Cooperação de entidades públicas: limites e possibilidades. José Vicente Santos de Mendonça

Documentos relacionados
DIREITO ADMINISTRATIVO

TEMA Nº 3: AGÊNCIAS REGULADORAS NO DIREITO BRASILEIRO

Análise de Impacto Regulatório na Saúde Suplementar

PRESTAÇÃO DE CONTAS 2016 SENADO FEDERAL

CONHECENDO O INIMIGO PROF. FELIPE DALENOGARE

CADE PARCERIAS E ATUAÇÃO COORDENADA. Alexandre Barreto de Souza Presidente do Cade

REGULAÇÃO DO SETOR DE RODOVIAS

GESTÃO PLANEJAMENTO E PROPOSTAS. Alexandre Barreto de Souza Presidente do Cade

PROPOSTA DE PROGRAMAÇÃO DO X CONGRESSO BRASILEIRO DE REGULAÇÃO FLORIANÓPOLIS-SC, 27, 28 e 29 de setembro de 2017

Nova Lei do CADE: um balanço dos primeiros meses

Audiência Pública na Câmara dos Deputados Brasília, 07 de junho de 2016 Rafael A. F. Zanatta

Sumário. Proposta da Coleção Leis Especiais para Concursos TEORIA GERAL DAS AGÊNCIAS REGULADORAS E SEU REGIME DE PESSOAL

16/12/2015 UNIÃO ESTADOS DF. ADMINISTRAÇÃO DIRETA ( Centralizada ou Central ) MUNICÍPIOS ESTUDA A ESTRUTURA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA UNIÃO

Visão das Agências Reguladoras sobre o PL 6621/2016

Universalização do Saneamento: Desafios e Metas para o Setor

CARTA DOS ENGENHEIROS ELETRICISTAS NA BUSCA DA AUTORIDADE DA ENGENHARIA NACIONAL RIO DE JANEIRO

A Regulação: História e Contribuição para Construção de uma outra Concepção de Estado

ESTUDA A ESTRUTURA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

DIREITO ADMINISTRATIVO

Direito Administrativo

Segurança de Barragens: Regulação e Pontos de Atenção

Telecomunicações no Brasil Oportunidades, Avanços e Desafios para o Novo Governo

Copyright Proibida Reprodução. Prof. Éder Clementino dos Santos

Avaliação SIBRATEC - Infraestrutura das Redes de Serviços Tecnológicos

Análise de Impacto Regulatório (AIR)

Eng Flávio de Miranda Ribeiro Gerente da Divisão de Produção mais Limpa e Qualidade Laboratorial. Agosto

IMPACTO DE UMA POLÍTICA ANTICORRUPÇÃO NA REGULAÇÃO ECONÔMICA. Antônio Fonseca Subprocurador Geral da República

ESTUDO DE BENCHMARKING DE REGULAÇÃO MODELOS DE GOVERNAÇÃO I PARTE

Licenciamento ambiental ALGUMAS CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DO PROJETO DE LEI 3729/2004

A Diretiva Seveso e a Proteção Civil

A atuação da ARSESP na Regulação dos Serviços de Saneamento no estado de São Paulo

Estratégia CAIXA para Consórcios Públicos e Desenvolvimento Regional

Estratégias para a Normalização de seus Produtos. Avaliação da Conformidade Compulsória e Voluntária e Regulamentos Técnicos

MINISTÉRIO DE MINAS E ENERGIA Secretaria Executiva. Assessoria Especial em Gestão Socioambiental (AESA) FÓRUM OS DESAFIOS DA TRANSMISSÃO

Rede de Metrologia Química do Inmetro (Remeq-I)

Direito Administrativo I: Ponto 6: Atividades da Administração Pública

PONTO 1: Administração Pública PONTO 2: Administração Direta PONTO 3: Administração Indireta PONTO 4: Autarquias 1. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

SANEAMENTO BÁSICO NOVO MARCO REGULATÓRIO DO SANEAMENTO BÁSICO

Iniciativas do Estado de São Paulo na Obtenção de um Desenvolvimento Sustentável pela Adoção da P+L. Fernando Rei. Presidente

15º ENASE 2018 PERSPECTIVAS DO SETOR ELÉTRICO 2018 A 2022 A Ótica do Regulador

AOS CONSELHEIROS DO COMITÊ GESTOR DA INTERNET (CGI.BR) Prezados senhores conselheiros e senhoras conselheiras do Comitê Gestor da Internet,

EGTI Aprovada por Resolução SISP n o 7, de 22/12/2010. Apresentação para o CTIC UNIRIO 14/02/2011

Estratégia CAIXA para Consórcios Públicos e Desenvolvimento Regional

Novas Tecnologias da Genética Humana:

POLÍTICA DE REGULAÇÃO DAS EMPRESAS ELETROBRAS. Política de Regulação das Empresas Eletrobras

Impacto na Avaliação e Inclusão de Tecnologias

PAINEL 1 DESAFIOS A CONSOLIDACÃO DA ABERTURA DO MERCADO DE GÁS NATURAL NO BRASIL

DIRIGENTES QUARENTENA

POLÍTICAS PÚBLICAS DE BANDA LARGA NO BRASIL ( ): CRÍTICAS E IMPASSES

Diálogos com o Poder Judiciário sobre. Comércio Exterior. Produtos Nacionais e Importados: A Igualdade de Atuação e Fiscalização do Inmetro

Apresentação do Ombudsman de. Contato Nacional

Aula 10 AGÊNCIA REGULADORA

APRESENTAÇÃO PROGRAMA DE INSTITUIÇÕES DO SETOR INFRAESTRUTURA (PROIF) Sebastian Azumendi Especialista em Governança Pública

V Diálogos de Saneamento. A Regulação no Setor de Saneamento. A importância dos indicadores na regulação

Novo Marco Legal da Ciência, Tecnologia e Inovação EC Nº 85/15 e LEI Nº /16

Plano Nacional de Internet das Coisas Uma Estratégia para o País

COMPETÊNCIA EM MATÉRIA AMBIENTAL

Formatos institucionais das agências Agencificação no mundo e no Brasil

rede colaboração para capacitação em gestão socioambiental.

Direito de Passagem uso da faixa de domínio em rodovias pelo setor de telecomunicações

AUDITORIA DE DESEMPENHO NAS INDÚSTRIAS EXTRATIVAS

MDIC Atuação em Comércio Eletrônico Ações voltadas para a China

PLC 77/2015. Resumo Geral

Revolução tecnológica e o papel dos Conselhos de Consumidores das Distribuidoras 1

INFORMATIVO ELETRÔNICO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Nos capítulos anteriores...

Carta do Rio de Janeiro

INDICADORES E METAS ESTRATÉGICOS

Os desafios para a Melhoria da Qualidade Regulatória no País

Meios Indiretos de Cobrança de Créditos da Fazenda Pública. Fabio Munhoz Procurador Federal

Estudo da AdC sobre a Concorrência no Setor Portuário. António Ferreira Gomes 12 de novembro de 2015

INSTRUMENTOS DE GESTÃO AMBIENTAL

DNIT INFRAESTRUTURA DE TRANSPORTES NO PAÍS. Valter Casimiro Silveira - Diretor Geral do DNIT Março 2018

AUTARQUIAS RESUMO PONTO 3 ESQUEMA

Integração das redes de distribuição nas cidades

Fórum Nacional de Concessões Fiscalização e Governança - Mecanismos de Controle, Fiscalização e Gestão de Projetos

AGÊNCIA NACIONAL DE MINERAÇÃO ANM

OS DESAFIOS NO ONSHORE BRASILEIRO

3ª CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO Experiência do MPF na Defesa da Concorrência

Uma Visão dos Empreendedores Privados: O Desafio das Agências Reguladoras

Layout do título S U B T ÍTULO

Breves apontamentos sobre Contrato de Gestão: Definição:

GESTÃO PÚBLICA DO TURISMO

A CRIAÇÃO E A EVOLUÇÃO DA PESQUISA CIENTÍFICA NO INMETRO

SEMINÁRIO: " O SETOR DE SAÚDE COMO MODELO

Internet das Coisas: um plano de ação para o Brasil

ACORDOS DE LENIÊNCIA: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

ESTUDO DESCRITIVO AGÊNCIA NACIONAL DO PETRÓLEO, GÁS NATURAL E BIOCOMBUSTÍVEIS (ANP)

CAMEX Secretaria-Executiva. Reunião do Comitê Técnico de Comércio Exterior e Fiscal. 20 de Setembro de 2018 São Paulo

I Seminário Latino-Americano sobre Experiências Exitosas em Regulação Brasília 29 de Fevereiro de Objetivos do Seminário:

Regulação no setor de saneamento: a busca pela eficiência e universalização

Internet das Coisas: um plano de ação para o Brasil

ESTATÍSTICAS DE PROCESSOS ELETRÔNICOS EM TRAMITAÇÃO NA JUSTIÇA FEDERAL DE BENTO GONÇALVES, CAXIAS DO SUL E VACARIA ATÉ DEZEMBRO/2013 1

CÂMARA DOS DEPUTADOS

CONTROLE DE CONTEÚDO DNIT ANALISTA DE INFRAESTRUTURA ENGENHARIA CIVIL

Regulação responsiva e telecomunicações: problemas de adaptação no Brasil. Rafael A. F. Zanatta

NOVO MARCO LEGAL DAS TELECOMUNICAÇÕES

Regulação Independente: Desafios e Oportunidades, Uma Perspectiva Global

POLÍTICA MINERAL & NOVO MARCO REGULATÓRIO DA MINERAÇÃO

Transcrição:

Cooperação de entidades públicas: limites e possibilidades. José Vicente Santos de Mendonça

Roteiro: (i) Problemas da atuação isolada; (ii) Modelos de interação; (iii) Fatores pró-cooperação; (iv) Instrumentos de cooperação; (v) Uma lei futura? (vi) Conclusões.

(i) Problemas da atuação isolada: (a.) Viés de foco: a entidade pública só é capaz de enxergar dentro de sua especialização. Limitação epistêmica (não conhece) e limitação de atenção (não percebe). Para o martelo, todo problema é prego. (Lei do Instrumento). Ex.: Acidentes em rodovia. Velocidade da via? Sinalização? Qualidade do asfalto?

(b.) Viés de comprometimento com a missão: a entidade pública só se importa com a sua missão institucional. Ex. Fiat Justitia, pereat mundus. Ocupação de espaços para fins orçamentários e de satisfação pessoal (public choice). Como resolver o problema epistêmico e o problema de ênfase? Solução: atuação conjunta/interação.

(ii) Modelos de interação: São tipos ideais. (a.) Antagônico/agonístico: Percepção da existência de incompatibilidade essencial nas finalidades das entidades. Ex.: Por vezes, Planejamento e Fazenda. Gera custos ao particular e permite que entidades sejam presas de comportamentos estratégicos.

(b.) Cooperação pontual: Vivem vidas independentes, mas, às vezes, atuam de modo conjunto. Acordos, termos de cooperação, convênios. Exs.: Resolução Conjunta ANEEL, ANATEL e ANP para Compartilhamento de Infraestruturas (Resolução Conjunta 1/99); acordo CVM/ANP; convênios de agências reguladoras federais com agências estaduais.

(c.) Cooperação orgânica: Diálogos inter-regulatórios. Cooperação estruturada, contínua. É evolução em relação à cooperação pontual. Ex.: Solução de Litígios de Saúde no RJ. Grupos interministeriais indicam caminhos de cooperação orgânica. Consórcios públicos (autarquias plurifederativas).

(iii) Fatores que propiciam a cooperação entre entidades administrativas: (a) Fóruns de discussão coletiva: Cooperação informal/estruturar coop. formal. (b) Maturidade das questões/instituições: Tempo para vencer a tentação autárquica. (c) Pressão de atores externos: Judicialização. Pressão política e administrativa (ex., TCU recomendou que ANP firmasse acordo com INMETRO sobre conteúdo local).

(iv) Instrumentos de coordenação: (a) Horizontais: convênios (ex. termo de compromisso entre ANEEL e CADE); atos normativos conjuntos (ex. resolução conjunta ANATEL, ANEEL e ANP; diversas instruções normativas conjuntas da ANVISA). (b) Verticais: decretos ou leis que impõem cooperação, sob pena de sanção (cooperação obrigatória ex. art. 17 da lei 13.334/2016); consultas obrigatórias (ex. art. 7º da lei da ANA).

(v) Uma lei futura? PL 6621/2016 (ex-pls 52/2013). Já saiu do Senado, semana que vêm Câmara começa a discutir (já foi montada Comissão Especial). Art. 27 e seguintes: cooperação com órgãos de defesa da concorrência (competência remetida ao sistema de defesa da concorrência).

Art. 32: cooperação entre agências reguladoras: criação de comitês para orientações comuns e consultas recíprocas. (vi) Conclusões: Parte dos problemas da atuação das entidades administrativas pode ser resolvido pela cooperação. Em certos casos, é possível pensar em cooperação orgânica; cooperação pontual é aplicável nos demais. Modelo agonístico não deve prevalecer.

Deve-se estimular fóruns de discussão; em certos casos, a pressão de agentes externos pode ser útil. Instrumentos formais são importantes; horizontais são, em princípio, preferíveis a verticais; mas devem ser acompanhados de cultura de cooperação. Há dispositivos legais que impõem a cooperação como dever jurídico. Se não por isso, é exigência que se extrai do princípio da eficiência.