EXCLUSÃO DO IRPJ E DA CSLL DAS RESPECTIVAS BASES DE CÁLCULO



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Transcrição:

EXCLUSÃO DO IRPJ E DA CSLL DAS RESPECTIVAS BASES DE CÁLCULO * 1 José Antonio Minatel 1. INTRODUÇÃO Não se cansa de repetir que a rigidez é nota marcante do sistema constitucional tributário brasileiro, logo identificada pelo extensivo detalhamento, no plano da Constituição Federal, de inúmeras diretrizes que deverão ser seguidas pelo legislador ordinário de cada entidade tributante, quando do exercício da específica competência tributária que lhe foi outorgada, em caráter privativo. No contexto da distribuição constitucional dos impostos, outorgou-se competência à União para instituir imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza 2, no pressuposto de que, mediante lei, uma parcela da riqueza nova auferida pelas pessoas privadas seja compulsoriamente transferida para o poder público, para fazer face aos diversos encargos suportados no interesse da coletividade. No capítulo destinado à estipulação de fontes de custeio para o sistema de seguridade social, nova competência foi atribuída à União para que, mediante lei, possa instituir específica contribuição social, determinando que parte do lucro 3 das empresas ou entidades equiparadas seja compulsoriamente carreada para custeio dos programas abarcados na amplitude da seguridade social. Portanto, partindo-se da premissa de que há conceito constitucional pressuposto para o vocábulo renda, que na perspectiva da pessoa jurídica é o * 1 Mestre e Doutor em Direito Tributário pela PUC-São Paulo; professor de Direito Tributário nos cursos de graduação e pós-graduação da Faculdade de Direito da PUC-Campinas; professor nos cursos de pós-graduação do IBET Instituto Brasileiro de Estudos Tributários; autor do livro Conteúdo do Conceito de Receita e Regime Jurídico para sua Tributação, publicado pela MP Editora; ex-delegado da Receita Federal em Campinas (SP); ex-membro do Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda em Brasília; advogado e consultor tributário. 2 Constituição Federal, art. 153, inciso III. 3 Constituição Federal, art. 195, inciso I, letra c. 1

acréscimo patrimonial aferido em determinado período de tempo e identificado pelo conceito de lucro, não resta dúvida de que essa mais valia ( lucro ) foi valorizada pelo constituinte como potencialidade econômica que tem aptidão para suportar dupla incidência de tributos de diferentes naturezas: (i) como base material de incidência de imposto 4 ; e, simultaneamente, (ii) como base de cálculo de contribuição social 5. A questão colocada para exame tem a ver com essa dupla incidência e com a apuração das bases de cálculo desses diferentes tributos, perquirindo-se sobre a possibilidade de exclusão do valor de cada obrigação tributária para efeito de determinar as respectivas bases de cálculo correspondentes. É certo que existe específica regra jurídica 6 prevendo a indedutibilidade da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), tanto para efeito da apuração do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ), quanto para efeito da apuração da base de cálculo da própria contribuição. No entanto, a despeito de pronunciamento do Superior Tribunal de Justiça 7 pela legalidade dessa restrição à dedutibilidade, em julgamento submetido ao rito de recurso representativo de controvérsia na forma do art. 543-C do Código de Processo Civil, não se pode ignorar que a constitucionalidade dessa mesma regra é matéria que hoje está afetada ao Supremo Tribunal Federal, que já reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada e determinou o sobrestamento de recursos 8 na forma do art. 543-B e 1º do CPC, o que evidencia a pertinência e atualidade da reflexão em torno de tema ainda pendente de pronunciamento definitivo por parte Poder Judiciário. 2. RESULTADO CONTÁBIL DA PESSOA JURÍDICA: PONTO DE PARTIDA PARA APURAÇÃO DA BASE DE CÁLCULO DO IRPJ E DA CSLL 4 Constituição Federal, art. 153, inciso III. 5 Constituição Federal, art. 195, inciso I, letra c. 6 Lei nº 9.316, de 22 de novembro de 1996 7 STJ, Recurso Especial nº 2009/0056935-6, sessão de 11/11/2009, Relator o Ministro Luiz Fux. 8 STF, Repercussão Geral em Recurso Extraordinário nº 582.525-6, de São Paulo, sessão do Tribunal Pleno de 24/04/2008, relator o Ministro Joaquim Barbosa. 2

No âmbito das pessoas jurídicas, a apuração do acréscimo patrimonial é implementada pela avaliação das receitas e ganhos auferidos em determinado período, que são colocados em confronto com as perdas, despesas e custos suportados ou incorridos pela empresa, eventos esses emparelhados segundo diretrizes, técnicas, métodos e princípios fornecidos por outra ciência, particularmente pela Ciência Contábil. A lei societária, por sua vez, incorpora esses preceitos ditados pela Ciência Contábil, determinando que a escrituração da companhia será mantida em registros permanentes, com obediência aos preceitos da legislação comercial e desta Lei e aos princípios de contabilidade geralmente aceitos, devendo observar métodos ou critérios contábeis uniformes no tempo e registrar as mutações patrimoniais segundo o regime de competência. 9 Com base nessas diretrizes são registrados contabilmente os fatos com repercussão econômica no patrimônio da entidade empresarial, elaborando-se as demonstrações financeiras e demonstração do resultado do exercício 10 ao final do período de apuração. No entanto, em razão da atual periodicidade adotada pela legislação do imposto sobre a renda, essa apuração pode ser exigida trimestralmente ou anualmente, coincidindo, nessa última hipótese, com o ano civil ou ano-calendário. Inspirado nas disposições art. 44 do CTN, que estipula que a base de cálculo do imposto é o montante, real, arbitrado ou presumido, da renda ou dos proventos tributáveis, fixou o legislador ordinário que o imposto de renda das pessoas jurídicas, inclusive das equiparadas, será devido à medida que os rendimentos, ganhos e lucros forem sendo auferidos 11, estabelecendo-se três diferentes formas para tributação do resultado da pessoa jurídica: pelo lucro real, presumido ou arbitrado. 12 Como se depreende da legislação transcrita, não se tributa o resultado provável ou potencial, pois o resultado da pessoa jurídica é submetido à tributação 9 Lei nº 6.404/76, art. 177. 10 Lei nº 6.404/76, art. 187. 11 Lei nº 8.891/95, art. 25, que é matriz legal do art. 218 do Regulamento do Imposto de Renda RIR/99, aprovado pelo Decreto nº 3.000/99. 12 Lei nº 9.430/96, art. 1º. 3

à medida que os rendimentos, ganhos e lucros forem sendo auferidos, no sentido de lucros realizados, já incorporados ao patrimônio da pessoa jurídica e, portanto, já disponíveis. Como a questão colocada para exame tem a ver com a possibilidade de dedução dos tributos (IRPJ e CSLL) incidentes sobre o lucro, para apuração de suas respectivas bases de cálculo, essa reflexão só tem sentido no contexto da tributação pela sistemática do lucro real, apuração que tem como ponto de partida o resultado do exercício determinado nos termos da legislação comercial, que será ajustado mediante adições e exclusões, nos termos e condições determinadas pela legislação tributária. 13 Por sua vez, é a própria legislação tributária que se apressa em especificar o conceito de lucro líquido como o ponto de partida para os ajustes que levarão ao chamado lucro real, como se vê do art. 248 do atual Regulamento do Imposto de Renda que tem a seguinte redação: Conceito de Lucro Líquido Art. 248. O lucro líquido do período de apuração é a soma algébrica do lucro operacional (Capítulo V), dos resultados não operacionais (Capítulo VII), e das participações, e deverá ser determinado com observância dos preceitos da lei comercial (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 6º, 1º, Lei 7.450, de 1985, art. 18, e Lei nº 9.249, de 1995, art. 4º) Como regra, os ajustes determinados pelas adições são utilizados pelo legislador como instrumentos de controle e proteção da consistência da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, coibindo que a base da tributação possa ser manipulada por iniciativas do próprio sujeito passivo, como acontece com a costumeira prática de assunção de custos e encargos não vinculados com a manutenção da fonte produtora da renda, e que são pagos pela pessoa jurídica por mera liberalidade, portanto, adequadamente rotulados como desnecessários. Dessa construção decorre a diretriz fundamental para a dedutibilidade de despesas suportadas pela pessoa jurídica, no sentido de que são despesas dedutíveis aquelas que estejam 13 Decreto-Lei nº 1.598/77, art. 6º, que é matriz legal do art. 247 do Regulamento do Imposto de Renda RIR/99, aprovado pelo Decreto nº 3.000/99. 4

relacionadas com as atividades da empresa e que sejam necessárias, usuais e normais. 14 Portanto, esse é o limite da liberdade do legislador para crivar de indedutibilidade qualquer encargo que afeta o resultado da empresa. Preenchidos esses requisitos, é imperativo que seja reconhecida a dedutibilidade das despesas e custos suportados pela pessoa jurídica, sob pena de restar mutilado o conceito de renda, vindo o imposto incidir sobre realidade desprovida dos seus atributos, atingindo o patrimônio e não mais o acréscimo da nova riqueza. De outra parte, é absolutamente impróprio o juízo de necessidade diante de tributos, pelo que não se pode negar a dedutibilidade de encargos suportados compulsoriamente pela pessoa jurídica, como acontece com os tributos incidentes sobre o patrimônio da empresa, assim como aqueles tributos incidentes no contexto das atividades desenvolvidas pela entidade empresarial. 3. REGIME DE DEDUTIBILIDADE DOS TRIBUTOS PARA EFEITO DE IRPJ E CSLL Em que pese possa o legislador crivar de indedutibilidade determinados encargos suportados pela pessoa jurídica por mera liberalidade, portanto, não vinculados com a necessidade de manutenção da respectiva fonte produtora da renda, evidente que não pode a lei tributária exigir IRPJ ou CSLL se ausente o acréscimo patrimonial que caracteriza a existência lucro, quantificado segundo os princípios e métodos ditados pela ciência contábil e pelas diretrizes da lei societária. Pudesse o legislador tributário definir como lucro o decréscimo patrimonial e não o acréscimo, ou como receita o desembolso de recurso financeiro e não o ingresso, ruiria todo o sistema tributário brasileiro que é calcado na rígida distribuição de competências, a partir da entrega aos entes tributantes de específicas parcelas da 14 RIR/99: Art. 299. São operacionais as despesas não computadas nos custos, necessárias à atividade da empresa e à manutenção da respectiva fonte produtora (Lei nº 4.506, de 1964, art. 47). 1º São necessárias as despesas pagas ou incorridas para a realização de transações ou operações exigidas pela atividade da empresa (Lei nº 4.506, de 1964, art. 47, 1º). 2º As despesas operacionais admitidas são as usuais ou normais no tipo de transações, operações ou atividades da empresa (Lei nº 4.506, de 1964, art. 47, 2º). 5

realidade dotadas de potencialidade econômica, compreendidas pelo conteúdo semântico constitucionalmente pressuposto para cada um dos vocábulos. Essa construção está em plena sintonia com o disposto no art. 110 do Código Tributário Nacional, vazado nos seguintes termos; Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias. A advertência prevista no dispositivo da lei complementar aqui transcrito nem seria necessária, mas tem a função didática de esclarecer, de uma vez por todas, que o legislador ordinário não pode alterar a competência tributária ao seu talante, mediante distorção dos conceitos, ou alteração de conteúdos de institutos já consagrados em outra área do conhecimento. Dessa forma, na perspectiva de tributação da pessoa jurídica, é imperativo que as regras de incidência do imposto sobre a renda (IRPJ) e da contribuição social sobre o lucro líquido (CSLL) só possam alcançar materialidade tipificada pela existência de efetivo acréscimo patrimonial, traduzido pelo resultado positivo do confronto entre receitas e custos/despesas, conhecido pelo conceito de lucro. Evidente que os tributos suportados pela pessoa jurídica, na condição de sujeito passivo, interferem negativamente nessa equação, pois são encargos compulsórios que contribuem para a diminuição do resultado do período base em que brotam seus fatos geradores. A dedutibilidade dos tributos está regulada em específica regra consolidada no art. 344 do Regulamento do Imposto sobre a Renda 15, estando ali prevista a expressa restrição para a dedutibilidade do IRPJ e da CSLL, conforme se vê dos parágrafos 2º e 6º colocados em destaque: Art. 344. Os tributos e contribuições são dedutíveis, na determinação do lucro real, segundo o regime de competência (Lei nº 8.981, de 1995, art. 41). 1º O disposto neste artigo não se aplica aos tributos e contribuições cuja exigibilidade esteja suspensa, nos termos dos incisos II a IV do art. 151 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966, haja ou não depósito judicial (Lei nº 8.981, de 1995, art. 41, 1º). 2º Na determinação do lucro real, a pessoa jurídica não poderá deduzir como custo ou despesa o Imposto de Renda de que for sujeito passivo como 15 RIR/99 aprovado pelo Decreto nº 3.000, de 26 de março de 1999. 6

contribuinte ou responsável em substituição ao contribuinte (Lei nº 8.981, de 1995, art. 41, 2º). [...] 6 o A partir de 1º de janeiro de 1997, o valor da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido CSLL não poderá ser deduzido para efeito de determinação do lucro real (Lei nº 9.316, de 1996, art. 1º). (grifos acrescidos) Não é novidade a previsão de indedutibilidade do IRPJ, para apuração da sua própria base de cálculo, pois já estava prevista no art. 16 do Decreto-Lei nº 1.598/77 com semelhante enunciado 16. Diferentemente, quando criada a CSLL pela Lei nº 7.689/88, não havia qualquer restrição para que essa contribuição fosse deduzida na apuração da base de cálculo do IRPJ. Pelo contrário, a administração tributária regulamentou 17 a apuração da CSLL reconhecendo sua natureza de despesa na apuração do resultado da pessoa jurídica e, nessa condição, a norma regulamentadora admitia que a CSLL fosse considerada dedutível não só para efeito de cálculo do IRPJ, mas também para efeito de apuração da base de cálculo da própria CSLL, sistemática que ficou conhecida como fórmula de cálculo por dentro para encontrar o valor devido dessa contribuição. Posteriormente, na tentativa de aproximar a apuração da CSLL aos ajustes já exigidos para o IRPJ, veio o art. 57 da Lei nº 8.981/95 determinar que fossem aplicadas à Contribuição Social sobre o Lucro as mesmas normas de apuração e de pagamento estabelecidas para o imposto de renda das pessoas jurídicas, [...] mantidas a base de cálculo e as alíquotas previstas na legislação em vigor, com as alterações introduzidas por esta Lei 18. Há ponderados questionamentos sobre a eficácia dessa pretendida equiparação nos ajustes para determinação da base de cálculo desses tributos, na medida em que o próprio texto do art. 57 é taxativo para confirmar que ficavam mantidas a base de cálculo e as alíquotas previstas na legislação em vigor, ao mesmo tempo em que se mandava observar as mesmas 16 Art 16 - Os tributos são dedutíveis como custo ou despesa operacional no período-base de incidência: I - em que ocorrer a fato gerador da obrigação tributária, se o contribuinte apurar os resultados segundo o regime de competência; ou II - em que forem pagos, se o contribuinte apurar os resultados segundo o regime de caixa. 1º - Na determinação do lucro real, a pessoa jurídica não pode deduzir como custo ou despesa o imposto de renda de que for sujeito passivo como contribuinte ou como responsável em substituição ao contribuinte. 17 7. A contribuição social poderá ser registrada como despesa dedutível ao período-base a que competir. Item 7 da Instrução Normativa da Secretaria da Receita Federal nº 198, de 29 de dezembro de 1988. 18 Art. 57 da Lei nº 8.981/95, com a redação atribuída pela Lei nº 9.065/95. 7

normas de apuração e de pagamento estabelecidas para o imposto de renda das pessoas jurídicas, assim entendidas as regras que estabelecem as sistemáticas de tributação pela sistemática do lucro real, presumido e arbitrado. Portanto, o crivo direto da indedutibilidade da CSLL veio somente com a Lei nº 9.316/96, regrado nos seguintes termos: Art. 1º O valor da contribuição social sobre o lucro líquido não poderá ser deduzido para efeito de determinação do lucro real, nem de sua própria base de cálculo. Parágrafo único. Os valores da contribuição social a que se refere este artigo, registrados como custo ou despesa, deverão ser adicionados ao lucro líquido do respectivo período de apuração para efeito de determinação do lucro real e de sua própria base de cálculo. A transcrição do dispositivo legal serve também para demonstrar que a nova regra jurídica, a despeito do seu comando objetivo e inequívoco pela indedutibilidade da contribuição, continua reconhecendo que a CSLL é tributo que afeta o resultado da pessoa jurídica, tanto que exige que os seus valores registrados como custo ou despesa, deverão ser adicionados ao lucro líquido do respectivo período de apuração para efeito de determinação do lucro real e de sua própria base de cálculo. Nesse passo, ao reconhecer a natureza do tributo como custo ou despesa da pessoa jurídica e ato contínuo considerar esse encargo como não dedutível na apuração do IRPJ e da própria CSLL, além de postura contraditória do legislador é iniciativa ilegítima que extrapola a competência que lhe foi atribuída pela Constituição Federal, na medida em que a regra de incidência desses tributos passa a alcançar parcelas que vão além da renda, ou do lucro, que identifica o acréscimo patrimonial auferido pela pessoa jurídica, no período de apuração considerado. 4. IRPJ E CSLL: TRIBUTOS QUE INDICAM DESTINAÇÃO COMPULSÓRIA DE PARTE DO LUCRO OU TRIBUTOS QUE AFETAM O RESULTADO Tem-se colocado a tônica na natureza diferenciada desses tributos, para se sustentar a possibilidade da lei impedir a dedutibilidade dessas incidências na determinação do montante do lucro a ser tomado como base de cálculo de cada um dos tributos. 8

Há os que enxergam esses tributos como forma de destinação compulsória do resultado apurado pela pessoa jurídica, determinando a lei que uma parte seja transferida a título de imposto (IRPJ) à União Federal para custeio de seus encargos gerais, ao mesmo tempo em que outra regra de incidência exige que se aparte montante específico desse resultado (9%) 19 para que seja destinado, também à União, para o custeio da seguridade social, a título de contribuição social incidente sobre o lucro (CSLL). Essa configuração tem sido utilizada como fundamento para sustentar que esses tributos não estão relacionados com as operações que levam a apuração do resultado da pessoa jurídica, na medida em que as obrigações tributárias nascem em decorrência desse próprio resultado positivo, e não para a formação dele, daí a propalada pertinência da decretação da indedutibilidade desses tributos. Esse viés interpretativo pode ser confirmado em pronunciamentos da doutrina, como se constata do magistério de Ricardo Mariz de Oliveira que se manifesta nos seguintes termos: Assim, tais tributos estão fora do lucro propriamente dito, vindo após ele, o qual, inclusive, é o pressuposto para as respectivas obrigações tributárias e, por isso mesmo, também a sua dedução dependeria de uma norma de permissão, assim como é legítima a proibição legal de sua dedução. 20 Na mesma linha pode ser encontrado aceno indicativo do futuro voto a ser proferido pelo Ministro Joaquim Barbosa, que em medida cautelar chegou a manifestar seu prévio entendimento sobre essa matéria, com as seguintes considerações: Com efeito, reputei que, sem um adequado exame do conceito constitucional de renda, não seria possível afirmar que os valores cobrados a título de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido sempre se caracterizam como despesa necessária do empreendimento, e, portanto, são ontologicamente dedutíveis da base de cálculo do Imposto sobre a Renda. Para tanto, constatei que parte da doutrina afirma que o valor da CSL constitui verdadeira participação do Estado na exploração empresarial e, portanto, a dedução pretendida corresponderia a um verdadeiro benefício fiscal. 21 (grifos são do original) 19 Alíquota prevista no art. 3º, inciso II, da Lei nº 7.689/88, com a redação que lhe foi atribuída pelo art. 17 da Lei nº 11.727, de 23 de junho de 2008. 20 OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Fundamentos do Imposto de Renda. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 727. 21 Voto em Agravo Regimental na Ação Cautelar nº 1.338/-1, de São Paulo, Segunda Turma do STF, pelo Ministro Joaquim Barbosa, em 12/06/2007. 9

Pelos trechos negritados, deliberadamente destacados pelo Ministro da Suprema Corte no seu voto (repita-se, assim transcritos do original), é possível antever que a sua análise da dedutibilidade põe em cotejo o tributo (CSLL) frente ao requisito geral da necessidade de assumir o encargo. No entanto, o primeiro equívoco parece estar nesta premissa, pois essa cláusula geral prevista na legislação tributária que exige ser a despesa necessária, para efeito de sua dedutibilidade na apuração do lucro tributável, só tem aplicação para coibir a liberalidade, portanto só exigível diante de despesas e custos suportados por deliberação da própria pessoa jurídica, não sendo aplicável diante de encargos compulsoriamente determinados pela lei, dos quais não pode o sujeito passivo se eximir, como são exemplos os tributos. O segundo equívoco vem no trecho em sequência e traduz verdadeira contradição, ao mencionar que a dedução pretendida corresponderia a um verdadeiro benefício fiscal, ao mesmo tempo em que constata que o valor da CSL constitui verdadeira participação do Estado na exploração empresarial. O argumento é contraditório, pois como participação compulsória do Estado na exploração empresarial, evidente que o tributo (CSLL) afeta negativamente o resultado da pessoa jurídica, diminuindo a riqueza nova auferida no respectivo período-base, resultado líquido que deve ser o ponto de partida para mensuração da base tributável pelo imposto de renda (lucro real). Nessa condição, é imperativo que se reconheça a dedutibilidade dessa participação compulsória do Estado (tributo) que afeta a capacidade contributiva, na medida em que reduz a renda disponível, sob pena de restar caracterizada a incidência do IRPJ sobre a parcela da própria CSLL, constatação suficiente para refutar a inadequada ótica da dedução como verdadeiro benefício fiscal. Como visto, em contraposição ao entendimento da corrente que vê a CSLL e também o IRPJ como simples forma de participação do Estado no resultado das empresas, é perfeitamente possível sustentar que esses tributos têm direta interferência na apuração da riqueza nova tributável da pessoa jurídica, e como tal, deveriam ser considerados para efeito de determinar a verdadeira base econômica 10

de suas incidências, evitando-se que o crivo da indedutibilidade faça com que um incida sobre o outro. Em testemunho dessa configuração pode ser mencionada a estrutura da demonstração do resultado da empresa determinada pelo art. 187 da Lei nº 6.404/76, que assim estabelece: Art. 187. A demonstração do resultado do exercício discriminará: I - a receita bruta das vendas e serviços, as deduções das vendas, os abatimentos e os impostos; II - a receita líquida das vendas e serviços, o custo das mercadorias e serviços vendidos e o lucro bruto; III - as despesas com as vendas, as despesas financeiras, deduzidas das receitas, as despesas gerais e administrativas, e outras despesas operacionais; IV o lucro ou prejuízo operacional, as outras receitas e as outras despesas; (Redação dada pela Lei nº 11.941, de 2009) V - o resultado do exercício antes do Imposto sobre a Renda e a provisão para o imposto; VI as participações de debêntures, empregados, administradores e partes beneficiárias, mesmo na forma de instrumentos financeiros, e de instituições ou fundos de assistência ou previdência de empregados, que não se caracterizem como despesa; (Redação dada pela Lei nº 11.941, de 2009) VII - o lucro ou prejuízo líquido do exercício e o seu montante por ação do capital social. Ainda que o IRPJ apareça expressamente como destaque na demonstração do resultado líquido, é sintomático que a lei societária determine que a verdadeira grandeza do resultado da pessoa jurídica (lucro ou prejuízo, inciso VII) seja aferida somente depois de deduzido o próprio imposto sobre a renda (inciso IV), indicativo que poderia servir de fundamento para a pretensão de deduzir o IRPJ da sua própria base de incidência. Nem se diga que essa apuração circular afrontaria a estrutura da base de incidência do tributo, pois é preciso advertir que o abuso na utilização do raciocínio circular para apuração de base de cálculo de tributo é criação do próprio legislador tributário, como se vê de dispositivo inserido no texto constitucional atribuindo à lei complementar a função de fixar a base de cálculo [do ICMS], de modo que o montante do imposto a integre, também na importação do exterior de bem, mercadoria, ou serviço 22. Também releva destacar que, a despeito da atualização promovida pela Lei nº 11.941/2009 na estrutura da demonstração do resultado prevista no mencionado art. 22 CF, art. 155, 2º, incisa XII, letra i, inserido pela Emenda Constitucional nº 33 de 2001. 11

187, anteriormente transcrito, é certo que nessa reforma abdicou o legislador de fazer qualquer referência à CSLL, existente desde 1988, em que pese ser inegável que a base constitucional de sua incidência seja também a mais-valia identificada no conceito de lucro. Nem se alegue que a CSLL seria um mero adicional do IRPJ e, por conseqüência, teria a mesma natureza deste, pois essa aproximação já foi afastada pela Suprema Corte 23 que se pronunciou pelas diferentes naturezas desses tributos, circunstância também confirmada pelos diferentes regimes previstos no texto constitucional, a começar pela constatação que a CSLL está submetida à anterioridade nonagesimal mitigada (art. 195, 6º), não se sujeitando ao princípio constitucional da anterioridade em relação ao exercício financeiro (art. 150, III, b ), que é diretriz fundamental para o IRPJ. Essa constatação permite inferir que, diferentemente do IRPJ que aparece como parcela a ser destacada do resultado da empresa para destino à União, para a lei societária o encargo relativo à contribuição devida para custeio da seguridade social (CSLL) tem natureza de despesa tributária que afeta o resultado da pessoa jurídica, e não fracionamento desse resultado para esse específico destino. E não é só. A despeito da sutileza nessa distinta configuração, o reconhecimento de que a CSLL tem natureza de despesa tributária (e não partilha do lucro) está confirmada na própria Lei nº 9.316/96, na medida em que determina que os valores da contribuição social a que se refere este artigo, registrados como custo ou despesa, deverão ser adicionados ao lucro líquido do respectivo período de apuração para efeito de determinação do lucro real e de sua própria base de cálculo. (grifos acrescidos) Com essa natureza de custo ou despesa de índole tributária, é imperativo que o encargo compulsoriamente exigido a título de CSLL, que afeta negativamente o resultado da empresa, tenha sua dedutibilidade reconhecida no período da ocorrência do seu fato gerador, pela regra geral aplicável à dedutibilidade dos demais tributos, afetando a apuração da sua própria base de cálculo, assim como a apuração da base de cálculo do IRPJ. Assim o sendo, padece de vício de 23 Recurso Extraordinário nº 143.733-9, relator o Ministro Moreira Alves. 12

inconstitucionalidade o art. 1º da Lei nº 9.316/96, no exato ponto em que veda a dedução da CSLL para determinação do lucro real e de sua própria base de cálculo. 5. SÍNTESE CONCLUSIVA Com base nos fundamentos trazidos à colação, é possível arrolar as seguintes conclusões para a controvérsia objeto deste estudo: 5.1. A atual estrutura de repartição de competências prevista no sistema constitucional tributário brasileiro prevê dupla incidência de tributos de diferentes naturezas sobre a base econômica identificada pelo conceito de lucro : (i) pelo imposto de renda (CF, art. 153- III); e (ii) pela contribuição (CSLL) destinada ao custeio da seguridade social (CF, art. 195, I, c ); 5.2. A apuração de lucro, enquanto resultado positivo auferido pela pessoa jurídica, é procedimento que pressupõe rígida observância das diretrizes da Ciência Contábil, assim como das determinações previstas na lei societária, sendo o ponto de partida para os ajustes exigidos pela legislação tributária para efeito de quantificar a base de cálculo da CSLL e do IRPJ; 5.3. A estrutura de demonstração do resultado da pessoa jurídica, determinada pela atual lei societária, prevê que se destaque do resultado a parcela do lucro que constitui obrigação a título de IRPJ, sem qualquer referência à CSLL, pressupondo que o encargo dessa contribuição, de natureza compulsória, já tenha sido apropriado e deduzido como despesa tributária no período da ocorrência do seu fato gerador, e dessa forma, é despesa que já afetou o lucro líquido que é ponto de partida para os ajustes determinados pela legislação tributária; 5.4. Diferentemente da parcela do IRPJ que tem previsão legal para que seja destacada do lucro, a natureza da contribuição da CSLL como despesa tributária, que afeta a apuração do resultado da pessoa jurídica e não como simples partilha do resultado para específica destinação à seguridade social, está confirmada pela questionada Lei nº 9.316/96, na medida em que determina que os valores da contribuição social a que se refere este artigo, registrados como custo ou 13

despesa, deverão ser adicionados ao lucro líquido do respectivo período de apuração para efeito de determinação do lucro real e de sua própria base de cálculo ; (grifos acrescidos) 5.5. Há pouca liberdade ao legislador tributário para crivar de indedutibilidade despesas e custos suportados pela pessoa jurídica, podendo restringir a dedução unicamente dos encargos assumidos por mera liberalidade, por isso reconhecidos como não necessários para a manutenção da fonte produtora da renda; 5.6. Não há como vedar a dedutibilidade de encargos compulsoriamente determinados pela lei, dos quais não pode o sujeito passivo se eximir, como são exemplos as despesas com os tributos suportados pela pessoa jurídica, sob pena de mitigar o conceito de renda (lucro para a pessoa jurídica) pressuposto pelo constituinte, vindo a tributação atingir outra realidade (patrimônio) e não o efetivo acréscimo da riqueza nova que qualifica o lucro no contexto constitucional de renda para a pessoa jurídica. Dessa forma, por mutilar o conceito de lucro e atentar contra o princípio da capacidade contributiva, padece de vício de inconstitucionalidade o art. 1º da Lei nº 9.363/96, no ponto em que veda a dedução da CSLL para determinação do lucro real e de sua própria base de cálculo. 14