido a partir da mistura de serragem com resíduo orgânico (30% de serragem), apesar de não atender ao valor estabelecido para o parâmetro C/N pela Legislação do Brasil, apresentou uma boa redução dos sólidos voláteis, bem como da relação C/N, refletindo assim um bom grau de estabilização. Os demais experimentos atenderam aos valores estabelecidos pela Legislação do Brasil. A serragem mostrou não interferir na eficiência da sanitização do composto, sendo esta uma grande vantagem. Até é possível se evidenciar uma otimização da sanitização nas leiras com adição deste material ao resíduo orgânico, o qual é de grande importância, porque pode contribuir com a obtenção de um composto bacteriologicamente mais seguro. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. DE BERTOLDI, M; VALLINI, G; PERA, A. The biology of composting: a review, In: Waste management & research. 1993. 2. EGREJA FILHO, F. B. Avaliação da Ocorrência e Distribuição Química de Metais Pesados na Compostagem do Lixo Domiciliar Urbano. Dissertação de Mestrado, UFV Departamento de Engenharia Civil da Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, 1993. 3. KIEHL, E. J. Fertilizantes Orgânicos. Piracicaba, 1985. 4. PEREIRA NETO, J. T. On the treatment of municipal refuse and sewage sludge using aerated static pile composting: a low cost technology approach. Tese de doutorado University of Leeds, Leeds, 1987. 5. PEREIRA NETO, J. T. Conceitos Modernos de Compostagem. Engenharia Sanitária, abril/jun 104-109, 1989. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 5