DA FONOLOGIA ESTRUTURAL AOS MODELOS NÃO-LINEARES Nataniel dos Santos Gomes (UFRJ/UNAM/CiFEFiL) INTRODUÇÃO. (1.) Estruturalismo

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Transcrição:

DA FONOLOGIA ESTRUTURAL AOS MODELOS NÃO-LINEARES Nataniel dos Santos Gomes (UFRJ/UNAM/CiFEFiL) INTRODUÇÃO O objetivo de nosso trabalho é de dar um apanhado da fonologia, para tal ele está dividido em 3 partes principais: estruturalismo, fonologia gerativa e pós-gerativismo. Por questões de espaço nosso trabalho está muito resumido, algumas abordagens certamente que foram superficiais, mas tentamos contextualizar os exemplos com a língua portuguesa. (1.) Estruturalismo O Estruturalismo foi um movimento europeu que permeou as ciências humanas, surgindo na França durante a década de 1950. Para o estruturalista a linguagem desempenha uma função chave. O estruturalismo tem suas raízes na lingüística de Ferdinand de Saussure. A Lingüística Estruturalista e Descritiva tem início do século XX quando Ferdinand de Saussure produziu uma verdadeira revolução na lingüística teórica com a publicação de sua obra póstuma por seus alunos, Curso de lingüística geral. Para Saussure, a linguagem é estruturada em um completo sistema de sinais: a língua, que, através da fala, faz-se presente em cada uma das realizações das pessoas. Com Saussure foi fundamentada a fonologia, desenvolvida posteriormente. De acordo com a Enciclopédia Encarta 2000: Na mesma época, nos Estados Unidos, foram analisados e isolados os fundamentos das línguas indígenas e do inglês. O trabalho foi iniciado por Franz Boas e Edward Sapir, que organizaram estes fundamentos estabelecendo hierarquias e dependências. Graças aos princípios do Círculo de Praga, conhecido por Sapir, foram descobertas as unidades mínimas de significação, os fonemas. Assim, Boas e Sapir construíram o método de comutação que as identificaria. (2) Fonêmica Norte-Americana Segundo Câmara Jr. (1986:167), a maior contribuição para a lingüística norte-americana foi a partir dos estudos das línguas indígenas. Este estudo estava inicialmente ligado à antropologia, tanto que o

antropólogo Franz Boas, teve grande importância na descrição das línguas indígenas americanas. Boas, de origem alemã, não tivera treinamento prévio em lingüística e estava completamente liberto de idéias preconcebidas sobre a linguagem com base na lingüística indo-européia. A influência de Boas foi decisiva para que Edward Sapir se interessasse pelas línguas indígenas norte-americanas. Sapir via a linguagem como uma forma auto-suficiente que fornece ao pensamento e cultura seus canais expressivos adaptando ambos a ela. Foi a partir deste pressuposto que ele procurou chegar a um padrão intrínseco para os sons vocais. Na década de 30 surgem as teorias de Bloomfield, bem diferentes das propostas de Sapir, que focalizou a base psicológica dos fenômenos lingüísticos, embora não estive satisfeito com correntes clássicas da psicologia. Em 1933, Bloomfield desenvolveu o conceito de fonema como um feixe de traços distintivos dentro do complexo do som vocal de modo semelhante ao conceito de Jakobson e Trubetzkoy. Ele deu base para a fonêmica, a réplica da fonologia de Trubetzkoy. A Fonêmica foi o termo encontrado pela Escola de Lingüística Norte-Americana para estudar apenas o fonema, sem se preocupar com a realidade física integral do som da fala. (1.2) Fonologia de Praga O lingüista Trubetzkoy foi forçado a deixar a Rússia depois da Revolução Comunista de 1917, estabelecendo-se na Áustria, lecionando em Viena e em Praga. Em Praga criou com alguns lingüistas russos um Círculo Lingüístico. A aparição do grupo se deu na Europa em 1928, durante o Primeiro Congresso Internacional de Lingüistas. Durante o congresso, eles propuseram a criação de dois estudos distintos: a fonética, como ciência natural, e a fonologia, como uma parte lingüística que trata da significação dos traços fonéticos em uma língua. A preocupação principal deles era em estender à parte sonora da linguagem as idéias de Saussure, mantendo a dicotomia língua-fala e estabelecendo o fonema como uma unidade mínima operacional e suas variações fonéticas. Para eles, o fonema é um feixe de traços distintivos, e cada traço compõe o feixe operando em oposição a um outro traço componente de outro fonema. A noção de sistema leva a classificar as oposições dos vários

domínios de dimensão fonológica de uma língua, tanto no eixo sintagmático quanto no eixo paradigmático. DIFERENÇAS NAS ESCOLAS A principal diferença entre os foneticistas americanos e a escola de Praga é que estes últimos aceitavam os conceitos de neutralização e arquifonema, que não eram discutidos por Bloomfield. Ele não considerava a fonética como uma ciência verdadeira. Isso levou a fonêmica americana a enfatizar cada vez cada vez mais o que se chamou de distribuição de fonemas, ao invés de definir um fonema através de seus traços fonéticos. Através da distribuição, a neutralização podia ser evitada, restringindo o fonema às posições parciais nas quais a sua posição não é neutralizada. Os estudiosos americanos preferiram a superposição ou o desbordamento, quando não ocorria o contraste entre dois fonemas. (1.3) Aplicação Para Câmara Jr. (1977), as consoantes da língua portuguesa, podem ser classificadas segundo a oposição oral / nasal, oclusiva / fricativa e articulação labial, ântero-lingual e póstero-lingual. As oposições /p/ : /b/ ou /v/ : /f/ são oposições privativas de um termo que foi marcado pela presença do traço de sonoridade e sua ausência. No caso /m/ : /b/ a oposição também é privativa de um termo marcado pelo traço de nasalidade e pela ausência. A oposição /p/ : /b/ é privativa e bilateral, afinal são estes os únicos fonemas do português do português que recebem a classificação de oclusivas bilaterais orais. Estas são apenas algumas das oposições entre as consoantes, não poderemos citar todas por questão de espaço. No sistema de vogais do português brasileiro (/i/, /e/, /E/, /u/, /o/, / /, /a/) encontramos uma série de oposições graduais, já que já três graus de abertura, com propriedades distintivas. Os graus de abertura vocálica só se opõem plenamente em posição tônica. Em sílaba átona final, no dialeto carioca, só ocorrem [i], [i] e [α] e na pretônica [i], [e], [u], [o], [α]. Ocorre ainda uma neutralização da distinção de grau de abertura nas vogais e a unidade resultante é denominada arquifonema. Esses procedimentos de análise são aplicados aos elementos segmentais e aos supra-segmentais em seus aspectos constrativos.

FONOLOGIA GERATIVA (2.1) Críticas ao Estruturalismo Se a condição de não-debordamento era a tradução do ideal da fonêmica estruturalista norte-americana, tornando a relação entre a representação fonética e a fonêmica recuperável, a partir dos sons circunvizinhos para a distribuição da alofonia, sem qualquer apelo a informações de natureza morfológica ou sintática, os gerativistas se opuseram exatamente a esta determinação local e invariável. A condição de linearidade, para o estruturalista, dizia que uma seqüência dos fonemas na representação fonêmica deveria ser a mesma da dos fones na representação fonética. O estruralismo privilegiava uma descrição por elemento e arranjo, excluindo qualquer tipo de regra que não fosse a expressão não-formalizada da distribuição complementar. Com tudo isso, podemos fazer um breve resumo do modelo estruturalista ao afirmar que o fonema era a unidade mínima de análise, por isso tinha dificuldade em expressar generalizações, deixando de explicar o fato de que as regras fonológicas se aplicam a classes de sons e não somente a sons individuais. Segundo Callou e Leite (1995:58): O argumento principal apresentado pelos precursores da fonologia gerativa em favor dessas modificações é que as condições de bi-univocidade, determinação local, invariância e linearidade, levavam à atomização dos fenômenos fonológicos, mascarando as generalizações depreensíveis de um sistema lingüístico, generalizações que seriam psicologicamente válidas e representativas da gramática internalizada pelo falante da língua. (2.2) Pressupostos de Análise Gerativa Em 1952, foi publicado Prelimaries to Speech Analysis, de Jakonson, Fant e Halle, neste livro eles fizeram a primeira formalização de um modelo de traços distintivos, onde o fonema já possuía um caráter abstrato. Em 1965, Chomsky publica Aspects of the Theory of Sintax, livro que trata o componente fonológico apenas como parte integrante de todo o mecanismo lingüístico, atribuindo uma interpretação fonética à descrição sintática, foco da análise lingüística. A partir daí surgem as noções de competência / desempenho e recursividade. O gerativismo para estudar a linguagem humana tem uma proposta mentalista e uma outra inatista, e postula que o falante tem um

conhecimento internalizado de sua língua, que é permitido recorrer para auxiliá-lo em seu desempenho lingüístico. O seu objetivo é descrever os princípios universais que regulam os sistemas sonoros numa tentativa de entender os mecanismos que guiam a chamada Gramática Universal, propondo um sistema revisado de traços distintivos, que distinguindo suas funções fonéticas e fonológicas. Existem restrições seqüências que formalizarão os processos fonológicos, permitindo que hajam generalizações a partir da relação entre a representação fonológicas e a produção fonética. Na fonologia gerativa tem-se o traço como unidade mínima, com a representação dos segmentos constituída de um feixe de traços. As propriedades dos traços são definidas com base em duas características exigidas para a configuração do trato vocal na ocasião da produção dos sons da fala: posição neutra e vozeamento espontâneo. Chomsky e Halle tentaram juntar as propriedades articulatórias e acústicas quando elaboraram um conjunto de traços com uma feição fonética, representando as capacidades de produção da fala do aparato vocal humano e outra fonológica, identificando os itens lexicais das línguas e as diferenças entre si. (2.3) Aplicação Gostaríamos de transcrever um exemplo de Callou e Leite (1995:58) que ilustra bem como a fonologia gerativa trabalha: Na gramática tradicional a formação do plural é descrita independentemente da fonologia e as raízes e radicais dos substantivos e adjetivos têm de ser divididos em classes a fim de que se possam acrescentar os morfemas s e es. Caso bem complexo é do plural dos nomes terminados em ão. Muitas vezes o que se faz é listar palavra por palavra, explicando-se a idiossincrasia de cada raiz. O modelo gerativo recorre às alternativa em formas como leão leões leonino, capitão capitães capitanear, mão mãos manual para estabelecer representações subjacentes leon+e(+s), kapitan+e(+s), man+o(+s), a partir das quais, através de regras ordenadas, se chegará às saídas fonéticas adequadas, conforme se pode ver nas derivações abaixo: leon+e leon+e+s kapitan+e kapitan+e+s leon -- kapitan -- 1. Apócope do e leõn leõnes kápitan kapitãnes 2. Nasalização leõ leões kapitã kapitães 3.queda do n leã -- -- -- 4.Desarrendondamento do õ leãw -- kapitãw -- 5. Inserção de w

-- leõis kapitãis 6. Neutralização das vogais átonas -- leõys -- kapitãys 7. Assilabação do i leãw) leõy)s kapitãw) kapitãy) 8. Assimilação da nasalidade leõy)s -- kapitãy)s& 9. Palatização do s leα)w) -- kapitα)w) kapitα)y)s& 10. Alçamento da vogal nasal A regra 10 é específica do dialeto carioca e não figurará na gramática de outros dialetos que não palatizam. Esse tipo de descrição torna possível a simplificação de regras de formação de plural. As formulações são independentemente motivadas, não restringindo o processo à formação de plural, sendo necessárias para adaptar as generalizações de outros processos da língua portuguesa. É importante notar que além de extrinsecamente ordenadas, as regras são aplicadas em ciclos, obedecendo a fronteiras morfológicas e sintáticas. O gerativista usa a expressão representação subjacente por negarem a existência de um nível operacional do tipo que fica explícito na desgnição transcrição fonêmica, por implicar na observância das condições de bi-univocidade, linearidade, determinação local e invariância. Para eles, o traço é a unidade mínima que tem uma realidade psicológica e um valor operacional, não o feixe de traços, como concebido pelo Círculo de Praga. (3.) Pós-Gerativismo (3.1) Modelos Naturais A fonologia gerativa natural surgiu a partir das críticas às representações fonológicas, estabelecendo como representação subjacente uma forma igual à forma fonética. As regras fonológicas passam a ser generalizações verdadeiras sobre a boa formação da estrutura fonética de superfície e podem ser de dois tipos. Há regras e processos que são motivados foneticamente e que em sua formulação contêm apenas informação fonética, como os segmentos fonéticos, as fronteira silábica etc; essas regras são vivas, produtivas e sem exceção. Por exemplo, no dialeto carioca temos palatização do t diante do i no dialeto carioca. Porém, as regras que explica a alternâncias do tipo leão leões leonino, não são produtivas e essas correspondências de forma e sentido não devem expressar pelo mesmo tipo de formalização que as regras fonológicas

produtivas, pois exprimem não mais generalizações fonéticas, mas sim léxico-semânticas. A segunda generalização é apreendida através de pararegras e admitem exceção e traços morfológicos e lexicais em sua formulação, sendo processos distintos das regras fonológicas naturais. Distingui-se formalmente regras fonológicas das regras morfológicas. Em resumo, a fonologia gerativa natural procura estabelecer os princípios e condições gerais que regem essas duas de formalizações. A chamada fonologia natural também parte de uma crítica à teoria gerativa, aproximando-se bastante da fonologia gerativa natural. O ponto central é a naturalidade dos processos fonológicos. Para Stampe, a faculdade fonética inata aos homens pode ser representada por meio de dois processos gerais: 1) processos sintagmáticos, que são devidos à contigüidade dos segmentos e que têm uma motivação assimilatória e 2) processos paradigmáticos, que maximizam as propriedades acústicas ou assimilatórias de um segmento. Callou & Leite afirmam que (1995:85): Para Stampe a aprendizagem dos processos fonológicos não é uma aquisição, mas sim o cancelamento de possibilidades universais que não se verificam em uma dada língua. A finalidade da fonologia seria determinar os processos naturais dos quais o homem é dotado. (3.1) Modelos Não-Lineares A Fonologia Autossegmental permite a segmentação independente de partes dos sons da fala. Ela entendeu que não há uma relação de umpara-um entre o segmento e o conjunto de traços que o caracteriza. a) os traços podem estender-se além ou aquém de um segmento; b) o apagamento de um segmento não implica necessariamente o desaparecimento de todos os traços que o compõem. Goldsmith observou que em muitas línguas tonais o apagamento de um segmento não implicava o desaparecimento do tom que recaía sobre ele, mas que esse tom podia espraiar-se para outra unidade fonológica. A Fonologia Autossegmental passou a defender que o segmento apresenta uma estrutura interna, isto é, que existe uma hierarquização entre os traços que compõem determinado segmento da língua. Ao reconhecer uma hierarquia entre os traços, passou-se a analisar os segmentos em camadas, ou seja, pôde dividir partes do som e tomá-las independentemente. A Fonologia Autossegmental caracteriza-se por tratar os traços fonológicos como unidades cujo domínio pode ser maior ou menor que um

segmento e cuja representação, refletindo a organização hierárquica, deve ser feita em diferentes camadas, dispostos em diferentes planos. A geometria de traços fonológicos adotada por Clements (1985, 1991) diz que os traços que constituem os segmentos que estão no mesmo morfema são adjacentes e formam uma representação tridimensional que permite distingui-los. A Geometria de Traços tem como objetivo representar a hierarquia existente entre os traços fonológicos e o fato de que os traços podem ser tanto manipulados isoladamente como em conjuntos isolados. Nesta representação, os segmentos são representados com uma organização interna a qual se mostra através de configurações de nós hierarquicamente ordenados, em que os nós terminais são traços fonológicos e os nós intermediários, classes de traços. O princípio que rege a Geometria de Traços é que somente conjuntos de traços que tenham um nó de classe em comum podem funcionar juntos em regras fonológicas. A estrutura arbórea possibilita expressar a naturalidade dos processos fonológicos que ocorrem nas línguas do mundo, atendendo ao princípio de que as regras fonológicas constituem uma única operação, seja de desligamento de uma linha de associação ou de espraiamento de um traço. Conseqüentemente, a estrutura apresenta, sob o mesmo nó de classe, traços que funcionam solidariamente em processos fonológicos. Portanto, os nós têm razão de existir quando há comprovação de que os traços que estão sob o domínio funcionam como uma unidade em regras fonológicas. Na fonologia Auto-Segmental, os segmentos deixaram de ser entendidos como conjuntos desordenados de traços, e passam a ser hierarquizados. Sendo estes traços dispostos em camadas tiers ligados por uma linha de associação. A partir da nova formalização, é possível distinguir três tipos de segmentos: a) segmentos simples quando se apresenta apenas um nó de raiz e é caracterizado por, no máximo, um traço de articulação oral. b) Segmentos complexos é quando um nó de raiz é caracterizado por, no mínimo, dois traços diferentes de articulação oral, ou seja, quando o segmento apresenta duas ou mais constrições no trato oral. c) Segmentos de contorno é quando contém seqüências de diferentes traços. Na Fonologia Auto-Segmental há princípios que delimitam a aplicação de regras, tais limites decorrem, pelo menos em parte, das propriedades estruturais das representações. 1 O Princípio do Não-Cruzamento de linhas de Associação.

Este princípio proíbe a associação de dois elementos de um tier a outro tier através do cruzamento. 2 O Princípio do Contorno Obrigatório. O princípio define que elementos adjacentes idênticos são proibidos. 3 O Princípio de Restrição de Ligação. Restringe a aplicação de uma regra à forma que nela é representada, de modo que, se contiver uma só linha de associação, fica bloqueada em contextos de ligação dupla ou vice-versa. CONCLUSÃO Podemos concluir que o trabalho da fonologia se encontra em franco crescimento, desde do Estruturalismo, e cada vez mais profundo em suas análises. Muita coisa boa ainda estar por vir. BIBLIOGRAFIA BISOL, Leda. Introdução aos estudos de fonologia do português brasileiro. EDIPUCRS, 1996. CALLOU, Dinah e LEITE, Yonne. Iniciação à fonética e à fonologia. 5 ed. Rio de Janeiro : Jorge Zahar, 1995. CÂMARA Jr., Joaquim Mattoso. Para o estudo da fonêmica portuguesa. 2 ed. Rio de Janeiro : Padrão, 1977.. História da lingüística. 4 ed. Petrópolis : Vozes, 1986. CATFORD, J.C. A practical introduction to phonetics. Oxford: Carendon Press, 1988. CHOMSKY, Noam. The sound pattern of English. New York : Holt, Rinehart and Winston, 1968. ELSON, Benjamin & PICKETT, Welma. Introdução à morfologia e à sintaxe. Petrópolis : Vozes, 1973. HYMAN, Larry. Phonology: theory and analysis. New York : Holt, Rinehart and Winston, 1975. ISTRE, Giles Lother. Fonologia transformacional e natural: uma introdução crítica. Santa Catarina : UFSC. LASS, Roger. Phonology: na introduction to basic concepts. Cambridge : Cambridge Univ. Press, 1984. MATTHEES, P. H. Morphology Cambridge : Cambridge Univ. Press, 1974. WETZELS, Leo. Estudos fonológicos das línguas indígenas brasileiras. Rio de Janeiro : UFRJ, 1995.