APONTAMENTOS DP/DPP C3

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Transcrição:

APONTAMENTOS DP/DPP C3 Violência Doméstica A violência doméstica, numa acepção abrangente, abarcará a violência física, a violência psicológica e a violência sexual que ocorre no espaço doméstico ou por causa dele, exercida por um dos seus membros sobre outro ou outros, ou, fora desse espaço, entre pessoas que com ele tenham alguma relação. O Conselho da Europa caracterizou a violência doméstica como «ato ou omissão cometido no âmbito da família por um dos seus membros, que constitua atentado à vida, à integridade física ou psíquica ou à liberdade de um ou outro membro da mesma família ou que comprometa gravemente o desenvolvimento da sua personalidade». O objectivo final do comportamento violento é submeter o outro mediante o uso da força.» A violência doméstica é socialmente intolerável, sentimento esse que acompanha outras formas de discriminação. E é justamente neste quadro que é elaborado e publicado o Plano Nacional Contra a Violência Doméstica. Neste documento assume-se a violência doméstica como flagelo que põe em causa o cerne da vida em sociedade e a dignidade da pessoa humana e afirma-se que toda a violência (nomeadamente a doméstica) assenta em relações de dominação e de força. Reconhece-se, na linha dos textos internacionais mencionados, que a utilização da violência contra as mulheres, as crianças e os idosos constitui uma violação dos direitos fundamentais da pessoa humana Nas mais das vezes é através da denúncia por banda das vítimas ou de terceiros (familiares ou vizinhos), feita junto das entidades policiais, que esta problemática entra no sistema de justiça. Essa notícia dará origem a um procedimento, no qual se irá apurar a responsabilidade do agressor pela prática de crime, que pode ser de ofensa à integridade física, de ameaça, de coação, de injúrias ou difamação, de violação ou de outros crimes sexuais, ou de maus tratos. No que tange à ação penal, o crime poderá ser qualquer dos referidos supra, embora, nos mais dos casos, atentas as regras da especialidade ou da consumpção, o crime efetivamente cometido seja o de maus tratos, punível na sua forma «simples» com pena de prisão de 1 a 5 anos. No crime de ofensas à integridade física simples artigo 143.º - tutela-se a integridade física das pessoas, restringida esta ao seu núcleo essencial, por forma a não contender com a tutela de outros bens jurídicos também protegidos pela lei penal. No crime de maus tratos ao cônjuge, o bem jurídico protegido pela incriminação é a saúde, nas suas vertentes física, psíquica e mental, radicada na dignidade da pessoa humana. Por outro 1

lado, enquanto, nas ofensas à integridade física, o tipo legal se refere a um dado resultado instantâneo produzido no corpo ou na saúde de outra pessoa (que é a lesão no corpo ou na saúde), fazendo-se a imputação objectiva desse resultado à conduta comissiva ou omissiva, nos maus tratos é elemento implícito uma reiteração de condutas que irão produzir o resultado típico que é a lesão do bem jurídico tutelado. A reforma penal efectuada pelo Decreto-Lei nº 48/95, de 15 de Março, acolheu, e bem, a experiência jurisprudencial e os ensinamentos da doutrina entretanto produzidas, introduzindo importantes alterações. Foi então dada ao referido ilícito, agora epigrafado de maus tratos ou sobrecarga de menores, de incapazes ou do cônjuge e sob nova ordenação (passou a ser o artigo 152º do Código Penal), a seguinte redação: 1. Quem, tendo ao seu cuidado, à sua guarda, sob a responsabilidade da sua direção ou educação, ou como seu subordinado por relação de trabalho, pessoa menor, incapaz ou diminuída por razão de idade, doença, deficiência física ou psíquica e: a) Lhe infligir maus tratos físicos ou psíquicos, ou o tratar cruelmente; b) A empregar em atividades perigosas, desumanas ou proibidas; ou, c) A sobrecarregar com trabalhos excessivos; é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos, se o facto não for punível pelo artigo 144º. 2. A mesma pena é aplicável a quem infligir ao cônjuge, ou a quem com ele conviver em condições análogas às dos cônjuges, maus tratos físicos ou psíquicos. O procedimento criminal depende de queixa. 3.Se dos factos previstos nos números anteriores resultar: a) Ofensa à integridade física grave, o agente é punido com pena de prisão de 2 a 8 anos; b) A morte, o agente é punido com pena de prisão de 3 a 10 anos. Depois, em 1998, através da Lei n.º 65/98, de 2 de Setembro, o normativo em questão voltou a ser alterado e, na parte que ora mais releva, tornou o procedimento independente de queixa, embora deixando à vítima a última palavra quanto ao prosseguimento do processo. Passou a ser a seguinte a sua redação: 1. Quem, tendo ao seu cuidado, à sua guarda, sob a responsabilidade da sua direção ou educação, ou a trabalhar ao seu serviço, pessoa menor ou particularmente indefesa, em razão de idade, deficiência, doença ou gravidez, e: a) Lhe infligir maus tratos físicos ou psíquicos, ou o tratar cruelmente; 2

b) A empregar em atividades perigosas, desumanas ou proibidas; ou, c) A sobrecarregar com trabalhos excessivos; é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos, se o facto não for punível pelo artigo 144º. 2. A mesma pena é aplicável a quem infligir ao cônjuge ou a quem com ele conviver em condições análogas às dos cônjuges maus tratos físicos ou psíquicos. O procedimento criminal depende de queixa, mas o Ministério Público pode dar início ao procedimento se o interesse da vítima o impuser e não houver oposição do ofendido antes de ser deduzida acusação. 3. A mesma pena é aplicável a quem, não observando disposições legais ou regulamentares, sujeitar trabalhador a perigo para a vida ou a perigo de grave ofensa para o corpo ou a saúde. 4. Se dos factos previstos nos números anteriores resultar: a) Ofensa à integridade física grave, o agente é punido com pena de prisão de 2 a 8 anos; b) A morte, o agente é punido com pena de prisão de 3 a 10 anos. A referência que se impõe é a de que se atribuiu ao Ministério Público legitimidade para ex oficio iniciar o procedimento sem queixa. É esta a alteração que mais significativamente mostra a evolução que este tipo de ilícito vinha tendo. Desta maneira procurou-se evitar que uma grande parte dos ilícitos relativos à violência conjugal ficasse impune em face das conhecidas renitências e constrangimentos iniciais da vítima. Não obstante, a lei deixou para a pessoa maltratada a decisão última acerca da continuação do processo passou a poder opor-se a que o procedimento continuasse. Na solução adoptada ressalta a consagração da tese que sustentava a natureza pública do crime como meio de «atacar» o até agora subsistente problema de um grande número de arquivamentos de processos por vontade expressa, embora com questionável liberdade, da vítima. Por isso hoje o procedimento, quaisquer que sejam as circunstâncias, já não depende da vontade da vítima. A redação vigente é a seguinte: 1. Quem, tendo ao seu cuidado, à sua guarda, sob a responsabilidade da sua direção ou educação, ou a trabalhar ao seu serviço, pessoa menor ou particularmente indefesa, em razão de idade, deficiência, doença ou gravidez, e: 3

a) Lhe infligir maus tratos físicos ou psíquicos, ou o tratar cruelmente; b) A empregar em atividades perigosas, desumanas ou proibidas; ou, c) A sobrecarregar com trabalhos excessivos; é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos, se o facto não for punível pelo artigo 144º. 2. A mesma pena é aplicável a quem infligir ao cônjuge ou a quem com ele conviver em condições análogas às dos cônjuges maus tratos físicos ou psíquicos. 3. A mesma pena é também aplicável a quem infligir a progenitor de descendente comum em 1.º grau maus tratos físicos ou psíquicos. 4. A mesma pena é aplicável a quem, não observando disposições legais ou regulamentares, sujeitar trabalhador a perigo para a vida ou a perigo de grave ofensa para o corpo ou a saúde. 5. Se dos factos previstos nos números anteriores resultar: a) Ofensa à integridade física grave, o agente é punido com pena de prisão de 2 a 8 anos; b) A morte, o agente é punido com pena de prisão de 3 a 10 anos. 6. Nos casos de maus tratos previstos nos n.os 2 e 3 do presente artigo, ao arguido pode ser aplicada a pena acessória de proibição de contacto com a vítima, incluindo a de afastamento da residência desta, pelo período máximo de dois anos. Concretamente, as principais inovações são as seguintes: a) Atribuiu-se natureza pública ao crime, pondo fim ao expediente anteriormente introduzido, que permitia à vítima pôr termo ao processo ainda que o mesmo se tivesse iniciado sem a sua queixa; b) O campo de tutela passou a abranger também os progenitores de descendente comum, passando, nesta matéria, o âmbito da proteção penal para fora das paredes da casa de morada da família e do agregado familiar assim entendido. c)por forma a melhor colmatar as deficiências apontadas ao anterior regime, nomeadamente no que respeita à recorrente oposição da vítima ao prosseguimento do processo, previu-se agora uma outra solução, que reside no novo enquadramento e redação do instituto da suspensão provisória do processo, previsto nos artigos 281.º e 282.º do C.P.P., abrindo-se a possibilidade de, em processo pelo crime de maus 4

tratos entre cônjuges ou entre quem conviva em condições análogas, se decidir por aquela suspensão, a qual até poderá ser requerida pela própria vítima; d) Previu-se ainda a possibilidade de ser aplicada ao condenado a pena acessória de proibição de contacto com a vítima, incluindo a obrigação de afastamento da residência desta, até ao máximo de dois anos. O que mais ressalta face ao regime anterior é a consagração da tese que há muito sustentava a necessidade de atribuir natureza pública ao crime, como meio de «atacar» o até então subsistente problema de um grande número de arquivamentos por vontade expressa, embora com questionável liberdade, da vítima. Por isso, o procedimento atual, em qualquer circunstância ou fase do processo, não depende da vontade daquela. Pese embora a benévola intenção do legislador, a verdade é que o novel regime permite a instauração da ação pública a partir, por exemplo, de delação (denúncia) de terceiro, podendo por essa via encetar-se uma cruzada de efeitos imprevisíveis, sem que a tal a própria vítima possa pôr termo. Para além das casas de apoio às mulheres maltratadas e de outras estruturas de apoio social, criadas e mantidas pelas instituições de solidariedade social ou por outras organizações não-governamentais, pouco mais existe para minorar os efeitos emergentes desta questão social. A final, só a final, deverá intervir o direito penal e a estrutura judiciária com toda a sua pesada artilharia, intervenção essa, como é sabido, consentânea com a sua natureza. A prova testemunhal, ensina Germano Marques da Silva, «é essencialmente constituída pela narração de um facto juridicamente relevante de que a testemunha tem conhecimento». Sendo as testemunhas, na expressão de Bentham, «os olhos e os ouvidos da justiça». Trata-se claramente de um dos mais importantes meios de prova; no respeitante aos crimes emergentes da violência doméstica, designadamente nos crimes de maus tratos ao cônjuge, é, nos mais dos casos, essencial. Ora a lei não só prevê a possibilidade de recusa de parentes e afins do arguido de deporem como testemunhas, como estabelece a obrigação, para a entidade competente para a recolha do depoimento, de advertência para essa faculdade, sob pena de nulidade. 5

Intervenção do juiz criminal O contacto do juiz criminal com a matéria de violência conjugal faz-se por um de três meios, e em qualquer deles a impulso do Ministério Público: a) Ou lhe é apresentado o arguido para primeiro interrogatório judicial na sequência de detenção e manifesta intenção do Estado (representado pelo Ministério Público) de àquele ser aplicada uma medida de coação diferente do Termo de Identidade e Residência ; b) Ou lhe é presente o procedimento para apreciação judicial da proposta do Ministério Público com vista à suspensão provisória do processo, conforme preconizado no artigo 281.º do Código de Processo Penal. c) Ou lhe é remetido o processo para julgamento, na sequência de uma acusação pública feita em processo comum, em processo sumário ou em processo abreviado. Artº 152, nº 3 Agravação pelo resultado a título de negligência Obedecendo à estrutura do artigo 18 do CP, próprio de um crime preterintencional, sempre que da conduta de violência doméstica advenha um resultado lesivo da vida ou que provoque uma ofensa à integridade física grave, resultados que são imputados no agente a título de negligência. Lei 112/2009 de 16 de Setembro A presente lei estabelece o regime jurídico aplicável à prevenção da violência doméstica e à proteção e assistência das suas vítimas. Definições: «Vítima» a pessoa singular que sofreu um dano, nomeadamente um atentado à sua integridade física ou mental, um dano moral, ou uma perda material, diretamente causada por ação ou omissão, no âmbito do crime de violência doméstica previsto no artigo 152.º do Código Penal; «Vítima especialmente vulnerável» a vítima cuja especial fragilidade resulte, nomeadamente, da sua diminuta ou avançada idade, do seu estado de saúde ou do facto de o tipo, o grau e a duração da vitimização haver resultado em lesões com consequências graves no seu equilíbrio psicológico ou nas condições da sua integração social; 6

«Técnico de apoio à vítima» a pessoa devidamente habilitada que, no âmbito das suas funções, presta assistência direta às vítimas; «Rede nacional de apoio às vítimas da violência doméstica» o conjunto dos organismos vocacionados para o apoio às vítimas de violência doméstica, nele se incluindo o organismo da Administração Pública responsável pela área da cidadania e da igualdade de género, as casas de abrigo, os centros de atendimento, os centros de atendimento especializado, bem como os núcleos de atendimento e os grupos de ajuda mútua devidamente reconhecidos; «Organizações de apoio à vítima» as organizações da sociedade civil, nãogovernamentais (organizações não governamentais, organizações não governamentais de mulheres, instituições particulares de solidariedade social, fundações ou outras associações sem fins lucrativos), legalmente estabelecidas, cuja atividade se processa em cooperação com a ação do Estado e demais organismos públicos; «Programa para autores de crimes no contexto da violência doméstica» a intervenção estruturada junto dos autores de crimes no contexto da violência doméstica, que promova a mudança do seu comportamento criminal, contribuindo para a prevenção da reincidência, proposta e executada pelos serviços de reinserção social, ou por outras entidades competentes em razão da matéria. Finalidades: Desenvolver políticas de sensibilização nas áreas da educação, da informação, da saúde e do apoio social, dotando os poderes públicos de instrumentos adequados para atingir esses fins; Consagrar os direitos das vítimas, assegurando a sua proteção célere e eficaz; Criar medidas de proteção com a finalidade de prevenir, evitar e punir a violência doméstica; Consagrar uma resposta integrada dos serviços sociais de emergência e de apoio à vítima, assegurando um acesso rápido e eficaz a esses serviços; Tutelar os direitos dos trabalhadores vítimas de violência doméstica; Garantir os direitos económicos da vítima de violência doméstica, para facilitar a sua autonomia; Criar políticas públicas destinadas a garantir a tutela dos direitos da vítima de violência doméstica; Assegurar uma proteção policial e jurisdicional célere e eficaz às vítimas de violência doméstica; Assegurar a aplicação de medidas de coação e reações penais adequadas aos autores do crime de violência doméstica, promovendo a aplicação de medidas complementares de prevenção e tratamento; 7

Incentivar a criação e o desenvolvimento de associações e organizações da sociedade civil que tenham por objectivo atuar contra a violência doméstica, promovendo a sua colaboração com as autoridades públicas; Garantir a prestação de cuidados de saúde adequados às vítimas de violência doméstica. Princípio da Igualdade: Toda a vítima, independentemente da ascendência, nacionalidade, condição social, sexo, etnia, língua, idade, religião, deficiência, convicções políticas ou ideológicas, orientação sexual, cultura e nível educacional goza dos direitos fundamentais inerentes à dignidade da pessoa humana, sendo -lhe assegurada a igualdade de oportunidades para viver sem violência e preservar a sua saúde física e mental. Princípio do respeito e reconhecimento 1 À vítima é assegurado, em todas as fases e instâncias de intervenção, tratamento com respeito pela sua dignidade pessoal. Princípio da autonomia da vontade A intervenção junto da vítima está limitada ao respeito integral da sua vontade, sem prejuízo das demais disposições aplicáveis no âmbito da legislação penal e processual penal. A vítima pode querer o estatuto ou não. Princípio da confidencialidade Sem prejuízo do disposto no Código de Processo Penal, os serviços de apoio técnico à vítima asseguram o adequado respeito pela sua vida privada, garantindo o sigilo das informações que esta prestar. O Regulamento Disciplinar da PSP, explora o segredo profissional. Princípio do consentimento 1 Sem prejuízo do disposto no Código de Processo Penal, qualquer intervenção de apoio à vítima deve ser efectuada após esta prestar o seu consentimento livre e esclarecido. 2 A intervenção de apoio específico, nos termos da presente lei, ao jovem vítima de violência doméstica, com idade igual ou superior a 16 anos, depende somente do seu consentimento. 8

3 A intervenção de apoio específico, nos termos da presente lei, à criança ou jovem vítima de violência doméstica, com idade inferior a 16 anos, depende do consentimento de representante legal, ou na sua ausência ou se este for o agente do crime, da entidade designada pela lei e do consentimento da criança ou jovem com idade igual ou superior a 12 anos. 4 O consentimento da criança ou jovem com idades compreendidas entre os 12 e os 16 anos é bastante para legitimar a intervenção de apoio específico nos termos da presente lei, caso as circunstâncias impeçam a recepção, em tempo útil, de declaração sobre o consentimento de representante legal, ou na sua ausência ou se este for o agente do crime, da entidade designada pela lei. 5 A criança ou jovem vítima de violência doméstica, com idade inferior a 12 anos, tem o direito a pronunciar-se, em função da sua idade e grau de maturidade, sobre o apoio específico nos termos da presente lei. 6 A vítima pode, em qualquer momento, revogar livremente o seu consentimento. Proteção da vítima que careça de capacidade para prestar o seu consentimento 1 Fora do âmbito do processo penal, qualquer intervenção de apoio a vítima que careça de capacidade para prestar o seu consentimento apenas poderá ser efectuada em seu benefício direto. O consentimento tem de ser direto. Não pode ser por terceiros. 2 Sempre que, nos termos da lei, um maior careça, em virtude de perturbação mental, de doença ou por motivo similar, de capacidade para consentir numa intervenção, esta não poderá ser efectuada sem a autorização do seu representante, ou na sua ausência ou se este for o agente do crime, de uma autoridade ou de uma pessoa ou instância designada nos termos da lei. Inimputável Princípio da informação O Estado assegura à vítima a prestação de informação adequada à tutela dos seus direitos. Atribuição do estatuto de vítima Quando se atribui o estatuto da vítima? 1 Apresentada a denúncia da prática do crime de violência doméstica, não existindo fortes indícios de que a mesma é infundada, as autoridades judiciárias ou os órgãos de polícia criminal competentes atribuem à vítima, para todos os efeitos legais, o estatuto de vítima. 9

2 No mesmo ato é entregue à vítima documento comprovativo do referido estatuto, que compreende os direitos e deveres estabelecidos na presente lei, além da cópia do respectivo auto de notícia, ou da apresentação de queixa. 3 Em situações excepcionais e devidamente fundamentadas pode ser atribuído o estatuto de vítima pelo organismo da Administração Pública responsável pela área da cidadania e da igualdade de género, valendo este para os efeitos previstos na presente lei, com exceção dos relativos aos procedimentos policiais e judiciários. 4 A vítima e as autoridades competentes estão obrigadas a um dever especial de cooperação, devendo agir sob os ditames da boa-fé. Somos os primeiros a ter conhecimento da situação. Temos de ter o discernimento para distinguir uma situação real de violência, de uma simulação. Pode acontecer muito. Direito à informação 1 É garantida à vítima, desde o seu primeiro contacto com as autoridades competentes para a aplicação da lei, o acesso às seguintes informações: a) O tipo de serviços ou de organizações a que pode dirigir -se para obter apoio; b) O tipo de apoio que pode receber; c) Onde e como pode apresentar denúncia; d) Quais os procedimentos sequentes à denúncia e qual o seu papel no âmbito dos mesmos; e) Como e em que termos pode receber proteção; f) Em que medida e em que condições tem acesso a: i) Aconselhamento jurídico; ou ii) Apoio judiciário; ou iii) Outras formas de aconselhamento; g) Quais os requisitos que regem o seu direito a indemnização; h) Quais os mecanismos especiais de defesa que pode utilizar, sendo residente em outro Estado. 10

2 Sempre que a vítima o solicite junto da entidade competente para o efeito, e sem prejuízo do regime do segredo de justiça, deve ainda ser -lhe assegurada informação sobre: a) O seguimento dado à denúncia; b) Os elementos pertinentes que lhe permitam, após a acusação ou a decisão instrutória, ser inteirada do estado do processo e da situação processual do arguido, por factos que lhe digam respeito, salvo em casos excepcionais que possam prejudicar o bom andamento dos autos; c) A sentença do tribunal. 3 Devem ser promovidos os mecanismos adequados para fornecer à vítima a informação sobre a libertação de agente detido ou condenado pela prática do crime de violência doméstica, no âmbito do processo penal. 4 A vítima deve ainda ser informada, sempre que tal não perturbe o normal desenvolvimento do processo penal, sobre o nome do agente responsável pela investigação, bem como da possibilidade de entrar em contacto com o mesmo para obter informações sobre o estado do processo penal. 5 Deve ser assegurado à vítima o direito de optar por não receber as informações referidas nos números anteriores, salvo quando a comunicação das mesmas for obrigatória nos termos do processo penal aplicável. Direito à audição e à apresentação de provas 1 A vítima que se constitua assistente colabora com o Ministério Público de acordo com o estatuto do assistente em processo penal. Assistência específica à vítima O Estado assegura, gratuitamente nos casos estabelecidos na lei, que a vítima tenha acesso a consulta jurídica e a aconselhamento sobre o seu papel durante o processo e, se necessário, o subsequente apoio judiciário quando esta seja sujeito em processo penal. Direito à proteção 1 É assegurado um nível adequado de proteção à vítima e, sendo caso disso, à sua família ou a pessoas em situação equiparada, nomeadamente no que respeita à segurança e salvaguarda da vida privada, sempre que as autoridades competentes considerem que existe uma ameaça séria de atos de vingança ou fortes indícios de que essa privacidade pode ser grave e intencionalmente perturbada. 11

2 O contacto entre vítimas e arguidos em todos os locais que impliquem a presença em diligências conjuntas, nomeadamente nos edifícios dos tribunais, deve ser evitado, sem prejuízo da aplicação das regras processuais estabelecidas no Código de Processo Penal. 3 Às vítimas especialmente vulneráveis deve ser assegurado o direito a beneficiarem, por decisão judicial, de condições de depoimento, por qualquer meio compatível, que as protejam dos efeitos do depoimento prestado em audiência pública. 4 O juiz ou, durante a fase de inquérito, o Ministério Público, podem determinar, sempre que tal se mostre imprescindível à proteção da vítima e obtido o seu consentimento, que lhe seja assegurado apoio psicossocial e proteção por teleassistência, por período não superior a seis meses, salvo se circunstâncias excepcionais impuserem a sua prorrogação. 6 O disposto nos números anteriores não prejudica a aplicação das demais soluções constantes do regime especial de proteção de testemunhas, nomeadamente no que se refere à proteção dos familiares da vítima. Direito a indemnização e a restituição de bens 1 À vítima é reconhecido, no âmbito do processo penal, o direito a obter uma decisão de indemnização por parte do agente do crime, dentro de um prazo razoável. 4 Independentemente do andamento do processo, à vítima é reconhecido o direito a retirar da residência todos os seus bens de uso pessoal e exclusivo e ainda, sempre que possível, os seus bens móveis próprios, bem como os dos filhos ou adoptados menores de idade, os quais devem constar de lista disponibilizada no âmbito do processo sendo a vítima acompanhada, quando necessário, por autoridade policial. Cessação do estatuto de vítima 1 O estatuto de vítima cessa por vontade expressa da vítima ou por verificação da existência de fortes indícios de denúncia infundada. 2 O estatuto de vítima cessa igualmente com o arquivamento do inquérito, do despacho de não pronúncia ou após o trânsito em julgado da decisão que ponha termo à causa, salvo se, a requerimento da vítima junto do Ministério Público ou do tribunal competente, consoante os casos, a necessidade da sua proteção o justificar. Acesso ao direito 1 É garantida à vítima, com prontidão, consulta jurídica a efetuar por advogado, bem como a célere e sequente concessão de apoio judiciário, com natureza urgente, ponderada a insuficiência económica, nos termos legais. 12

2 Quando o mesmo facto der causa a diversos processos, deve ser assegurada, sempre que possível, a nomeação do mesmo mandatário ou defensor oficioso à vítima. Celeridade processual 1 Os processos por crime de violência doméstica têm natureza urgente, ainda que não haja arguidos presos. 2 A natureza urgente dos processos por crime de violência doméstica implica a aplicação do regime previsto no n.º 2 do artigo 103.º do Código de Processo Penal. Denúncia do crime 1 A denúncia de natureza criminal é feita nos termos gerais, sempre que possível, através de formulários próprios, nomeadamente autos de notícia padrão, criados no âmbito da prevenção, da investigação criminal e do apoio às vítimas. 2 É ainda assegurada a existência de formulários próprios no âmbito do sistema de queixa electrónica, que garante a conexão com um sítio da Internet de acesso público com informações específicas sobre violência doméstica. Detenção 1 Em caso de flagrante delito por crime de violência doméstica, a detenção efectuada mantém -se até o detido ser apresentado a audiência de julgamento sob a forma sumária ou a primeiro interrogatório judicial para eventual aplicação de medida de coação ou de garantia patrimonial, sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 143.º, no n.º 1 do artigo 261.º, no n.º 3 do artigo 382.º e no n.º 2 do artigo 385.º do Código de Processo Penal. 2 Para além do previsto no n.º 1 do artigo 257.º do Código de Processo Penal, a detenção fora de flagrante delito pelo crime previsto no número anterior pode ser efectuada por mandado do juiz ou do Ministério Público, se houver perigo de continuação da atividade criminosa ou se tal se mostrar imprescindível à proteção da vítima. 3 Para além das situações previstas no n.º 2 do artigo 257.º do Código de Processo Penal, as autoridades policiais podem também ordenar a detenção fora de flagrante delito pelo crime previsto no n.º 1, por iniciativa própria, quando: a) Se encontre verificado qualquer dos requisitos previstos no número anterior; e b) Não for possível, dada a situação de urgência e de perigo na demora, esperar pela intervenção da autoridade judiciária. 13

Medidas de coação urgentes 1 Após a constituição de arguido pela prática do crime de violência doméstica, o tribunal pondera, no prazo máximo de 48 horas, a aplicação, sem prejuízo das demais medidas de coação previstas no Código de Processo Penal e com respeito pelos pressupostos gerais e específicos de aplicação nele referidos, de medida ou medidas de entre as seguintes: a) Não adquirir, não usar ou entregar, de forma imediata, armas ou outros objetos e utensílios que detiver, capazes de facilitar a continuação da atividade criminosa; b) Sujeitar, mediante consentimento prévio, a frequência de programa para arguidos em crimes no contexto da violência doméstica; c) Não permanecer na residência onde o crime tenha sido cometido ou onde habite a vítima; d) Não contactar com a vítima, com determinadas pessoas ou frequentar certos lugares ou certos meios. Declarações para memória futura 1 O juiz, a requerimento da vítima ou do Ministério Público, pode proceder à inquirição daquela no decurso do inquérito, a fim de que o depoimento possa, se necessário, ser tomado em conta no julgamento. Meios técnicos de controlo à distância 2 O controlo à distância é efectuado, no respeito pela dignidade pessoal do arguido, por monitorização telemática posicional, ou outra tecnologia idónea, de acordo com os sistemas tecnológicos adequados. 3 O controlo à distância cabe aos serviços de reinserção social e é executado em estreita articulação com os serviços de apoio à vítima, sem prejuízo do uso dos sistemas complementares de teleassistência referidos no n.º 5 do artigo 20.º Consentimento 1 A utilização dos meios técnicos de controlo à distância depende do consentimento do arguido ou do agente e, nos casos em que a sua utilização abranja a participação da vítima, depende igualmente do consentimento desta. 3 O consentimento do arguido ou do agente é prestado pessoalmente perante o juiz, na presença do defensor, e reduzido a auto. 14

Medidas de apoio à reinserção do agente 1 O Estado deve promover a criação das condições necessárias ao apoio psicológico e psiquiátrico aos agentes condenados pela prática de crimes de violência doméstica, bem como àqueles em relação aos quais tenha recaído decisão de suspensão provisória do processo, obtido o respectivo consentimento. 2 São definidos e implementados programas para autores de crimes no contexto da violência doméstica, designadamente com vista à suspensão da execução da pena de prisão. Rede nacional de apoio às vítimas de violência doméstica Os gabinetes de atendimento às vítimas, constituídas no âmbito dos órgãos de polícia criminal atuam em estreita cooperação com a rede nacional de apoio às vítimas de violência doméstica. Gratuitidade 1 Os serviços prestados através da rede nacional de apoio às vítimas de violência doméstica são gratuitos. 2 Por comprovada insuficiência de meios económicos, o apoio jurídico prestado às vítimas é gratuito. Portaria n.º 229-A/2010 O estatuto de vítima importa os seguintes direitos: Direito à informação A vítima tem direito a ser informada sobre: 1.1 Os serviços e ou organizações a que pode dirigir-se para obter apoio e qual o tipo de apoio que pode receber; 1.2 Os procedimentos sequentes à denúncia e qual o seu papel no âmbito dos mesmos; 1.3 Como e em que termos pode receber proteção, nomeadamente policial, processual e psicossocial adequada ao seu caso e proporcional às suas necessidades; 1.4 As modalidades de proteção jurídica a que pode ter acesso: aconselhamento jurídico, apoio judiciário e outras formas de aconselhamento previstas na lei; 15

1.5 O direito a obter uma indemnização por parte do agente do crime, no âmbito do processo penal; 1.6 Quais os mecanismos especiais de defesa que pode utilizar, sendo residente em outro Estado. Sem prejuízo do regime do segredo de justiça, pode a vítima solicitar informação sobre: 1.7 O estado do processo; 1.8 A situação processual do arguido, por factos que lhe digam respeito, salvo em casos excepcionais que possam prejudicar o andamento do processo; 1.9 A sentença do tribunal. Tem, ainda, a vítima direito a ser informada: 1.10 Sobre a libertação do detido ou condenado pela prática do crime de violência doméstica; 1.11 Do nome do agente responsável pela investigação, bem como da possibilidade de entrar em contacto com o mesmo e obter informação sobre o estado do processo, sempre que tal não perturbe o normal desenvolvimento do processo penal. Direito à audição e à apresentação de provas 2.1 A vítima tem direito a requerer a sua constituição como assistente, oferecendo provas e requerendo diligências, colaborando com o Ministério Público de acordo com o estatuto do assistente em processo penal; 2.2 A vítima tem direito a ser inquirida pelas autoridades, apenas na medida do necessário para os fins do processo penal. Despesas resultantes da sua participação no processo penal 3.1 A vítima tem a possibilidade de ser reembolsada das despesas efectuadas em resultado da sua legítima participação no processo penal, nos termos estabelecidos na lei. Direito à proteção 4.1 À vítima é assegurado um nível adequado de proteção e, sendo caso disso, à sua família ou pessoas em situação equiparada; 4.2 Por decisão judicial, às vítimas especialmente vulneráveis deve ser assegurado a prestação de depoimento por qualquer meio compatível, que as proteja dos efeitos 16

do depoimento prestado em audiência pública; 4.3 Sempre que se mostre imprescindível à sua proteção, à vítima é assegurado apoio psicossocial e proteção por teleassistência. Direito a indemnização e a restituição de bens 5.1 À vítima é reconhecido o direito de, no âmbito do processo penal, obter uma decisão de indemnização por parte do agente do crime, em prazo razoável; 5.2 Os objetos restituíveis pertencentes à vítima e apreendidos no processo penal são imediatamente examinados e devolvidos, salvo necessidade imposta pelo processo penal; 5.3 A vítima tem o direito de retirar da residência todos os seus bens de uso pessoal e exclusivo e ainda os bens móveis próprios, bem como os dos filhos menores de idade, os quais devem constar de lista disponibilizada no âmbito do processo, sendo acompanhada para o efeito, sempre que necessário, por autoridade policial. Direitos sociais 6.1 Beneficiar, de forma gratuita, de um conjunto de respostas sociais ao nível do atendimento, acolhimento, apoio e encaminhamento personalizado, tendo em vista a sua proteção, designadamente casas de abrigo, núcleos e centros de atendimento, centros de atendimento especializado e gabinetes de atendimento e tratamento clínico; 6.2 Isenção do pagamento de taxas moderadoras no âmbito do Serviço Nacional de Saúde; 6.3 Justificação das faltas ao trabalho motivadas por impossibilidade de o prestar em consequência do crime de violência doméstica, bem como a solicitar a transferência, temporária ou definitiva, para outro local de trabalho, cumpridas determinadas condições; 6.4 Ser apoiada no arrendamento de habitação ou beneficiar da atribuição de fogo social ou de modalidade específica equiparável, nos termos da lei, quando as necessidades de afastamento da vítima do autor do crime o justifiquem; 6.5 Beneficiar do rendimento social de inserção, nos termos da Lei n.º 13/2003, de 21 de Maio, e receber o abono de família referente aos filhos menores que consigo se encontrem; 6.6 Aceder, de forma preferencial, aos programas de formação profissional disponíveis. 17

Cessação do estatuto de vítima 7.1 A vítima tem direito a ser informada de como cessa o estatuto de vítima; 7.2 A vítima pode, por manifestação de vontade expressa, fazer cessar o estatuto de vítima que impende sobre si; 7.3 A cessação do estatuto de vítima não prejudica, sempre que as circunstâncias forem julgadas justificadas pelos correspondentes serviços, a continuação das modalidades de apoio social que tenham sido estabelecidas, e em caso algum as regras aplicáveis do processo penal. Deveres A vítima tem os seguintes deveres: 1) Não prestar falsas declarações, sob pena de eventual responsabilidade penal e de cessação das prestações sociais e económicas que lhe tenham sido concedidas; 2) Restituir as prestações indevidamente pagas por terem sido baseadas em falsas declarações ou na omissão de informações legalmente exigidas; 3) Colaborar com as autoridades judiciárias e os órgãos de polícia criminal no decurso do processo penal; 4) Em geral, cooperar com as várias entidades que prestam apoio, agindo sob os ditames da boa-fé. Teleassistência a vítimas de violência doméstica Teleassistência a Vítimas de Violência Doméstica surge da necessidade de garantir proteção e segurança às vítimas e diminuir o seu risco de revitimização. A Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG) é o organismo da administração pública com competência para instalar, assegurar e manter em funcionamento os sistemas técnicos de teleassistência, podendo recorrer para o efeito à celebração de parcerias. Entidades envolvidas Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género Cruz Vermelha Portuguesa Guarda Nacional Republicana (GNR) Polícia de Segurança Pública (PSP) Ministério Público 18

Serviço de teleassistência a vítimas de violência doméstica Este serviço assegura às vítimas de Violência Doméstica que dele beneficiem uma resposta rápida e proporcional em situações de risco/perigo e ainda apoio emocional, 24 horas por dia, 365 dias por ano, através de um equipamento móvel que se encontra conectado diretamente ao Centro de Atendimento Telefónico da Cruz Vermelha Portuguesa onde se encontram técnicos/as especificamente preparados/as para dar uma resposta adequada a cada situação. Este serviço é gratuito. Objetivos Garantir uma intervenção imediata e adequada em situações de emergência Atenuar níveis de ansiedade, aumentando e reforçando o sentimento de proteção e de segurança das vítimas Aumentar a qualidade de vida das vítimas Minimizar a situação de vulnerabilidade em que as vítimas se encontram, contribuindo para o aumento da sua autonomia e a sua (re)inserção na sociedade Mobilizar os recursos policiais proporcionais ao tipo de emergência. Aplicação da teleassistência a vitimas de violência doméstica Podem sinalizar ao Tribunal competente após formalização de queixa/denúncia pelo crime de violência doméstica as seguintes Entidades: Órgãos de Polícia Criminal; Entidades previstas na rede nacional de apoio às vítimas de violência doméstica artigo 53. da Lei n. 112/2009 de 16 Setembro; Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG) Conteúdos Sintetizados Se é vítima de violência doméstica dirija-se a qualquer Esquadra da PSP, Posto da GNR, Piquete da Polícia Judiciária ou Tribunal, porque vale a pena denunciar. É fundamental que as vítimas de crime exerçam o seu direito de apresentação de denúncia crime, para dar início à resolução do problema da violência doméstica. 19

Se é vítima de violência doméstica procure sempre um hospital, centro de saúde ou médico particular, mesmo que não apresente sinais externos de agressão. Se possível solicite a um familiar ou pessoa amiga que (o) a acompanhe. Se foi vítima de violação não deve lavar-se até ser observada por um (a) médico (a). Guarde, sem lavar, a roupa que vestia no momento. Violência Doméstica assume a natureza de crime público, o que significa que o procedimento criminal não está dependente de queixa por parte da vítima, bastando uma denúncia ou o conhecimento do crime, para que o Ministério Público promova o processo. As EPAV (totalizam na presente data, ao nível nacional, 621 Agentes) constituem, assim, no que diz respeito à prevenção da problemática da violência doméstica, uma primeira linha de intervenção, de proteção e segurança, de atendimento, de acompanhamento, de apoio e de encaminhamento das vítimas, apreensão de objetos (armas, roupas e outro tipo de objetos). Simultaneamente, as equipas de investigação criminal da PSP ao nível nacional constituem uma segunda linha de intervenção, responsável pela gestão do local do crime, recolha dos meios de prova, inquirição de testemunhas (designadamente um inquérito de vizinhança junto à residência do agressor e da vítima para tentarem recolher informações sobre os antecedentes e contexto da violência), apreensão de objetos (designadamente armas) entre outras diligências consideradas relevantes no âmbito do inquérito. 20