Recentemente foi licenciada no Brasil a vacina conjugada contra os meningococos dos sorogrupos A, C, Y, W135, produzida pelo Laboratório Novartis e conhecida internacionalmente como Menveo. A vacina é composta por: 10µg do polissacaríde capsular do meningococo A 5µg dos polissacárides capsulares dos meningococos C, Y e W135 conjugados ao carreador proteico CRM 197 (mutante atóxico da toxina diftérica) e não contém adjuvantes. No Brasil, esta vacina foi licenciada para adolescentes e adultos, a partir de 11 anos de idade. Apresentamos, a seguir, alguns dados a respeito da vacina, da doença meningocócica e também sugestões da CEDIPI para revacinação com vacinas meningocócicas conjugadas. Epidemiologia Conhecemos hoje a existência de 13 sorogrupos de meningococos classificados de acordo com a especificidade capsular. No entanto, apenas cinco destes são responsáveis pela grande maioria dos casos de doença meningocócica (DM): A, B, C, Y e W-135. A DM ocorre em todo o mundo. Há, entretanto, marcantes diferenças geográficas na incidência e distribuição dos sorogrupos causadores de doença. Esses estão em constante mudança, sendo a epidemiologia do meningococo de natureza dinâmica e imprevisível. Essas mudanças de prevalência ocorrem globalmente inclusive em regiões de um mesmo país. Sorogrupos raros ou ausentes em determinada região podem emergir, e em pouco tempo serem grandes causadores de surtos ou até virem a se tornar endêmicos. Como
exemplo dessas alterações epidemiológicas podemos citar os dados recentemente atualizados do Estado de São Paulo: DOENÇA MENINGOCÓCICA: CASOS E PORCENTAGENS POR SOROGRUPO NO ESTADO DE SÃO PAULO - 1998 a 2011 SOROG B C W135 Y OUTROS TOTAL ANO casos % casos % casos % casos % casos % casos % 1998 367 63,4 197 34,0 12 2,1 0 0,0 3 0,5 579 100,0 1999 370 64,1 185 32,1 14 2,4 1 0,2 7 1,2 577 100,0 2000 369 60,0 221 35,9 22 3,6 0 0,0 3 0,5 615 100,0 2001 246 54,5 177 39,2 22 4,9 1 0,2 5 1,1 451 100,0 2002 228 50,9 197 44,0 15 3,3 2 0,4 6 1,3 448 100,0 2003 164 37,6 252 57,8 14 3,2 3 0,7 3 0,7 436 100,0 2004 187 35,8 303 58,0 24 4,6 1 0,2 7 1,3 522 100,0 2005 154 30,2 328 64,3 16 3,1 7 1,4 5 1,0 510 100,0 2006 125 24,3 352 68,3 26 5,0 2 0,4 10 1,9 515 100,0 2007 86 16,1 408 76,5 31 5,8 4 0,8 4 0,8 533 100,0 2008 97 14,4 504 74,9 57 8,5 8 1,2 7 1,0 673 100,0 2009 85 12,3 546 79,0 47 6,8 12 1,7 1 0,1 691 100,0 2010 90 10,9 673 81,3 49 5,9 10 1,2 6 0,7 828 100,0 2011 64 13,6 368 78,1 28 5,9 10 2,1 1 0,2 471 100,0 OBS: Total = total de sorogrupados Fonte: SINAN / DDTR / CVE / CCD / SES-SP - dados em 15/9/2011. No Brasil circulam atualmente os sorogrupos B, C, W-135 e Y. O sorogrupo A, que assolou o país na epidemia da década de 70 (juntamente com o C), não tem mais circulado em nosso meio.
Até meados de 2000, o sorogrupo B liderava como causa de DM, sendo responsável por mais de 60% dos casos. O sorogrupo C era o segundo mais prevalente (pouco mais de 30% dos casos), e era quase insignificante a participação dos sorogrupos Y e W-135. Durante a última década, vimos uma grande redução do número de casos pelo B, uma crescente participação do C, sendo este sorogrupo o mais prevalente em São Paulo desde 2003. Ocorreu também, neste período, aumento dos casos pelos sorogrupos Y e W-135, sendo que atualmente os dois juntos são responsáveis por 8% dos casos no Estado de São Paulo. Esse dinamismo epidemiológico tornou especialmente importante o desenvolvimento de vacinas multivalentes que pudessem ampliar a cobertura, contemplando número maior de sorogrupos. A DM acomete pessoas de todas as idades, porém aproximadamente 50% dos casos ocorrem em crianças < 5 anos. Apesar de lactentes e crianças pequenas serem a faixa etária de maior risco e o pico de incidência ser em menores de 1 ano de idade, em diversos países ocorre um segundo pico mais tarde em adolescentes e jovens entre 15 e 19 anos. Isto não é verificado na maioria dos países da América Latina, incluindo o Brasil. Porém, quando analisamos os surtos da doença, vemos que adolescentes e adultos jovens são particularmente mais vulneráveis, provavelmente por características comportamentais próprias desta faixa etária. Como exemplo: frequência a bares, danceterias, eventos superlotados, beijo, fumo, compartilhamento de copo, etc... Vacinas A vacina conjugada contra o meningococo C introduzida inicialmente em programas de vacinação do Reino Unido e de vários países da Europa, passou a fazer parte da rotina do nosso Programa Nacional de Imunizações (PNI) no segundo semestre de 2010 para crianças até 2 anos de idade.
A avaliação da efetividade da vacinação após alguns anos de uso, se por um lado revelou enorme redução na incidência de DM pelo sorogrupo C, mostrou, também, alguns dados surpreendentes em relação à persistência de títulos de anticorpos protetores (anticorpos bactericidas séricos 4 com complemento humano ou 8 quando se utiliza complemento de coelho hsba e rsba, respectivamente). De fato: no Reino Unido, das crianças vacinadas entre 2 meses e 6 anos de idade apenas 25% mantinham títulos protetores 6-7 anos após a última dose. Por outro lado, 79% e 88% das vacinadas entre 6 e 9 anos e 10-15 anos, respectivamente, conservavam títulos protetores cerca de 5 anos após a imunização. É possível que entre nós, pela continuada circulação de meningococos na população, a queda não seja em percentuais tão elevados. Entretanto, individualmente não é possível garantias quanto a isso. Por que, apesar dessa rápida queda nos títulos de anticorpos protetores, a DM pelo sorogrupo C continua controlada nos países que introduziram a vacina desde o início da década passada? É muito provável que o sucesso se deva à herd immunity (proteção coletiva ou de rebanho) conseguida nesses países, que vacinaram não só crianças pequenas, mas também adolescentes (e às vezes, adultos jovens), faixas etárias que apresentam taxas elevadas de estado de portador de meningococos em orofaringe. Como esse fenômeno provavelmente só será verificado no Brasil (que vacina apenas crianças até 2 anos de idade em seu programa público rotineiro) dentro de vários anos, parece evidente, para segura proteção individual, a necessidade de administração de reforço, quando possível. Assim, para manter adequada a proteção individual, levando em conta os recentes dados e discussões publicadas na literatura (nesse sentido, ver, especialmente, as referências bibliográficas 3, 5, 7 e 8) a CEDIPI apresenta as seguintes recomendações: a) Para as crianças que receberam a vacina meningocócica C conjugada (MCC) nos primeiros dois anos de vida (independentemente do número de doses): uma dose de reforço a partir dos seis anos de idade.
b) Para as crianças vacinadas entre dois e cinco anos com vacina MCC: uma dose adicional de vacina conjugada, cinco anos depois da última dose. c) Para as crianças vacinadas entre 6 e 10 anos de idade: uma dose de reforço cinco anos depois da última dose, de preferência com a vacina quadrivalente conjugada. A dose de reforço na adolescência já é preconizada nos calendários vacinais da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e da Associação Brasileira de Imunizações (SBIm). A vacina quadrivalente Embora não disponível no Brasil, há muitos anos utilizava-se vacina polissacarídica contra os meningococos A, C, Y, W135 na América do Norte e Europa. Um dos estudos que permitiram o licenciamento de vacina quadrivalente conjugada (MCV4), comparando-a com a polissacarídica, mostrou que além de bem tolerada (eventos adversos locais e sistêmicos leves), os títulos médios geométricos de anticorpos bactericidas foram significantemente mais elevados (p < 0,05) com a vacina conjugada, em comparação com a polissacarídica, para os quatro sorogrupos, um mês após a imunização. A porcentagem de vacinados com títulos protetores (hsba 4) foi significantemente mais elevada para os sorogrupos A, C e Y e não inferior para o sorogrupo W135 nos que receberam a vacina conjugada. Nos Estados Unidos a vacina quadrivalente do laboratório Novartis (Menveo ) foi licenciada pelo FDA (Food and Drug Administration) para ser utilizada a partir de dois anos de idade. O laboratório Novartis já solicitou à ANVISA o licenciamento da vacina para uso a partir dos dois anos aqui no Brasil.
BIBLIOGRAFIA 1. Associação Brasileira de Imunizações (SBIm). Calendários de vacinação da criança e do adolescente SBIm. www.sbim.org.br 2. Centers for Disease Control and Prevention (CDC) Recommended immunization schedules for persons aged 0 through 18 years United States, 2011. MMWR 2011; 60: 1-4. 3. Centers for Disease Control and Prevention (CDC). Updated recommendations for use of meningococcal conjugate vaccines Advisory Committee on Immunization Practices (ACIP) 2010. MMWR 2011; 60: 72-6. 4. Jackson LA, Jacobson RM, Reisinger KS et al. A randomized trial to determine the tolerability and immunogenicity of a quadrivalente meningococcal glycoconjugate vaccine in healthy adolescents. Pediatr Infect Dis J 2009; 28: 86-91. 5. Khatami A, Peters A, Robinson H et al. Maintenance of immune response throughout childhood following serogroup C meningococcal conjugate vaccination in early childhood. Clin Vaccin Imunnol 2011; 18: 2038-42. 6. Poland GA. Prevention of meningococcal disease. Current use of polysaccharide and conjugate vaccines. CID 2010; 50: 45-53. 7. Sáfadi MA, Berezin E, Oselka G. Análise crítica das recomendações do uso das vacinas meningocócicas conjugadas de acordo com a atual situação epidemiológica no Brasil. J Ped (Rio) 2012; no prelo. 8. Snape MD, Kelly DF, Lewis S et al. Serogroup C meningococcal disease in adolescents in the United Kingdom: observational study. BMJ 2008; 336: 1487-94. 9. World Health Organization (WHO). Meningococcal vaccines: WHO position paper, November 2011. Weekly Epidemiol Rec 2011; 86: 521-40.
Sugestões da CEDIPI para revacinação com vacina meningocócica conjugada 1. Para as crianças que receberam a vacina meningocócica C conjugada (MCC) nos primeiros dois anos de vida (independentemente do número de doses): uma dose de reforço a partir dos seis anos de idade. 2. Para as crianças vacinadas entre dois e cinco anos com vacina MCC: uma dose adicional de vacina conjugada, cinco anos depois da última dose. 3. Para as crianças vacinadas entre seis e dez anos de idade: uma dose de reforço cinco anos depois da última dose, de preferência com a vacina quadrivalente conjugada (MCV4).