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Transcrição:

UM DISCURSO SOBRE A VIOLÊNCIA NO BRASIL: OS SENTIDOS REPRESENTACIONAIS, INTERACIONAIS E COMPOSICIONAIS CONSTRUÍDOS PELA MULTIMODALIDADE NUMA CAPA DE REVISTA¹ COSTA, Fernanda Bertollo²; PINTO, Marciele Benittes³; MASTELLA, Veronice 4 Resumo: O estudo apresenta uma análise multimodal das representações da violência construídas na capa da revista ISTOÉ, publicada na edição de 6 de julho de 1 2016. A análise fundamenta-se no aparato teórico-metodológico da Gramática do Design Visual (KRESS E VAN LEEUWEN, 1996), e busca identificar o processo de articulação entre os elementos multimodais que compõem os procedimentos de representação no contexto jornalístico. No sistema de análise são consideradas as diferentes dimensões das três funções realizadas pela linguagem - representacional, interacional e composicional. Na sociedade contemporânea, as representações construídas no contexto jornalístico são cada vez mais multimodais ampliando as possibilidades nos processos de significação. Palavras-Chave: Gramática do Design Visual. Multimodalidade. Capa de Revista. Violência. Abstract: The study presents a multimodal analysis of the representations of violence published on July 6, 2016. The analysis is based on the theoretical-methodological apparatus of Grammar of Visual Design (KRESS and VAN LEEUWEN, 1996), and seeks to identify the process of articulation between the multimodal elements that compose the processes of representation in the journalistic context. In the analysis procedures are considered the different dimensions of the three functions performed by the language - representational, interactional and compositional. In contemporary society, the representations constructed in the journalistic context are increasingly multimodal, expanding the possibilities in the processes of signification. Keywords: Grammar of Visual Design. Multimodality. Magazine Cover. Violence. 1 Este estudo foi desenvolvido na disciplina de Semiótica do curso de Jornalismo da Unicruz. 2 Acadêmica do 7ª semestre do Curso de Jornalismo da Unicruz. E-mail: fernandabertollocosta9@gmail.com. 3 Acadêmica do 7º semestre do Curso de Jornalismo da Unicruz. E-mail: cellybenittes@gmail.com. 4 Doutora em Linguística, Mestre em Comunicação Social e professora da disciplina de Semiótica no curso de Jornalismo da Unicruz. E-mail: vmastella@unicruz.edu.br

INTRODUÇÃO Na área da educação, a análise ou ao menos a compreensão básica sobre as questões semióticas e de análise do discurso são essenciais, tendo em vista, principalmente no que se referem os sentidos e interpretações que damos às representações disponibilizadas em livros, jornais, revistas e outros produtos culturais que fazem parte do nosso cotidiano. Para Fairclough (2003, apud MASTELLA, 2015, p. 24), representar é construir textualmente o mundo social e as constituições discursivas possibilitadas pela linguagem incluem aspectos do mundo físico (seus processos, objetos, relações, parâmetros espaciais e temporais), aspectos do mundo mental de pensamentos, sentimentos, sensações [...] e os aspectos do mundo social. A Análise Crítica do Discurso (FAIRCLOUGH, 1989), uma perspectiva teórica com abordagem transdisciplinar, considera a linguagem como uma forma de prática social. Tal prática pode ser estudada em materiais escritos, impressos, fílmicos ou televisionados, cuja significância dos elementos visuais é extremamente evidente e na qual os elementos imagéticos e verbais operam de forma tão interativa que se torna muito difícil isolá-los. Nesse contexto, a análise do discurso realizada neste estudo procura evidenciar categorias da multimodalidade, no gênero capa de revista, a partir das funções da Gramática do Design Visual (GDV), um aparato teórico-metodológico do campo da sociossemiótica, proposto por Kress e van Leeuwen (1996) e inspirado nos fundamentos fundamentados na Gramática Sistêmico-Funcional (HALLIDAY, 1994). Assim, com base nas funções representacional, interativa e composicional (dimensões de análise da GDV), apresentaremos os significados atribuídos socialmente à violência no Brasil, no exemplar que constitui o corpus deste estudo. Kress e van Leeuween (1996) consideram que a linguagem visual/imagética - assim como a linguagem verbal apresenta tri funcionalidade. As três meta-funções podem ser assim compreendidas: a Representacional é onde o usuário da língua (verbal ou imagética) reproduz as experiências de vida; a Interacional é responsável pela credibilidade no discurso do participante interativo (PI), de modo que suas posições sejam transparentes quando transmitidas ao participante representativo (PR); e a Composicional refere-se ao modo de estruturação das informações dentro de um texto conforme com sua relevância. No que se refere à proposta da Gramática Visual os autores frisam a importância de um letramento visual, na medida em que a comunicação visual está se tornando cada vez mais um domínio crucial nas diversas redes de práticas sociais inclusive de informações públicas. Por

isso, não ser visualmente letrado começará a atrair sanções sociais. Letramento visual começará a ser uma questão de sobrevivência, especialmente no ambiente de trabalho (KRESS e van LEEUWEN, 1996, p.3). METODOLOGIA OU MATERIAL E MÉTODOS O presente trabalho foi elaborado a partir de pesquisa bibliográfica e sucedida de análise do discurso com base nas dimensões propostas pela GDV nas três funções: Composicional, Interacional e Representacional. Os procedimentos analíticos do corpus selecionado seguiram o viés da Análise Crítica do Discurso e as dimensões de análise da GDV, uma vez que o gênero capa de revista é multimodal, ou seja, constituído de diferentes modos semióticos (especialmente verbal e imagético). O corpus de análise é a capa da revista ISTOÉ (Figura 1) publicada no dia 6 de julho de 2016. RESULTADOS E DISCUSSÕES Antes de iniciarmos a análise do exemplar do gênero capa de revista selecionado para a análise multimodal, entendemos ser pertinente tecer algumas considerações a respeito do contexto de produção e circulação da referida capa. A Revista ISTOÉ, é um veículo de informação, de circulação nacional, publicada desde 1976, editada em São Paulo pela Editora Três. A Revista foi publicada com periodicidade mensal nos seus dez primeiros números, e em março de 1977 a ISTOÉ passou a circular semanalmente. Desde o seu lançamento, apresentouse como uma revista de variedades, ocupando-se de política, economia, ciência, comportamento, artes, esportes e outros assuntos. A capa da ISTOÉ de 6 de julho de 2016 apresenta uma chamada em letras garrafais vermelhas e com reproduções semelhantes a bala oriunda de arma de fogo, intitulada Até quando a violência vai vencer?.

Figura 1 Capa da revista ISTO É Fonte: https://istoe.com.br/edicoes/ É pertinente ressaltar que o assunto, na época, era ainda mais importante no Brasil em função da matéria ter sido publicada exatamente um mês antes da cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos de 2016 conhecidos como Jogos da XXXI Olimpíada no Rio de Janeiro. Além disso, dados da matéria apontam que diariamente 116 (cento e dezesseis) pessoas são mortas por dia com arma de fogo, o que soma quarenta e dois mil quatrocentos e dezesseis pessoas mortas por ano.

O sentido composicional Na capa em análise o valor informativo está no centro da imagem. Ao fundo, a imagem em preto e branco de parte de uma camiseta com vários furos. O furo maior desvela alguns jornais empilhados, cujas manchetes de jornais relatam casos de violência. Em primeiro plano está a manchete da revista Até quando a violência vai vencer?, apresentada em letras grandes e vermelhas. Essa composição visual ganha destaque de significância não apenas pela mensagem que o espectador lê, mas dado pelo tamanho e cor das letras da manchete. Tal distribuição sinaliza a importância do valor semiótico da representação em estudo. Além das letras grandes e vermelhas, outro ponto que pode ser estudado é a presença das cores preto e branco, que se ajustam as circunstâncias do enredo. O preto se opõe a qualquer ideia de alegria, junto à preocupação, a tristeza. O branco por si só remete a inocência, a pureza e tranquilidade. Em sua composição ainda, a capa apresenta marcas de furos, sendo uma reprodução de tiros de arma de fogo. O furo maior, encontrado a direita da imagem revela manchetes de quatro veículos impressos que pautaram em suas capas a morte de cidadãos seja por policiais ou criminosos. O sentido interativo Na imagem analisada o participante é representado através da imagem da roupa furada de um cidadão ferido, ao passo que os participantes interativos são os leitores da revista, e é para esses que a capa é diretamente direcionada. Nos gêneros midiáticos, como o objeto deste estudo, o produtor da imagem está ausente no instante e no local em que o participante interativo olha a imagem. Assim, a interação é representada e imaginária, pois a relação estabelecida entre o observador e o produtor ocorre de forma simbólica. O sentido interativo se dá de acordo com as estratégias de aproximação ou afastamento entre o produtor do texto e o leitor que é o observador, este último que se encontra fora da imagem, objetiva dessa maneira criar uma espécie de relação ou vínculo afetivo (KRESS e van LEEUWEN 1996, 2006). Sendo assim, a capa da Revista em análise é centro margem. A posição dos participantes representados dentro do enquadramento permite concluirmos que em relação ao ângulo a categorização sugere centro margem porque aponta para um envolvimento total com o leitor através das palavras vermelhas ocuparem a maior parte da capa de forma centralizada, ou seja, induz que o tema é algo que precisa ser encarado, até

mesmo pelo leitor. A centralização de um ou mais elementos na composição da imagem (ARNHEIM, 1982; KRESS e van LEEUWEN 1996, 2006) parece conferir a esses elementos a condição de núcleo da informação em relação aos elementos dispostos ao redor e talvez mais próximos das margens do enquadre. O sentido representacional Na capa em análise, o sentido representacional é identificado pelo texto imagético que representa a roupa de um cidadão inocente atingida por tiros, e em letras maiúsculas vermelhas a pergunta Até quando a violência vai vencer?, na qual procura dimensionar o número de assassinatos no Brasil em meio aos confrontos entre o crime organizado e os policiais. Tal imagem, de acordo com as categorias da Gramática do Design Visual, pode ser identificada como conceitual simbólica atributiva, pois a roupa furada pelo tiro apresenta atributos daquilo que se deseja representar: o cidadão inocente. Além disso, as letras garrafais, em destaque, que ocupam a maior parte do espaço da capa da revista, sugere que se trata de um problema devastador. Neste exemplar do gênero capa de revista, a linguagem verbal (a manchete Até quando a violência Vai Vencer? ), restringe-se a situar o participante interativo em relação ao tema tratado. Todavia, é por meio dos elementos visuais que se constrói a representação a respeito da violência no Brasil. Embora para compor a reportagem tenham sido usadas informações de diversas fontes, como o Mapa da Violência de 2015 e o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, na elaboração da capa os criadores buscaram elementos do universo do senso comum, próprios do cotidiano popular. A roupa furada pode ter diferente significação que varia de leitor para leitor de acordo com sua visão de mundo. Para uns a roupa furada pode representar apenas uma roupa furada, porém, para outros, que prestarem a atenção aos demais atributos da imagem, como as letras grandes vermelhas e até mesmo o furo maior, encontrado a direita da imagem podem compreender que se trata de uma matéria sobre violência. Sendo assim, de forma metafórica, a roupa rasgada e todas as demais características contidas na capa levam a compreensão do tamanho da violência no Brasil. O destaque se dá ao uso de cores em sua composição. A cor vermelha aparece em dois momentos, trazendo em evidência um questionamento e uma afirmação. Por se tratar de uma matéria que aborda a violência diária no cenário brasileiro na época da publicação, o vermelho vem para remeter ao sangue. Sendo uma cor quente, é associada à guerra, ao perigo e a violência. O título da reportagem é formulado com o uso de

letras garrafais vermelhas, dessa maneira salienta a questão tornando possível ao leitor assimilar a representação da frase e da cor naquele contexto. Há também a utilização das cores preto e branco, que se ajustam as circunstâncias do enredo. O preto se opõe a qualquer ideia de alegria, junto à preocupação, a tristeza. O branco por si só remete a inocência, a pureza e tranquilidade. Em sua composição ainda, a capa apresenta marcas de furos, sendo uma reprodução de tiros de arma de fogo. Cinco furos grandes e quatro menores se encontram presentes acima do título que identifica a manchete principal. O furo maior, encontrado a direita da imagem revela manchetes de quatro veículos impressos que pautaram em suas capas a morte de cidadãos seja por policiais ou criminosos. Observando o conjunto em geral, pode-se dizer que a utilização da cor branca como plano de fundo na capa, pode ser associada à roupa de um cidadão inocente, que foi baleado com tiros consecutivos vindos de uma arma de fogo. Os furos pretos representando a execução, a morte, e, o vermelho sendo o líquido do sangue. Dessa forma, as frases e dados presentes na capa, são reforçadas com o auxílio de recursos imagéticos que são identificáveis graças ao repertório visual e cultural do leitor. CONSIDERAÇÕES FINAIS O estudo nos possibilitou compreender que um texto multimodal pode representar aspectos da realidade e as vivências sociais a partir da interpretação dos elementos linguísticos. A temática da violência no Brasil, em destaque na capa foi representada pela articulação de linguagem verbal e imagética. O projeto gráfico da capa foi expandido ao longo das páginas 52 a 58 da revista onde foi publicada a reportagem que teve destaque na capa. A cor vermelha foi usada em todas essas páginas evidenciando a significação do vermelho como representação do sangue, do perigo e da violência. Na diagramação da reportagem as cores preta e branca realçam as circunstâncias do enredo. O preto expressa a preocupação e a tristeza com os altos dados de assassinatos e se contrapõe com o branco que remete a inocência das vítimas. Na capa analisada, observa-se uma mescla entre o visual e o verbal já que a linguagem verbal que constitui a manchete apresenta alto grau de avaliação e constitui parte do sentido da informação sobre a violência. A partir disso compreendemos que é o conjunto de ambas as linguagens que oferece ao leitor os elementos para que ele observe que realmente a violência no Brasil é preocupante.

REFERÊNCIAS ARNHEIM, Rudolf. Arte e percepção visual: uma psicologia da visão criadora. 5. ed. São Paulo: Pioneira, 1989. FAIRCLOUG, N. Analysing discourse: textual analysis for social research. New York: Routledge, 2003. FAIRCLOUGH, N. Language and power. London: Longman, 1989. HALLIDAY, M. A.K. An Introduction to Functional Grammar. 2 ed. London: Edward Arnold,1994. KRESS, G. VAN LEEUWEN. Reading images: the grammar of visual design. London; New York: Routledge, 2006 (1996). MASTELLA, V. De anônimos a heróis: discursos sobre o câncer de 1973 a 2013 no gênero reportagem de popularização da ciência na revista VEJA. Tese de Doutorado. Universidade Federal de Santa Maria, Centro de Artes e Letras, Programa de Pós-Graduação em Letras, RS, 2015. SANTOS, Záira Bomfante dos. As Considerações da Gramática do Design Visual para a Constituição de Textos Multimodais. 2010. SAUSSURE, Ferdinand. Curso de Linguística Geral. São Paulo: Cultrix, 2004.