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Por momentos, o Pai Natal só conseguia ver papéis de embrulho amarfanhados e laços coloridos que muitos pés, grandes e pequenos, de botifarras, sapatos de tacão, de atacadores e de pala, de pantufas e mesmo descalços, ou apenas com meias, calcavam sem reparar. Estava na sua casa do Pólo Norte e seguia pela televisão a cerimónia do desembrulhar das prendas em todas as casas do mundo. Que pena que isto me dá! desabafou, enquanto uma lagriminha pequena como uma pérola de fantasia, lhe deslizava pela face vermelhusca e se lhe ia dependurar da barba comprida.

Com a mão espalmada, esmagou a lágrima importuna e disse: Ai que infeliz que eu sou! Ninguém dá prendas ao Pai Natal! Estava bem enganado. Ainda mal tinha acabado de soltar aquele queixume, quando se ouviu bater à porta: truz, truz, truz. Quem vem lá? perguntou o Pai Natal. Sou eu, Pai Natal, a Menina do Capuchinho Vermelho. O Pai Natal abriu a porta e a sua visita ofereceu lhe uma bonita capa vermelha com capucho.

Ah, ah, ah, ah! riu o Pai Natal. Onde está a graça? perguntou, com certa irritação na voz, a Menina do Capuchinho Vermelho. É que eu sou muito bem constituído respondeu o Pai Natal, que acrescentou: Pareceme que esta capa não me vai servir. Só para não desfreitear aquela menina simpática, o Pai Natal tentou embrulhar se na capa. Mas esta mal lhe tapava os ombros, e não havia maneira de conseguir enfiar o capucho.

A Menina do Capuchinho Vermelho meneou a cabeça e disse: Pois olha, não era má ideia fazeres uma dieta. Podia ser a tua resolução para o Ano Novo. Que achas? Todo comprometido, o Pai Natal ofereceu uma bebida à sua visita e dedicou se a encerar o seu trenó, enquanto saboreava uma deliciosa chávena de chocolate quente com natas receita típica do Pólo Norte.

Estava o Pai Natal a remendar o cobertor das suas renas quando se ouviu uma voz melodiosa a chamar: Pai Natal! Pai Nataaal! O Pai Natal abriu a porta e deu com uma bela menina, muito mal vestida, e com um par de sapatinhos de cristal. Pai Natal, trago te estes sapatinhos do mais fino cristal. Aceita esta prenda, que ta dou eu, a Gata Borralheira. O Pai Natal deu uma gargalhada: Ah, ah, ah, ah! E respondeu por fim, quando conseguiu controlar o riso: Querida menina, não se posso aceitar a tua prenda. Tenho um calo no dedo grande do pé. Mas deixa me experimentar.

OPaiNataldescalçou se e tentou enfiar aqueles sapatos tão delicados. Em vão. Agradeceu à Gata Borralheira e disse lhe: Mas entra, entra e toma uma bebida quente. Depois de servir uma chávena de chocolate quentinho e delicioso à Gata Borralheira (sem natas, porque ela estava de dieta), o Pai Natal sentou se junto das suas visitas e reparou que realmente tinha os pés em péssimo estado. É que a neve do Pólo Norte queima mais do que o mais gélido coração.

A Menina do Capuchinho Vermelho, prestável como sempre, sugeriu à Gata Borralheira: Queres que te dê a morada da minha costureira? Parece me que estás a precisar de um vestido novo. E, francamente, esses chinelos que trazes, nem servem para andar por casa.

Bateram de novo à porta: Truz, truz, truz. Quem vem lá? perguntou o Pai Natal. Uma voz fina chiou: Sou eu o João Ratão. Venho oferecer te um caldeirão. Pode Alto, alto, alto disse o Pai Natal. E acrescentou: Deixa me abrir te a porta. Mal entrou, o João Ratão voltou a repetir: Eu sou o João Ratão e venho oferecer te o caldeirão, para não cair na tentação.

O Pai Natal agradeceu ao João Ratão: Não posso aceitar a tua prenda. Só cozinho no micro ondas. Mas agradeço te a bonita acção. O João Ratão desandou, a murmurar: Francamente, sempre ouvi dizer que a caldeirão dado não se olha a asa. Mas o Pai Natal, que não gostava de ver ninguém aborrecido, convidou: Ó amigo João Ratão, fica mais um pouquinho. Tenho aqui queijo de rena que é uma especialidade. Queres prová lo?

Por falar em comida, o Pai Natal lembrou se de que não tinha ainda preparado o jantar das suas renas. Estavaacortaroslegumesaoscubos,enquantoosseustrêsvisitantes conversavam amenamente sentados à volta da lareira, quando viu um nariz comprido colado ao vidro da janela da sua cozinha. Toc, toc, toc bateu o nariz no vidro. O Pai Natal abriu a janela, cumprimentou a senhora idosa, de cabelo desgrenhado e roupas pretas e perguntou:

Quer entrar, minha senhora? Numa voz mais doce do que dez chupa chupas, a velha senhora disse: Trago lhe aqui umas prendas da minha casinha de chocolate. Ih, ih ih, ih Espero que goste. O Pai Natal convidou a amável velhinha a entrar e agradeceu lhe muito a prenda; mas infelizmente, não podia aceitar, estava proibido pelo médico de comer doçarias. Mas não faz mal consolou aopainatal. Voltando se para as suas visitas, disse: Talvez estes meus convidados apreciem chocolates e rebuçados e chupa chupas de trinta centímetros.

Era essa a prenda da Senhora da Casinha de Chocolate. Chamo me Bruxa, ó Natal disse a velha senhora, e sentou se à lareira com os outrosconvidados, olhando os cheia de interesse dissimulado. Voltou se para a Gata Borralheira e disse: Ó filha, estás tão magrinha! Come, come chocolates, pequena. O Pai Natal já começava a suspeitar que os seus novos convidados tinham vindo para uma ceia pós natalícia. E ele que não tinha nada na arca congeladora. Que arrelia!

Ó de casa! Ó de casa! Pai Nataaal! Estava alguém ao portão; não se conseguia ver quem era, porque a neve caía agora como pazadas de terra branca. O Pai Natal fez sinal da janela para que avançasse e foi abrir a porta. Caro amigo, trago lhe aqui um belo cacho de uvas. Estão muito madurinhas e são uma doçura! Era a Raposa, que, na pressa de oferecer a prenda ao Pai Natal, tinha agarrado no primeiro cacho que lhe viera parar às mãos. O Pai Natal, encantado por poder finalmente aceitar uma prenda, agradeceu à raposaeofereceuasuvasaosseusamigos.

A Raposa foi a primeira a servir se. Tirou do cacho uma uva redondinha e brilhante, trincou a cheia de vontade e disse: Ui, estão verdes, não prestam. Quem diria que até tive de me pôr em cima de um escadote para as colher. Risada geral. Não faz mal, querida Raposa, o que conta é a bonita intenção. disse o Pai Natal. Já se fazia tarde. O Pai Natal, que precisava de descanso da lufalufa dos últimos dias, sugeriu: Tenho todo o prazer em convidá los a todos para uma modesta ceia. Talvez mais uma chávena de chocolate quentinho e umas fatias de queijo? A Gata Borralheira perguntou com timidez: Émeio gordo? E o Pai Natal compreendeu pela reacção dos restantes amigos, que todos tinham aceite o convite.

Estavaa pôr a mesa, quando se ouvir bater à porta: Truz, truz, truz. Tão tarde já! Quem seria? Uma voz rouca e grossa respondeu: Sou eu, o Lobo Mau. O Pai Natal abriu a porta e deparou com o lobo todo molhado da neve que caía lá fora, carregando um grande saco preto. Venho oferecer te este grande saco preto. Toma, é a tua prenda de Natal. O Pai Natal não cabia em si de contente: Era mesmo do que eu estava a precisar, que o meu saco rebentou com o peso das prendas. Que ideia maravilhosa! Já posso fazer a entrega dos presentes no próximo ano.

O Lobo Mau entrou na casa do Pai Natal, depois de sacudir o seu belo pêlo, sentou se à lareira a aquecer se e olhou de soslaio para a Menina do Capuchinho Vermelho e para a Gata Borralheira. Enquanto acabava de pôr a mesa, o Pai Natal perguntou ao Lobo Mau: Querido amigo, ficas para a ceia, não é verdade? E o Lobo Mau aceitou e sussurrou à Capuchinho Vermelho e à Gata Borralheira: Pequenas, não se preocupem com o regresso a casa. Comigo, nada têm a recear!

EntretantooPaiNatalnãosefartavadeexclamarcomoeraútilaprendaqueo Lobo Mau lhe dera, e como estava satisfeito. Porém, quando reparou que a Menina do Capuchinho Vermelho, a Gata Borralheira, o João Ratão, a Bruxa e a Raposa pareciam um pouco comprometidos, acrescentou: Que prendas maravilhosas, digo eu. Todas elas. E principalmente da vossa companhia, meus amigos. Caiu lhe pela face rosada um lagriminha, que se veio dependurar, a marota, das suas barbas compridas. Mas ninguém se importou: o Pai Natal tem a lágrima fácil e o coração grande.