ESTUDO DAS OCLUSIVAS NA LEITURA DE INDIVÍDUOS COM DOENÇA DE PARKINSON



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Transcrição:

TEIXEIRA, E. G.; CARDOSO, F. Estudo das oclusivas na leitura de indivíduos com doença de Parkinson. ReVEL, v. 8, n. 15, 2010. [www.revel.inf.br]. ESTUDO DAS OCLUSIVAS NA LEITURA DE INDIVÍDUOS COM DOENÇA DE PARKINSON Érica Gonçalves Teixeira 1 Francisco Cardoso 2 ericagteixeira@gmail.com cardosofe@terra.com.br RESUMO: A Disartria na fala do indivíduo com a doença de Parkinson (DP,) está associada com um estreitamento do trato vocal, acarretando alterações prosódicas esperadas. O foco principal deste trabalho é descrever as características duracionais encontradas nas consoantes oclusivas produzidas por indivíduos com DP, antes e após o uso da medicação pertinente. A duração do tempo de silêncio das consoantes oclusivas foram medidas e analisadas separadamente para três grupos: grupo experimental off (GE off), grupo experimental on (GE on) e grupo controle (GC). A duração não se mantém estável entre os grupos, devido às limitações da doença. Embora o tratamento medicamentoso tenha contribuído para a ligeira diminuição na duração do silêncio das oclusivas no GE on, a diferença não foi estatisticamente significativa. PALAVRAS-CHAVE: consoantes oclusivas; doença de Parkinson. 1. INTRODUÇÃO A doença de Parkinson (DP) é caracterizada por uma enfermidade neurológica progressiva que atinge estruturas dos núcleos da base, mais especificamente da morte de células da substância negra compacta, produzindo um esgotamento seletivo de dopamina (Azevedo et al, 2001; Bear et. al, 2002; Ortiz, 2004). Como consequência, os parkinsonianos sofrem de disartria hipocinética (Azevedo et al., 2001; Ortiz, 2004; Locco, 2005) que se manifesta em todos os planos da produção da fala: respiração, fonação, articulação, nasalização e prosódia (Locco, 2005). Neste artigo, buscaremos compreender como a disartria 1 Fonoaudióloga, doutoranda em Ciências da Fala pela Universidade de Newcastle, Reino Unido. 2 Neurologista, professor e chefe do serviço de Neurologia, Ambulatório dos distúrbios do movimento Universidade Federal de Minas Gerais UFMG. ReVEL, v. 8, n. 15, 2010. ISSN 1678-8931 171

hipocinética se manifesta nos indivíduos com DP, no que tange o tempo de silêncio das consoantes oclusivas do português (/p/, /t/, /k/, /b/, /d/, /g/). 1.1 AS CONSOANTES OCLUSIVAS A maioria das línguas do mundo é produzida através de uma corrente de ar egressiva, na qual utilizamos o sistema respiratório. Durante a fala, a respiração se modifica de forma a otimizar o ar na produção dos sons da fala: as inspirações são breves enquanto a expiração é aumentada. O ar fonador é modulado na laringe, através das diferentes configurações das pregas vocais, sofrendo, em seguida, nas cavidades supra-glóticas, variações de fluxo e pressão, de acordo com os diferentes gestos articulatórios. A produção das consoantes oclusivas depende do fechamento completo em algum ponto do trato vocal através dos articuladores que, por sua vez, devem permanecer em contato total firme de modo a resistir ao acúmulo de pressão de ar atrás da oclusão. O fechamento é mantido até que a pressão seja liberada repentinamente por um tipo de movimento dos articuladores (Zemlin, 2000). Para que haja o acúmulo de ar atrás da oclusão, é preciso que o palato mole esteja na posição abaixado, impedindo o escape de ar para a cavidade nasal (Cagliari, 1978; Huffman, 1989; Ladefoged, 2001). As oclusivas se dividiram em vozeadas /b,d,g/ e não-vozeadas /p,t,k/, dependendo da vibração ou não das pregas vocais, respectivamente (Mateus et al., 2005). Acusticamente, o fechamento completo do trato vocal é visualizado no espectrograma por um momento de silêncio (com ou sem barra de vozeamento), seguido de uma barra de explosão, correspondente à liberação da pressão de ar realizada pelos articuladores e, por fim, um tempo entre a barra de explosão e o início da sonorização do som seguinte, normalmente, uma vogal. O tempo de início de sonorização (VOT, voice-onset-time), dessa forma, manifesta-se como intervalo de tempo que começa com ruído provocado pela liberação da oclusão e termina com o início da periodicidade do vozeamento (Rocca, 2003). Em um estudo sobre as oclusivas do português europeu, em indivíduos com DP, Lousada (2003) observou que as consoantes /b,d,g/ ocorrem algumas vezes como nãovozeadas. Em tais momentos, os parâmetros acústicos de duração (total, da oclusão, da vogal seguinte, da vogal precedente e da própria oclusão) assumem papel primordial na diferenciação do vozeamento. ReVEL, v. 8, n. 15, 2010. ISSN 1678-8931 172

1.2 A ARTICULAÇÃO NA FALA DO PARKINSONIANO Na disartria hipocinética encontrada na fala do parkinsoniano é possível observar que as alterações iniciam-se já na movimentação das pregas vocais, caracterizando a voz desses indivíduos, segundo Ortiz (2004) e Locco (2005), como rouco e/ou soprosa com intensidade reduzida. Essas autoras também relatam que a produção das consoantes é imprecisa e Schulz (2002) afirma que a doença afeta especialmente as consoantes oclusivas, já que estas dependem do fechamento completo em algum ponto do trato vocal, fato alterado devido à hipocinesia característica da DP. Na tentativa de melhorar não somente a musculatura responsável pela fala, mas a musculatura esquelética de uma forma geral, a principal estratégia para tratamento da doença é a administração de levodopa (Bear et al., 2002). 1.3 OBJETIVOS E HIPÓTESES O presente estudo tem como objetivo descrever os padrões encontrados na produção de consoantes oclusivas em indivíduos com DP em comparação com indivíduos da mesma idade sem doenças neurológicas, bem como relacionar os resultados em pacientes com e sem o efeito do medicamento pertinente, visando verificar o efeito da medicação na comunicação oral do Parkinsoniano. Tendo em vista a revisão da literatura científica sobre o tema aqui abordado, nossa hipótese inicial, preconiza que, sob o ponto de vista acústico, o tempo de silêncio das consoantes oclusivas do grupo experimental (GE) difere do tempo encontrado para os indivíduos do grupo controle (GC), e que esses valores tendem a se aproximar com a administração da levodopa. 2. METODOLOGIA O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), sob parecer número ETIC 182/07. ReVEL, v. 8, n. 15, 2010. ISSN 1678-8931 173

2.1 INFORMANTES Foram selecionados dois grupos para participar deste estudo. O GE foi constituído por 10 informantes com DP (conforme critério do Banco de Cérebro de Londres e que se encontravam entre os estágios 2 a 3 de Hoehn e Yahr 3 ), 5 informantes do sexo feminino de 53 a 73 anos de idade (média 68,4 anos) e 5 informantes do sexo masculino de 57 a 71 anos de idade (média 65,4 anos). O GC foi composto por 10 informantes sem alterações neurológicas, 5 informantes do sexo feminino de 54 a 70 anos de idade (média 63,4 anos) e 5 informantes do sexo masculino de 55 a 74 anos de idade (média 62,6 anos). Não foi encontrada diferença estatisticamente significativa na comparação entre as médias das idades do GE e GC quanto à idade. Todos os informantes possuem o português brasileiro como língua materna, nascidos e residentes em Belo Horizonte e região metropolitana (Contagem e Betim). O pareamento entre os grupos foi realizado por meio dos parâmetros idade e escolaridade. Os pacientes foram selecionados tendo como critérios de exclusão: intervenção cirúrgica prévia para a DP, presença de demência, histórico de gagueira, asma e tratamento fonoaudiológico. Todos os informantes passaram por avaliação audiológica, avaliação laringológica e avaliação neurológica, a fim de excluir possíveis enfermidades que pudessem interferir no material de fala. 2.2 COLETA DE DADOS Para coleta de dados foi apresentada uma passagem traduzida e adaptada para o português brasileiro (pela equipe do LabFon Laboratório de Fonética da UFMG) do banco de dados europeu EUROM1: Minha irmã tem medo do escuro. Ela nunca sai à noite sozinha. Ela tem que ter sempre alguém com ela. Meu pai fala que ela deve levar o cachorro quando sair. Pelo menos ela estaria protegida se algo a ameaçasse. 3 A Escala de Hoehn e Yahr (HY Degree of Disability Scale), desenvolvida em 1967, é rápida e prática ao indicar o estado geral do paciente (Hoehn; Yahr, 1967). Em sua forma original, a HY compreende cinco estágios de classificação para avaliar a severidade da DP e abrange, essencialmente, medidas globais de sinais e sintomas que permitem classificar o indivíduo quanto ao nível de incapacidade. Os sinais e sintomas incluem instabilidade postural, rigidez, tremor e bradicinesia (Shenkman et al., 2001). Os pacientes classificados nos estágios I, II e III apresentam incapacidade leve a moderada, enquanto os que estão nos estágios IV e V apresentam incapacidade mais grave. ReVEL, v. 8, n. 15, 2010. ISSN 1678-8931 174

As gravações foram realizadas na cabine acústica diretamente em um computador da marca Apple (Macintosh), modelo MacBook, 2GHz, 512 MB. Utilizamos o microfone interno do próprio computador, posicionado a 10 cm da boca do leitor. O GE foi submetido à gravação em dois momentos. Inicialmente, o grupo foi submetido à gravação após abstenção do uso da levodopa por um período de 12 horas (período fora do efeito da medicação - off). Posteriormente, o grupo foi submetido à gravação do mesmo corpus, porém 1 hora após a administração da levodopa (período sob o efeito da medicação - on). Já o GC foi submetido à gravação em um único momento. Dessa forma, foram analisados 3 grupos: GC, grupo experimental - off (GE off) e grupo experimental - on (GE on). 2.3 ANÁLISE DOS DADOS A análise dos dados foi realizada no Software livre Praat, produzido por Paul Boersma e David Weenink, da Universidade de Amsterdam, na versão 4.4.27. Foi medida a duração do tempo de silêncio das oclusivas quando tais consoantes encontram-se em contextos intervocálicos, sendo esta realizada manualmente com o auxílio do espectrograma e sinal de fala, como pode ser visto na figura 1. Figura 1: Sinal de fala, espectrograma e a marcação do tempo de silêncio da consoante oclusiva vozeada /d/ no textgrid ReVEL, v. 8, n. 15, 2010. ISSN 1678-8931 175

2.4 ANÁLISE ESTATÍSTICA O teste utilizado foi o teste não-paramétrico de Kruskall Wallis (Teste H), baseado na mediana. Os três grupos foram comparados simultaneamente, sendo que foi levado em consideração o fator sexo. Para os casos significativos (p<0,05), foi realizado o teste de comparações múltiplas ou comparações em pares (GE off x GE on, GC x GE off e GC x GE on) para identificar os pares de grupos que diferem. Esses testes foram realizados pelo Microsoft Excel na versão 2000 e Minitab 15. 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO A tabela 1 refere-se à mediana e valor de significância (p) na comparação dos dados do tempo de silêncio das oclusivas entre os três grupos para os informantes do sexo feminino e masculino. A tabela 2 refere-se aos valores de significância (p) na comparação em pares, para os indivíduos do sexo feminino, e a tabela 3 refere-se aos indivíduos do sexo masculino. Mediana e valor de significância (p) Sexo GC GE off GE on p Feminino 0,091 0,106 0,104 0,022 Masculino 0,076 0,093 0,083 0,091 Tabela 1: Mediana e valor de significância (p) na comparação dos dados do tempo de silêncio das oclusivas, entre os três grupos, para os informantes do sexo feminino e masculino Comparação em pares p GE off x GE on 0,290 GC x GE off 0,004 GC x GE on 0,131 Tabela 2: Valores de significância (p) na comparação em pares, para os indivíduos do sexo feminino ReVEL, v. 8, n. 15, 2010. ISSN 1678-8931 176

Comparação em pares p GE off x GE on 0,454 GC x GE off 0,036 GC x GE on 0,141 Tabela 3: Valores de significância (p) na comparação em pares, para os indivíduos do sexo masculino Pelo resultado dos testes, observou-se que o tempo de silêncio das oclusivas para o grupo feminino apresentou diferenças significativas entre os três grupos (p=0,022). Aplicando, então, o teste em pares, como pode ser observado na tabela 2, constatamos que existem diferenças significativas na duração das consoantes oclusivas entre o GE off e o GC (p=0,004). Constata-se que o GE on é similar ao GC, porém mais próximo do GE off, a ponto de tornar a diferença não mais significativa. Mesmo assim, o GE não apresentou diferenças significativas nos estados off e on, dando indícios de que a medicação influencia, mas a influência é pequena, de modo que não atinge significância estatística entre on e off. Para os indivíduos do sexo masculino, através das análises, observou-se que o grupo tendeu a apresentar resultados não significativos (p=0,091). Mesmo assim, resolvemos aplicar o teste em pares (tabela 3) e, mais uma vez, vemos que o GC se diferencia do GE no estado off (p=0,036). No estado on, essa diferença não foi significativa, indicando que não houve uma diferenciação no GE antes e depois da medicação. Esses achados eram esperados, tendo em vista que as alterações articulatórias na fala do parkinsoniano são caracterizadas como consoantes imprecisas e refletem as limitações no estreitamento do trato vocal lábios, língua e mandíbula em seus diferentes pontos de articulação para a produção dos sons da fala (Carrara-de-Angelis, 2000). A rigidez e bradicinesia, além de outros fatores, interferem na produção da fala, por outro lado os nossos achados reforçam o efeito do medicamento na fala, fazendo com que o indivíduo apresente uma melhora (redução do tempo de elocução) do parâmetro duração (Azevedo, 2007; Duez, 2005; Reis et al., 2007). A tabela 4 mostra os valores da mediana e significância (p) na comparação dos dados do tempo de silêncio das consoantes oclusivas, entre os indivíduos do sexo masculino e os indivíduos do sexo feminino. ReVEL, v. 8, n. 15, 2010. ISSN 1678-8931 177

Mediana e valor de significância (p) Sexo GC GE off GE on Feminino 0,091 0,106 0,104 Masculino 0,076 0,093 0,083 p 0,095 0,465 0,251 Tabela 4: Valores da mediana e significância (p) na comparação dos dados do tempo de silêncio das consoantes oclusivas, entre os indivíduos do sexo masculino e os indivíduos do sexo feminino Não foi possível verificar diferença estatisticamente significativa para o tempo de silêncio das consoantes oclusivas nos três grupos (p<0,05) entre os indivíduos do sexo feminino e os indivíduos do sexo masculino. 4. CONCLUSÃO Ao verificar se o tempo de silêncio das consoantes oclusivas se manteve estável nos três grupos (GC, GE off e GE on), pudemos observar que para os indivíduos do sexo feminino e para os indivíduos do sexo masculino a duração variou, sendo encontrados valores menores para o GC. Tais achados reforçam nossa ideia inicial, de que esse parâmetro não se mantém estável entre os grupos, devido às limitações no estreitamento do trato vocal. O tratamento medicamentoso, embora tenha contribuído para uma ligeira diminuição na duração do silêncio das oclusivas no GE on, essa diminuição não foi significativa. Pesquisas futuras poderão mostrar a possibilidade de maior eficácia da levodopa na produção da fala do parkinsoniano, controlando-se, para isso, seja a variável dose do medicamento, seja a variável estágio da doença, ou, ainda, outro fator que se julgar relevante. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. AZEVEDO, L. L.; CARDOSO, F.; REIS, C. Aspectos Segmentais e Prosódicos da Fala do Parkinsoniano: Observações Preliminares. Org. Mendes, Oliveira e Benn-Ibler. O Novo Milênio: Interfaces Linguísticas e Literárias. Belo Horizonte: Faculdade de Letras / UFMG, 2001. ReVEL, v. 8, n. 15, 2010. ISSN 1678-8931 178

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