PROGER - PROGRAMA PARA GERENCIAMENTO DE REJEITOS EM INSTITUIÇÕES DE PESQUISA Rubemar S. Ferreira, Maria Regina Ferro Costa, Anthenor C. Ramos Jr., Irapoan Espósito; Solange dos Reis e Vaz; Elizabeth May Pontedeiro, Carlos de Almeida Gomes Supervisão de Rejeitos Radioativos/ Superintendência de Licenciamento e Controle Comissão Nacional de Energia Nuclear R. General Severiano 90, Botafogo, Rio CEP 22 294-900 ABSTRACT This article demonstrates the feasibility of a program, denominated PROGER, and aimed at the improvement of radioactive waste management activities in research institutions in Brazil. This program involves implementation, correction and updating of waste management techniques in those institutions that already possess a waste management system or its full set-up for the institutions where it is nonexistent. Parcial results are presented, concerning characteristics and quantities of wastes, and the methodology utilized by PROGER discussed INTRODUÇÃO A Gerência de Rejeitos Radioativos tem sido comumente definida como uma estratégia de administração técnica dos subprodutos radioativos. Enquanto a palavra gerência pode significar administrar, conduzir, implicando em modificações dos processos de trabalho aplicados nesses rejeitos, as palavras rejeitos radioativos remetem para a imposição de que sejam limitados aos materiais resultantes de atividades humanas, que contenham radionuclídeos em quantidades superiores aos limites de isenção [1] e para o qual a reutilização é imprópria ou não prevista, visando a minimizar ou mesmo eliminar os efeitos danosos que possam advir desses materiais, tanto no presente como em épocas futuras. A difusão da estratégia de gerência de rejeitos radioativos no Brasil, vem sendo motivada por vários parâmetros, entre eles: 1. O crescente nível do número de fontes radioativas no país e o reconhecimento dos chamados riscos decorrentes da sua má gerência. Particularmente críticos são os problemas ocasionados pelas exposições ocupacionais e ambientais, que se superpõem às conseqüências do aumento do volume de rejeitos não segregados, tanto em relação ao armazenamento impróprio quanto à possibilidade de liberação desses materiais ao meio ambiente. 2. A necessidade de uma estratégia simples e objetiva de armazenamento provisório e reciclagem, sempre que possível, dos rejeitos radioativos. 3. Uma nova ordem no estatuto social do país que, privilegiada por uma consciência ecológica mais atuante, reconhece a importância e necessidade da disposição dos resíduos radioativos como forma de cumprir condições propícias de salubridade Algumas Características do Inventário de Fontes Radioativas no Brasil Em termos de distribuição geográfica, a maior parte dos rejeitos radioativos têm origem na região Sudeste, decorrentes principalmente da maior concentração de indústrias, instituições médicas e instituições de pesquisa. A figura 1 dá uma idéia geral da distribuição de rejeitos no Brasil no ano de 1997. A relação entre a quantidade de instalações e suas atividades aparece em destaque na figura 2. Nela pode ser observado que, em termos percentuais, a industria detém o maior número de instalações, seguidas das instalações de radioterapia. As instalações de radioimunoensaio, pesquisa e medicina nuclear aparecem em ordem decrescente de quantidade.
10000 8000 6000 9160 5352 ainda, o tratamento de materiais radioativos combinados a rejeitos biológicos (carcassas), materiais patogênicos (bactérias) e líquidos de características químicas altamente poluentes (solventes orgânicos, líquidos de cintilação). MATERIAIS E MÉTODOS 4000 2000 0 SP RJ 1419 832 616 566 330 213 1262 MG BA RS PE GO DF OUTROS Figura 1 - Contribuição relativa dos estados brasileiros à quantidade total de fontes armazenadas (até dezembro de 1994). Adaptado do relatório anual SLC/CNEN INDÚSTRIA 33% 621 DISTRIBUIÇÃO 2% 45 NUMERO DE INSTALAÇÕES RADIATIVAS NO BRAZIL EDICINA NUCLEAR 11% 204 RADIOTERAPIA 9% 158 PESQUISA 20% 375 RADIOIMUNOENSAIO 24% 453 Figura 2 - Quantidade de instalações radiativas no Brasil. Adaptado do relatório anual SLC/CNEN 1996. Ao fim de 1995, fundamentado na análise de resultados da gerência de rejeitos nos últimos anos, a Superintendência de Licenciamento e Controle, através da sua Coordenação de Rejeitos Radioativos (COREJ/SLC/CNEN) iniciou e logo desenvolveu um programa visando atender a geração de rejeitos na área de pesquisa científica. Os fundamentos para a organização do programa foram : O aumento rápido e desordenado dos volumes de rejeitos radioativos combinados com rejeitos biológicos, produtos químicos e outros materiais poluentes, especialmente nas pesquisas em biociências, intensificando proporcionalmente a probabilidade de contaminação ambiental e os riscos de contaminação de trabalhadores e indivíduos do público. O grande número de laboratórios em universidades que utilizam radioisótopos na pesquisa científica. A intensificação e diversificação de técnicas com emprego de radioisótopos de meia-vida longa, que requerem maior disciplina na sua utilização, como forma de minimizar a quantidade de rejeito gerado e a qualidade deste subproduto da pesquisa científica. A diferenciação dos processos de segregação, tratamento, armazenamento e eliminação para rejeitos sólidos e líquidos, é um elemento essencial da adequada gerência de rejeitos[2], por equacionar, para cada caso, os problemas relacionados aos riscos de contaminação e, em conseqüência, os relacionados à saúde e ao meio-ambiente. Assim, enquanto a estratégia de controle de fontes radioativas da indústria convencional tem como questão prioritária aspectos voltados à irradiação de trabalhadores ocupacionalmente expostos, do público e armazenamento de fontes sólidas (seladas) de média atividade(~500 Ci), para as instituições de pesquisa, as questões prioritárias continuam sendo aquelas relacionadas à gerência de rejeitos sólidos e líquidos de meia vida extremamente longa(c-14 e H-3); problemas relacionados à detecção de emissões b de baixa energia ( H-3 e S-35) e, Dentro dessa ótica estabeleceram-se como metas, a partir do mapeamento dos principais laboratórios de pesquisa: 1. garantir, através de acompanhamento sistemático, que a coleta, segregação, acondicionamento, eliminação ou armazenamento dos rejeitos radioativos sejam realizados de forma segura. 2. Avaliar e propor, a partir da identificação dos locais que geram maior quantidade de rejeitos, bem como quanto aos radionuclídeos mais usados, modificações de ordem operacional nas metodologias e condições da gerência de rejeitos com vistas à sua melhoria. 3. Introduzir técnicas de segregação e redução de volume de rejeitos. 4. Impor medidas restritivas às instituições reincidentes em más condutas relacionadas à gerência de rejeitos. 2
5. Armazenar os rejeitos de meia-vida longa previamente segregados, contaminados por C-14 e H-3 Algumas características específicas do programa: Visa paralelamente a identificar pessoal qualificado para atuação, no âmbito dos laboratórios, departamentos e institutos, na solução dos problemas relativos à gerência dos rejeitos produzidos. Desenvolvimento de metodologias apropriadas ao tratamento, acondicionamento, eliminação ou armazenamento provisório dos rejeitos radioativos combinados a rejeitos químicos inorgânicos e biológicos, além dos procedimentos para recolhimento e descarte desses materiais no sistema de lixo urbano e rede de esgotos. Apoio na elaboração de metodologias para, no âmbito das universidades, provê-las com depósitos provisórios de rejeitos radioativos, de acordo com padrões da CNEN-NE-6.05, além dos procedimentos, testados e implementados de forma rotineira. Infra-estrutura O PROGER conta com um corpo técnico de 10 especialistas em gerência de rejeitos, alguns com experiência adquirida como participantes na resposta ao acidente radiológico de Goiânia. Conta ainda com o apoio do corpo técnico da área de rejeitos radioativos do Instituto Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN), para atender a região de São Paulo. Dispõe, com o apoio de outros departamentos da SLC/CNEN, de base de dados sobre fontes, instalações e responsáveis com autorização para pesquisa com radioisótopos[3], além de base de dados específica sobre rejeitos radioativos no Brasil. RESULTADOS E DISCUSSÃO Os importantes avanços na área de gestão ambiental nos aspectos de prevenção e despoluição, permitem apontar os efeitos relacionados à má gerência dos rejeitos gerados na pesquisa, como um dos grandes problemas a serem solucionados a curto prazo pelas entidades reguladoras e usuários de material radioativo. A mesma tendência se observa, em relação a segregação e eliminação de alguns agentes poluentes, como as substâncias radioativas presentes em materiais biológicos, as soluções cintiladoras e solventes orgânicos, e produtos químicos. Apesar das concentrações de materiais radioativos liberados ao meio ambiente serem baixas, o perigo de exposição ambiental da combinação de soluções cintiladoras + solventes orgânicos + substâncias radioativas; rejeitos biológicos + substâncias radioativas; solventes orgânicos + ácidos e outros materiais patogênicos e pirofóricos, têm despertado preocupação pela forma como são tratadas e administradas no nível das universidades, principais fomentadoras de pesquisas científicas no país[4]. O risco para o ser humano radica principalmente na sua potencialidade patogênica e carcinogênica, fora os problemas de poluição Quanto as quantidades de radioisótopos liberados ao meio ambiente, oriundos de instituições de pesquisa, não se encontram registros bem documentados no mundo [5]. O Japão, de acordo com a tabela 1, para o ano de 1989 e para uma população de 118,9 milhões de habitantes estimou uma razão de 5,2, 6,1 14 34 GBq por 10 6 hab, para C-14; I-125; H-3 e I-131 respectivamente. Tabela 1 - Fontes Não Seladas Utilizadas em Instituições de Pesquisa no Japão em 1989 Radionuclídeo Atividade (GBq) H-3 1 168 C-14 469 P-32 543 S-35 134 Ca-45 6 Cr-51 79 Fe-59 1 Ga-67 0,2 Se-75 0,1 Kr-85 14 In-111 0.07 I-123 0,07 I-125 0,5 I-131 174 Xe-133 3 Tl-201 1 Em relação aos Estados Unidos, no mesmo documento, a produção de compostos marcados com C-14 tem sido estimado em cerca de 7 a 30 TBq por 10 6 hab., o que significa aproximadamente 6 vezes o uso no Japão. Na Europa, segundo o mesmo documento, estimase a razão de 50 GBq por 10 6 hab. No Brasil, este levantamento encontra-se em fase de coleta de dados pelo PROGER. 3
As primeiras ações do PROGER priorizaram um levantamento específico das condições de gerência de rejeitos de instituições selecionadas entre as maiores usuárias de material radioativo, através do envio de questionários onde questões relevantes para o bom gerenciamento de rejeitos radioativos eram abordados, tais como: linhas de pesquisa; descrição de uso dos radionuclídeos; tipos de radionuclídeos em uso; tipos de rejeitos gerados; quantidade de rejeitos geradas; gerência de rejeitos gerados executada; tipo de armazenamento provisório executado; experiência com o uso de materiais radioativos pelo pesquisador; existência de Serviço de Radioproteção. Com o retorno de cerca de 30% dos questionários enviados, foram planejadas as condições em que seriam desenvolvidas as ações de intervenção, que na primeira instituição visitada, com 13 laboratórios de pesquisa em bioquímica, apresentou os resultados mostrados na tabela 2: Tabela 2 Resultado dos laboratórios analisados LABORATÓRIOS DE BIOQUÍMICA RADIONUCLÍDEOS EM USO TIPOS DE REJEITOS Nº 01 S-35; C-14; H-3 SR, LR Nº 02 Ca-45; C-14; S-35; SR, LR Fe-55; Fe-59; H-3; I-125; P-32 Nº 03 H-3; C-14; S-35; P- SR, LR 32 Nº 04 Cr-51; H-3 SR, LR Nº 05 P-32; Ca-45; Sr-90 SR, LR Nº 06 P-32; Ca-45; C-14; SR, LR H-3 Nº 07 H-3 SR, LR Nº 08 P-32 SR, LR Nº 09 P-32 SR, LR Nº 10 H-3; C-14; S-35; P- SR, LR 32 Nº 11 P-32; I-125; S-35 SR, LR Nº 12 P-32; Ca-45; H-3 SR, LR Nº 13 H-3; P-32 SR, LR TOTAL 13 Labs H-3; C-14; P-32; S- 35; I-125; Cr-51; Ca- 45; Fe-55; Fe-59 SR=SÓLIDO RADIOATIVO/LR=LÍQUIDO RADIOATIVO A intervenção realizada na sala de armazenamento provisório desta instituição, que apresentou após segregação e acondicionamento, os valores encontrados na tabela 3: Tabela 3 Valores dos rejeitos após a intervenção realizada na instituição CLASSIFICAÇÃO QUANTIDADE (litros)* Lixo comum 20000 Rejeito estocado 1000 Obs. Para decaimento Rejeito removido 1200 C-14; H-3 e Sr-90 * Os rejeitos foram avaliados em litros tendo em conta o número de sacos plásticos usados para acondicioná-los Devido ao gerenciamento realizado na instituição, ou a falta dele, havia uma mistura de radionuclídeos sem segregação e sem registro das atividades envolvidas, assim, o critério de segregação dos rejeitos seguiu o critério de experiência prática[6], utilizando a taxa de contagem como referência de segregação, por tratarem-se de b e g,, podendo-se observar o critério utilizado, na tabela 4. Tabela 4 Critérios utilizados na segregação de rejeitos Medida de CATEGORIA Radiação na Superfície dos rejeitos(m.r) Lixo comum M.R= radiação de fundo Rejeitos para M.R> radiação decaimento de fundo Rejeitos para estocar M.R>> radiação de fundo *200 cps = radiação de fundo em unidade arbitrária Obs. Os resultados obtidos nesta instituição apontam para a necessidade de expandir-se o PROGER para as outras, que via de regra, encontram-se nas mesmas condições. CONCLUSÃO 1) A prática com radioisótopos no mundo foi construída basicamente nos últimos 40 anos. A contribuição de C-14, dentro das fontes de origem artificial é, quando vista a curto prazo, relativamente sem importância. Entretanto, considerando que as taxas de doses estendem-se sobre um longo período de tempo, os cuidados com esse radionuclídeo em relação ao meio ambiente não devem ser negligenciados. 4
2) O PROGER possibilita o treinamento em segregação, acondicionamento, monitoração e outras ações necessárias para o correto gerenciamento de rejeitos radioativos, dos técnicos envolvidos, tanto da CNEN como das instituições de pesquisa. 3) A expansão do PROGER em âmbito nacional, é de extrema necessidade, para evitar exposições desnecessárias aos pesquisadores e público envolvidos, e na contribuição para minimização de efeitos estocásticos do ponto de vista do impacto REFERÊNCIAS [1] COMISSÃO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR Licenciamento de Instalações Radiativas, Norma CNEN-NE-6.02 (1984); [2] AGÊNCIA INTERNACIONAL DE ENERGIA ATÔMICA, Handling and Treatment of Radioactive Aqueous Waste, AIEA - TecDoc 654, Viena (1992), 21 [3] COMISSÃO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR Sistema Integrado de Informações em Instalações Radiativas, SLC/CNEN (1991); [4] CABALLERO, K. C., Proteção Radiológica em Universidades Brasileiras, Tese de Mestrado da Universidade Federal do Rio de Janeiro, COPPE/UFRJ, RJ (1993); [5] UNITED NATIONS SCIENTIFIC COMMITTEE ON THE EFFECTS OF ATOMIC RADIATION, Relatório UNSCEAR de 1993 (5), UNSCEAR, Nova York (1993) pág. 112-113 tópico 130-134; [6] AGÊNCIA INTERNACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR Standardization of Radioactive Waste Categories, Technical Reports Series No. 101 (1970), 12-14; 5