Água, bem finito e cada vez mais valioso. P o r K e l l y N a s c i m e n t o. R e c u r s o s h í d r i c o S



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Transcrição:

Água, bem finito e cada vez mais valioso P o r K e l l y N a s c i m e n t o E d i t o r a d a R e v i s t a B r a s i l S e m p r e 24 julho/agosto/setembro 2007

Um dos líquidos mais preciosos deste século atende por uma velha fórmula conhecida nos bancos escolares: duas moléculas de hidrogênio, uma de oxigênio e voilà H 2 O. A disponibilidade em abundância e gratuita deste recurso é coisa do passado. Mas ajudou na criação da falsa premissa que a água seria um bem infinito. Como ocorre com toda falsa premissa, a verdade veio à tona. No caso específico do Brasil, essa verdade emergiu com uma ajudinha da legislação. Há dez anos o país ganhava a Lei 9.433, mais conhecida como Lei das Águas. Além de instituir a Política Nacional de Recursos Hídricos, foi o primeiro passo para a conscientização sobre o uso da água sob a ótica do desenvolvimento sustentável. Qual será o próximo passo? No final de agosto, durante o lançamento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para saneamento e urbanização, o presidente Lula disse que os administradores brasileiros não gostavam de fazer obras de saneamento por dois motivos: ficam enterradas e não se pode colocar placa. Na ocasião, Lula liberou verba de R$ 1,25 bilhão para 35 municípios do Paraná investirem em saneamento. Ao avaliar a postura de seus antecessores, deu bom exemplo para se entender porque os entraves na gestão da água no Brasil estão mais enraizados do que se possa imaginar. Daí a se imaginar que, passados dez anos de criação da Lei 9.433, a tarefa não está completa. É preciso percorrer outras etapas da maratona aquática. A primeira legislação a respeito da água no Brasil data da década de 80 e instituiu regras para o descarte de efluentes. A revolução só viria com a Lei das Águas, que estabeleceu que a gestão dos recursos hídricos deve sempre proporcionar o uso múltiplo das águas. A partir dela, surgiu o fundamento da idéia de que a água é um bem de domínio público; um recurso natural limitado, dotado de valor econômico e cuja gestão deve sempre proporcionar o uso múltiplo das águas. Entre os objetivos da Política Nacional de Recursos Hídricos está assegurar a necessária disponibilidade de água em quantidade e qualidade adequadas aos brasileiros, seu uso racional e integrado e também prevenir a população de evento hidrológicos críticos. Tudo muito correto, mas a verdade é que levamos um certo tempo para reconhecer o devido valor da água. Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), entre 1970 e 2000, a disponibilidade anual de água per capita no mundo caiu 43%. E as projeções da ONU tampouco são animadoras: nos próximos 30 anos a quantidade de água disponível por pessoa será apenas 20% da capacidade atual. A redução é explicada pelo ritmo de uso e crescimento populacional. E, por causa do aquecimento global, a escassez de água afetará os cultivos agrícolas e a segurança alimentar das populações mais pobres do mundo a partir de 2020, segundo relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas. A previsão é que a falta de água atingirá entre 75 e 250 milhões de pessoas na África e 1 bilhão na Ásia. A mudança causará, ainda, deficiência na irrigação de lavouras e, conseqüentemente, redução na produção de alimentos. Do ponto de vista da espécie humana, a água é fundamental. Hoje em dia é imprescindível para produção de energia, para todo sistema industrial e abastecimento público e atividades agrícolas. De maneira resumida, não existe vida orgânica sem água. O fenômeno vida está ligado aos recursos hídricos. Toda atividade e sobrevivência humanas dependem disso. A água é um fator decisivo e importante para o desenvolvimento de qualquer população humana, avalia o professor Enéas Salati, diretor técnico da Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável (FBDS). Até pouco tempo, o Brasil foi notadamente negligente com suas águas. Vigorava por essas bandas um padrão de utilização em bases não sustentáveis, sem planejamento ou regras apropriadas. O saldo deste descaso foi um notório passivo ambiental, numa miscelânea entre rios e lagos poluídos por esgotos domésticos e efluentes industriais em julho/agosto/setembro 2007 25

diversas regiões do país. Estudo recente da ONU afirma que, no Brasil, os conflitos entre usuários de diferentes recursos hídricos estão aumentando. Entre as áreas de conflito pelo uso da água mencionadas estão os rios da Região Sudeste, como Paraíba do Sul, Piracicaba e Capivari. A afirmação ganha todo sentido quando comparamos a concentração dos recursos hídricos e da população no território nacional. Em torno de 80% da água disponível está na Bacia Amazônica. Só que a população se concentra nos grandes eixos urbanos das regiões Sul e Sudeste, mais próximos da Bacia do Prata e bem distantes da Amazônica. Já a Amazônia concentra 74% da disponibilidade água do Brasil, mas é habitada por menos de 5% dos brasileiros. Ou seja, a abundância em termos quantitativos contrasta-se com a distribuição desigual em termos geográficos e populacionais. Apesar de rico em disponibilidade hídrica 12% da disponibilidade de águas doces superficiais do planeta estão em solo brasileiro, a oferta de recursos hídricos no Brasil é muito diferenciada: há áreas com excesso de água, como a Amazônia; com água suficiente como o Centro Sul e com água insuficiente para atividades humanas, como é o caso do Nordeste. Logo, o país não está livre de gargalos. O primeiro é a própria distribuição de água de maneira temporal e espacial nas diversas regiões brasileiras. O segundo gargalo está relacionado às áreas mais desenvolvidas: é a qualidade dos recursos hídricos. Em regiões densamente povoadas, há rios altamente poluídos, muitas vezes pela atividade industrial. A qualidade é mais crítica nas áreas altamente povoadas, especialmente pelo esgoto urbano, industrial e pesticidas. Esse é um problema sério, que afeta a biodiversidade, incluindo fauna e flora aquáticas. E também causa escassez de recurso para atividade humana. O diretor da Agência Nacional de Águas, Benedito Braga, diz que o país enfrenta outro tipo de entrave - o econômico. O principal gargalo que enfrentamos é a gestão do recurso financeiro. Ao longo desses anos tivemos dificuldades de obtenção de recursos. O principal problema brasileiro é a poluição doméstica que municípios causam aos rios. É preciso maciça quantidade de dinheiro para resolver o problema. Se o governo federal não fizer esses esforços, continuaremos a ter esse problema, diz. A solução para esses gargalos? Administrar os recursos de maneira adequada. E, no vestibular da água, digamos que o Brasil não passaria com nota dez. Do ponto de vista da qualidade, o país provavelmente ficaria reprovado. Basta analisar as áreas mais industrializadas, onde predominam a poluição e a degradação da qualidade dos recursos hídricos. Já sob a ótica da quantidade, o país faz bonito. Conseguiu aproveitar bem seus recursos hídricos na geração de energia limpa, a hidroeletricidade. A matriz energética brasileira é majoritariamente hidrelétrica. O principal gargalo que enfrentamos é a gestão do recurso financeiro. Ao longo desses anos tivemos dificuldades de obtenção de recursos. O principal problema brasileiro é a poluição doméstica que municípios causam aos rios. É preciso maciça quantidade de dinheiro para resolver o problema Benedito Braga, diretor da Agência Nacional de Águas 26 julho/agosto/setembro 2007

A maior parte da poluição vem do setor público, é esgoto não tratado. As indústrias, se não tratarem o dejeto, tomam multa e são até fechadas. Já as cidades não podem ser fechadas. O saneamento básico é um problema que é sempre jogado para depois. Aparentemente, não há vontade política para resolver a questão Professor Enéas Salati, diretor técnico da Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável Mas o Brasil ainda precisa avançar. Apesar de detentor de uma legislação de recursos hídricos, falta educar a população, fiscalizar o cumprimento das normas e também punir os infratores. No Rio de Janeiro, a presidente da Fundação Superintendência Estadual de Rios e Lagoas (Serla), Marilene Ramos, acompanha o problema de perto e tem a exata percepção dos gargalos. Segundo ela, uma das principais dificuldades enfrentadas pelos administradores fluminenses é a baixa capacidade técnica de gestão. A deficiência fez com que o estado administrasse mal a verba disponível. O Rio de Janeiro só teve sua lei de recursos hídricos aprovada em 1999, bem depois de outros estados. Nossos órgãos gestores, assim como nossos órgãos ambientais, passaram por um processo de esvaziamento técnico, de poder político, de capacidade de intervenção, durante muitos anos. Esse esvaziamento impediu o avanço da gestão dos recursos hídricos e da tomada de medidas adequadas. Um exemplo disso é o Programa de Despoluição da Baía de Guanabara, que trouxe ganhos muito pequenos com relação ao que foi investido e ao tempo em que ele está acontecendo: há mais de dez anos. A sonhada despoluição da Baía de Guanabara está muito longe de acontecer. Uma sucessão de governos que não contavam com apoio do governo federal. Tentar fazer sozinho não deu certo, avalia. Mesmo assim, o panorama poderia ser mais cinza. A Lei das Águas, através do Plano Nacional de Recursos Hídricos, teve papel fundamental na harmonização entre estados e governo federal. Em 97, com a Lei das Águas, tivemos necessidade de implementar um plano nacional de gerenciamento. Esse plano se insere no contexto nacional, com estados, União e municípios. É uma iniciativa que objetiva verificar em todo território nacional opções para implementação de política nacional de gerenciamento de recursos hídricos e procura ações necessárias para a boa implementação desse sistemas, pondera o diretor da ANA. Para Marilene, a lei ajudou os estados a avançar, mas não no ritmo desejável. Eu diria que, dez anos depois, os avanços ainda são muito tímidos. Precisamos acelerar esse passo. Estamos avançando, mas muito lentamente. A Lei das Águas foi um balizador geral, um regulamento para todos os estados. A partir daí, alguns estados já tinham avançado, já tinham feito suas leis estaduais de recursos hídricos. Os que não tinham feito como é o caso do Rio de Janeiro se sentiram chamados a fazer seus próprio sistema. E, à medida que o sistema nacional avança, ele acaba permeando para o estado. COMITÊS DE BACIA: ÁGUA GANHA PREÇO Uma experiência positiva na gestão coordenada entre União, estados e municípios são os comitês de bacias hidrográficas. A medida permitiu que a gestão dos recursos hídricos se desse de forma democrática. Ou seja, não é só o governo que decide. Surgiu uma figura nova, o comitê de bacias, que une representantes do governo e da sociedade civil. Cabe a esse comitê a definição das ações prioritárias para cada bacia. É a chamada gestão participativa e descentralizada. Outra mudança importante é que a unidade julho/agosto/setembro 2007 27

de administração passou a ser a bacia hidrográfica. Agora, pensa-se em todo o curso de água, em vez de rios e lagoas isoladamente. Um avanço inquestionável, dizem os especialistas. Fazer comitês das bacias hidrográficas, estudar problema de cada bacia, é um avanço na legislação. Hoje se vê comunidade e sociedade preocupadas com a bacia de sua região. No caso do Rio Piracicaba, muito poluído, há todo um aparato para discutir e resolver os problemas. Agora a fiscalização deve ser feita por quem de direito, diz Salati. Além do Comitê do Piracicaba, o da bacia do Rio Paraíba do Sul é outro exemplo positivo dessa mudança na gestão. Localizada numa área com alta densidade industrial, entre Rio de Janeiro e São Paulo, a bacia do Paraíba do Sul é a principal do Estado do Rio. Hoje 13 milhões de pessoas dependem dessas águas: dez no Estado do Rio e outras três em São Paulo e Minas Gerais. Com a criação do Comitê, há quatro anos, as empresas que operam na região passaram a pagar para usar a água do rio, bem como devolvê-la à rede de esgoto. A cobrança pelo uso da água na bacia do Paraíba do Sul começou com base na lei federal. Isso acabou vindo para o estado, que fez sua própria lei de recursos hídricos, está criando comitês, fez a lei de cobranças, por conta do início da cobrança da bacia federal. É como uma reação em cadeia, explica a presidente da Serla. Nem só de acertos se faz o caminho de uma nação como o Brasil. E se a Lei das Águas trouxe melhoras para a gestão de bacias, foi bem menos eficiente com relação a um velho conhecido: saneamento básico. O desleixo não pode ser explicado por falta de informações a respeito da gravidade do problema. Os números são alarmantes. Pouco mais de metade dos lares no Brasil (54%) é contemplada com coleta de esgoto em pleno século XXI! Paraná e Atlântico Sudeste são as regiões com maiores coberturas, mesmo assim não chegam a 70%. No outro extremo está a região do Parnaíba com somente 4% de domicílios com coleta. No Brasil, 10,7% das residências não têm água encanada. Outros 23,3% não contam sequer com rede de esgotos. A estimativa do Ministério das Cidades é de que para que todos brasileiros tenham acesso a água e esgoto é preciso investir R$ 178 bilhões até 2020. A maior parte da poluição vem do setor público, é esgoto não tratado. As indústrias, se não tratarem o dejeto, tomam multa e são até fechadas. Já as cidades não podem ser fechadas. O saneamento básico é um problema que é sempre jogado para depois. Aparentemente, não há vontade política para resolver a questão do saneamento básico, aponta o diretor da FBDS. Em se tratando de água, uma dos únicos problemas que atingem democraticamente tanto o Norte quanto o Sul do Banco Mundial 28 julho/agosto/setembro 2007

Brasil é a falta de saneamento. O caso do Estado do Rio de Janeiro ilustra a assertiva de maneira exemplar. Apesar de corresponder a 15,8 do Produto Interno Bruto nacional e ter testemunhado um boom do setor de petróleo e seus respectivos royalties, o Rio continua lindo, mas sem grandes avanços na matéria. Tal qual grande parte do Brasil. A questão do saneamento é o principal problema na área de recursos hídricos no Rio de Janeiro. No estado, apenas 20% do esgoto recebem algum tipo de tratamento. Vale lembrar que são 17 milhões de habitantes. Logo, o esgoto de apenas 3,4 milhões tem algum tipo de tratamento. O resto é jogado in natura no rio, córrego ou valão mais próximo. Os rios fluminenses são verdadeiros valões de esgoto. Daí aquele o mau cheiro tão comum em alguns lugares e já conhecido de quem chega à capital pelo Aeroporto Antônio Carlos Jobim e passa pela Linha Vermelha em direção à Zona Sul. O único investimento público que existe no Rio em saneamento e esgoto vem do Programa de Despoluição da Baía de Guanabara, que teve mais insucessos que vitórias. O Rio de Janeiro é relativamente rico, em termos de quantidade de água. Mas está ficando pobre em qualidade de água. Isso porque nossos rios estão poluídos por esgotos sem tratamento, lixo, sedimento por conta da ocupação das encostas. Esse é o problema mais grave e que não é exclusividade do Rio de Janeiro. Os demais estados brasileiros sofrem do mesmo problema. As exceções são a região do semi-árido onde além de faltar saneamento, falta água em quantidade. Mesmo em regiões muito ricas como a Amazônica, a situação no entorno das grandes cidades é de poluição. Acabo de vir de Belém e lá há uma queixa com relação à degradação dos pequenos igarapés que cruzam a cidade e seu entorno. A falta de saneamento é um flagelo no Brasil, comenta Marilene Ramos. A exceção fica por conta da cidade de Niterói (RJ). Na terra de Araribóia, a concessionária Águas de Niterói fez os investimentos previstos e hoje a cidade tem quase 100% de seu esgoto coletado e tratado. Um raro caso de sucesso. E SE O MAR VIRAR SERTÃO? Mas a grande preocupação do homem das grandes metrópoles, onde a oferta de líquido potável é cada vez menor, é o fantasma da escassez de água. Os grandes centros urbanos do Brasil podem sofrer com a escassez de água no futuro. São Paulo hoje trabalha no limite. Os mananciais existentes foram todos usados. Cerca de 50% da água de São Paulo vem de outra bacia, a de Piracicaba. E a reversão do Sistema Cantareira foi muito maior que a proposta para o Rio São Francisco. O custo fica cada vez mais alto. São Paulo vai ter que começar a pegar água nos rios da vertente da Serra do Mar, com grandes dificuldades ambientais, alerta Benedito Braga. São Paulo tem uma das menores disponibilidades hídricas entre as grandes cidades do mundo. São 201 metros cúbicos por habitante por ano. Para se ter idéia da aridez da situação, o mínimo recomendável é 1,5 mil metros cúbicos por habitante. Hoje a água que chega às torneiras dos domicílios da Grande São Paulo vem de áreas próximas à divisa do estado Pouco mais de metade dos lares no Brasil (54%) é contemplada com coleta de esgoto em pleno século XXI! Paraná e Atlântico Sudeste são as regiões com maiores coberturas, mesmo assim não chegam a 70%. No outro extremo está a região do Parnaíba com somente 4% de domicílios com coleta julho/agosto/setembro 2007 29

com Minas Gerais. Ou seja, São Paulo está importando água. Os mananciais paulistas estão degradados. Apenas metade do consumo da cidade é abastecido pelas represas da região metropolitana. Grande parte da água vem da Bacia do Piracicaba. A Sabesp, para renovar seu direito de tirar essa água, teve que participar de uma negociação com o Comitê da Bacia de Piracicaba que não quer mais ceder toda aquela quantidade de água. A Sabesp está pagando R$ 15 milhões por ano por essa transposição de água que ela faz. Esse recurso está sendo aplicado na Bacia do Piracicaba, isso é um grande avanço que nós temos hoje no Brasil, diz a presidente da Serla. Segundo o diretor da ANA, o esforço da Agência em São Paulo tem sido no sentido de enfatizar a redução de perda de água no sistema de abastecimento. Reduzir as perdas significa não precisar construir obra de porte para trazer água pra cidade. São Paulo está no nível internacional com relação à perdas no abastecimento: entre 17 e 18%. Em outras cidades brasileiras, a perda chega a 60%. E a tendência para as grandes cidades é esse índice se agravar, alerta. Uma das ações para que a Agência prepara para minimizar o problema é o Atlas das Regiões Metropolitanas Brasileiras. O estudo traça um Raio X das cidades brasileiras com mais de 100 mil habitantes e deve ficar pronto em 2008. A idéia é apresentar opções de atendimento de demandas até 2025. O relatório GEO Brasil Recursos Hídricos, lançado este ano pela Agência Nacional de Águas, mostra que o setor líder no ranking de consumo é a irrigação, que monopoliza 46% do total de água extraída dos rios. Em segundo lugar vem o consumo humano urbano (27%), seguido pelo uso industrial (18%). O estudo foi elaborado com o propósito de fornecer informações atuais sobre modelo institucional, políticas de ação, avanços e desafios da gestão de recursos hídricos no Brasil. A baixa qualidade das águas nas regiões Sul e Sudeste decorre das altas taxas de urbanização e industrialização destas áreas, segundo o relatório. Já no Centro-Oeste, o alerta fica por conta da bacia do Alto Paraguai, ameaçada pela expansão da fronteira agrícola, garimpo e atividades pecuárias. A região também requer uma gestão mais aprofundada de suas águas. No Nordeste, a falta de água parece ser crônica. É sabido que o ponto mais crítico em todo território nacional é a região semi-árida, que abrange a maior parte do Nordeste. O quadro é causado por características naturais, mas boa dose de descaso e falta de empenho dos governantes fizeram com que o bode empacasse em vez de avançar. O avanço que houve em relação ao abastecimento de água na Região Nordeste foi tecnológico, na utilização da água com eficiência, principalmente na agricultura. Houve avanço na coleta e no armazenamento, principalmente nas residências. Hoje as pessoas guardam água nos telhados, em sistemas de cisternas coletivas. Mas a situação ainda é crítica. Para se ter idéia, chove 700 milímetros/ano no semi-árido. Na Amazônia, esse índice é de 2.400 e em São Paulo, 1.400, explica o diretor da FBDS. A associação dessa baixa precipitação ao clima e às formações geológicas (principalmente no Nordeste cristalino) resulta em pouquíssimo reservatório de água no subsolo. Uma das ações da Agência Nacional de Águas, em conjunto com Ministério de Integração Nacional, para tentar aplacar o fenômeno da seca foi o programa Proágua, que conseguiu levar água para mais de 4 milhões de habitantes, através da construção de barragens, adutoras e estações de tratamento de água. O diferencial do Proágua foi combinar obras à gestão de recursos hídricos. Nenhuma obra foi feita sem que houvesse plano de gerenciamento de água. Bem-sucedida, a experiência será levada a outras praças. No começo de agosto, o Senado aprovou o Proágua Nacional. Essa experiência do Nordeste vai para todo território brasileiro: construir obra e operar de forma coerente. No passado, as obras do Nordeste eram construídas e ninguém se beneficiava; hoje a situação está totalmente diferente na região. Isso se deve à ANA, que cuidou da gestão. Em curto espaço de tempo, já temos resultados expressivos, comemora Braga. A mesma receptividade não teve a proposta do Ministério de Integração Nacional de Transposição do Rio São Francisco. A ANA não se envolveu na polêmica da transposição do Rio São Francisco, apenas analisamos a disposição do projeto do Ministério de Integração Nacional. Avaliamos que havia deficiência hídrica na área que receberia a água e autorizamos o projeto. A ANA não questiona o projeto, é responsável por autorizar o uso de rios. Apenas verificamos que a autorização podia ser dada, não questionamos questões político-financeiras. Mantivemos-nos isentos, comenta o diretor da Agência. O debate sobre o equacionamento do déficit de água do Nordeste é fervoroso. E a artilharia contra a transposição do Velho Chico acaba mirando no alvo errado. É o que acontece com a proposta do estudo conhecido como Atlas do Nordeste. O Atlas do Nordeste tem sido usado de forma inadequada. Os que são contrários à transposição dizem que o Atlas mostra que a transposição não seria necessária. O que o Atlas fez foi uma análise do semi-árido do Nordeste, com vista de abastecimento doméstico. A transposição não prevê uso doméstico, mas desenvolvimento regional. Logo, o Atlas e a transposição são complementares, não conflitantes, explica. O Atlas objetiva identificar alternativas de abastecimento 30 julho/agosto/setembro 2007

Se não existe fórmula milagrosa para multiplicação da água, o jeito é reciclar. No cenário futuro, o Brasil deve se preocupar com a expansão de atividades rurais, especialmente a irrigação, comprovadamente o setor que mais consome água. Nesse sentido, é fundamental que o país invista em tecnologias que possibilitem o manejo eficaz da água julho/agosto/setembro 2007 31

público para sedes municipais com mais de 5 mil habitantes, a partir de projeções de crescimento de demanda por consumo urbano de água numa área que abrange mais de 1,3 mil cidades nordestinas. Não trata do problema de segurança hídrica do Nordeste, já que não garante o atendimento de usos múltiplos da água. Enéas Salati é a favor da transposição, mas ajuda a colocar lenha na fogueira. Ele alerta para a necessidade de investimentos altos e o risco de salinização do solo. A experiência é válida. No entanto, tem que ser tomar cuidado quanto a problemas que podem acontecer, especialmente com a salinização dos solos. Se você joga água no solo e a maior parte evapora, a água sempre tem um pouco de sal, que vai sobrar. Então, se você faz irrigação sem fazer uma drenagem perfeita do solo, há tendência de salinização. Esse fenômeno já ocorreu em áreas do entorno de Petrolina, que foram irrigadas. Lá, o pessoal aprendeu que o investimento é alto, mas tem que se fazer sistema de drenagem, conta. Experiência à parte, engana-se quem pensa que a seca do Nordeste acabará com a transposição do São Francisco. A experiência é valida, mas não é uma solução para todo Nordeste. Isso porque o São Francisco é um rio naturalmente pequeno, com vazão de 2 mil m 3 /segundo na média. A visão correta é trazer água das bacias com muita água como a Tocantins/Araguaia e a Amazônica. No Rio Amazonas, são 200 mil m 3 / segundo de vazão média. Não há dúvidas de que, do ponto de vista agrícola, é uma região excelente. Só falta mesmo a água para irrigar as plantações, argumenta Salati, principal pesquisador responsável pela descrição do ciclo da água da Amazônia brasileira - base para o conhecimento hidrológico da região. FUTURO ESTÁ NO REÚSO Se não existe fórmula milagrosa para multiplicação da água, o jeito é reciclar. No cenário futuro, o Brasil deve se preocupar com a expansão de atividades rurais, especialmente a irrigação, comprovadamente o setor que mais consome água. Nesse sentido, é fundamental que o país invista em tecnologias que possibilitem o manejo eficaz da água. O livro Reúso da água Conceitos, Teorias e Práticas (Editora Blucher) mostra que 1/6 da população mundial, ou seja, 1,1 bilhão de pessoas não têm acesso a água de qualidade e em quantidade suficiente. A projeção para 2025 preocupa ainda mais: serão 7 bilhões de pessoas, atingindo 1/3 da população no planeta. Tendo em vista as projeções que mostram o risco real de falta de água, o homem passou a investir na reciclagem deste recurso. Países como França, Alemanha e Estados Unidos saíram na frente na corrida pelo reúso de água. O Brasil ainda é iniciante no assunto, mas caminha a passos largos. O setor industrial tem avançado bastante e cresce a tendência de promover o chamado fechamento do circuito: água usada num processo é aproveitada no seguinte. No entanto, ainda há muito a fazer. Para se fazer o reúso, conforme a qualidade da água, é preciso atingir determinado nível de despoluição. Gosto muito do sistema de waterland, através do qual você pega a água e faz um sistema de um solo muito permeável quando se faz uma cultura convergente, como a cultura de arroz. A água penetra no solo e é coletada no sistema de drenagem na parte inferior. Com isso, tem-se a produção de arroz e de água limpa, explica Salati. Esse sistema já é usado no Brasil. Em Analândia, no interior de São Paulo: o abastecimento da cidade é feito em parte nesse processo. Água bombeada de um córrego, purificada por esse processo, depois clorada e servida à população, diz. Sistema semelhante está funcionando em Piracicaba(SP) para tratar o esgoto da cidade. Há o tratamento de esgoto primário, depois passa pelo solo permeável para purificar a água numa primeira etapa. Em seguida, dá-se a última fase da limpeza, a passagem por plantas aquáticas purificantes. Experiências interessantes, tecnologias acessíveis e pouco dispendiosas. Mas a iniciativa mais revolucionária em termos de reúso em território brasileira se dá na comunidade de Emaús, na cidade de Ubatuba (SP). Trata-se de uma comunidade carente o único lugar do litoral brasileiro que tem tratamento terciário, através do qual é possível tirar até os nutrientes da água. Lá é feito o tratamento do esgoto (waterland), da água para piscicultura e purificação outra vez para usar na irrigação, explica Salati, que ajudou a implementar os projetos. A tendência mundial é que a técnica de reúso cresça nos setores de irrigação e indústria. No Rio de Janeiro, a empresa Geoplan, especializada 32 julho/agosto/setembro 2007

em soluções de abastecimento de água para fins industriais, vem se destacando no setor de reúso. Nesse ano, a empresa inaugurou, em parceria com a Bayer, a primeira estação de tratamento e reúso indireto de água da Baixada Fluminense. Com a solução da Geoplan, a Bayer deixará de usar 70 milhões de litros de água potável por mês. A estação de tratamento tem cerca de dois mil m 2 e o investimento no projeto foi de R$ 4,5 milhões. Iniciativas como esta tem sido cada vez mais comuns no estado. A estratégia da Serla é mostrar ao empresariado que sai mais barato captar menos água dos rios. O estímulo ao reúso é dado pelo instrumento econômico da cobrança. Isso tem levado as indústrias a aplicar práticas de reúso. Em vez de obrigarmos, nós cobramos. Se a empresa não fizer, pagará mais. Em seis meses, aumentamos em 50% a arrecadação. Já estamos com uma cobrança de R$ 4,5 milhões/ano. Mais gente está pagando, ou seja, mais gente está recebendo esse estímulo de usar menos água, comemora Marilene Ramos. Sinal de que é possível mudar os padrões de consumo da água. O planeta agradece. serla: avanços na gestão A Fundação Superintendência Estadual de Rios e Lagoas (Serla), responsável pela gestão dos recursos hídricos do Estado do Rio de Janeiro, comemora os resultados da nova gestão. Além de aumentar a arrecadação de R$ 3 para R$ 4,5 milhões ao ano, a Serla passou a atuar de maneira intensiva na otimização do uso da água no estado. Atuamos em várias dessas frentes. Trabalhamos na área de sistema de informação. Para gerir é preciso ter informação, é preciso conhecer e saber o que você está gerindo: como está nossa água, qualidade, quantidade. Hoje nós estamos com edital na rua para contratar todo o sistema de alerta de cheias na Baixada Fluminense. Trabalhamos também na montagem do nosso sistema de informação de recursos hídricos, onde todas as informações sobre chuva, qualidade de água, quantidade, o que está acontecendo em nossos rios, vão ficar disponibilizadas numa página pública para pesquisadores, estudiosos, gestores, diz a presidente Marilene Ramos. Segundo Marilene, os maiores desafios a ser enfrentados são a questão do saneamento e a capacidade de mobilização para gestão de recursos hídricos. Um dos principais gargalos é o saneamento e não é só esgoto: é esgoto e lixo. É preciso acabar com lixões, ampliar a coleta de lixo domiciliar; tudo isso é absolutamente prioritário para recuperar nossos corpos hídricos para a sustentabilidade, ou seja, para termos água no futuro. Outra frente de trabalho fundamental refere-se à estruturação dos comitês de bacia, a sociedade tomar parte nesse trabalho, essa gestão participativa, isso é extremamente importante. O Estado do Rio tem hoje cinco comitês de bacia instalados. A meta é chegar a nove até o fim dessa administração. Na linha de pequenas regiões onde não há saneamento, a Serla está atuando na despoluição do sistema de coleta e tratamento de esgoto da região de Mauá, Maromba e Maringá, por onde passa o Rio Preto. As ações de recuperação ambiental também foram intensificadas. Lagoas e rios poluídos estão recebendo atenção especial. Além de promover a despoluição, a meta é espantar as tenebrosas inundações. Temos ações em todos sistemas lagunares do estado, atuamos na revitalização desses sistemas para melhorar a circulação e qualidade das águas. Trabalhamos com esses comitês na montagem, executando o saneamento de pequenas comunidades que muitas vezes não vão ser alcançadas pelo sistema de coleta e tratamento de esgoto da cidade. Para poder fazer despoluição de pequenos mananciais nós estamos construindo uma estação de tratamento de esgoto lá em Nova Friburgo. Nós estamos construindo biodigestores em pequenas comunidades de Petrópolis. O combate à inundação passa pela conscientização dos moradores, já que é preciso reduzir a quantidade de lixo e sedimentos que chegam aos mananciais. Nesse sentido, a Serla estabeleceu parcerias com prefeituras a fim de melhorar a coleta de lixo. Quando o sistema de drenagem está entupido, a água da chuva não consegue passar - o que provoca inundação. Fazemos esse trabalho contínuo de limpeza. Marilene gosta sempre de lembrar que a água é um bem finito, daí a obrigatoriedade da regulação do uso. Não se pode tirar quantidade de água no rio à vontade, jogar efluente sem que haja algum controle. Durante muitos anos, o Rio de Janeiro nunca teve controle sobre isso. Nós estamos cadastrando os usuários: quem vai ao rio e capta água, joga lixo no esgoto, indústrias, empresas de abastecimento público, agricultores, produtores. Nós estamos cadastrando esses usuários, que são quem vai ao rio e pega água bruta, represa ou gera energia. Com essa mentalidade, a Serla conseguiu aumentar o número de outorgas de 111 para 280; os usuários cadastrados saíram de 500 para 1.500. Podemos esperar Marlene Ramos numa das visitas boas notícias nos próximos anos. aos municípios fluminenses julho/agosto/setembro 2007 33