O PROJETO PROFISSIONAL DO SERVIÇO SOCIAL E A REFORMA UNIVERSITÁRIA:



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Transcrição:

O PROJETO PROFISSIONAL DO SERVIÇO SOCIAL E A REFORMA UNIVERSITÁRIA: o enfrentamento da categoria profissional e estudantil no período de contra-reforma do Estado 1 Andréa Alice Rodrigues Silva 2 Larisse de Oliveira Rodrigues 3 Resumo: Realizaremos uma breve abordagem sobre o desenvolvimento do Serviço Social no Brasil, e como seu projeto profissional vem sendo discutido, formulado e materializado na conjuntura brasileira atual. O objetivo deste trabalho é analisar quais os princípios e quais os desafios desse projeto na contemporaneidade. Em seguida, analisaremos a luta dos diversos sujeitos políticos organizados na defesa da formação profissional de qualidade, frente à precarização que sofre o ensino superior brasileiro. Palavra-chave: Serviço Social, projeto ético-político profissional e educação superior. Abstract: We will make one brief boarding on the development of the Social Work in Brazil, and as its professional project comes being argued, formulated and materialized in the current Brazilian conjuncture. The objective of this work is to analyze which the principles and which the challenges of this project in the contemporary. After that, we will analyze the fight of the diverse citizens politicians organized in the defense of the professional formation of quality, front to the precarização that suffers Brazilian superior education. Key words: Social Work, ethical-politicial project professional and superior education. 1 Trabalho disponibilizado para apresentação na IV Jornada Internacional de Políticas Públicas, com tema central: NEOLIBERALISMO E LUTAS SOCIAIS: perspectivas para as Políticas Públicas. Universidade Federal do Maranhão. São Luis/MA. 25-28 de agosto de 2009. 2 Mestranda. Universidade Federal de Pernambuco. E-mail: andrealekka@gmail.com 3 Mestranda. Universidade Federal de Pernambuco. E-mail: larisse.ufrn@gmail.com

1 INTRODUÇÃO Cotidianamente, os Assistentes Sociais atuam na intervenção direta das diversas expressões da Questão Social, engendradas pelo sistema capitalista, e que, contraditoriamente, tem que enfrentar os conflitos causados por esse sistema, pois este se utiliza do Serviço Social para regular as contradições sociais e manter a dominação de classe. Segundo Nobuco Kameyama, Atuando como construtor, organizador e persuasor permanente, o assistente social pode atender ao mesmo tempo as demandas da classe capitalista e dos seus representantes no Estado, exercendo atividade auxiliar e subordinada no exercício do controle social e na difusão da ideologia dominante, e as necessidades legitimas de sobrevivência da classe trabalhadora (KAMEYAMA, 1994, p. 8). Devendo ser, portanto, uma formação profissional comprometida com valores democráticos e com transformações sociais que favoreçam a classe trabalhadora, o que significa um novo ordenamento das relações sociais (IAMAMOTO, 2005). É necessária então, uma formação teórico-metodológica, ético-política e técnico-operativa para que se tenha uma compreensão do significado social da profissão, e formulem possibilidades de ações que enfrentem os diversos desafios dos profissionais em seu cotidiano. A formação profissional qualificada é na atualidade um dos debates centrais na categoria profissional e estudantil, em vista a precarização que perpassa o ensino superior na atualidade, aprofundada a partir da política neoliberal adotada durante o governo Lula. Esse processo de contra reforma que vivenciam as políticas sociais, e no caso a política de educação, reflete diretamente nas condições efetivas da implementação das diretrizes curriculares 4, contrapondo-se com o projeto profissional defendido hegemonicamente pela categoria. Está posto então, o desafio da luta pela defesa do referencial construído pela profissão ao longo de setenta anos de Serviço Social no Brasil 5. A recusa e crítica ao conservadorismo na profissão se inicia em discussões, na década de 1970 e 1980, estas que se materializaram no atual projeto ético-político do Serviço Social. Mas é em momento histórico totalmente desfavorável a este projeto que ele eclode e começa a se definir. A passagem do período ditatorial no Brasil provoca uma 4 A proposta de diretrizes gerais para o curso de Serviço Social foi aprovada em 1996, após a realização de aproximadamente duzentas oficinas locais, vinte e cinco regionais e duas nacionais para a discussão do currículo mínimo para o curso de graduação em Serviço Social (JORGE, 2000, p. 144). 5 A primeira escola de Serviço Social no Brasil surge no ano de 1936 na cidade de São Paulo (IAMAMOTO, 2005b, p. 180).

mobilização da classe trabalhadora, que lutava pela liberdade negada durante todo este período. O amadurecimento do projeto foram os primeiros passos que a profissão percorre para uma maior acumulação teórica, que propiciou uma interlocução com as ciências sociais e com fundamentações marxistas. Isso ocorre com a reforma universitária realizada no período ditatorial, na qual vários cursos de pós-graduação foram criados. A partir desta fundamentação teórica o Serviço Social busca embasar sua intervenção na sociedade, sua relação com as instituições e o Estado e seu posicionamento diante a sociedade burguesa. Nesse sentido, sentiu-se a necessidade de realizar uma reformulação curricular para se debater o projeto de formação profissional do assistente social. O processo de reformulação do currículo, que ocorre em 1982, foi precedido de amplos e produtivos debates estimulados pela ABESS 6. Com a reformulação curricular o que se pretendia era a construção de um novo perfil profissional, capaz de responder as demandas de maneira eficaz e competente. Em 1996 desenvolve-se novamente a reformulação curricular para o curso, no sentido de adequar a formação profissional as exigências contemporâneas postas a formação profissional e ao exercício, mantendo neste o compromisso com a direção social crítica. O projeto ético-político do Serviço Social vincula-se a um projeto societário que propõe a construção de uma nova ordem social, sem dominação e/ou exploração de classe, etnia e gênero. Nesse sentido, projeto profissional possui então, uma visão crítica, que se referencia em um projeto de sociedade, e para sua implementação o profissional possui inúmeros desafios. O amadurecimento do capital, traz consigo diversas determinações que limitam a materialização cotidiana deste projeto profissional. 2 O PROJETO ÉTICO-POLÍTICO DO SERVIÇO SOCIAL VERSUS PROJETO NEOLIBERAL O projeto hegemonizado atualmente pela categoria é antagônico ao projeto neoliberal que vivencia atualmente a sociedade, este que perpassa todas as dimensões da vida social. Nesse sentido, a implementação desse projeto é um desafio cotidiano para os 6 Associação Brasileira de Escolas de Serviço Social - ABESS, que em 1998 se torna Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social ABEPSS.

profissionais. A situação se agravou após o início do mandato do presidente Lula no ano de 2003. Isto porque, o projeto ético-político do Serviço Social foi construído com os diversos sujeito coletivos, dentre eles o Partido dos Trabalhadores (PT) que era o partido de esquerda que possuía direção social em conformidade com o projeto profissional. Não faltam elementos substantivos para enlaçar a história recente dos avanços profissionais com a história do PT (NETTO, 2004, p. 23). A chegada de Lula a Presidência e a adoção de manutenção e aprofundamento da política neoliberal, traz consigo inúmeras conseqüências na organização dos movimentos populares que historicamente o apoiaram. Desta forma, a organização da classe trabalhadora atualmente passa por grandes conflitos a respeito da aceitação ou oposição a prática do atual governo. De acordo com Netto (2007, p.38) este momento distingue-se, sobretudo, pela maciça cooptação de entidades e organizações que tinham peso sobre significativos movimentos sociais (aqui, emblemática é a funcionalidade agora assumida, por exemplo, pela CUT e pela UNE 7 ). Neste momento histórico, temos o compromisso enquanto categoria profissional, preservar, contra ventos e marés, a autonomia para conduzir e aprofundar as exigências do projeto ético-político. Preservar a autonomia das entidades de organização da categoria, o Conselho Federal de Serviço Social CFESS, os Conselhos Regionais de Serviço Social CRESS, a ABEPSS e na organização estudantil a Executiva Nacional de Estudantes de Serviço Social - ENESSO. A defesa da categoria deve ser pelo projeto ético-político que colide com a orientação política dos governos anteriores e do governo atual (NETTO, 2004, p. 24). Após assumir a presidência foi continuada pelo governo Petista a política neoliberal iniciada nos governos anteriores 8. A adoção dessa política se inicia no Brasil, nos anos 1990, e traz consigo o processo de contra-reforma do Estado, o qual, como afirma Behring (2003), implica em um profundo retrocesso social, em benefício de poucos. Uma das políticas sociais atingidas nesse processo é a educação, que no sistema capitalista é usada como instrumento de alienação e opressão da classe trabalhadora. Desta forma, 7 Central Única dos Trabalhadores CUT, referência nacional da organização sindical da classe. União Nacional dos Estudantes UNE, referência da organização estudantil, principalmente nas décadas de 1970 e 1980. 8 Segundo Faleiros (1998) a política neoliberal é caracterizada pela redução do Estado na esfera econômica e social, abertura do mercado às importações, precarização do trabalho, privatização de bens estatais, reajuste fiscal, transferência da responsabilidade do Estado para a esfera financeira, desemprego em massa como um mal necessário. Uma das faces do capitalismo, que se baseia na propriedade privada dos meios de produção, visando à acumulação do capital.

configura-se como mais uma forma de reprodução da ideologia capitalista. De acordo com Meszáros (2007, p. 196) Poucos negariam hoje que os processos educacionais e os processos sociais mais abrangentes de reprodução estão intimamente ligados. Consequentemente, uma reformulação significativa da educação é inconcebível sem a correspondente transformação do quadro social no qual as práticas educacionais da sociedade devem cumprir as suas vitais e historicamente importantes funções de mudança. Nesse sentido, o autor afirma que o impacto da incorrigível lógica do capital sobre a educação tem sido grande ao longo do desenvolvimento do sistema (MESZÁROS, p. 201). A partir dessa lógica, analisa-se como são desenvolvidas as políticas educacionais no Brasil após a adoção da política neoliberal. 3 CONTRA-REFORMA DO ESTADO: impasses e desafios das políticas de educação Com a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases para a Educação - LDB em 1996 a educação brasileira passa por processo contra-reforma, o qual precariza as instituições publicas e impulsiona a mercantilização do ensino. As medidas seguem a lógica neoliberal e estão em consonância com as exigências dos organismos internacionais como o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional - FMI, a Organização das Nações Unidas - ONU e a Organização Mundial do Comércio OMC que impõem aos países em desenvolvimento uma série de medidas sobre as diversas formas de produção humana (BOSCHETTI, 2007). No ano de 2004 se aprofunda a precarização do ensino superior público, a partir decretos como o Programa de apoio a planos de reestruturação e expansão das universidades federais (REUNI) 9, além do incentivo ao crescimento do ensino privado 10, fazendo mais uma vez uma política que deveria ser pública se transforme em mercadoria. Como afirma NEVES (2004, p. 43) esta proposta de reforma da educação superior retoma e aprofunda os pontos centrais da lógica neoliberal para a educação. A política de contra-reforma do ensino superior se agrava quando o atual governo lança uma série de medidas que visam ampliar a quantia de estudantes matriculados no ensino superior, seguindo as exigências internacionais. Entretanto, essa ampliação não quer dizer investimento Estatal no ensino, o que ocorre é um incentivo a aberturas de centros de ensinos privados, concedendo a estes incentivos fiscais, bem como 9 Decreto Nº 6. 096, de 24 de abril de 2007. 10 Beneficiando o desenvolvimento do ensino superior privado foi lançado o Programa Universidade Para Todos (PROUNI) através do projeto de Lei 3.582, de 2004.

uma quase ausência de fiscalização. No ensino superior público, também, pretende-se ampliar as vagas, mas sem que tenha maiores investimentos dos já existem, e desta forma precarizando o ensino público. Como afirma Boschetti, O que está em questão hoje, com essa política de expansão desmesurada é uma mudança no sentido e conceituação de universidade: trata-se de uma perspectiva que restringe o sentido de espaço de produção autônomo de pesquisa e produção de conhecimento e amplia o sentido de usina de produção e titulação. Sem considerar relevante definir parâmetros para a garantia de um padrão de qualidade técnica, ética e social, se volta, exclusivamente, para responder às exigências do capital financeiro com expansão quantitativa e submissão às demandas do mercado (BOSCHETTI, 2007, p. 5). Multiplicam-se, então, as instituições particulares, que em sua grande maioria possui um ensino precarizado, voltado para as exigências do mercado sem a garantia da qualificação e sem a formação crítica e propositiva, de acordo com o projeto profissional, e sem a utilização do tripé ensino, pesquisa e extensão. Nas instituições públicas, o pouco investimento causa a defasagem da infra-estrutura e a pouca contratação de professores acaba dificultando o desenvolvimento de atividades de pesquisa e extensão, limitando a perspectiva pedagógica até mesmo no âmbito do ensino. Além desses desafios que já se apresentam ao longo da última década no Brasil, existe um novo elemento que pode colocar a perder o que foi construído historicamente pela categoria profissional dos (as) Assistentes Sociais trata-se do ensino de graduação à distância, que está em intensa expansão 11, massificando o ensino superior e não adotando nenhum dos requisitos necessários para a formação profissional qualificada em Serviço Social (como as diretrizes curriculares). Esta modalidade de ensino se expande no Brasil a partir de 2005, com o lançamento pelo governo federal do decreto 5.622, que detalha a oferta da modalidade em todos os níveis de ensino. A abertura não se segue de acompanhamento, fiscalização e avaliação pelo Estado. A responsabilidade por essa avaliação é transferida para o mercado, através da competitividade entre os cursos, e para os indivíduos (BOSCHETTI, 2007). Diante disto, percebe-se que o amadurecimento do capital, traz consigo diversas determinações que limitam a materialização cotidiana do projeto profissional. Este conforme Braz (2007, p. 7) vivencia uma crise determinada pela articulação de dois problemas centrais. O primeiro diz respeito a ausência de uma proposta alternativa à do capital na 11 Segundo levantamento parcial do conjunto CFESS/CRESS o ensino a distância já atinge mais de quinhentos municípios do país, totalizando a abertura de milhares de vagas. As escolas de ensino presencial totalizam duzentos e cinqüenta, criadas ao longo de setenta anos da profissão no Brasil (BRAZ, 2007, p. 8).

sociedade brasileira que tenha capacidade de unificar interesses sociais distintos relativos ao trabalho. O aprofundamento da política neoliberal no Brasil, gerou um empobrecimento de um projeto societário alternativo a do capital. Isto significa tanto para o Serviço Social, como para os demais grupos sociais e profissionais, a instalação de uma verdadeira crise. Na tentativa de barrar esse desenvolvimento da precarização, as entidades da categoria formulam coletivamente estratégias para o enfrentamento a esse desafio. As entidades lançaram manifestos, notas e dados para a categoria, o Ministério da Educação MEC e para a sociedade. Como afirma Boschetti (2007, p. 8) Precisamos, mais do que nunca, reafirmar e ter os princípios do nosso projeto ético-político como balizadores das nossas ações e estratégias. Não devemos abrir mão de construir estratégias coletivas que nos unifiquem para enfrentar essa nova ofensiva. 4 CONCLUSÃO Nesse sentido, a categoria profissional e estudantil através das suas entidades representativas, buscam estratégias de enfrentamento dessa política de precarização do ensino superior. A ABEPSS continua na defesa das diretrizes curriculares comprometida com o projeto ético-político e com a formação profissional de qualidade, aliando-se as entidades representativas como o conjunto CFESS/CRESS e a ENESSO, compatível com a direção social defendida hegemonicamente pela categoria profissional. Nesse sentido as três entidades nacionais, respaldadas pela categoria estudantil e profissional, desenvolvem atividades em conjunto como fóruns para discussão, formulação de estratégias e ações políticas eficazes na luta contra a precarização do ensino superior. Como afirma ABEPSS (2004, p. 78) muitas frentes de trabalho têm sido realizadas em conjunto com o CFESS e com a ENESSO, fortalecendo a articulação entre as entidades representativas e dando materialidades ao projeto. Frente aos desafios impostos a categoria profissional de Serviço Social, em vista ao avanço do neoliberalismo no Brasil, é necessária a continuidade dessa resistência e luta permanente pela sua defesa. Nesse sentido essa deve atentar para o compromisso com o projeto profissional, seus princípios e os caminhos apontados. Se faz necessário ainda, a união com os sujeitos coletivos com direção social convergente, para que a resistência ao projeto do capital tenha força para o transpor e chegar na construção de uma sociedade baseada na emancipação humana.

REFERÊNCIAS ABEPSS. A formação do assistente social no Brasil e a consolidação do projeto éticopolítico. Serviço Social e Sociedade, São Paulo, n. 79, p. 72 81, set. 2004. BEHRING, Elaine Rossetti. Brasil em Contra-reforma. Desestruturação do Estado e perda de direitos. São Paulo: Cortez, 2003. BOSCHETTI, Ivanete. As contra reformas para a Formação e Exercício Profissional: a insuficiência do Exame de Proficiência como estratégia de enfrentamento. Rio de Janeiro, 2007. Texto apresentado no Seminário: Desafios Atuais da Formação Profissional: exame de proficiência e o ensino à distancia, organizado pelo CRESS/RJ. BRAZ, Marcelo. A hegemonia em cheque: projeto ético-político do Serviço Social e seus elementos constitutivos. INSCRITA, Brasília, n. 10, p. 5 10, nov. 2007. FALEILROS, Vicente de Paula. O que é política social. 3. ed. São Paulo: Brasiliense, 1988. Coleção Primeiros Passos. IAMAMOTO, Marilda Villela. O serviço social na contemporaneidade: trabalho e formação profissional. 9. ed. São Paulo: Cortez, 2005. JORGE, Maria Rachel Tolosa. A construção curricular no Serviço Social: processo permanente. Serviço Social e Sociedade, São Paulo, n. 61, p. 127 149, 2000. MESZÁROS, István. A Educação para além do capital. In: MESZÁROS, István. O desafio e o fardo do tempo histórico: o socialismo no século XXI. Tradução Ana Contrim e Vera Contrim. São Paulo: boitempo, 2007. p. 195 223. NETTO, José Paulo. A conjuntura brasileira: o Serviço Social posto à prova. Serviço Social e Sociedade, São Paulo, n. 79, p. 5 26, set. 2004.. Das ameaças à crise. INSCRITA, Brasília, n. 10, p.37 40, nov. 2007.

NEVES, Lúcia Maria Wanderley (Org.), et al. Reforma Universitária do Governo Lula: reflexões para o debate. São Paulo: Xamã, 2004.