RESÍDUOS DE EXPLORAÇÃO EM AREEIROS DE TRÁS-OS-MONTES ORIENTAL: POTENCIALIDADES COMO MATÉRIA PRIMA PARA A INDÚSTRIA CERÂMICA DE CONSTRUÇÃO.



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Transcrição:

RESÍDUOS DE EXPLORAÇÃO EM AREEIROS DE TRÁS-OS-MONTES ORIENTAL: POTENCIALIDADES COMO MATÉRIA PRIMA PARA A INDÚSTRIA CERÂMICA DE CONSTRUÇÃO. Luís Gonçalves*, M. I. Caetano Alves Centro de Ciências da Terra, Universidade do Minho, Campus de Gualtar, 4710-057 Braga. *e-mail: luisgoncalves@dct.uminho.pt Resumo: A exploração de sedimentos cenozóicos, para produção de inertes (areia e seixo), efectuada em areeiros da região de Trás-os-Montes Oriental, é geradora de resíduos (fracção dos sedimentos <70µm), aos quais estão associados impactes vários. Neste trabalho apresentam-se parte dos resultados do estudo mineralógico, químico, granulométrico e tecnológico dos resíduos. Os resíduos possuem características que os permitem considerar como Argilas Comuns, com apetência para a produção de cerâmicos de construção, nomeadamente tijolo alveolado e maciço, sendo no entanto necessária a beneficiação de algumas das suas características. Abstract: The Cenozoic sediments of Eastern Trás-os-Montes region are extracted for the production of sand and gravel, used as row materials in the construction industry. This extraction produce a large amount of waste mud, generating several environmental impacts. The waste mud was submitted to mineralogical, chemical and granulometric analysis. Tecnological tests were also performed with these materials. These studies allowed the classification of the waste mud as common clay, and showed their suitability for aplication in the bricks production, although some technological properties corrections should be made. Palavras chave: resíduos de exploração; areeiros; caracterização. Key words: waste mud; sand quarries; characterisation. Introdução Os depósitos sedimentares cenozóicos de Trás-os-Montes Oriental constituem importante fonte de matéria prima para a indústria da construção civil (inertes - areias e seixos) e para a indústria cerâmica de construção (argilas comuns). Gerados na dependência de sistemas aluviais, relacionados com a evolução da drenagem durante o Cenozóico (Pereira, 1997), estes depósitos possuem grande diversidade dimensional. Os sedimentos são predominantemente conglomeráticos, de matriz arenolutítica e lutítica-arenosa, ocorrendo alguns níveis essencialmente lutíticos nas regiões de Miranda do Douro e Mirandela. Limitar a exploração destes depósitos a um intervalo restrito de dimensões, em que apenas são aproveitadas as argilas comuns ou a areia e o seixo, conduz à delapidação destes recursos e à diminuição das suas potencialidades (Gonçalves, 2004). Este panorama foi observado em várias explorações existentes nesta região por Meireles (2000) e Pereira et al. (2000) que, resumidamente, indicam o desaproveitamento nas explorações de inertes das bancadas mais argilosas e da matriz lutítica das bancadas mais grosseiras. Gonçalves (2004) verificou que os areeiros presentemente activos na região apenas exploram a fracção mais grosseira dos sedimentos (seixos e areias com dimensão superior a 70µm), sendo a fracção restante (em média 40±20% dos depósitos) desprezada. Essa fracção, considerada resíduo de exploração, é depositada após a lavagem da fracção >70µm em tanques de decantação, vulgarmente designados como tanques de lamas ou de resíduos. Estes resíduos têm associados impactes vários, designadamente impactes de índole ambiental (contaminação da rede fluvial com partículas finas, no caso de as águas residuais não passarem por tanques de decantação; possível ruptura dos tanques de decantação, com o consequente escoamento ou deslizamento dos resíduos acumulados; e impacte negativo na paisagem provocado pela presença dos referidos tanques). Acresce ainda salientar os

efeitos limitadores na progressão da exploração, resultante da localização dos tanques, situados em zonas potencialmente exploráveis. A avaliação das potencialidades destes resíduos como possível sub-produto de exploração, isto é, como possível recurso, indo ao encontro do preconizado por Leite (2000) que refere a reciclagem dos resíduos gerados pela indústria extractiva, aproveitando-os como sub-produto com potenciais mais valias significativas, poderá ajudar a mitigar parte dos impactes associados a estes resíduos, contribuindo assim para uma maior rentabilização da exploração dos recursos sedimentares cenozóicos desta região. Com o intuito de avaliar as potencialidades destes resíduos como sub-produto de exploração, nomeadamente a sua possível utilização como matéria prima para a indústria cerâmica, seleccionaramse dois areeiros desta região, designadamente o areeiro de Sendas (Bragança) e o areeiro de Vale da Porca (Macedo de Cavaleiros), tendo-se estudado as características composicionais e tecnológicas dos seus resíduos. Materiais e Métodos A avaliação das características mineralógicas, químicas, granulométricas e tecnológicas dos resíduos de exploração, foi efectuada em 30 amostras, colhidas nos tanques de lamas dos areeiros de Vale da Porca e de Sendas, tendo-se efectuado os seguintes estudos, nos laboratórios do Departamento de Ciências da Terra da Universidade do Minho (DCT-UM) e no Laboratório do INETI (ex-igm) de São Mamede Infesta: Estudo mineralógico por difracção de Raios X da amostra total e da fracção <2µm (DCT- UM); Análise química por fluorescência de Raios X (INETI); Análise granulométrica, por crivação (fracção >63µm) e pelo Sedigraph (fracção <63µm) (DCT-UM); Determinação da plasticidade (limites de Atterberg) (INETI); Cozedura cerâmica em ambiente oxidante, à temperatura máxima de 950ºC (INETI); Avaliação dos parâmetros cromáticos das amostras, em cru e após cozedura cerâmica (INETI); Análises dilatométricas (INETI); Avaliação da retracção após secagem (verde seco) e após cozedura cerâmica (retracção total) (INETI); Avaliação da resistência mecânica à flexão (INETI); Avaliação da absorção de água após cozedura cerâmica (INETI). Resultados Após a caracterização mineralógica, química e granulométrica efectuada aos resíduos de exploração dos areeiros de Sendas e Vale da Porca, foi possível chegar aos resultados que se resumem de seguida: os resíduos de exploração são, quanto à composição mineralógica, predominantemente quartzo-ilítico-cauliníticos (resíduos do areeiro de Vale da Porca) e ilítico-quartzo-cauliníticos (resíduos do areeiro de Sendas), possuindo em percentagens menores esmectite, goetite e feldspatos (potássicos e plagioclases); do ponto de vista químico, os resíduos de exploração de ambos os areeiros são siliciosos, com teores médios a baixos de Al 2 O 3 e teores baixos de Fe 2 O 3, estando, segundo Gomes (2002) e Velho et. al. (1998), em concordância com as características químicas de matérias primas classificadas como argilas comuns; granulometricamente, segundo a classificação de Shepard (1954), os resíduos de Vale da Porca correspondem essencialmente a areia limo-argilosa e a argila limosa, e os resíduos de Sendas a argila limosa e limo argiloso.

Os resultados dos ensaios tecnológicos efectuados com os resíduos de exploração dos areeiros de Sendas e Vale da Porca são apresentados no Quadro 1 e na Figura 1. Quadro 1 Resultados dos ensaios tecnológicos dos resíduos dos areeiros de Vale da Porca e Sendas. Areeiros Ensaios Tecnológicos Vale da Porca Sendas Limite Fluidez (%) 60 ± 17 83 ± 22 Limites Atterberg Limite de Plasticidade (%) 37 ± 7 43 ± 7 Índice de Plasticidade (%) 25 ± 10 40 ± 17 L* 66 ± 2 69 ± 1 Parâmetros Cromáticos a* 12 ± 2 10 ± 2 (cru) b* 27 ± 2 26 ± 2 L* 53 ± 1 54 ± 1 Parâmetros Cromáticos a* 26 ± 1 25 ± 1 (950ºC) b* 26 ± 1 25 ± 1 Retracção Verde-Seco (%) 8 ± 2 9 ± 2 Total (%) 10 ± 3 12 ± 3 Resistência Mecânica à Provetes Secos 18 ± 7 23 ± 16 Flexão (Kg/cm 2 ) Provetes Cozidos (950ºC) 64 ± 35 110 ± 66 Absorção de Água 16 ± 2 14 ± 4 Figura 1 Curvas dilatométricas representativas dos resíduos de exploração dos areeiros estudados. Aplicabilidade dos resíduos de exploração A partir da caracterização granulométrica, mineralógica, química e tecnológica dos resíduos de exploração, é possível definir o tipo de aplicações adequadas a estes materiais. As suas características composicionais permitiram classificar estes resíduos como argilas comuns. Comparando os resultados com os dos trabalhos de Fabbri & Dondi (1995) conclui-se que, quanto à composição químicomineralógica, estes materiais são semelhantes aos utilizados para fabrico de cerâmicos de construção, nomeadamente tijolo furado. Em relação aos domínios, referentes às aplicações industriais de argilas, apresentados por Dondi et al. (1998) adaptados do diagrama de Winkler (1954), verificou-se que os resíduos estão aptos (no que respeita à granulometria) para a produção de tijolo furado e tijolo maciço. A caracterização tecnológica do resíduos permitiu verificar o seguinte: 1- possuem plasticidade moderada a elevada, o que lhes confere uma trabalhabilidade razoável; 2- boa resistência à flexão após cozedura cerâmica; 3- parâmetros cromáticos com pouca variação, que permitem considerar estes materiais como cerâmicos de pasta vermelha (Gomes, 1990) e; 4- percentagem de absorção de água, que permite classificar os materiais cerâmicos como porosos (Gomes, 2002), estando aptos à elaboração de produtos cerâmicos de construção. A caracterização tecnológica mostra a apetência

destes materiais para utilização na industria cerâmica de construção, sendo no entanto necessária a correcção da plasticidade para conferir uma melhor trabalhabilidade às pastas cerâmicas. Conclusões O aproveitamento das fracções grosseiras dos depósitos sedimentares cenozóicos de Trás-os- Montes para a produção de inertes (areia e seixo) é geradora de resíduos de exploração, causando estes impacte negativo de vários níveis. Leite (2000) refere que em muitos produtos resultantes da transformação industrial de matérias primas minerais, os efeitos de concentração preferencial dos minerais podem ser igualmente significativos a ponto de deles se poder tirar partido. Em Trás-os- Montes Oriental parte significativa dos sedimentos explorados (a fracção limo-argilosa corresponde, em média, a 40±20% dos depósitos) está a ser desaproveitada, podendo esta ser considerada, pelas suas características, como subproduto explorável. A caracterização composicional e tecnológica dos resíduos de exploração dos areeiros de Sendas e Vale da Porca permitiu verificar a adequabilidade destes materiais à produção de cerâmicos de construção, sendo no entanto necessária a sua beneficiação para correcção da plasticidade, especialmente nos resíduos de Sendas. O estudo efectuado neste trabalho permitiu analisar de um modo mais abrangente, e de um ponto de vista mais integrador, as potencialidades, como recurso geológico, dos sedimentos cenozóicos desta região. Verificou-se que as potencialidades destes depósitos sedimentares podem ser largamente ampliadas com a caracterização dos resíduos gerados pela sua exploração, podendo estes resíduos vir a ser valorizados como um subproduto com mais valias comerciais. A abordagem utilizada nos areeiros estudados, se implementada em outras explorações, actuais ou futuras, nesta região ou em regiões com depósitos semelhantes, poderá mitigar os impactes a elas associados, ampliar as reservas existentes, rentabilizar as explorações, contribuindo assim para a utilização sustentada dos recursos. Agradecimentos Ao Director do Laboratório do INETI de São Mamede Infesta, Eng. Machado Leite, pela facilidade concedida na realização dos estudos laboratoriais que contribuíram para o trabalho agora apresentado. Aos colegas geólogos Laboratório do INETI de São Mamede Infesta, Dr. José Grade e Dr. Álvaro Oliveira por todo o apoio e esclarecimentos prestados. Bibliografia Dondi, M., Fabri, B. & Guarini, G. (1998) Grain-size distribuition of Italian raw materials for building clay products: a reappraisal of the Winkler diagram. Clay Minerals. 33, pp. 435-442. Fabbri, B. & Dondi, M. (1995) Caracteristiche e difetti del laterizio. Grupo Editoriale Faenza Editrice, S.p.A, Faenza, Italy, 142 p. Gonçalves, L. (2004) Depósitos cenozóicos de Trás-os-Montes oriental. Caracterização tecnológica de resíduos de exploração de areeiros. Contribuição para o uso sustentável dos recursos. Tese de Mestrado. Faculdade de Ciências da Universidade do Porto. 136 p. Gomes, C.S.F. (1990) Minerais Industriais: matérias-primas cerâmicas. Instituto Nacional de Investigação Científica (Ed.), Lisboa, 247 p. Gomes, C.S.F. (2002) Argilas. Aplicações na Indústria. Edição de autor. Aveiro. 338 p. Leite, R.M. (2000) Valorização de matérias-primas minerais e resíduos da actividade extractiva, através das tecnologias de processamento. Cerâmica. Indústria sustentável em matérias-primas nacionais?. Instituto Geológico e Mineiro, pp. 67-81. Meireles, C. (2000) Carta Geológica de Portugal, na escala 1/50.000. Notícia explicativa da folha 3-D Espinhosela. Instituto Geológico e Mineiro, Lisboa, 64 p. Pereira, D.I. (1997) Sedimentologia e Estratigrafia do Cenozóico de Trás-os-Montes Oriental (NE Portugal). Tese de Doutoramento, Universidade do Minho, 341 p.

Pereira, E., Ribeiro, A. & Castro P. (2000) Carta Geológica de Portugal na escala 1/50.000. Notícia explicativa da folha 7-D Macedo de Cavaleiros. Instituto Geológico e Mineiro, Lisboa, 63 p. Velho, J., Gomes, C. & Romariz, C. (1998) Minerais Industriais. Geologia, propriedades, tratamentos, aplicações, especificações, produções e mercados. Edição de autor. Coimbra. 592 p. Winkler, H. (1954) Bedeuting der korngrossen-verteilung und des mineral-bestandes von tonen für die herstellung grobkeramischer erzeugnisse, Berichte Deutsche Keramische Gesellschaft, 37/10, pp. 337-343.