CPM Creation Process Management: Considerações Sobre o Processo de Criação em Alunos de Design e Arquitetura



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Transcrição:

CPM Creation Process Management: Considerações Sobre o Processo de Criação em Alunos de Design e Arquitetura CPM: Considerations on Creation Process Management for Design and Architecture Students Castillo, Leonardo; PhD; Universidade Federal de Pernambuco leonardo.a.gomez@gmail.com Dantas, Ney; PhD; Universidade Federal de Pernambuco ney.dantas@gmail.com Resumo O objetivo da presente pesquisa é compreender como o processo de criação é gerenciado a fim de facilitar o entendimento e aprendizado do problema de design para chegar a soluções inovadoras. A pesquisa é resultado das observações realizadas na condução de 3 disciplinas e várias oficinas ministradas aos alunos dos cursos de graduação em Design e Arquitetura da UFPE e UFRN. Nessas disciplinas, o ato de criar é entendido e proposto como um processo dinâmico de construção de desafios e não de resolução de problemas. Um processo que é composto de diversos sub-processos que é capaz de agir como um objeto de pesquisa e teste de novas idéias, conceitos e formas inovadoras de resolução de problemas. Palavras Chave: processo de criação ; ensino do design; inovação. Abstract The objective of this paper is to understand how the creation process is managed in order to facilitate problem understanding and learning, during the development of innovative solutions. The research is the result of an experiment conducted in 3 courses and several workshops among design and architecture students. The creation act, instead of being a tool for problem solving, is understood as a dynamic process of challenge resolution. It is a process divided into several sub-processes that is able to act as research object as well as a testing tool for new ideas, concepts and innovative forms. Keywords: creation process management; design teaching; innovation. IMPORTANTE: na parte inferior desta primeira página deve ser deixado um espaço de pelo menos 7,0 cm de altura, medido da borda inferior, no qual serão acrescentadas, pelos editores, informações para referência bibliográfica

Introdução No desenvolvimento da metodologia e teoria do design, vários autores descrevem o processo de design como uma atividade que é agregada a conceitos de criatividade, fantasia cerebral, senso de invenção e de inovação tecnológica (Bürdek, 2006). Nessa perspectiva, o design é caracterizado como uma espécie de ato cerebral que tem como objetivo dar resposta satisfatória a um determinado problema dentro de um contexto específico. O processo cognitivo que se manifesta na ação do design, constitui uma etapa fundamental do desenvolvimento de produtos. Trata-se de uma atividade mental através da qual o designer projeta e configura todo tipo de artefatos, incluindo utensílios, vestimentas, peças gráficas, livros, máquinas, ambientes, softwares, etc. Paralelamente, essa atividade mental está condicionada por fatores e decisões externas que vão além do projeto, e transcendem o ato projetual (Moraes, 2006). Trata-se de diversos fatores produtivos, tecnológicos, mercadológicos, socioeconômicos, e culturais que suportam e guiam a atividade projetual num cenário de criação fluido e dinâmico, viabilizando as soluções resultantes desse processo. Foi principalmente a partir dos anos sessenta que as pesquisas relacionadas a processos de criação e métodos de design ganharam volume. Motivados pelo aumento da complexidade dos problemas, da quantidade de informação envolvida na busca de soluções e, principalmente, pela grande e variada demanda de projetos, buscava-se abrir a caixa preta do processo de concepção para tornar clara e transparente a atividade de design (Neves et all, 2008). Os avanços na formulação de modelos metodológicos de caixa transparente permitiu, entre outras coisas, que o processo de design pudesse ser algo ensinável, aprendível e com isto comunicável de forma sistemática no âmbito acadêmico. Com isso, a adoção desses modelos facilitou o ensino lógico e racional do processo de resolução de problemas. Métodos tradicionais de design, como os propostos por Jones, Archer, Bürdek, Löbach, Rittel, Assimov e Alexander, enfatizam a necessidade de realizar uma análise racional rigorosa que preceda a síntese. Essa abordagem prescritiva busca derivar especificações lógicas a partir da formulação do problema, uma análise racional posterior a cada etapa do processo e uma seleção da solução ótima baseada em critérios analíticos. Nesse contexto, a ação de criar ato criativo passa a ser uma etapa metodológica do processo, a ser desenvolvida uma vez que o problema de design tenha sido compreendido de maneira exaustiva para poder derivar ações lógicas a partir da definição do mesmo (Guersenzvaig, 2010). Diversos autores questionam a compatibilidade dos modelos prescritivos com a forma como o processo de design acontece na prática (Cross, 2006, Darke 1979). Para chegar a uma solução inovadora, a rígida hierarquia e linearidade do enfoque prescritivo, adotado por tantos anos na academia, nem sempre garante que o designer consiga seguir a risca e de maneira lógica cada etapa do processo. O caráter racionalista e analítico que os métodos prescritivos conferem ao processo de criação, servem como instrumento de validação dos pressupostos do designer com relação ao problema, mas não ajudam a construir e definir os conceitos de inovação próprios do ato criativo.

O que acontece quando o processo de criação deixa de ser uma etapa metodológica, para se transformar ele mesmo em um objeto de investigação que guie o processo de design? Com essa inquietação como ponto de partida, foi realizada a presente pesquisa. O objetivo é compreender como o processo de criação é gerenciado a fim de facilitar o entendimento e aprendizado do problema de design para chegar a soluções inovadoras. A pesquisa é resultado das observações realizadas na condução de 3 disciplinas e várias oficinas ministradas aos alunos dos cursos de graduação em Design e Arquitetura da UFPE e UFRN. Nessas disciplinas, o ato de criar é entendido e proposto como um processo dinâmico de construção de desafios e não de resolução de problemas. Um processo que é composto de diversos sub-processos que é capaz de agir como um objeto de pesquisa e teste de novas idéias, conceitos e formas inovadoras de resolução de problemas. A seguir, são apresentadas a mecânica e as principais contribuições da proposta. O documento esta distribuído em outras 3 seções. Na seção 1 apresentamos um breve histórico das metodologias de design, na seção 2 introduzimos a dinâmica das disciplinas e os resultados das mesmas, na seção 3 apresentamos o modelo CPM. Abordagens Metodológicas em Design e Arquitetura: o caminho prescritivo Após a Segunda Guerra Mundial iniciou-se um grande crescimento econômico dos países industrializadas, motivado principalmente pelo crescimento da economia de mercado e a acirrada concorrência das empresas em expansão. Nesse novo contexto, as empresas necessitavam adaptar seus métodos de design de produtos para uma abordagem que fosse condizente com os novas formas racionais de produção industrial. Buscava-se abrir a caixa preta do processo de concepção para tornar clara e transparente a atividade de design. Para isso, era necessário que o processo de design deixasse de ser menos intuitivo e subjetivo, e adotasse métodos científicos de projeto, a fim de ser aceito pela industria. Datam dos anos 60 as primeiras pesquisas e propostas metodológicas de design com essa nova abordagem. Influenciados pela pesquisa aeroespacial, surgem os assim chamados métodos da primeira geração em design (Rittel, 1973 Apud Bürdek, 2006). A noção geral desses métodos baseia-se na idéia de que, antes de criar algo novo, é necessário compreender claramente do que se trata. Neles, o processo de desenvolvimento de um produto é dividido e estruturado em discretas e bem definidas etapas, onde cada fase ocorre após o fechamento da anterior. De uma maneira geral, nessa abordagem prescritiva, o processo de design percorre 3 etapas: inicia-se o processo por uma ampliação de informações a respeito ao entendimento e conhecimento do problema; depois são executadas as fases de geração de alternativas; e finalmente é realizada a seleção e desenvolvimento da melhor solução. São propostas representativas de métodos da primeira geracao os trabalhos de Morris Assimov, Bruce Archer, Christopher Jones, Bernhard Bürdek, Bernhard Löbach e Nigel Cross.

No final dos anos setenta, com o avanço das pesquisas em metodologia e o amadurecimento da atividade do design, iniciou-se uma nova orientação na metodologia que levou a uma mudança de paradigma. De acordo com Bürdek (2006), essa mudança consistia na forma de trabalhar o problema: num primeiro momento, os problemas de design eram abordados desde uma perspectiva dedutiva. Ou seja, para um problema geral era desenvolvida uma solução específica de design, e o processo era direcionado de fora para dentro utilizando uma abordagem prescritiva como método de operacionalização. O novo paradigma orientava o processo de design a uma forma mais indutiva, definindo inicialmente para quem deveria ser desenvolvido o projeto. Surge assim uma segunda geração de métodos de design: os chamados métodos centrados no usuário, marcados principalmente pelo caráter argumentativo, pelas soluções reguladas pela satisfação e por ter aos usuários como parceiros na definição da solução. Contudo, a abordagem geral dos métodos centrados no usuário continua a funcionar de maneira prescritiva, isto é, indicando a seqüência de ações que devem ser seguidos para alcançar o desenvolvimento ideal do produto, mas marcada principalmente pelo fato de as fases do processo não ocorrem mais de forma linear, e sim de forma cíclica, com ações de feedback e com a possibilidade de realizar etapas simultâneas. Isso da ao designer uma maior flexibilidade no processo, favorecendo retornos, avanços e processos concomi-tantes no mesmo. Os principais autores dessa geração são Naisbitt, Kaku, Norman, Nielsen e Burdek. Inquietações sobre o processo criativo na academia No final de 2007, uma inquietação sobre a capacidade inventiva e a produção de alunos de arquitetura e design era tema freqüente nas reuniões informais entre alguns professores do curso de arquitetura e design da UFPE: Os professores estavam insatisfeitos com o reduzido grau de inovação e a pequena quantidade de alternativas que eram levantadas a partir da apresentação de um determinado tema de projeto. Normalmente, as soluções apresentadas se resumiam ao desenvolvimento de diversas variantes de uma única alternativa que se estabelecia como senso comum às turmas. Nossa principal hipótese era de que a existência de uma rígida hierarquia e linearidade das atividades estabelecidas nos métodos tradicionais de ensino de Arquitetura e Design em que a solução de problemas e o entendimento integral do tema sempre antecede a ação de criar causava esta restrição à criação e desenvolvimento de soluções inovadoras. Para tentar entender e propor soluções para esta inquietação durante três semestres foi estabelecida uma disciplina experimental conjunta entre professores e alunos de arquitetura e design, dentro do contexto da proposta político pedagógica do curso de design da UFPE, onde as disciplinas do referido currículo são orientadas a problemas e não a conteúdos e a abordagem de um mesmo problema pode ter ênfases diferentes, de acordo com as habilidades e competências a serem trabalhadas pelos alunos em cada semestre. Como conseqüência desse enfoque, a construção do conhecimento passa a ser o resultado da troca de experiências de uma comunidade de aprendizagem, resultantes da abordagem do problema que foi colocado. Neste modelo, os papeis dos estudantes e professor

se torna mais dinâmico. O estudante assume uma participação mais ativa no processo e o professor passa a ser visto como integrante de um grupo que objetiva a construção do conhecimento, onde sua função é promover desafios que estimulem sinergias entre os integrantes do grupo. As Disciplinas Experimentais: visão sistêmica e CPM A proposta pedagógica das disciplinas, focada no aluno e não no professor (CONNER, 1997), concebia a contínua observação, análise e avaliação dos processos que envolvem a criação como forma de aprendizado e entendimento dos temas de estudo. Nesse sentido, o ato de criar é visto como um processo dinâmico de construção de desafios e não de resolução de problemas. Um processo que é composto de diversos sub-processos capaz de ser gerenciado e agir como um objeto heurístico, testando novas idéias, conceitos e processos. Esta possibilidade de gerenciamento da criação e de seus sub processos surgiu a partir do conhecimento das idéias de pensamento vertical e horizontal de Edward Bono (Bono, 1990) e do conceito de Business Process Management- BPM (Lee & Dale, B. 1998; Ould, M. 2005; Smith, 2003). Bono advoga a utilização complementar da racionalidade e da intuição para potencializar o pensamento criativo e o BPM trata da gestão de processos complexos que estão sempre em constante evolução e mudança. A correspondência entre criação e BPM foi particularmente importante pois nos abriu a possibilidade de alinhamento dos sub-processos inerentes a criação com objetivos estratégicos e necessidades de gerar produtos inovadores de forma permanente. O BPM da criação em design e arquitetura, renomeado CPM (Creation Process Management), se impôs ao longo das disciplinas como uma mudança de atitude: de uma orientação voltada a hierarquia linear em etapas para uma orientação a processos. O CPM passa a ser então uma abordagem estruturada e sistemática que visa analisar, melhorar, controlar e gerir o processo da criação com o objetivo de aumentar o grau de inovação e a qualidade e das propostas desenvolvidas pelos alunos. A rigidez prescritiva das metodologias tradicionais de ensino de Arquitetura e Design é assim rompida e o processo de criação deixa de ser uma etapa metodológica, para ser visto como um sistema onde não existe começo nem fim, onde todos os sub-processos ocorrem ao mesmo tempo. O conceito de CPM começou ser construído de forma experimental ao longo dos três semestres disciplinares: no primeiro reafirmou-se a importância do FAZER e da vivência com a MATÉRIA no processo de criação, o fazer desafiando a matéria. Contando com a colaboração de um químico especialista em gesso e com o desenvolvimento de experimentos em laboratório procurou-se chegar aos limites do material. Surgiram possibilidades como gesso semi flexível, gesso flutuante, gesso para blindagem, gesso com memória. Apesar de propostas inovadoras o período letivo não foi suficiente para que se desenvolvesse algum produto. Os alunos tiveram muita dificuldade de colocar a mão na massa. A importância de SENTIR e CONSTRUIR no processo de criação apareceram claramente como processos estruturadores.

Figura 2: primeiro semestre da disciplina. Exploração com o material. No segundo semestre a disciplina procurou construir pontes entre o fazer e o pensar, para isso a ênfase saiu da matéria para um produto, não um objeto isolado mas um sistema. O desafio foi desenvolver propostas de mobiliário urbano para a orla da Praia de Boa Viagem, o cartão postal da cidade do Recife. Depois de diversas vivências na praia (os alunos foram conduzidos em duplas onde um deles estava vendado; aulas de maquetes conceituais com areia, etc.) que possibilitaram um SABER sensorial e quebraram o gelo entre a mente e a matéria os estudantes alcançaram uma reflexão mais aprofundada sobre o que SIGNIFICAVA a idéia de mobiliário urbano para aquele contexto. Figura 3: segundo semestre da disciplina. Foco no produto Os sistemas não representavam apenas um conjunto de objetos funcionais mas criavam espaços específicos e multi-programáticos. Assim a articulação entre a praia e os edifícios, o calçadão e a areia poderiam ser utilizados também como brinquedos, áreas de contemplação e descanso, apoio para prática de Ginástica ou meditação (figura 3). Ao final do semestre estava

claro para os professores que juntamente com os processos de SENTIR E CONSTRUIR se agregaram os de SABER e SIGNIFICAR. No terceiro e último semestre, a disciplina deu ênfase às explorações formais. A experiência do semestre anterior demonstrou que o processo de significar restringia a liberdade de criação e inovação limitando a produção de alternativas extra-ordinárias. Baseados em pesquisa de visualidade (HANSEN, 2005) onde neuro-cientistas destacavam a importância do estado de pré-atenção na percepção e conhecimento da realidade circundante, resolvemos propor um desafio onde os alunos, por simples afinidade, deveriam escolher uma forma qualquer da natureza e explorá-la ao seu limite. Houve uma grande perplexidade inicial com os alunos, muitos travaram. A idéia de explorar uma forma sem atribuir um significado pareceu completamente sem sentido. Não se sabia por onde começar, que forma escolher, como sentir ou o que construir? Mesmo esta liberdade com poucos limites parecia aterradora. Ao longo do processo, uns poucos alunos se desprenderam e começaram a explorar cascas de semente, texturas, animais. Muitos passavam diversas aulas sem aparecer porque tinham vergonha de não chegar a nenhum lugar. Muitos pensaram em desistir. No entanto, a partir da segunda metade do semestre as coisas começaram a ficar mais claras. Os professores compreenderam como a participação e o auto conhecimento do CRIADOR e da CRIATURA eram importantes neste desafio. Instruímos os alunos a procurar entender o que a criatura queria e tentar estabelecer um dialogo com ela. Os processos de VISUALIZAR (desenho, fotografia, maquete, animação) e de PRECISAR a forma (definir cores, curvas, texturas, materiais) ajudaram muito no estabelecimento deste dialogo. Ao final os alunos perguntaram às formas o que elas queriam ser e muitos produtos inovadores surgiram, como telefones celulares para cegos, bancos aranhas, brushes para photoshop, brinquedos, cobogós, etc (figura 4). Figura 4: Terceiro semestre da disciplina: ênfase às explorações formais Desta terceira experiência percebemos que cada criador tem um tempo e uma forma diferente de se aproximar do problema o que nos levou a levantar uma hipótese, ainda por ser testada, que o processo de criação pode ser iniciado com ênfase em qualquer um dos subprocessos. A escolha do ponto de entrada parece a melhor quanto mais ela se identifica com o

criador. Um criador pode procurar SIGNIFICAR, pode iniciar VISUALIZANDO, ou procurando SABER sobre aquela necessidade SENTIDA de criar algo. Esta jornada de três semestres de disciplina e mais um ano de reflexão sobre os caminhos da criação nos levaram a elaboração inicial de um diagrama para gerenciamento dos processos de criação CPM (figura 5). À esquerda do diagrama estão os processos ditos racionais - sentir, saber e significar e à direita os processos intuitivos visualisar, precisar e construir. Ao centro criador e criatura também incluídos como sub-processos da Criação. Figura 5: Diagrama processual Este diagrama apresenta de forma didática processos que consideramos chave para a criação nos campos de arquitetura e design. Ele mostra como estes processos se interrelacionam e como formam um sistema coeso que, através de cada módulo podem se ligar a outros processos formando estruturas diferenciadas. (por isso cada criação é única). Este diagrama, gostaríamos de enfatizar, é uma representação bidimensional de um fenômeno que é tridimensional. Da mesma forma que os planetas acreditamos que os processos da criação se relacionam entre si de forma orbital e, certamente a posição que eles assumem no sistema, contribui significativamente para os resultados finais. Considerações Finais Os caminhos e as pesquisas em Criação, Inovação e Ensino de Arquitetura e Design possuem pouco mais de 40 anos. A busca por tornar transparente e controlar o que os pesquisadores chamam de a caixa preta da criação torna-se cada dia mais importante em um mundo onde o excesso de informação restringe e por vezes corrompe o pensamento criativo e inovador. Neste contexto, conhecer a caixa preta constitui-se antes de tudo um desafio de liberdade ou pelo menos a possibilidade de destravar competências e habilidades que recebemos ao nascer e que são sufocadas e reprimidas ao longo de décadas de massificação e desrespeito às riquezas e especificidades individuais.

Certamente não estamos avocando o CPM como o método de ouro, a fórmula que resolverá todos estes questionamentos. Acreditamos na possibilidade de construção no futuro de algo como um CPMS (creation process management system) um sistema que possa ser utilizado como ferramenta de apoio na tomada de decisões por professores, alunos e equipes de criação. Uma sequência didática já foi testada em um workshop de pensamento criador com profissionais de TI e alunos de arquitetura da UFRN, os resultados são promissores mas ainda iniciais. Referências BONO, E. Lateral Thinking: creativity step by step. New York, Harper Perennial, 1990 BURDEK, B. E.; Historia, teoria e prática do design de produtos. Tradução, Freddy Va Camp. São Paulo, Edgar Blücher, 2006. BROADBENT, G. (1973). Design in Architecture. New York, John Wiley. CONNER, M. L. Andragogy and Pedagogy. In: Ageless Learner, 1997-2004. (http://agelesslearner.com/intros/andragogy.html) em 28 de Abril de 2005 CROSS, Nigel; Designerly ways of knowing. Springer, 2006. DARKE, Jane; The primary generator and the design process. Pages 36-44. In Design Studies, Volume 1, Issue 1, July 1979. GUERSENZVAIG, Ariel; El generador primário. In: Interacciones, 2009. (http://interacciones.org/2009/11/29/el-generador-primario) HANSEN, C. D. and JOHNSON, C. R. The Visualization Handbook. Elsevier, 2005. LEE, R.G. & DALE, B.G., Business Process Management - a Review and Evaluation,. In: Business Process Management Journal, Vol. 4 No. 3, 1998 NEVES et all; XDM Métodos Extensíveis de Design. In: 8 Congreso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design, 2008, São Paulo. Anais do 8 Congreso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design, 2008. OULD, M., Business Process Management: A Rigorous Approach. Meghan-Kiffer, 2005. SMITH, H., FINGAR, P. Business Process Management: The Third Wave. In BPMI (bmpi.org) 2003.