EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) JUIZ(A) FEDERAL DA 1ª VARA FEDERAL DE DUQUE DE CAXIAS - SEÇÃO JUDICIÁRIA DO RIO DE JANEIRO

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Transcrição:

EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) JUIZ(A) FEDERAL DA 1ª VARA FEDERAL DE DUQUE DE CAXIAS - SEÇÃO JUDICIÁRIA DO RIO DE JANEIRO Processo nº 5010720-05.2019.4.02.5101 Apelante: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. Apelado: GUSTAVO CANUTO BEZERRA. O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pelo Procurador da República que esta subscreve, nos autos da presente Ação Civil Pública movida em face de GUSTAVO CANUTO BEZERRA, inconformado com a respeitável sentença contido no evento 38, com fundamento no art. 1900 do Código de Processo Civil, vem interpor APELAÇÃO cujas razões seguem anexas, para que, após as formalidades de estilo, seja devolvido o conhecimento da matéria impugnada ao Juízo ad quem, com a remessa dos autos ao Egrégio Tribunal Regional Federal da 2ª Região. São João de Meriti, 15 de maio de 2020. ASSINADO DIGITALMENTE Julio José Araujo Junior Procurador da República

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RELATOR DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO Apelante: Apelado: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL GUSTAVO CANUTO BEZERRA. RAZÕES DE RECURSO DE APELAÇÃO O Ministério Público Federal, pelo Procurador da República signatário, vem, respeitosamente, à presença de Vossas Excelências apresentar suas Razões de Apelação contra a sentença contida no evento 38, proferida pelo Juízo a quo nos autos do processo em epígrafe, pelos fundamentos de fato e de direito a seguir expostos: I - DA TEMPESTIVIDADE Inicialmente, cabe salientar que o presente recurso de apelação é tempestivo, nos termos do art. 1.003 5º do Código de Processo Civil de 2015, que prevê prazo de 15 dias contados da intimação do MPF para sua interposição, c/c art. 180 do CPC de 2015 do mesmo diploma legal, que prevê prazo em dobro ao Ministério Público para recorrer. No cômputo do prazo, somente serão considerados os dias úteis, conforme o art. 219 do CPC de 2015. Sendo assim, uma vez que o processo foi remetido para o MPF em 13/05/2020 (evento 40), está aguardando abertura no Sistema Eproc. Desse modo, o presente recurso é tempestivo.

II SÍNTESE DO CASO O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ajuizou ação civil pública em face de GUSTAVO CANUTO BEZERRA buscando sua condenação ao pagamento de R$ 20.000,00 a título de danos morais coletivos e a publicar, no seu perfil pessoal do Facebook, em modo público, nota de retratação pelo comentário que originou a demanda (comentário de cunho homofóbico), especificando tratar-se de condenação judicial imposta nos autos desta ação civil pública, devendo a referida postagem permanecer no ar por, pelo menos, 1 ano. Narra a petição inicial que o demandado utilizou usou seu perfil na rede social Facebook para postar conteúdo discriminatório contra a comunidade LGBT, nos seguintes termos: Todo homossexual é promíscuo. Não tenho amigos assim. Não quero perto dos meus filhos e da minha família. Graças a Deus que a lei da homofobia será revogada pelo novo presidente. Essa minoria voltará aos guetos que é o seu lugar. Os locais públicos terão uma faixa bem vizível dizendo: AMBIENTE HETERONORMATIVO. Voltaremos a poder não aceitar esses anormais em nossos estabelecimentos O juízo da 14º Vara Federal do Rio de Janeiro determinou que o MPF esclarecesse as razões que ensejariam a competência do Juízo da Capital para processar e julgar a demanda (evento 3). Manifestação do MPF requereu o reconhecimento da competência do Juízo da Capital e o prosseguimento do feito (evento 6). Decisão do juízo da 14º Vara Federal do Rio de Janeiro declinou, então, da competência para uma das varas federais da Subseção de Duque de Caxias (evento 8). No evento 14, consta decisão da 1ª Vara Federal de Duque de Caxias, em que fixou a sua competência para processar e julgar o feito, e determinou a citação do

réu para apresentar resposta. O demandado apresentou contestação, no evento 24. O juízo determinou que o MPF apresentasse réplica e especificasse as provas que pretendia produzir, e determinou que, após, fosse dada vista ao réu, para especificação de provas (evento 27). O MPF apresentou réplica no evento 31. O demandado não indicou provas (evento 34). O juízo da 01ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Duque de Caxias/RJ julgou então parcialmente procedente o pedido, para condenar o réu ao pagamento de R$ 5.000,00 a título de compensação por danos morais coletivos, a serem revertidos ao Fundo Federal de Defesa dos Direitos Difusos; e julgou improcedente o pedido de publicação, no seu perfil pessoal do Facebook, em modo público, de nota de retratação pelo comentário que originou a presente demanda. Todavia, a despeito de sua clara fundamentação e acerto parcial, respeitosamente, a r. sentença merece reforma, tendo em vista as razões a seguir. III - FUNDAMENTOS PARA A REFORMA A) MAJORAÇÃO DA INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL A sentença contida no evento 38 deve ser reformada a fim de se majorar

o valor arbitrado da indenização por danos morais, conforme as razões que se passam a expender. O ato praticado pelo apelado foi plenamente demonstrado nos autos, tendo a parte ré confirmado a autoria da publicação e tentado justificar que seria apenas uma brincadeira entre amigos. que dizia o que segue: O apelado postou, na sua rede social (Facebook) texto de sua autoria Todo homossexual é promíscuo. Não tenho amigos assim. Não quero perto dos meus filhos e da minha família. Graças a Deus que a lei da homofobia será revogada pelo novo presidente. Essa minoria voltará aos guetos que é o seu lugar. Os locais públicos terão uma faixa bem vizível dizendo: AMBIENTE HETERONORMATIVO. Voltaremos a poder não aceitar esses anormais em nossos estabelecimentos As declarações do apelado constituem uma agressão evidente a pessoas homossexuais, atribuindo-lhes uma característica estigmatizante e tida pelo emissor como negativa como forma de demonstrar sua repulsa, apontando, ainda, a necessidade de que os locais públicos não deveriam aceitar tal condição. Assim, causou dano de natureza moral eis que violam o princípio basilar da dignidade da pessoa humana. Apesar de o juízo ter reconhecido que as falas extrapolam a esfera da mera opinião do réu, julgando procedente o pedido no que se refere à indenização por danos morais, o valor arbitrado de R$ 5.000,00 foi pequeno ante a conduta reprovável do apelado. O dano moral é a lesão à esfera íntima da pessoa, aos seus valores, às suas concepções e crenças, à sua individualidade como ser humano íntegro, dotado de existencialidade corpórea, sensibilidade, razão e paixão. Essa ofensa traduz, em sua, uma violência aos direitos de personalidade.

As falas proferidas pelo apelado demonstram nitidamente o ato discriminatório contra os homossexuais. A homofobia é uma violação do direito Humano fundamental de liberdade de expressão da singularidade humana, revelando-se um comportamento discriminatório. A conduta discriminatória do apelado constitui ato atentatório ao art. 3º, IV, da Carta Política, o qual descreve como objetivo fundamental da República Federativa do Brasil promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Além disso, o art. 5º, XLI, da Constituição prevê que a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais. Recentemente o STF, por ocasião do julgamento do MI 4.733, reconheceu que a homofobia e a transfobia estão equiparadas às demais discriminações tuteladas pela Lei nº 7.716/1989, cuja decisão foi prolatada nos seguintes termos: O Tribunal, por maioria, conheceu do mandado de injunção, vencido o Ministro Marco Aurélio, que não admitia a via mandamental. Por maioria, julgou procedente o mandado de injunção para (i) reconhecer a mora inconstitucional do Congresso Nacional e; (ii) aplicar, com efeitos prospectivos, até que o Congresso Nacional venha a legislar a respeito, a Lei nº 7.716/89 a fim de estender a tipificação prevista para os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional à discriminação por orientação sexual ou identidade de gênero, nos termos do voto do Relator, vencidos, em menor extensão, os Ministros Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli (Presidente) e o Ministro Marco Aurélio, que julgava inadequada a via mandamental. Plenário, 13.06.2019. (grifo nosso) E por ocasião do julgamento da ADO 26, o STF assim decidiu: O Tribunal, por unanimidade, conheceu parcialmente da ação direta de inconstitucionalidade por omissão. Por maioria e nessa extensão, julgou-a procedente, com eficácia geral e efeito vinculante, para: a) reconhecer o estado de mora inconstitucional do Congresso Nacional na implementação da prestação legislativa destinada a cumprir o mandado de incriminação a que se referem os incisos XLI e XLII do art.

5º da Constituição, para efeito de proteção penal aos integrantes do grupo LGBT; b) declarar, em consequência, a existência de omissão normativa inconstitucional do Poder Legislativo da União; c) cientificar o Congresso Nacional, para os fins e efeitos a que se refere o art. 103, 2º, da Constituição c/c o art. 12-H, caput, da Lei nº 9.868/99; d) dar interpretação conforme à Constituição, em face dos mandados constitucionais de incriminação inscritos nos incisos XLI e XLII do art. 5º da Carta Política, para enquadrar a homofobia e a transfobia, qualquer que seja a forma de sua manifestação, nos diversos tipos penais definidos na Lei nº 7.716/89, até que sobrevenha legislação autônoma, editada pelo Congresso Nacional, seja por considerar-se, nos termos deste voto, que as práticas homotransfóbicas qualificamse como espécies do gênero racismo, na dimensão de racismo social consagrada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento plenário do HC 82.424/RS (caso Ellwanger), na medida em que tais condutas importam em atos de segregação que inferiorizam membros integrantes do grupo LGBT, em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade de gênero, seja, ainda, porque tais comportamentos de homotransfobia ajustam-se ao conceito de atos de discriminação e de ofensa a direitos e liberdades fundamentais daqueles que compõem o grupo vulnerável em questão; e e) declarar que os efeitos da interpretação conforme a que se refere a alínea d somente se aplicarão a partir da data em que se concluir o presente julgamento, nos termos do voto do Relator, vencidos os Ministros Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli (Presidente), que julgavam parcialmente procedente a ação, e o Ministro Marco Aurélio, que a julgava improcedente. (grifo nosso) Embora a tese fixada pelo STF tenha, no campo penal, aplicação para os fatos posteriores ao julgamento, esse raciocínio é plenamente aplicável neste caso, já que as razões que determinaram o recente entendimento incriminando o ato homofóbico servem para demonstrar a gravidade dos atos praticados contra os homossexuais, podendo ser inserida a conduta do apelado no conceito de ato discriminatório e homofóbico, razão pela qual deve ser majorada a verba indenizatória por danos morais. Quanto ao valor dos danos morais, o quantum deve ser tal que desestimule a prática de condutas semelhantes no futuro e, dentro do possível, que recomponham o mal estar gerado pela publicação. Ocorre que o valor arbitrado em R$ 5.000,00 não é adequado, pois não alcança a finalidade a que se destina essa indenização. A doutrina e a jurisprudência

tendem a conferir à reparação por dano moral um caráter dúplice, isto é, uma forma de punição ao agente que praticou a conduta e uma compensação à vítima (no caso, um grupo indeterminável). Colaciona-se julgado do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, em um julgamento similar ao presente caso, no qual a verba indenizatória foi fixada em R$ 150.000,00: 0115411-06.2011.8.19.0001 APELAÇÃO, Des(a). Relatora INÊS DA TRINDADE CHAVES DE MELO, Julgamento: 08/11/2017, SEXTA CÂMARA CÍVEL APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ALEGADA VIOLAÇÃO A DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. DEMANDA INTERPOSTA POR ENTIDADES DE CLASSE DE COMBATE À HOMOFOBIA. DECLARAÇÕES EMANADAS POR DEPUTADO FEDERAL, EM PROGRAMA TELEVISIVO, QUE ATINGIRAM A HONRA E A DIGNIDADE DA COMUNIDADE LGBT. PEDIDO JULGADO PARCIALMENTE PROCEDENTE PARA CONDENAR O RÉU AO PAGAMENTO DO IMPORTE DE R$ 150.000,00 (CENTO E CINQUENTA MIL REAIS) A TÍTULO DE DANOS MORAIS COLETIVOS. RECURSO DE APELO DO RÉU, ARGUMENTANDO, PRELIMINARMENTE, A ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAUM, A INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA E A VIOLAÇÃO À PRERROGATIVA DA IMUNIDADE MATERIAL. APELAÇÃO ADESIVA, INTERPOSTA PELOS AUTORES PLEITEANDO A MAJORAÇÃO DOS DANOS MORAIS COLETIVOS. (...)Preliminares rejeitadas. Quanto à análise do mérito, como principal tese defesa, alega o réu a ocorrência de violação a sua prerrogativa funcional de imunidade parlamentar, em seu aspecto material ou substantivo (freedom of speech), a que faz jus no exercício do mandato de Deputado Federal, conforme previsto no art.53 da CR/88. (...)No caso em tela, as palavras proferidas pelo réu, fora do recinto da Casa Legislativa e em programa veiculado em rede nacional, além não guardarem qualquer correlação com o livre exercício de seu mandato parlamentar, provocaram humilhação e sentimento de menos valia aos atingidos. Há, em diversas falas do réu, como ao dizer que "não correria o risco" de ter um filho homossexual, em razão da boa educação dedicada aos filhos e "por ter sido um pai presente" ou que "ninguém tem orgulho de ter um filho gay ou uma filha lésbica" a exteriorização de uma ideia de inferioridade e de inadequação social e moral daqueles que possuem uma orientação sexual diversa da sua, a qual propala ser a única correta. Desta forma, a exposição pública do réu, discutida nestes autos, não está acobertada pelo manto da imunidade parlamentar

material, além do que está em frontal inobservância ao objetivo republicano fundamental de promoção do bem de todos sem quaisquer formas de discriminação, insculpido no inciso IV do art.3º da CR/88. Igualmente, não há que se falar, na presente hipótese, da ocorrência de nenhum ato de censura, posto que, diferentemente do seu significado, em que há um julgamento prévio da conveniência da liberação ou exibição pública de manifestações, o réu, em pleno exercício do seu direito fundamental à liberdade de expressão, não só o exerceu, como abusou de tal postulado, ao exprimir consideração de cunho, eminentemente, ofensivo, sob o espeque de descrever uma opinião pessoal que entendia estar salvaguardada pela prerrogativa constitucional da imunidade. DANOS MORAIS COLETIVOS QUE RESTARAM CARACTERIZADOS EM RAZÃO DAS OFENSAS IRROGADAS PELO RÉU A TODOS OS REPRESENTADOS DOS AUTORES, CIDADÃOS QUE CONTINUAM NA BUSCA DA EFETIVAÇÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS E DA ERRADICAÇÃO DAS DIVERSAS FORMAS DE DISCRIMINAÇÃO AINDA PRESENTES NA SOCIEDADE. VALOR ARBITRADO A ESTE TÍTULO, PELA JUÍZA A QUO, EM R$ 150.000,00 (CENTO E CINQUENTA MIL REAIS), QUE NÃO MERECE RETOQUE, POSTO QUE, DEVIDAMENTE, OBSERVADOS OS REQUISITOS PARA SUA FIXAÇÃO, MORMENTE NO QUE CONCERNE AO CRITÉRIO DA CAPACIDADE ECONÔMICA DO RÉU, PESSOA FÍSICA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. DESPROVIMENTO DOS RECURSOS. (grifo nosso) Portanto, pelos fundamentos ora expostos, há que se reconhecer que a quantia arbitrada pelo Juízo a quo foi demasiadamente ínfima se comparada ao ato reprimido, motivo pelo qual serve-se do presente recurso para requerer a reforma parcial do julgado com a majoração do valor arbitrado pela indenização por danos morais. B) CABIMENTO DA RETRATAÇÃO Igualmente, deve ser reformada a sentença no ponto em que julgou improcedente o pedido de publicação de nota de retratação, pelo demandado, no seu perfil pessoal do Facebook. O juízo fundamentou o indeferimento do pedido por entender que não há amparo legal, e considerou não ser possível invadir campo próprio de sua liberdade de ação de ter ou não rede social.

Quanto a essa questão, é importante ressaltar que a menção à rede social Facebook, no pedido do MPF, buscou pontuar que a retratação deveria ter o mesmo alcance da declaração discriminatória. O pedido do MPF buscou a condenação do réu a publicar nota de retratação, haja vista que tal determinação é parte integrante do direito à reparação civil pelo dano moral sofrido, e atende a uma finalidade pedagógica. A operacionalização de tal publicação faz parte do cumprimento da obrigação de fazer, e, sendo comprovado que o demandado desativou sua conta na rede social (buscando se furtar da responsabilidade pelos seus atos), serão buscados meios alternativos de cumprimento que permitam conferir à nota de retratação o mesmo alcance da publicação discriminatória. Desse modo, conclui-se que a sentença deverá ser reformada para que se condene o demandado a publicar nota de retratação pelo comentário que originou a presente demanda. IV - CONCLUSÃO. Ante o exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL requer que seja conhecido e provido o presente recurso de apelação para reformar parcialmente a sentença majorando o valor arbitrado da indenização por danos morais coletivos em R$ 20.000,00 (vinte mil reais), e para que condene o demandado a publicar, no seu perfil pessoal do Facebook, em modo público, nota de retratação pelo comentário que originou a presente demanda, especificando tratar-se de condenação judicial imposta nos autos desta ação civil pública, devendo a referida postagem permanecer no ar por, pelo menos, 1 ano. São João de Meriti, 15 de maio de 2020. ASSINADO DIGITALMENTE Julio José Araujo Junior

Procurador da República