ORGANIZAÇÕES SINDICAIS, ESTADO E SOCIEDADE CIVIL NO BRASIL



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ORGANIZAÇÕES SINDICAIS, ESTADO E SOCIEDADE CIVIL NO BRASIL José Antonio SEGATTO 1 RESUMO: No decorrer de um largo processo histórico, de mais de um século, o movimento sindical acumulou um importante patrimônio de conquistas. Os limites e a extensão dessas aquisições não podem ser dissociados das complexas relações entre o Estado e a sociedade civil no Brasil. PALAVRAS-CHAVES: Sindicatos. Estado. Sociedade civil. Cidadania. Corporativismo. O movimento sindical no Brasil acumula experiências que ultrapassam mais de um século. Ao longo desse largo processo histórico acumulou um importante patrimônio de conquistas, expressas não só em direitos sociais, mas também civis e políticas. Os limites e a extensão dessas aquisições e práticas não pode ser dissociados das complexas relações entre Estado e sociedade civil no Brasil, nos diversos momentos da história brasileira desde fins do século XIX. Num primeiro momento, que vai até os anos vinte do século passado, as relações de trabalho foram reguladas pelo liberalismo expresso na Constituição de 1891 que afirmava a não intervenção do Estado no mercado e nas relações de trabalho sua regulamentação era vista como atentatória à livre circulação de mercadorias, mais especificamente à compra e venda da força de trabalho. Por isso, a legislação trabalhista praticamente inexistia. Os conflitos derivados das relações de trabalho caíam jurisdição do Código Penal, sujeito à criminalização e à constante perseguição e repressão. Somente a partir de 1919 é que a política do Estado sofre modificações face aos problemas nas relações de trabalho. Em função dessas mudanças, foram feitas diversas leis trabalhistas entre 1919 e fins dos anos vinte. Elas foram frutos das pressões e movimentos reivindicativos que ocorreram com grande intensidade entre 1917/19 e também pelo fato de o país ser signatário do Tratado de Versalhes, que exigia a adoção de medidas legislativas no que diz respeito às relações de trabalho. Os movimentos reivindicativos foram, geralmente, organizados e dirigidos por entidades de caráter e projetos diversos e/ou muito heterogêneos. As associações mutualistas 1 UNESP - Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Ciências e Letras Departamento de Sociologia. Araraquara SP Brasil. 14800-901 - segatto@fclar.unesp.br REDD Revista Espaço de Diálogo e Desconexão, Araraquara, v. 3, n. 1, jul/dez. 2010

ou de socorro mútuo foram as primeiras organizações classistas a serem criadas e surgem ainda no século XIX. Essas formas primitivas de organização dos trabalhadores tiveram fins assistenciais e de ajuda mútua em casos de doença, acidente, velhice e outros. Com o tempo, algumas ultrapassaram o assistencialismo e reivindicaram melhores condições de vida e de trabalho. Posteriormente, essas primitivas formas de organização se desenvolveram e evoluíram para a formação de uniões e ligas operárias que tinham por objetivo organizar a resistência dos trabalhadores contra a exploração patronal daí o nome de associações de resistência. No início do século XX, muitas dessas uniões e ligas de resistência evoluíram e deram origem aos sindicatos e, mesmo quando mantiveram a denominação original de liga, união ou outra, exerceram papel semelhante ao dos sindicatos. Entretanto, a primeira lei sindical, de 1903, regulamentou a formação de sindicatos de profissionais da agricultura e de indústrias rurais. Os sindicatos urbanos só foram regulamentados em 1907, facultando [...] aos profissionais de profissões similares ou conexas, inclusive as profissões liberais, organizaremse entre si em sindicatos, tendo por fim o estudo, a defesa e o desenvolvimento dos interesses gerais da profissão e dos interesses profissionais de seus membros. A organização era livre e registrada como entidade civil desde que estivesse de acordo em promover a harmonia dirimindo dúvidas entre Capital e Trabalho (SEGATTO, 1987, p.37). Com a reordenação do poder, em 1930, o governo passou a desenvolver uma política no sentido de institucionalizar as relações entre capital e trabalho. Assim, uma das primeiras medidas do Governo Provisório de Vargas foi a criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, com o objetivo de organizar e controlar as relações de trabalho e implementar uma política de paz social, procurando disciplinas e evitar os conflitos sociais e impor a colaboração e a harmonia entre as classes. Nos anos 1930/1943 foi estabelecida uma ampla e complexa legislação trabalhista, que foi ampliada e sistematizada na Consolidação das Leis do Trabalho CLT (1943). Essa legislação não era extensiva aos trabalhadores rurais, sendo exclusiva dos urbanos. Paralelamente, de 1931 a 1939, o governo criou uma estrutura sindical totalmente subordinada ao Estado. Sua intenção foi nítida: disciplinar e evitar conflitos sociais e impor a harmonia entre as classes. Em 1939, pelo Decreto-Lei nº 1402, a legislação sindical que vinha sendo posta em prática desde 1931 ganhou sua configuração final e plena e seria complementada em 1940 pela criação do imposto sindical. Essa estrutura sindical seria a mesma para as organizações dos trabalhadores e dos empresários e não era permitida a sindicalização dos servidores públicos e dos trabalhadores rurais. Em resumo, ela impunha o

controle das entidades pelo Ministério do Trabalho, a unicidade e a verticalidade e a concepção de que o sindicato deveria ser um órgão de colaboração. Ela seria também mediada pela Justiça do Trabalho. O que de fato se fez após 1930, foi se recriar a sociedade civil por meio do Estado, subordinando-a a ele. As relações capital/trabalho foram regulamentadas via criação de uma estrutura corporativa. Na proposta corporativista caberia ao Estado, através de sua elite dirigente, definir novas formas de organização e de participação. Dentro dessa preocupação julgava-se que as sociedades deveriam ser organizadas não a partir de ideologias políticas, mas sim dos grandes ramos da produção econômica, o que por sua vez definiria, no plano macro, os interesses mais amplos da sociedade. (D ARAUJO, 2003, p.218). Dessa maneira o Estado do [...] ponto de vista social e político, regulou as relações sociais, absorveu no interior de suas estruturas os interesses sociais e se transformou numa arena de conflitos, todos eles politizados, mediados e arbitrados pelos seus agentes. (DRAIBE, 1985, p.20). Essa estrutura corporativa sobrevive com pequenas modificações, até hoje. No início dos anos 60 foi estendido o direito de organização sindical e os direitos da legislação presentes na CLT aos trabalhadores rurais. E, em 1988, na Constituição foi retirado a exigência de estatuto padrão, abolido o poder de intervenção do Ministério do Trabalho nas entidades e o direito à sindicalização aos servidores públicos. Muitos interpretaram o movimento sindical do pós-1930 como sendo um movimento manipulado, controlado e subordinado ao Estado e aos ditames de políticos governamentais. Dizem que, ao mesmo tempo em que atendia algumas das reivindicações dos trabalhadores (outorga da legislação trabalhista), procurava controlá-lo e manipulá-lo, impedindo sua organização e intervenção autônoma e independente. Um outro tipo de compreensão do processo histórico brasileiro no pós-1930 assinala que as relações entre o movimento sindical não foi tão tranqüilo como querem fazer crer determinadas explicações. Ao contrário, foram bastante tensas e nos anos 1950/60 caminharam progressivamente no sentido da autonomia. E na medida em que foi conquistando-a, aumentou sua pressão sobre o(s) governo(s), procurando forçá-lo à realização de reformas estruturais. Paralelamente, o movimento sindical aproveitou-se das instituições corporativas para se apoderar de agências estatais ou para-estatais e influir no aparato governamental, criando,

inclusive uma situação anômala, na medida em que começou a subverter as finalidades (de controle e subjugação) para os quais foram criados. Dessa forma a estrutura sindical passou a ser utilizada como instrumento para favorecer o desenvolvimento das lutas e mobilizações. O imposto sindical [...] criado para viabilizar a perpetuação no poder de lideranças pelegas, nas mãos de um sindicalismo livre se vira em poderoso instrumento de sua influência social. Todo esse processo se agrava com a expansão na sociedade da ideologia operária que atrai intelectuais e profissionais liberais, alguns em posições chaves no interior do Ministério do Trabalho, na Justiça do Trabalho e na Previdência Social. (VIANNA, 1983, p.100). Outros, afirmam que o Estado criou uma verdadeira engenharia institucional com a imposição de uma cidadania regulada, que não é universal, pois incorpora somente [...] aqueles membros da comunidade que se encontram localizados em qualquer uma das ocupações reconhecidas e definidas em lei [...]. A cidadania está embutida na profissão e os direitos do cidadão restringem-se aos direitos do lugar que ocupa no processo produtivo, tal como reconhecido por lei [...]. A regulamentação das profissões, a carteira profissional e o sindicato público definem, assim, três parâmetros no interior dos quais passa a definir-se a cidadania. (SANTOS, 1994, p.68-69, grifo do autor). Se por um lado a legislação trabalhista e sindical atrelou o movimento operário/sindical ao Estado, criou uma estrutura corporativa, uma cidadania regulada, por outro, apresentou a possibilidade de manter os interesses dos trabalhadores na arena política através da intermediação do Estado, instrumentalizando os sindicatos a enfrentarem a intensa exploração do patronato. A indagação que pode e deve ser posta é como se explica a longa sobrevida dessa estrutura corporativa? quase sete décadas, com algumas mudanças que não alteraram sua essência. Foi, inclusive, nos seus elementos básicos, incorporada, com algumas inovações, à Constituição Cidadã de 1988, como foi chamada. E nas décadas de 1980/90 quando se colocou a questão da reforma do Estado e no seu bojo a revisão da legislação trabalhista, da estrutura sindical, da Justiça do trabalho, qual foi a reação do movimento sindical? De resistência, defensiva e de conservação, contra ofensiva neoliberal que propugnava a mutilação e a subtração de direitos. Mas sem propor novas alternativas mesmo de alargamento e de novos direitos -, agarrando-se à defesa a velha estrutura corporativa. Nas últimas três décadas, pelo menos, o mundo e o Brasil em particular, passou por um processo de profundas transformações. A reestruturação do capitalismo, a globalização, a crise do socialismo, as inovações técnico-científicas e outras, alteraram substancialmente as

relações de trabalho com repercussões intensas e extensas nas formas de organização sindical e políticas e nos movimentos reivindicativos dos trabalhadores. Modificaram-se [...] os padrões de sociabilidade, vida cultural e consciência, simultaneamente às condições de organização, mobilização e reivindicação. Os padrões de trabalho, organização e consciência que se haviam produzido e sedimentado no âmbito da sociedade nacional, são reelaborados ou abandonados, já que a nova divisã o transnacional do trabalho e produção, na fábrica, estabelece outros horizontes e limites de sociabilidade. (IANNI, 1996, p.165). Nesse quadro histórico aberto no último quartel do século, onde pode-se dizer que o capitalismo entrou mesmo numa nova fase, as antigas formas de organização sindical e não só a corporativa não teriam se tornado anacrônicas? No caso no Brasil, seria possível manter a estrutura sindical reatualizada, reformada? É uma questão que o movimento sindical, mas não só ele, tem urgência em enfrentar ou ele se reinventa ou definhará e corre sérios riscos de ficar à margem da história e o pior, junto com ele todos os que, para sobreviver, dependem da venda da força de trabalho. TRADE UNION ORGANIZATIONS, STATE AND CIVIL SOCIETY IN BRAZIL ABSTRACT: During a long historical process of over a century, the trade union movement gathered a significant amount of achievements. The limits and the extent of these achievements cannot be dissociated form the complex relations between State and civil society in Brazil. KEYWORDS: Trade unions. State, Civil society. Citizenship. Corporatism. REFERÊNCIAS D ARAUJO, M. C. Estado, classe trabalhadora e políticas sociais. In: FERREIRA, J.; DELGADO, L. de A. N. (Org.). O Brasil republicano. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. v.2, p.213-239. DRAIBE, S. Rumos e metamorfoses. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985. IANNI, O. A era do globalismo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1996. SANTOS, W. G. dos. Cidadania e justiça. 3.ed. Rio de Janeiro: Campus, 1994.

SEGATTO, J. A. A formação da classe operario no Brasil. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1987. VIANNA, L. W. A classe operária e a abertura. São Paulo: Cerifa, 1983.