OE2011: Um orçamento que vai destruir a economia e que ataca quem trabalha e os pensionistas Pág. 1



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Transcrição:

OE2011: Um orçamento que vai destruir a economia e que ataca quem trabalha e os pensionistas Pág. 1 OE20111- Um orçamento que vai destruir ainda mais a economia e agravar as desigualdades e as dificuldades dos portugueses e que não resolve os problemas do País RESUMO DESTE ESTUDO O governo apresentou uma Proposta de Orçamento para 2011 que, se for aprovada, determinará um grande agravamento da situação económica (destruição da economia) e social do País. O cenário macroeconómico apresentado pelo governo é fictício e só serve para a propaganda governamental. A confirmar isso, está o facto de que depois na previsão das receitas fiscais o governo ignora esse cenário de crescimento económico de 0,2% do PIB real em 2011, e de 1,9% em termos nominais, e utiliza um outro em que prevê a recessão económica com uma contracção do PIB real entre -0,7% e -0,9%. Para reduzir o défice orçamental de 7,3% para 4,6%, o governo pretende fazer um corte nos vencimentos dos trabalhadores da Administração Central que atinge 1.100 milhões ; nos das Regiões Autónomas e Autarquias Locais que soma 90 milhões ; e nos do Sector Empresarial do Estado em 242,5 milhões. Portanto serão cortados nas remunerações dos trabalhadores 1.432,5 milhões. E não se pense que os atingidos serão apenas os trabalhadores com remuneração base superior a 1.500. Neste valor são consideradas todas as prestações pecuniárias que são objecto de desconto para a CGA ou para a Segurança Social, bem como todos os subsídios, suplementos remuneratórios, incluindo emolumentos, gratificações e demais prestações pecuniárias, designadamente senhas de presença, abonos, despesas de representação e trabalho suplementar, extraordinário ou em dias de descanso e feriados. Só não são considerados os montantes abonados a titulo de subsidio de refeição, ajuda de custo, subsidio de transporte ou reembolso de despesas efectuado nos termos da lei e os montantes que tenham natureza social. O IRS e o IVA que atingem fundamentalmente os trabalhadores e os reformados registarão um aumento muito significativo em 2011. Para além do adicional de 1 ponto percentual no IRS que o governo aprovou em 2010, e que continuará em vigor em 2011, verificam-se alterações importantes no IRS que determinarão um aumento significativo da carga fiscal. Assim, as taxas de IRS sobem e a subida é tanto maior quanto menor é o rendimento. Por ex., para o escalão até 4.898 de rendimento colectável a taxa sobe 3,8%, mas para os rendimentos superiores a 153.300 a subida de taxa é apenas de 1,35% (quase 1/3 do verificado no escalão de rendimento mais baixo). Por aqui se vê o espírito social deste governo. Para além disso, todos as deduções a nível de IRS que estavam indexadas ao Salário Mínimo Nacional ( rendimentos do trabalho, descendentes e ascendentes, despesas de educação, encargos com lares, deficientes, despesa de acompanhamento, etc.) passam a estar indexadas ao IAS (Indexante de Apoios Sociais), cujo valor actual (419,22 ) é inferior ao Salário Mínimo Nacional (475 ), e assim quando este for actualizado deixará de ter qualquer efeito nas deduções. E de acordo com o artº 94º da Proposta de Lei enquanto o valor do IAS (419,22 ) não atingir o valor actual do SMN (475 ) todas aquelas deduções estarão congeladas, o que determinará que uma parcela do rendimento que, se aquelas deduções fossem actualizadas, não seria sujeito a IRS passe a ser, aumentando assim a carga fiscal. E segundo o artº 64º da Proposta de Lei o valor do IAS é congelado pelo menos em 2011, o que determinará que durante muitos mais anos aquelas deduções que reduziam o rendimento sujeito a IRS não serão actualizadas. A nível do IVA a carga fiscal aumenta não só porque a taxa normal passa de 21% para 23%, mas também porque muitos bens sujeitos à taxa reduzida (6%) e taxa intermédia (13%) e passarão a estar sujeitos à taxa normal de 23%. Acontecerá isso aos leites chocolatados, aromatizados, vitaminados, e enriquecidos, às bebidas e sobremesas lácteas, aos livros e outras publicações não periódicas, aos utensílios e equipamentos de combate a incêndios que até aqui estavam sujeitos à taxa de 6% e que passarão a estar sujeitos à taxa de 23%; por outro lado, as conservas de carne, de peixe, de moluscos, de frutas e frutos de produtos hortícolas, os óleos e as margarinas que estão sujeitos à taxa de 13% passarão a ter de pagar IVA a 23%. A proposta de OE do governo constitui também um violentíssimo ataque ao Estado Social, aquele mesmo Estado que Sócrates diz defender em palavras. Em 2011, o Orçamento do Estado transferirá para Segurança Social, no âmbito da LBSS, menos 984,3 milhões para o combate à pobreza do que em 2010; para o SNS menos 598,7 milhões do que em 2010; para a educação menos 803,2 milhões do que em 2010; e para o Ensino Superior e Acção Social menos 113 milhões. Estes quatro pilares de qualquer Estado Social receberão do Orçamento do Estado em 2011 menos 2.499,2 milhões do que em 2010. Se entrarmos em conta com o efeito do aumento de preços, a redução é de menos 2.981,5 milhões em 2011. Para além disso todas as pensões, mesmo as sociais, não terão qualquer aumento em 2011. O objectivo é o estrangulamento e a destruição do Estado Social e dos mais pobres. E Sócrates ainda diz que defende o Estado Social, e afirma que o objectivo do seu governo é tornar obrigatório e gratuito o ensino até ao 12º ano, ao mesmo que reduz as verbas para a educação em 803,2 milhões.

OE2011: Um orçamento que vai destruir a economia e que ataca quem trabalha e os pensionistas Pág. 2 Quem analise a Proposta de Orçamento do Estado para 2010 que o governo acabou de apresentar, rapidamente conclui que ela não foi elaborado com o objectivo de resolver os graves problemas que o País enfrenta (endividamento externo e divida do Estado incomportáveis) e os portugueses, mas sim de acalmar os mercados ou seja, para sermos claros, de satisfazer as exigências dos bancos e dos diversos tipos de fundos que constituem e dominam esses mercados. A preocupação em servir o País e os portugueses está totalmente ausente da proposta de OE2011, o que determina que as medidas constantes dela só poderão agravar ainda mais a situação económica (destruição da economia) e social do País. É o que vamos provar analisando os aspectos mais importantes da Proposta de Lei e do Relatório do OE2011. UM CENÁRIO MACRO-ECONÓMICO FICTICIO QUE SÓ SERVE PARA A PROPAGANDA O governo apresentou um cenário macroeconómico, ou seja, as suas previsões sobre a evolução da economia em 2011, que não corresponde certamente ao que acontecerá. Assim, prevê que se verifique, em 2011, um crescimento económico de 0,2% quando todas as entidades internacionais prevêem uma recessão em Portugal. O próprio Banco Portugal, que normalmente apoia as previsões do governo, veio dizer que o crescimento será ZERO em 2011, e isto sem entrar em conta com as medidas constantes do PEC3. O governo também prevê que o consumo privado, em 2011, diminua apenas em -0,5%, quando faz um ataque brutal aos rendimentos dos trabalhadores e reformados; e que a quebra no investimento será apenas de -2,7% quando decide reduzir drasticamente o investimento publico para reduzir o défice orçamental, e as empresas privadas estão a reduzir drasticamente o investimento. Para salvar a previsível contracção interna, o governo agarra-se ao milagre das exportações prevendo que estas, em 2011, cresçam em 7,3%. Neste quadro de optimismo o governo prevê que a taxa de desemprego aumente, entre 2010 e 2011, de 10,6% para apenas 10,8%, portanto o desemprego praticamente não aumentará em Portugal entre 2010 e 2011 segundo o governo. No entanto, quando mais à frente analisamos as previsões do governo em relação às receitas fiscais, concluímos que aquele cenário optimista é totalmente ignorado. Assim, se adicionarmos ao crescimento em termos reais do PIB em 0,2% o efeito dos aumento de preços (para isso vamos utilizar o deflator do PIB do governo que é de 1,7%), obtemos um crescimento nominal do PIB de 1,9%. No entanto, o governo na pág. 96 do Relatório que acompanha o OE2011 afirma que para efeitos de cálculo de receita fiscal considerou-se um cenário macroeconómico traduzido num crescimento do produto nominal de 1%. E o quadro IV.1.2 constante da mesma página do Relatório onde constam as taxas de crescimento da receita fiscal em 2011 com e sem medidas revela que, apesar do crescimento económico de 0,2% constante do cenário do governo, as receitas fiscais, sem medidas, teriam em todos os impostos uma evolução negativa. É evidente que o próprio governo não acredita nos valores do cenário macroeconómico que apresentou, que só servem para a propaganda governamental, procurando desta forma manipular a opinião pública, já que as previsões de receita fiscal têm como base uma recessão económica, ou seja, uma contracção do PIB entre -0,7% e -0,9% (as empresas de rating prevêem -1,8%). SÓ O CORTE NOS SALÁRIOS VAI CUSTAR AOS TRABALHADORES DA FUNÇÃO PÚBLICA UMA REDUÇÃO DE 1.432,5 MILHÕES NOS SEUS VENCIMENTOS De acordo com os próprios dados constantes da pág. 48 do Relatório que acompanha o OE2011, o governo prevê que o corte de vencimentos na Administração Central some 1.100 milhões ; nas Regiões Autónomas e Autarquias Locais 90 milhões ; e no Sector Empresarial do Estado 242,5 milhões. Portanto, o governo pretende fazer uma corte nas remunerações dos trabalhadores de 1.432,5 milhões. E não se pense que os atingidos serão apenas os trabalhadores com remuneração base superior a 1.500 por mês e atingirá muitos mais do que os inicialmente previstos. Assim, de acordo com o nº 9 do artº 17º da Proposta de Lei do OE2011, a redução de remunerações atinge todos os trabalhadores da Administração Pública e das empresas públicas ou maioritariamente de capital público, incluindo EPE e empresas que integram o sector empresarial regional e municipal, com remunerações ilíquidas mensais superiores a 1.500. E segundo o nº4 do mesmo artigo, nas remunerações totais ilíquidas são consideradas todas as prestações pecuniárias que são objecto de desconto para a CGA ou para a Segurança Social, bem como todos os subsídios, suplementos remuneratórios, incluindo emolumentos, gratificações e demais prestações pecuniárias, designadamente senhas de presença, abonos, despesas de representação e trabalho suplementar, extraordinário ou em dias de descanso e feriados. Só não são considerados os montantes abonados a titulo de subsidio de refeição, ajuda de custo, subsidio de transporte ou reembolso de despesas efectuado nos termos da lei e os montantes pecuniários que tenham natureza social. O corte também atinge os subsídios de férias e de Natal que constituem mensalidades autónomas.

OE2011: Um orçamento que vai destruir a economia e que ataca quem trabalha e os pensionistas Pág. 3 De acordo com o nº1 do mesmo artigo, os cortes serão os seguintes: (a) 3,5% sobre o valor total das remunerações superiores a 1.500 e inferiores a 2000 ; (b) Para as remunerações entre 2000 e 4.165, 3,5% sobre o valor de 2000 acrescido de 16% no valor que exceda os 2000 até 4.165 ; (c) 10% sobre o valor total das remunerações superiores a 4.165. De acordo com o nº2 do artº 17º, estes cortes de remunerações também se aplicam aos trabalhadores independentes e aos trabalhadores dependentes contratados por mais de um entidade. Por outro lado, e de acordo com o artº 22º da Proposta de Lei é vedado a prática de quaisquer actos que consubstanciem valorizações remuneratórias, sejam elas alterações de posição remuneratória, progressões (incluindo as obrigatórias resultantes do trabalhador ter atingido nas avaliações 10 pontos de acordo com a Lei 12-A/2008), promoções, nomeações, ou graduações em categoria ou posto superior à detida; atribuição de prémios de desempenho ou outras prestações pecuniárias afins; mobilidade interna, etc. É o congelamento total das remunerações que atinge todos os trabalhadores da Administração Pública, incluindo mesmo os que recebem o salário mínimo nacional. De acordo com o nº6 do artº 22º só não se aplica às promoções no âmbito das Forças Armadas e Serviços de Segurança decorrentes da exigência legal de preenchimento de cargo ou função. Mesmo o subsidio de refeição não consegue escapar, pois de acordo com o artº 26º o seu valor não pode ser superior ao valor fixado na Portaria 1553-D/2008, cessando o abono de quaisquer outros valores a titulo de subsidio de refeição. Para além disso, e segundo o artº 39-A, a retribuição por trabalho suplementar e por trabalho nocturno passa a ser a estabelecida no RCTFP (trabalho nocturno é só pago a partir de 22 horas). Em 2011, todos os trabalhadores inscritos na CGA sofrerão uma redução de 1% nas suas remunerações (pág.78 do Relatório do OE2011) porque a taxa de contribuição aumentará de 10% para 11%, a juntar a 1,5% para a ADSE (os aposentados descontam 1% nas suas pensões, o que não acontece no sector privado). E a todas estas medidas há ainda a acrescentar o aumento da inflação em 2011, que o próprio governo prevê que atinja, 2,2%, que fará baixar ainda mais o poder de compra dos trabalhadores da Administração Pública. Só não encontramos nesta Proposta de Lei qualquer disposição que antecipe a entrada em vigor da idade de aposentação para 65 anos, apesar dessa intenção do governo constar do PEC2 (portanto, se o governo não alterar a Proposta de Lei ou não apresentar outra lei, a idade legal de aposentação aumentará apenas meio ano em 2011). AUMENTO SIGNFICATIVO DO IRS E DO IVA EM 2011 O IRS e o IVA que atingem fundamentalmente os trabalhadores e os reformados registarão um aumento muito significativo em 2011. Para além do adicional de 1 ponto percentual no IRS que o governo aprovou em 2010, e que continuará em vigor em 2011, verificam-se alterações importantes no IRS que determinarão um aumento significativo da carga fiscal. Assim, de acordo com a Proposta de Lei os valores dos escalões do IRS são aumentados em 2,2% ( o mesmo valor previsto para a taxa de inflação), mas as taxas de IRS também sobem, e o aumento é tanto maior quanto menor é o rendimento. Por ex., para ao escalão até 4.898 de rendimento colectável a taxa sobe 3,8% (passa de 11,08% para 11,5%), mas para os rendimentos superiores a 153.300 a subida de taxa é apenas de 1,35% (quase 1/3 do verificado no escalão de rendimento mais baixo). Por aqui se vê o espírito social deste governo. Para além disso, são congeladas as deduções que beneficiavam os rendimentos do trabalho o que determinará que o rendimento sujeito a IRS seja maior ao que seria se essas deduções fossem actualizadas de acordo com a taxa de inflação prevista pelo governo. Assim, todos as deduções a nível de IRS que estão indexadas ao Salário Mínimo Nacional (rendimentos do trabalho, descendentes e ascendentes, despesas de educação, encargos com lares, deficientes, despesa de acompanhamento, etc.) passarão estar indexadas ao IAS (Indexante de Apoios Sociais), cujo valor actual (419,22 ), portanto um valor inferior ao Salário Mínimo Nacional (475 ). E quando este for actualizado deixará de ter qualquer efeitos nas deduções. Para além disso foram introduzidas novos limites a deduções no IRS tendo como base o IAS (bolsas de formação desportiva, encargos com pensões de alimentos). E de acordo com o artº 94º da Proposta de Lei enquanto o valor do IAS (419,22 ) não atingir o valor actual do SMN (475 ) todas aquelas deduções estarão congeladas, o que determinará que uma parcela do rendimento que, se aquelas deduções fossem actualizadas, não seria sujeito a IRS passe a ser, aumentando assim a carga fiscal. Segundo o artº 64º da Proposta de Lei o valor do IAS é congelado pelo menos em 2011, o que determinará que durante muitos mais anos aquelas deduções que reduzem o rendimento sujeito a IRS não serão actualizadas. Para além disso, o governo introduz a partir do 3º escalão (inclusivé )do IRS, ou seja a partir dos 7.410 de matéria colectável, o governo tenciona introduzir um limite global à soma das deduções de despesas de

OE2011: Um orçamento que vai destruir a economia e que ataca quem trabalha e os pensionistas Pág. 4 educação, saúde, com aquisição de habitação e com encargos com lares, que será tanto maior quanto mais elevado é o rendimento tributável (800 para o 3º escalão do IRS, e 1.100 para o escalão mais elevado), o que determinará que aumente o rendimento sujeito a IRS fazendo assim aumentar a carga fiscal. A nível do IVA a carga fiscal aumentará não só porque a taxa normal passa de 21% para 23%, mas também porque muitos bens sujeitos à taxa reduzida (6%) e à taxa intermédia (13%) passam a estar sujeitos à taxa normal de 23%. Acontecerá isso aos leites chocolatados, aromatizados, vitaminados, e enriquecidos, às bebidas e sobremesas lácteas, aos livros e outras publicações não periódicas, aos utensílios e equipamentos de combate a incêndios que até aqui estavam sujeitos à taxa de 6% e que passarão a estar sujeitos à taxa de 23%; por outro lado, as conservas de carne, de peixe, de moluscos, de frutas e frutos de produtos hortícolas, os óleos e as margarinas que estão sujeitos à taxa de 13% e que passarão a ter de pagar IVA a 23%. Para se poder avaliar os efeitos destas medidas basta dizer que, segundo o próprio governo (pág. 96 do Relatório), em 2011, a taxa de crescimento da receita do IRS sem medidas seria negativa de -0,5% e com aquelas medidas que aumentarão o IRS será positivo atingindo o elevado valor de +9,8%; e que em relação ao IVA a taxa de crescimento da receita fiscal, sem medidas, seria negativa, e de -1%, e com aquelas medidas será já positiva atingindo +9,9%. Para se ficar com uma ideia do agravamento da injustiça fiscal que estas medidas determinarão interessa referir que, de acordo com o próprio governo (pág. 96), as medidas que incidem fundamentalmente sobre as famílias trabalhadoras e sobre os reformados, determinarão um aumento de 10,3% na receita do IRS e de 10,9% na receita do IVA, enquanto as medidas que incidem fundamentalmente sobre as empresas provocarão um aumento de receita de IRC de apenas 2,3%. O carácter de classe do governo de Sócrates é claro a este nível. As receitas fiscais repartidas pelos dois grandes grupos de impostos confirma o agravamento tremendo da injustiça fiscal em Portugal. Como se sabe, os impostos indirectos são muito mais injustos que os impostos directos. E isto porque os primeiros não têm em conta o rendimento do contribuinte. Por exemplo, um trabalhador com um rendimento mensal de 700 quando adquire um maço de cigarros paga o mesmo valor de IVA pago por um português com um rendimento mensal de 20.000 quando adquire o mesmo maço de cigarros. E o peso dos impostos indirectos está aumentar continuamente em Portugal. Em 2009, representavam 56% das receitas fiscais; em 2010 cerca de 57,9%; e, em 2011, o governo prevê que representem 58,3% de todas as receitas fiscais, portanto a injustiça fiscal registará um novo agravamento. A nível dos impostos directos IRS e IRC a injustiça tem aumentado. Isto porque a contribuição das famílias (IRS) é cada vez maior, enquanto a contribuição das empresas (IRC) é cada vez,menor. Em 2009, o IRS representava 66,35%% das receitas dos impostos directos; em 2010, representava 67,58% e, em 2011, o governo prevê que contribuía com 70,45% das receitas dos impostos directos. No próximo ano, o governo prevê que as empresas (IRC) contribuam com menos de 30% das receitas dos impostos directos. Estes dados globais mostram o agravamento da injustiça fiscal em Portugal, que já era muito elevada. O ATAQUE AO ESTADO SOCIAL PELO GOVERNO DE SÓCRATES: menos 2.499,2 milhões para o apoio à pobreza, educação e saúde Sócrates fala muito do Estado Social, e afirma que o quer defender, enquanto o PSD o quer destruir. É um facto que o desejo do PSD é destrui-lo e transformá-lo num negócio privado. No entanto, como tem habituado os portugueses, Sócrates diz uma coisa e faz precisamente o contrário. A proposta de OE2011 constitui um violento ataque ao Estado Social, como mostra o quadro seguinte construído com dados constantes no próprio Relatório do governo que acompanha a proposta de OE para 2011. Quadro 1 Transferências do Orçamento do Estado para a Segurança Social, Saúde e Educação e Ensino Superior TRANSFERENCIAS DO OE 2010 2011 Variação 2011-2010- Variação 2011-10 Em % Para a Segurança Social (LBSS) 7.726,9 6.742,6-984,3-12,7% Para o SNS 8.698,7 8.100,0-598,7-6,9% Para o Ministério da Educação 7.194,3 6.391,1-803,2-11,2% Para os Estabelecimentos Ensino Superior e Acção Social 1.285,0 1.172,0-113,0-8,8% FONTE. Relatório do OE2011 SOMA 24.904,9 22.405,7-2.499,2-10,0%

OE2011: Um orçamento que vai destruir a economia e que ataca quem trabalha e os pensionistas Pág. 5 Em 2011, o Orçamento do Estado transferirá para Segurança Social menos 984,3 milhões para o combate à pobreza do que em 2010; em 2011, o SNS receberá menos 598,7 milhões do Orçamento do Estado do que em 2010; a educação receberá menos 803,2 milhões do que em 2010; e o Ensino Superior e Acção Social receberão menos 113 milhões. Somando, estes quatro pilares de qualquer Estado Social receberão do Orçamento do Estado em 2011 menos 2.499,2 milhões do que em 2010. Se entrarmos em conta com o efeito do aumento de preços, a Segurança Social, o SNS, a Educação e o Ensino superior receberão menos -2.981,5 milhões do que em 2010. E a situação ainda é mais grave se se tiver presente que, em 2011,os serviços serão obrigados a contribuir para a ADSE com um valor correspondente a 3% das remunerações que pagam (pág. 113 do Relatório do OE2011), o que não acontecia anteriormente O objectivo claro desta politica é estrangular financeiramente e destruir o Estado Social. E Sócrates ainda diz que defende o Estado Social, e afirma que o objectivo do seu governo é tornar obrigatório e gratuito o ensino até ao 12º ano, ao mesmo tempo que reduz as verbas para a educação em 803,2 milhões. A politica do governo de Sócrates em relação à Segurança Social vai ter certamente consequências dramáticas.as transferências do Orçamento do Estado ao abrigo da Lei de Bases da Segurança Social visa apenas o combate à pobreza, já que as pensões dos trabalhadores que descontaram para a Segurança Social assim como o pagamento do subsidio do desemprego não são financiadas por estas transferências, mas sim pelas contribuições dos trabalhadores que estão no activo. A redução das transferências do OE para a Segurança Social em 984,3 milhões vai determinar que a pobreza aumente em Portugal ainda mais, quando já é muito grande. A juntar a tudo isto há ainda a referir que o artº 64 da proposta de Lei do OE, se for aprovado, suspende o regime de actualização do valor do IAS, das pensões e outras prestações sociais (Decreto Lei 323/2009, e as Leis 53-B/2006, e Lei 52/2007), o que leva à conclusão que é intenção do governo não actualizar as pensões quer da Segurança Social (incluindo as sociais cujo valor actual é apenas de 187 ) quer da CGA em 2011. E a inflação aumentará no próximo ano pelo menos 2,2% segundo as previsões do governo. Será este o Estado Social de que fala Sócrates? Que cada leitor responda por si e tire as suas conclusões. Eugénio Rosa Economista edr2@netacabo.pt 17.10.2010