Grandes Entrevistas - Djalma Fogaça "A F-TRUCK É A MINHA VIDA, É A VIDA DE MUITA GENTE. NÃO ME VEJO FAZENDO OUTRA CATEGORIA FORA A F-TRUCK" JULIANA TESSER, de Jacarepaguá D jalma Fogaça é certamente um dos nomes mais respeitados no automobilismo nacional. Nascido em Sorocaba, Djalma iniciou a carreira no tradicional caminho do kart, onde foi campeão paulista em 1982. Mirando a carreira na Europa com o sonho de chegar à F1, o piloto passou para a promissora F- Ford brasileira, categoria que contava com um grid bastante cheio em meados dos anos 80. Depois de conquistar o título brasileiro da categoria em 1988, Djalma rumou para o Velho Mundo e passou para a F-Opel, onde venceu a etapa de Ímola. Com os planos frustrados na Europa, Fogaça voltou ao Brasil onde, após uma passagem de destaque pela Stock Car, interrompida pela falta de verba, foi um dos primeiros grandes nomes a fazer parte da F-Truck, categoria criada pelo lendário Aurélio Batista Félix. Dos monopostos para o turismo, e do turismo para os brutos, o fato é que Fogaça construiu um novo ciclo em sua carreira. O sorocabano disputou a categoria durante uma década, entre 1999 e 2009 e hoje é o chefe da DF [suas iniciais] Motorsport, equipe oficial da Ford, que conta com os experientes Danilo Dirani e Pedro Gomes. Em Jacarepaguá, onde disputou a segunda etapa do Campeonato Brasileiro, Djalma conversou com a Revista WARM UP e falou sobre a receita de sucesso da F-Truck. Na visão do ex-piloto e chefe de equipe, o grande mérito da competição é de seu criador, Aurélio, e de Neusa Navarro Félix, que assumiu o comando da categoria após a morte do marido que, para Djalma, é o grande responsável pela competição gozar deste patamar atual. Fogaça também comentou sobre o atual momento do automobilismo nacional e creditou a queda no interesse pelo esporte a motor à falta de ídolos e ao espaço dado ao futebol na mídia nacional. Djalma também abordou a carreira do jovem filho, Fábio atualmente piloto da Mitsubishi no Brasileiro de Marcas, e seus planos para o futuro.
Revista WARM UP: Você sempre defendeu o envolvi- até uma corrida fora, na Argentina. É um atrativo mento das montadoras com o automobilismo. Agora, muito grande para as montadoras. Então o Marcas com o Campeonato Brasileiro de Marcas, você acha precisa chegar a essa condição. Como é uma Stock que é um envolvimento suficiente ou ainda precisa hoje também para os patrocinadores. Não é para as melhorar? montadoras, porque não tem montadora praticamente envolvida no evento, mas é um grande centro Djalma Fogaça: Eu acho que é um começo. A gente de negócios também. Então a corrida hoje é isso. Você sabe muito bem o que foi o caminho trilhado pela F- ter a competição atrelada a uma condição de negócio Truck e hoje nós temos quase todas as montadoras no evento. Então o evento tem de ser atrativo. Mas a muito fortes. E eu acho que é um começo as monta- gente sabe da competência do [Carlos] Col, da doras terem entrado com apoio das equipes no batalha dele, e por ele ter conseguido agora mais uma Marcas, e agora vai do organizador [a Vicar, a mesma marca para o Brasileiro de Marcas [Mitsubishi] e a empresa que promove e organiza a Stock Car]. É o entrada da Toyota também, oficialmente, sem dúvida trabalho do organizador, como foi o trabalho dele é um grande passo em relação ao ano passado. também levar essas montadoras para lá. Fazer um evento atrativo. As montadoras entraram aqui [na F- WUp: A F-Truck é uma das categorias mais sólidas do Truck] e estão até hoje porque aqui é um grande Brasil. Por que ela deu tão certo aqui? negócio. Na realidade, é um centro de negócios. Eu, sempre que saio em busca dos patrocínios para a DF:Muito foi pelo empenho do Aurélio. Eu acho que equipe, um dos ganchos mais fortes que eu tenho é ele é o grande desbravador de tudo isso. É uma esse. As montadoras investem muito no Fenatran, categoria que procura andar, fazendo as coisas dela que é o Salão do Automóvel do caminhão, que é de sem tentar alguma coisa com a prefeitura, com a CBA. dois em dois anos, sempre no Anhembi. Sempre no Um autódromo bem cuidado, por exemplo, isso não é mesmo lugar. Eu sempre falo que a F-Truck é uma obrigação da F-Truck fazer. Isso é obrigação da Fenatran [Feira Nacional do Transporte] ambulante. prefeitura, do Automóvel Clube, da cidade, da CBA, Cada mês em um estado, ela é a única categoria do nem tanto da CBA, mais é desse pessoal. E não existe Brasil que corre no Nordeste [em Caruaru (PE)] e faz isso. E a F-Truck vai lá e faz. E faz por quê? Porque
também tem condições hoje de fazer. Porque financeiramente a categoria é muito sólida. Então eu acho que esse foi o grande 'pulo do gato' da F-Truck. Ter um criador, ter um dono que acreditou no evento, acreditou nas coisas que ele fazia e enquanto ele fazia todo mundo achava que ele era louco. Mas um evento que tem arquibancada coberta, as próprias arquibancadas. É o único evento no Brasil, esportivo, que tem arquibancada coberta. Nem o tênis, que é um esporte totalmente elitizado, tem. Então está muito na frente das outras categorias. E eu acho que hoje é uma categoria que a fábrica, de repente, pode às vezes ter um diretor que nem gosta de corrida, mas ele tem de fazer. Porque a categoria tem esse atrativo com os clientes. E eu acho que é isso que falta em algumas categorias, e não é fácil de conseguir. WUp: Você é de uma época em que a base do automobilismo era muito mais forte. O que está faltando hoje? O que aconteceu? As pessoas perderam o interesse? DF: Não, não. O fundamental de tudo é você começar nos fórmula, nos monopostos. Antigamente ninguém queria andar de carro de turismo, todo mundo queria andar de monoposto. Mas o que acontecia muito é o Brasil tinha ídolos, né? Hoje, não. Porque os caras corriam aqui três, quatro, cinco anos, tem piloto com muita fama aqui e nunca foi para fora. Hoje, não. O cara nem passa aqui e já vai direto para fora. Então tudo isso conta na hora de o cara não ter alguém para torcer. Eu acho isso fundamental também. As categorias hoje não treinam. Antes tinha treino pra caramba, hoje não tem. E o principal de tudo é o crescimento do futebol. Por exemplo: ah, o Adriano tá com a ponta da unha quebrada. Dá uma página no jornal que o cara está com a unha quebrada. E o cara ganha corrida aqui, o cara nem sabe. O Cacá, por exemplo. É o principal, na minha cabeça, o principal piloto do país. E o melhor também. Na minha opinião, disparado o melhor. O cara foi correr na Argentina, que é um centro do automobilismo na América do Sul, é o mais forte que tem, foi lá, botou a pole na [Súper] TC2000, que é uma das principais categorias de lá, e não saiu uma linha, nem de que o cara ia correr lá. Você entendeu? E nós estamos falando do principal piloto do país. Quer dizer, então o fã do automobilismo não sabe que o cara foi lá e fez a pole na Argentina, então tá tudo voltado para o futebol e para a F1. E os jornalis- tas aqui no Brasil também, os sites, todo mundo tem culpa. Esses dias eu abri três sites da Argentina, nenhum falava de F1, de Indy, nem de MotoGP. Só falava de categorias nacionais. Então o piloto lá é famoso, tem patrocínio, dá retorno para o patrocina- dor. Aqui, não. Só fala de F1. O que que interessa para um torcedor que o Narain Karthikeyan bateu com o Sebastian Vettel e furou o pneu dele? Tudo mundo fura pneu, mas aí vem lá na primeira página de um site a declaração do Narain Karthikeyan. E o cara que ganha aqui, que investe aqui? As montadoras que
querem investir? Precisa desse retorno, e não tem. opinião. Por isso que ele está melhor. Mas a gente vê, Nos próprios sites de corrida e nos jornalistas de pelo menos, ele tentando fazer as coisas, sabe. E ele corrida, não tem esse retorno. Você abre uma revista acaba esbarrando em um problema muito grande aqui, só tem F1, Indy. Para mim, por exemplo: eu não também, que é essa falta de apoio ao automobilismo. assisto corrida de Indy. Me dá nojo assistir a corrida de O automobilismo tinha de estar mais em evidência e Indy. Entra uma bandeira amarela, fica dez, 12 voltas, não consegue estar por causa do futebol. Hoje uma 13. Isso é livre na TV. Eu não tenho saco para assistir Ford Caminhões, por exemplo, que está aqui com a aquilo. Um monte de piloto ruim guiando. Eu, por gente envolvida totalmente, na equipe e no evento, tá exemplo, acho que o Rubinho Barrichello montou lá também nos campos de futebol. Por quê? Porque num porco, de sentar num negócio daquele lá. hoje o cara do futebol, o marqueteiro de futebol, WUp: Você acha que ele deveria ter encerrado a descobriu também as outras empresas, que o futebol também é um grande negócio. Antes não. Era só a carreira? torcida, a paixão, tudo a torcida. Hoje não. Hoje é um evento feito para clientes. Então você vai lá, ninguém DF: Claro, pô! Ou que vá correr de Stock Car, então. Ia vê, ninguém fala, mas tem um camarote da Ford, tem ajudar o automobilismo no Brasil. O que ajuda o um camarote do Banco do Brasil, tem um camarote automobilismo no Brasil o Rubinho correr de Indy? do Santander, tem um camarote de vários caras Nada! Traz o que para o Brasil? É uma categoria que grandes e que tem o futebol para levar os seus vem para São Paulo, para o trânsito inteiro, que já é clientes. Então o futebol descobriu isso aí, tem uns caótico, para correr no Anhembi e deixa de correr três, quatro anos, e isso tomou muito do automobilisonde faz F1. E gasta milhões de dólares para organi- mo em geral. zar aquela corrida ali. Onde o palco principal, que é F1, nós temos. E corre lá no Anhembi, no meio da WUp: Você já pensou em se candidatar a CBA? reta, pulando que nem cabrito, tem chuva, não tem corrida, e acaba com o trânsito que já é caótico. Então DF:Não! Nem penso, mas eu acho que o Cleyton está tudo isso aí faz parte de uma série de coisas que não fazendo, está tentando fazer, mas a gente entende a acrescenta nada para o automobilismo nacional. Se dificuldade que ele tem. Porque ele tem uma pedra lá eu for ficar falando aqui, a gente vara a noite. dentro que ele precisa tirar. E, enquanto ele não tirar, não vai. E ele sabe disso. WUp: Você nunca escondeu sua posição em relação à CBA. Você acha que o Cleyton Pinteiro foi pior, melhor WUp: Nós tivemos agora essa polêmica com o Felipe ou a mesma coisa que o Paulo Scaglione? Giaffone e o Geraldo Piquet. Você acha que a punição ao Piquet é resultado da posição do Nelson Piquet em DF:O Pinteiro está melhor que o Scaglione, porque relação à CBA? ser pior que o Scaglione não dá. Essa é a minha
aí e andou muito bem, vai andar bem esse fim de semana também. Já passaram pela minha equipe diversos caras que vieram do turismo e não consegui- ram andar, e a categoria tem de ser renovada. Então no que eu acredito? Acredito que a categoria hoje tem bastante piloto que, uma hora vai ter de parar, seja neste ano, seja no outro ano. E a categoria tem de ter caras, pilotos, jovens. Que tenham condição de ser piloto de automóvel, ser profissional. E profissional tem de ganhar dinheiro. Então eu quero preparar esses pilotos. Não que eles sejam para mim, se não der para ser da minha equipe, amanhã folga uma vaga em outra equipe, o cara fala: 'Pô, o moleque tá lá, o moleque anda rápido, vamos chamar o menino.' Então é para dar condições, porque tem muito cara ruim aqui nessa categoria que tem de parar. WUp: Como foi a reação das outras equipes? Eles estão apoiando, mostraram interesse? DF:Não sei. Eu praticamente trabalho sem olhar muito para as outras equipes. Mas eu acho que é um programa que eles poderiam adotar, até porque o caminhão hoje só anda de carteira A, né. Não anda com uma carteira B, por exemplo. Então o cara anda de carro e, para chegar aqui, tem de andar, e um dos pilotos eu tive de parar esse desenvolvimento foi o DF: Mas é claro. Não tenho dúvida disso. Você viu alguém ser penalizado, suspenso por batida? Eu só lembro de mim, que tomei um ano de suspensão. Não lembro de outro piloto ter tomado um ano de suspensão. Só eu tomei. Fiquei um ano suspenso. Mas por quê? Porque eu já era muito polêmico. Já estava sendo visado há muito tempo, a hora que eu aprontei uma forte, fui penalizado. Mas não tenho dúvida nenhuma de que se não tivesse o fato da batida ser com o Giaffone, que a gente tem de considerar o peso do Giaffone também, que praticamente manda no automobilismo. Felipe tá dentro da CBA, é o menino bonzinho, tudo isso aí pesa. Não tenho dúvida. Como acho também que tem de ter punição. Eu não acho nenhum absurdo ele ser suspenso. Eu acho a atitude perfeitamente certa. Mas desde que os outros fossem também. WUp: Você agora criou um programa para desenvolver pilotos. Por quê? DF:Porque aqui no caminhão a gente vê um grande problema quando vem um piloto de carro correr no caminhão. O primeiro cara que eu vi, até hoje, e dei os parabéns para ele, foi o Christian [Fittipaldi]. Eu estou há 15 anos no caminhão, não vi nenhum cara vir do carro, chegar aqui e andar bem. E o Christian chegou
Dennis Dirani. Porque o Fábio [Fogaça] e o Sérgio Ramalho já têm carteira A. Então a gente vai tentar fazer esse trabalho aí, mas é um exemplo que as equipes poderiam seguir sim, perfeitamente. WUp: Você vê o Fábio seguindo carreira na F-Truck? DF: Eu não queria já, mas a nossa família vive de corrida. Nós não temos outro meio de vida. Nosso meio de vida são as corridas. Então, onde pagar para andar, vai. WUp: Você planeja ficar na F-Truck por muitos anos? DF:Ah, a F-Truck é a minha vida. A F-Truck é a vida de muita gente. A gente viu tudo que está aqui crescer, viu a batalha do Aurélio, viu a batalha da Neusa [Navarro Félix, esposa do fundador da categoria, que assumiu o comando após a morte dele]... Eu não me vejo fazendo outra categoria fora a F-Truck. WUp: Algumas pessoas falam que você teve um papel importante na criação da F-Truck. WUp: Ele chegou a correr na Argentina. Pela experiên- DF:Não, na criação, nenhuma. A criação foi do cia que você teve no exterior você o apoiaria a seguir Aurélio, do Renato Martins que estava junto, do carreira lá fora Macarrão, que estavam no primeiro e no segundo? ano. Eu entrei no segundo ano, mas esses caras DF:Eu apoiaria, mas ele é muito tranquilo. Ele é que participaram desde a primeira construção. Mas aí nem gato, não sai do lugar dele. Esse aí não vai para todo mundo está mais voltado para competição. O fora nem para ganhar US$ 1 milhão por mês. Aí cada mérito é de um cara só: chama Aurélio Batista Félix. É um é cada um. isso.