MIDIATIZAÇÃO E TURISMOFOBIA: UM ESTUDO A PARTIR DO JORNAL ESPANHOL EL PAÍS Resumo: O processo de midiatização social se caracteriza como o consumo relacionado a produção de sentidos, sejam eles individuais ou coletivos. Concebendo a midiatização como um novo modo de ser no mundo, assume-se a sociedade como consumidora de sentidos construídos por alheios, os quais produzem com maestria os discursos estruturadores do imaginário social. Com base neste preceito, o presente trabalho pretende investigar os efeitos da midiatização em elementos comunicacionais no âmbito do turismo, tendo como fonte de pesquisa o jornal espanhol El País e suas respectivas matérias jornalísticas que abordam a temática da turismofobia. Palavras chave: Midiatização; Turismofobia; Discursos midiáticos Abstract: The process of social mediatization is characterized as a consumption related to the production of meanings, whether being individuals or collective. Conceiving mediatization as a new way of being in the world, society is assumed as a consumer of the senses constructed by others, whom with mastery, produces the structuring discourses of the social imaginary. Based on this precept, the current task aims to investigate the effects of mediatization in communicational elements considering the field of tourism, having as an research source the spanish newspaper El País and their respective journalistic subjects that approach the theme tourismphobia. Keywords: Mediatization; Turismophobia; Media speech 1 INTRODUÇÃO É do conhecimento geral que o turismo é uma das principais atividades econômicas a nível mundial, portanto, possui um papel importante no que diz respeito ao desenvolvimento socioeconômico de uma localidade. Ademais, para as cidades serem consideradas turísticas, torna-se fundamental o uso de instrumentos midiáticos, que possibilitam o fomento da atividade turística e o desejo por viagens, seja pelo fator de status social e consumo, seja aguçando as emoções e o imaginário por parte da sociedade. Neste sentido, Falco (2011) ressalta que o jornalismo promove importante função, fato relacionado a credibilidade que lhe é reconhecida pelo público. Ainda segundo a autora, sua ação se dá como uma espécie de narrativa do real, e exerce representações sob as cidades, povos e culturas, aos quais são conferidos imaginários e identidades que serão percebidos pelo leitor. Diante de tal contexto é que se pretende neste estudo examinar os impactos da midiatização em elementos comunicacionais com conteúdo turístico, e como por intermédio da construção de narrativas midiáticas os discursos relacionados à temática da turismofobia são formulados, reformulados e ratificados.
Tendo por base o objetivo e a temática abordada na presente investigação, propõe-se, além da pesquisa bibliográfica, realizar análise exploratória e, a seleção de 19 publicações do portal digital do jornal espanhol El País, contempladas durante o mês de agosto do ano de 2017. O recorte analítico das matérias se deu por meio da busca a partir de palavras chave, respectivamente: turismofobia, turistificação, turismo massivo e, gentrificação. Em sequência, tais publicações foram selecionadas e ordenadas de forma cronológica, considerando o período de alta temporada do verão espanhol, com ênfase a acontecimentos ocorridos na capital catalã, Barcelona. 2 MIDIATIZAÇÃO E SEUS EFEITOS O primeiro passo para compreender a relação entre a mídia e o processo de midiatização social foi investigar o campo teórico da comunicação, ou seja, preliminarmente refletir sobre as tensões relacionadas entre as duas áreas de estudo. Ao conceituar comunicação, França (2003 apud CARVALHO; LAGE, 2012) a caracteriza como premissa constitutiva dos aspectos sociais, culturais, ideológicos, e tais aspectos são, de forma inerente, afetados pela materialização da mídia. Nos dias atuais, conforme Gomes (2017), acompanha-se uma transição epocal, com a inserção de um bios midiático que se adere de forma profunda ao tecido social. Há o surgimento de um novo sistema comunicacional: o bios virtual. Para além da interação por intermédio das tecnologias, surge, no entanto, um novo modo de ser e estar no mundo, representado pela sociedade midiatizada. Tal modo permite o deslocamento de indivíduos que antes estavam no centro das atividades, sendo considerados como atores e produtores de relações, para assumirem a posição de sujeitos passivos, consumidores da comunicação gerada pelos meios e mídias (GOMES, 2017). Sendo a midiatização um novo modo de ser no mundo, crê-se na mediação como elemento suporte ao se pensar em mídia atualmente, tanto a impressa,
eletrônica (rádio e televisão), quanto a digital. Gomes (2017) ressalta que a mediação é mais que um terceiro elemento que faz a ligação entre a realidade e o indivíduo, via mídia. Ele é a forma como receptor se relaciona com a mídia e o modo como justifica e tematiza essa mesma relação. Por isso, se estrutura como um processo social mais complexo que traz no seu bojo os mecanismos de produção de sentido social (GOMES,2017, p. 66-68) Trazendo o conceito para o domínio da comunicação de massa (jornais, televisão, mídias digitais), Gómez (apud Gomes, 2017, p. 74) distingue mediação como o conjunto de processos de estruturação advindos de ações concretas ou intervenções, originadas em diversas fontes: cultura, política, economia, gênero, classe social, condições situacionais e contextuais, instituições e movimentos sociais. Segundo o autor, a mediação também se origina na mente do sujeito, nas suas emoções, e experiências. Cada uma destas instâncias é fonte de mediações e pode também mediar outras fontes. Outros estudos recentes no campo da comunicação (BRAGA, 2006, 2007; FAUSTO NETO, 2008, 2009; SODRÉ, 2002, 2007; BARBERO, 2009) têm aprofundado a investigação a fim de compreender a transição social dentro do contexto da midiatização, a saber, a mudança para uma sociedade midiatizada. Muniz Sodré (2002) salienta que a midiatização é uma ordem de mediações socialmente realizadas no sentido da comunicação entendida como processo informacional, a reboque de organizações empresariais e com ênfase num tipo particular de interação [...] (SODRÉ, 2002, apud GOMES, 2017 p.78) Já na visão de Martín Barbero (2009 apud TREIN, 2016), numa sociedade midiatizada os meios, as tecnologias ou as indústrias culturais não são fatores determinantes, mas sim todos os grupos sociais, sujeitos e instituições que mobilizam tais processos, e à medida que os mobilizam. Muito embora existam linhas de pensamento que definem a midiatização como mediação tecnológica, Gomes (2017) enfatiza que a sociedade está perante algo contemporâneo, o que promove um salto qualitativo no que diz respeito ao avanço da mídia.
O autor também ressalta que a midiatização se reconfigura como mais um âmbito existencial, isto é, o bios midiático, o que vem a ser um princípio, modelo, e consequentemente, a chave para a interpretação e compreensão da realidade. Os indivíduos identificam e se identificam por intermédio da mídia, agora com recursos alargados que vão além dos dispositivos tradicionais. Diante disto, para Gomes (2017), é possível mencionar a mídia como um locus de discernimento da sociedade. Nessa perspectiva, faz-se imprescindível a reflexão sobre a função dos meios de comunicação como mediadores na concepção de sentido da vida para as pessoas, que, ao se relacionarem com o mundo, interagem entre si com o intuito de se localizarem no espaço e no tempo. No campo do turismo, esses meios atuam diretamente na produção de sentidos e imaginários sobre espaços urbanos e lugares, como tem acontecido no caso do uso midiático do conceito de turismofobia. 3 AFINAL, O QUE É TURISMOFOBIA? A turismofobia é um dos fenômenos recentes que mais tem chamado a atenção de estudiosos da área de turismo, autoridades e sociedade civil, gerando manchetes e discussões em todos os recursos midiáticos possíveis, esferas sociais e campos de investigação. A princípio, o termo se refere ao resultado ocasionado pela ineficiência ou inexistência de planejamento turístico e/ou urbano em um destino, deixando em evidência, por sua vez, os impactos negativos acarretados pela atividade turística, e consequentemente desvirtuando o olhar sob os aspectos positivos. Para melhor compreensão do termo, sugere-se sua divisão em duas palavras, tal como: turismo, segundo a Organização Mundial do Turismo (OMT, 2008, p. 10), é o deslocamento de pessoas para fora do seu entorno habitual por um período consecutivo inferior a um ano, por motivos de lazer, negócios ou outros. Já a fobia, de acordo com o dicionário Michaelis (2018), é entendida como medo mórbido, exagerado; falta de tolerância, aversão, intolerância, rejeição. Desse modo, pode-se resumir a turismofobia como o temor, a aversão, ou o repúdio social dos cidadãos residentes em uma localidade turística para com os turistas e visitantes.
Cidades europeias como Veneza, Roma, Amsterdam, Lisboa e recentemente, - provavelmente onde o termo começou a ganhar maior proporção e espaço nos veículos de comunicação Barcelona, tem enfrentado inúmeras intervenções urbanas, protestos, e desiquilíbrios políticos e sociais devido ao crescimento da atividade turística, de forma mais específica o turismo de massa, que tem o seu auge durante o período do verão, ou seja, alta temporada no continente europeu. 4 A TURISMOFOBIA E SUAS VERTENTES MIDIÁTICAS A ascensão da turismofobia nos meios de comunicação coincide com os diversos conflitos sociais, econômicos e políticos ocorridos na Europa, sobretudo o notável crescimento do sentimento de xenofobia por parte dos cidadãos, agravada ao longo da crise imigratória no ano de 2015, e, portanto, sendo considerada como um dos principais fatores para os constantes ataques em aversão aos visitantes. No entanto, ao contrário do que afirma o senso comum, a temática teve sua origem, ainda de forma sutil, em reportagens sobre o aumento vertiginoso de turistas em Dubrovinik, cidade croata onde foram filmadas cenas centrais da série Game Of Thrones. Desde então, publicações, artigos, e documentários sobre os efeitos do turismo massificado em algumas cidades europeias começaram a ganhar ainda mais espaço na mídia impressa e digital, sobretudo no que tange ao perfil dos visitantes, qualidade de vida dos autóctones, e a crescente perda dos costumes locais nas cidades, em adaptação aos moldes e demandas do lazer e entretenimento turístico. Na cidade de Barcelona, os casos de turismofobia tiveram repercussão mundial, e geraram efeitos de alerta sob diversas cidades do continente europeu que possuem a atividade turística como parte integrante da estratégia econômica local. Dentre outros veículos de comunicação, o jornal espanhol El País possui o papel de vanguarda no que diz respeito as publicações sobre a turismofobia na cidade de Barcelona, cedendo espaço significativo em seu periódico para múltiplas discussões em torno de seus aspectos, efeitos, e as reações de parte da sociedade e do poder público, o que notoriamente reflete na forma como a midiatização tem dado visibilidade para tal aspecto negativo do turismo em destinos turísticos da Europa. O Quadro 1 abaixo indicado concentra-se nas publicações do jornal El País
contempladas durante o mês de agosto de 2017, ou seja, alta temporada no continente europeu. Quadro 1 Mostra de publicações do portal digital do jornal El País sobre a temática turismofobia Fonte: Elaboração própria
5 CONSIDERAÇÕES INICIAIS Os dados coletados até o momento permitem, de forma preliminar, observar os principais discursos existentes em torno da temática abordada. Devido ao fato da temática ainda ser incipiente, tendo tido visibilidade primeiro midiaticamente, e mais recentemente ganhando espaço nos estudos em turismo, não se encontram discussões teóricas e conceituais consistentes envolvendo a turismofobia. A fim de explorar o conteúdo de cada publicação, posteriormente, irá realizar-se a análise da construção de tais discursos, bem como o modo com os quais os mesmos conduzem o imaginário, as emoções, os sentidos, e as relações interpessoais, no que diz respeito ao espaço urbano e à sociedade propriamente dita. 6 REFERÊNCIAS CARVALHO, C. A; LAGE, L. Midiatização e reflexividade das mediações jornalísticas. In: MATTOS, M. Â.; JANOTTI JUNIOR, J.; JACKS, N. (Org.). Mediação e midiatização. Salvador: EDUFBA, 2012. p. 245-269. FALCO, Débora de Paula. Narrativas turísticas: imaginário e mídia na experiência urbana do turismo. Revista Rosa dos Ventos, Caxias do Sul, v.3, n.1, 2011. GOMES, P. G. Dos Meios à Midiatização. São Leopoldo: Ed. Unisinos, 2017. ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO TURISMO. Glossary of tourism terms. 2008. Disponível em: <http://statistics.unwto.org/sites/all/files/docpdf/glossaryterms.pdf>. Acesso em: 24/04/2018. MICHAELIS, 2018. Disponível em: <http://michaelis.uol.com.br/modernoportugues/busca/portugues-brasileiro/fobia/>. Acesso em: 24/04/2018. TREIN, Sérgio Roberto. A RESSIGNIFICAÇÃO DOS TERRITÓRIOS URBANOS ATRAVÉS DE NOVOS PROCESSOS DE MIDIATIZAÇÃO NAS CIDADES. Seminário Internacional de Pesquisas em Midiatização e Processos Sociais, [S.l.], v. 1, n. 1, jun. 2017. ISSN 2526-222X. RUSSO, RENAN. Turismofobia: quando o turismo não agrada. 2017. Disponível em: <https://www.professordeatualidades.com.br/turismofobia-quando-o-turismonao-agrada-todo-mundo>. Acesso em: 24/04/2018.