Estaquia e qualidade de mudas de cariru. Daniel Felipe de Oliveira Gentil 1 ; Reginaldo Thuler Torres 2 1 Universidade Federal do Amazonas Faculdade de Ciências Agrárias, Av. Gal. Rodrigo O. J. Ramos, 3000, 69077-000, Manaus, AM, dfgentil@ufam.edu.br; 2 thulertorres@yahoo.com.br. RESUMO O cariru é uma hortaliça tradicional de ocorrência na Amazônia, usualmente propagada por estaquia. O presente trabalho foi realizado com o objetivo de verificar a influência do tipo e do tamanho das estacas na qualidade das mudas produzidas dessa espécie. O experimento foi instalado no delineamento inteiramente casualizado, em esquema fatorial 2 x 2 (dois tipos de estacas, conforme a posição no ramo: apicais e basais; e dois tamanhos de estacas: 12 cm e 15 cm), com cinco repetições de 10 estacas cada. As estacas foram plantadas em substrato Plantmax e avaliadas, aos 20 dias, quanto ao número de estacas brotadas, de estacas enraizadas, de estacas mortas e de brotações por estaca brotada, além da determinação da massa seca das brotações e das raízes por estaca. Os resultados indicaram que o cariru deve ser propagado por estacas apicais de 12 cm e 15 cm de comprimento, visando à obtenção de mudas de melhor qualidade. Palavras-chave: Talinum triangulare, hortaliças não convencionais, hortaliças herbáceas, propagação vegetativa. ABSTRACT Cutting and seedling quality of the Talinum triangulare. Talinum triangulare is a traditional vegetable of occurrence in the Amazonian Region, usually propagated by cuttings. The objective of this work was to evaluate the influence of cutting types and sizes in the seedlings quality. The experimental design was completely randomized in a 2 x 2 factorial scheme (two cutting types, according to position in the stem: terminal and basal; and two cutting sizes: 12 cm and 15 cm), with five replicates of 10 cuttings each. The cuttings were planted in Plantmax substrate and observed after 20 days as much the number of branched cuttings, rooted cuttings, died cuttings and shoots per branched cuttings, besides resolution of dried mass of shoots and roots per cuttings. The results indicated that the Talinum triangulare should be propagated by terminal position cuttings and 12 cm and 15 cm of length cuttings. Keywords: non conventional vegetables, herbaceous vegetables, vegetative propagation. INTRODUÇÃO A família Portulacaceae compreende 19 gêneros de distribuição predominantemente tropical e subtropical (Joly, 1998). Dentre as espécies que essa família apresenta, encontra-se Talinum triangulare (Jacq.) Willd., conhecida popularmente como cariru, caruru, caruru-do-pará, joão-gomes, maria-gorda, ervagorda, beldroega-graúda, lustrosa-grande, língua-de-vaca, alhures, manjongome e major-gomes (Pimentel, 1985; Khatounian, 1994; Kissmann & Groth, 2000). Talinum Hortic. bras., v. 30, n. 2, (Suplemento - CD Rom), julho 2012 S 3806
triangulare (Talinum nome nativo no Senegal; triangulare por ser o eixo da inflorescência trígono) tem como sinonímias botânicas: Portulaca triangularis Jacq. (Kissmann & Groth, 2000), P. racemosa L., Talinum crassifolium (Jacq.) Willd. e T. mucronatum Kunth. (Lorenzi, 2000). Existem controvérsias em relação ao local de origem da espécie. Segundo Kissmann & Groth (2000) e Lorenzi (2000), é originária da América tropical, embora Cardoso (1997) indique a África tropical como a região de origem. Hoje, é vastamente distribuída pelo mundo (Pimentel, 1985; Kissmann & Groth, 2000), sendo cultivada no oeste da África (Golfo da Guiné), Ásia (Índia, Indonésia e Malásia) e América do Sul (Brasil e Peru) (Khatounian, 1994; Kissmann & Groth, 2000). Na Amazônia, conforme Cardoso (1997), encontra-se ligado às tradições culturais dos amazônidas, sendo comumente plantado em quintais e até jardins, objetivando a provisão rotineira das famílias. A demanda de cariru, na região amazônica, é atendida pela produção oriunda de pequenos agricultores que mantêm a tradição do seu cultivo. São agricultores, em grande parte, de áreas ribeirinhas do rio Amazonas, que praticam o cultivo de hortaliças em pequena escala e que têm no cariru uma fonte de renda adicional na composição da renda da família. É uma hortaliça de preços populares, o que a torna acessível às pessoas de baixa renda, que podem adquirir e consumir um produto de ótimo valor nutritivo (Cardoso, 1997). A estaquia é o método mais recomendado na propagação do cariru, não só por ser mais prático, como também por abreviar a colheita em um mês (Pimentel, 1985). Gentil & Ascuí (2008), avaliando diferentes tipos e tamanhos de estacas de cariru, verificaram que estacas de 10 cm de comprimento apresentaram desempenho inferior em relação às de 12 cm e 15 cm de comprimento, independentemente do tipo de estaca (apical ou basal). As estacas de cariru apresentam facilidade de brotamento e de enraizamento (Gentil & Ascuí, 2008), mas ainda é necessária a continuidade dos estudos visando o aperfeiçoamento do método de propagação vegetativa da espécie. Diante disso, foi realizado o presente trabalho com o objetivo de verificar a influência do tipo e do tamanho das estacas na qualidade das mudas de cariru. Hortic. bras., v. 30, n. 2, (Suplemento - CD Rom), julho 2012 S 3807
MATERIAL E MÉTODOS Os ramos de cariru foram adquiridos no Mercado Municipal Adolpho Lisboa e o experimento realizado no Setor de Olericultura da Faculdade de Ciências Agrárias da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), em Manaus, Amazonas. Na preparação das estacas, as folhas foram eliminadas e os ramos cortados em segmentos de 12 cm e 15 cm, que foram separados, conforme a sua posição no ramo, em apicais e basais. Os diferentes tipos de estacas foram caracterizados quanto ao diâmetro da porção média e ao número de gemas por estaca. A medição do diâmetro foi realizada através de paquímetro digital, com sensibilidade de 0,01 mm. As estacas foram plantadas em copos plásticos (capacidade de 500 ml), com quatro furos (4 mm de diâmetro) na parte inferior, contendo substrato comercial Plantmax Hortaliças HT, que foram mantidos em telado (40% de sombreamento). No plantio, as estacas foram enterradas no substrato até a metade de seu comprimento (Pimentel, 1985). A irrigação foi efetuada diariamente, pela manhã, sempre que necessária. Aos 20 dias do plantio, foram avaliados o número de estacas brotadas, de estacas enraizadas, de estacas mortas e de brotações por estaca brotada, além da determinação da massa seca das brotações e das raízes por estaca. Os dados de número de estacas brotadas, de estacas enraizadas e de estacas mortas foram expressos em porcentagem. A determinação da massa seca foi realizada através de secagem em estufa a 75 C por 48 horas e pesagem em balança analítica digital, com sensibilidade de 0,001 g. Os resultados foram expressos em unidade de peso (g) por estaca. O experimento foi instalado no delineamento inteiramente casualizado, em esquema fatorial 2 x 2 (dois tipos de estacas, conforme a posição no ramo: apicais e basais; e dois tamanhos de estacas: 12 cm e 15 cm), com cinco repetições de 10 estacas cada. Para a análise estatística, os dados de porcentagens de estacas brotadas, de estacas enraizadas e de estacas mortas, e de número de brotações por estaca brotada foram transformados em raiz quadrada de x; nos resultados, foram apresentados os dados originais. As médias foram comparadas pelo teste de Tukey, a 5% de probabilidade. Hortic. bras., v. 30, n. 2, (Suplemento - CD Rom), julho 2012 S 3808
RESULTADOS E DISCUSSÃO A caracterização dos tratamentos evidenciou diferenças entre os tipos e os tamanhos de estacas (Tabela 1). Em relação ao diâmetro da porção média da estaca, as estacas basais apresentaram, em média, diâmetros superiores aos observados nas estacas apicais. Quanto ao número de gemas por estaca, as estacas apicais mostraram, em média, maior número de gemas do que as estacas basais. Esses resultados estão relacionados ao estágio de desenvolvimento das partes do ramo, pois o caule se alarga e as gemas se distanciam (decorrente do aumento do comprimento dos internós), à medida que o ápice vegetativo caulinar cresce (López, 1978). A análise estatística não detectou efeito de interação significativa entre os fatores tipos e tamanhos de estacas, em nenhuma das variáveis-resposta avaliadas. Do mesmo modo, não mostrou diferença entre os níveis dos fatores estudados, em relação às porcentagens de estacas brotadas, de estacas enraizadas e de estacas mortas, além da massa seca das brotações e das raízes por estaca (Tabela 2). As porcentagens de brotamento e de enraizamento foram iguais a 100%, enquanto a porcentagem de mortalidade foi de 0%, independentemente do tipo e do tamanho das estacas usadas. Isso confirma a facilidade de brotamento e de enraizamento de estacas de cariru (Gentil & Ascuí, 2008) e reforça a recomendação de utilização da estaquia na propagação da espécie (Pimentel, 1985; Cardoso, 1997). Por outro lado, foi observada diferença estatística entre os níveis do fator tipo de estaca na variável-resposta número de brotações por estaca (Tabela 2). As estacas apicais apresentaram desempenho superior no número de brotações, decorrente do maior número de gemas contido nesse tipo de estaca (Tabela 1). Os resultados indicaram que o cariru deve ser propagado por estacas apicais de 12 cm a 15 cm de comprimento, visando à obtenção de mudas de melhor qualidade. AGRADECIMENTOS pesquisa. Os autores agradecem ao MCT/CNPq e à FAPEAM, pelo financiamento da Hortic. bras., v. 30, n. 2, (Suplemento - CD Rom), julho 2012 S 3809
REFERÊNCIAS CARDOSO MO. 1997. Cariru (Talinum triangulare (Jacq.) Willd.). In: CARDOSO MO. (coord.) Hortaliças não-convencionais da Amazônia. Brasília: Embrapa-SPI. p.39-45. GENTIL DFO; ASCUÍ ACG. 2008. Características das estacas e qualidade de mudas de cariru. In: Congresso Brasileiro de Olericultura, 48. Resumos... Maringá: ABH. p.s6337-s6342. (CD-ROM). JOLY AB. 1998. Botânica: introdução à taxonomia vegetal. 12.ed. São Paulo: Nacional. 777p. (Biblioteca Universitária, Série 3, Ciências Puras, v.4). KHATOUNIAN CA. 1994. Produção de alimentos para consumo doméstico no Paraná: caracterização e culturas alternativas. Londrina: IAPAR. 193p. KISSMANN GK; GROTH D. 2000. Plantas infestantes e nocivas. São Paulo: BASF. 726p. LÓPEZ ML. 1978. Organografia cormofítica de espermafitas. Pamplona: Ediciones Universidad de Navarra. 179p. LORENZI H. 2000. Plantas daninhas do Brasil. Nova Odessa: Instituto Plantarum. 608p. PIMENTEL AAMP. 1985. Olericultura no trópico úmido. São Paulo: Agronômica Ceres. 322p. Tabela 1. Valores médios do diâmetro da porção média e do número de gemas, conforme o tipo e o tamanho da estaca de cariru (Talinum triangulare) (average values of medium portion diameter and number of buds, according to type and size of the Talinum triangulare cuttings). Manaus, UFAM, 2008. Tratamentos 1 Diâmetro da porção média da estaca (mm) Número de gemas por estaca A12 6,97 8 A15 6,85 11 B12 8,08 7 B15 8,54 8 1 Tipos de estacas, segundo a posição no ramo: apicais (A) e basais (B); tamanho das estacas: 12 cm e 15 cm (cutting types, according to position in the stem: terminal (A) and basal (B); cutting sizes: 12 cm and 15 cm). Hortic. bras., v. 30, n. 2, (Suplemento - CD Rom), julho 2012 S 3810
Tabela 2. Valores médios 1 de estacas brotadas, estacas enraizadas, estacas mortas, número de brotações, massa seca das brotações e das raízes, conforme o tipo e o tamanho da estaca de cariru (Talinum triangulare) (average values of branched cuttings, rooted cuttings, died cuttings, number of shoots, dried mass of shoots and roots, according to type and size of the Talinum triangulare cuttings). Manaus, UFAM, 2008. Variáveis-resposta Tipos de estacas Tamanhos das estacas Média 12 cm 15 cm Estacas brotadas (%) Apicais 100 100 100a Basais 100 100 100a Média 100A 100A Estacas enraizadas (%) Apicais 100 100 100a Basais 100 100 100a Média 100A 100A Estacas mortas (%) Apicais 0 0 0a Basais 0 0 0a Média 0A 0A Número de brotações por estaca Massa seca das brotações por estaca (g) Massa seca das raízes por estaca (g) Apicais 6 7 7a Basais 4 4 4b Média 5A 6A Apicais 2,10 2,11 2,11a Basais 2,27 2,47 2,37a Média 2,19A 2,29A Apicais 0,22 0,25 0,24a Basais 0,31 0,31 0,31a Média 0,27A 0,28A 1 Médias seguidas de mesma letra maiúscula nas linhas e minúsculas nas colunas, para cada variável-resposta, não diferem entre si pelo teste de Tukey, a 5% de probabilidade (means followed by the same capital letter in the lines and small letter in the columns, for each variable, did not differ from each other, Tukey s test, p < 0.05). Hortic. bras., v. 30, n. 2, (Suplemento - CD Rom), julho 2012 S 3811