Exmo. Sr. Presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros



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Transcrição:

Exmo. Sr. Presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros Ref.: voto-vista no Parecer PEC 399/2011 Indicação no.. 114/2011 Ementa: Terrenos de Marinha e seus acrescidos. Permanência que não se justifica nos dias atuais. Instituto arcaico que gera insegurança jurídica quanto à sua demarcação e onera os detentores do domínio útil, mediante cobrança de foro anual e laudêmio, criando, ademais, risco à manutenção da propriedade. Extinção que se propugna, com exclusão das áreas cedidas pela União e as que são objeto de mera ocupação. JACKSOHN GROSSMAN, nos autos da Indicação no. 114/2011, vem apresentar seu Voto-Vista no Parecer referente à PEC no. 399/2011, o que faz mediante as razões seguintes: 1)- Trata-se de Proposta de Emenda à Constituição no. 399/2011, subscrita por diversos parlamentares, visando revogar o inciso VII do art. 20 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, para extinguir o instituto do terreno de marinha e seus acrescidos e dispor sobre a propriedade desses imóveis. 2)- O Parecer, de autoria do ilustre consócio Hariberto de Miranda Jordão Filho, é no sentido de ser rejeitada a PEC em questão, com base, em apertada síntese, nos seguintes fundamentos:

a)- o Projeto teria sido concebido com o objetivo de atender a interesses das altas classes sociais, onde se encontram os pretensos proprietários das valiosas glebas litorâneas, edificadas ou não, e para beneficiar grupos e oligarquias que controlam estados e municípios; b)- decisões do Supremo Tribunal Federal de 1901 e 1906, respectivamente, consideraram que a União tem, verbis, o pleno domínio dos terrenos de marinha não aforados e o direto dos aforados, cuja posse não perde com a cessão do (domínio) útil, bem assim que se faz mister o título de aforamento concedido, após as formalidades legais,(...) e sem o qual não deve este permitir construções, aterros ou quaisquer outras obras sobre o mar ; c)- o uso dos terrenos de marinha e acrescidos é de interesse público, preservando o patrimônio coletivo; d)- o desaparelhamento do órgão patrimonial da União leia-se Serviço do Patrimônio da União é utilizado em iniciativa limitada e impatriótica, ferindo os princípios da publicidade, impessoalidade e moralidade, previstos no caput do art. 37 da Constituição Federal. 3)- Permito-me, porém, com a devida vênia, discordar dos fundamentos e conclusões do Parecer, em face das razões a seguir expostas. Vejamos, primeiramente, como se definem os terrenos de marinha e acrescidos. Segundo o art. 2º. do Decreto-lei no. 9.760, de 05/09/46, são terrenos de marinha, em uma profundidade de 33 (trinta e três) metros, medidos horizontalmente, para a parte da terra, da posição da linha do preamar médio de 1831: a) os situados no continente, na costa marítima e nas margens dos rios e lagoas, até onde se faça sentir a influência das marés; b) os que contornam as ilhas situadas em zona onde se façam sentir a influência das marés. Parágrafo único. Para os efeitos deste artigo a influência das marés é caracterizada pela oscilação periódica de 5 (cinco) centímetros pelo menos do nível das águas, que ocorra em qualquer época do ano.

mesmo texto supracitado: Quanto aos acrescidos, é a seguinte a definição legal do Art. 3º - São terrenos acrescidos de marinha os que se tiverem formado, natural ou artificialmente, para o lado do mar ou dos rios e lagoas, em seguimento aos terrenos de marinha. 4)- A criação de tal instituto deu-se, pois, há mais de 180 anos, remontando a uma situação que, à toda evidência, não mais se coaduna com a realidade. Vale notar que esses terrenos são denominados como "de marinha" por sua proximidade com as águas salgadas, e não "da Marinha", no sentido de pertencerem à Marinha do Brasil, ora Comando da Marinha, órgão subordinado ao Ministério da Defesa, o qual não exerce controle patrimonial sobre os mesmos, sendo tal tarefa atribuída à Secretaria do Patrimônio da União, órgão do Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão (MPOG). Cumpre ainda registrar, que as praias também não são terrenos de marinha. São bens públicos de uso comum, tais como as praças e ruas, e têm definição específica conforme Lei 7.661/88, que instituiu o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro. 5)- A causa imediata do atributo das áreas designadas de marinha e seus acrescidos, resultou de sua importância para a defesa do território nacional. Porém, é fato notório que, com o advento do monitoramento por satélite de nossas fronteiras e a existência de armas que alcançam milhares de quilômetros, deixou de haver justificativa para a consideração de tal aspecto. Além disso, a faixa de 33 metros, qualquer que tenha sido o parâmetro utilizado originalmente para estabelecê-la, é simplória. Considerando, por exemplo, a necessidade de instalações de bases militares em tais regiões, tal dimensão seria irrisória. Caso a Marinha, por exemplo, venha a necessitar de uma base para sediar submarinos de propulsão nuclear, distante de centros urbanos, os 33 metros de faixa

seriam notoriamente insuficientes. O mesmo se diga em relação às reservas ambientais ou outras áreas públicas, como instalações portuárias. Quanto ao aspecto ambiental, a restritiva legislação pertinente e os diversos órgãos existentes para tal fim, são suficientes para fiscalizar e preservar as áreas contra possíveis danos ambientais. 6)- Posteriormente, verificou-se que também representavam valor patrimonial elevado para as receitas da União, sobrepujando sua utilidade como área de defesa e reserva para serviços públicos. Com efeito, como consta do acórdão proferido pela 7ª. Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª. Região, Apelação Cível no. 2006.51.01.004674-4, relatora a Des. Federal Salete Maccaloz, nos autos da ação ajuizada pela Associação dos Moradores e Amigos do Tijucamar e Jardim Oceânico AMAR, a primeira demonstração efetiva de interesse patrimonial do Estado sobre essas terras surge na Lei Orçamentária de 15 de novembro de 1831, que orçou a receita e despesa para o período financeiro de 1832 e 1833, colocando à disposição das Câmaras Municipais os terrenos de marinha para aforar e estipular o foro sobre os mesmos. Todavia a titularidade permaneceu com a União e as rendas posteriormente foram direcionadas ao poder central. O ano de 1831 tornou-se então o marco temporal que serve para definir a linha do preamar médio, marco inicial para as medições da Marinha. 7)- Cuida-se, na espécie, de regime patrimonial diferenciado do que se aplica aos demais bens imóveis da União, vez que tais áreas se submetem obrigatoriamente ao aforamento, e, ao que consta, sem similar no direito comparado. Tal regime tem causado apreensões àqueles que edificaram sobre tais terrenos, principalmente em razão não só da própria natureza do instituto que rege os direitos reais sobre os imóveis ali situados, mas também pela legislação por demais oscilante, considerando-se que versa sobre propriedade, bem de raiz que naturalmente requer maior estabilidade.

Ademais, as sucessivas alterações legislativas adicionaram complicadores ao que já era complexo, no que tange à demarcação de uma preamar média de 1831. 8)- Importa serem destacadas as extremas dificuldades e os inúmeros litígios decorrentes da demarcação de tais terras. O Decreto-lei nº 9.760/46 atribuiu ao Serviço de Patrimônio da União, hoje Secretaria do Patrimônio da União (SPU), competência para determinar a posição das linhas do preamar médio do ano de 1831, preliminar necessária para os trabalhos de demarcação. Admite o próprio texto legal, possivelmente antevendo as dificuldades de execução, aproximações razoáveis em sua fixação, bem como a participação dos interessados: Prescreve seu art. 9º que será da competência do Serviço do Patrimônio da União (SPU) a determinação da posição das linhas do preamar médio do ano de 1831 e da média das enchentes ordinárias O art. 10º declara que a determinação será feita à vista de documentos e plantas de autenticidade irrecusável, relativos àquele ano, ou quando não obtidos, à época que do mesmo se aproxime. Em seu art. 11º. o DL prevê que, para a realização do trabalho, o SPU convidará os interessados certos e incertos, pessoalmente ou por edital, para que no prazo de 60 (sessenta) dias ofereçam a estudo, se assim lhes convier, plantas, documentos e outros esclarecimentos concernentes aos terrenos compreendidos no trecho demarcado. Diógenes Gasparini (in Direito Administrativo, São Paulo: Saraiva, 3ª. ed.), afirma que tem sido aceito, inclusive pelo Judiciário, a linha do jandu, vegetação existente nas proximidades das praias, como marco substituto da linha de preamar média de 1831, quando de todo impossível determiná-la. Os procedimentos adotados pela SPU estão detalhados em Orientação Normativa (ON-GEADE nº 002 de 12 de março de 2001) daquela Secretaria, que estabeleceu os critérios técnicos para o trabalho, inclusive prevendo a utilização de dados do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, da Diretoria de Hidrografia e Navegação do Comando da Marinha

(que dispõe de um banco de dados oceanográficos), mapoteca do Itamarati, Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, museus, Diretoria do Serviço Geográfico do Exército, empresas de aerolevantamentos, Biblioteca Nacional, bibliotecas regionais e locais, associações culturais, câmaras de vereadores, prefeituras, igrejas, cartórios, depoimentos de moradores e/ou pescadores antigos. Tal trabalho, ainda inconcluso para todo o país, tem gerado milhares de processos judiciais, especialmente pela não observância, quando do procedimento administrativo de demarcação, dos princípios do contraditório e da ampla defesa, para que os interessados proprietários das terras atingidas possam se manifestar. Podem-se citar, a propósito, as decisões do Superior Tribunal de Justiça, no AgRg no Ag 1028974/RJ, 2ª. Turma, DJe 05/08/2008; REsp 827680/SCm 1ª, Turma, DJe 05/06/2008; REsp 724741/SCm Relator Min. LUI8Z FUX, 1ª. Turma, DJ 15/02/2007; REsp 550146/PE, DJ 05.12.2005; AgRg no REsp 898.720/SC, 2ª. T., 16/12/2008, DJe 04/02/2009; AgRg no REsp 1072290/RS, 1ª. T., 02/10/2009, DJe 13/10/2008; REsp 1059561/SC, 2ª. T., 05/08/2008, DJe 22/08/2008. Estes julgados são no sentido de se anular o processo administrativo em que foi realizada a demarcação, uma vez que, sendo possível a identificação dos proprietários dos imóveis em causa, deveriam ser intimados pessoalmente para ciência do procedimento, e não simplesmente pela via editalícia. Exemplo próximo e concreto é a ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal em face da UNIÃO, objetivando a anulação do processo administrativo da Secretaria de Patrimônio da União, destinado à demarcação da linha de preamar média (LPM) de 1831 de todo o litoral do Estado do Rio de Janeiro, eis que os interessados conhecidos não foram intimados pessoalmente, mas apenas por edital, para manifestarem-se sobre a linha demarcatória estabelecida pela Comissão técnica do órgão. Cabe observar que somente a publicação do aludido edital levou mais de 4 (quatro) anos após o início do procedimento administrativo, ou seja, entre 09.04.97 a 03.07.2001. No entanto, a SPU só viria a dar efeitos práticos à sua

própria decisão a partir de 2004, quando passou a remeter aos cartórios de Registro de Imóveis plantas demarcatórias para a devida averbação nos registros dos imóveis, a fim de viabilizar a cobrança retroativa das taxas de ocupação. Encaminhou ainda, cópia das plantas ao Município de Niterói, solicitando que não autorizasse construção alguma nos imóveis situados em terreno de marinha, antes da devida regularização pelos pretensos proprietários, o que gerou centenas de ações e a criação de uma CPI na Assembléia Legislativa do Estado do Rio, chegando em seguida à Câmara Municipal de Niterói, que constituiu uma Comissão Especial, cujo relatório apontara equívocos técnicos na demarcação feitas nas Lagoas de Piratininga e Itaipu. A sentença proferida pelo Juízo da 4ª. Vara Federal de Niterói, vazada em 34 laudas, acolheu o pedido, invalidando o processo administrativo em relação aos interessados que detêm títulos registrados, e, portanto, identificáveis, mandando intimar pessoalmente as pessoas em cujo nome estiverem registrados imóveis na área incluída nos terrenos de marinha, por meio de entrega pessoal da notificação, para que, em desejando, ofereça impugnação dirigida ao Gerente Regional da SPTU no Estado do Rio de Janeiro. Foram ainda anuladas todas as averbações efetuadas pelos cartórios de registro imobiliário, determinando seu cancelamento, e também da inscrição em dívida ativa dos débitos relativos ao não pagamento de foro, laudêmio e taxas de ocupação. Um dos fundamentos ressaltados na sentença mencionada, é o de o que antes não passava de longínqua e abstrata possibilidade de afetação se materializa subitamente em concreta e inequívoca intervenção na esfera jurídica dos administrados, com graves repercussões patrimoniais: 1)- a propriedade, direito real pleno sobre bem próprio (CC 1.225, I) é reduzida à condição de domínio útil correspondente a 83% do domínio pleno expressão de direito real de gozo sobre coisa alheia;2)- o antigo proprietário, agora meramente enfiteuta, é obrigado a pagar à União, senhoria ou foreira, taxa de ocupação ou foro anual de 0,6% sobre o valor do terreno e benfeitorias. O não pagamento do foro por três anos consecutivos ou quatro intercalados, leva à caducidade, sem prejuízo da inscrição em dívida ativa e da cobrança dos débitos por meio de execução fiscal; 3)- ao contrário do que se dava com a propriedade, a transferência do domínio útil requer anuência da nu proprietária,

representada pela SPU, restringindo ainda mais o exercício de direitos pelo titular do domínio útil. 9)- Como fonte de geração de rendas ao Estado, as receitas dos terrenos foreiros não gozam do necessário atributo da simplicidade, requerendo pesada estrutura para sua arrecadação, manutenção de cadastros, defesa jurídica em procedimentos diversos, etc. Com o decurso de tantos anos após sua instituição, inúmeros municípios, alguns extremamente populosos, cresceram ao longo da costa e possuem grande parte de seu território assentado em terrenos de marinha. A conseqüência disso é a existência de milhares de construções, muitas delas financiadas com recursos do sistema financeiro da habitação, feitas sob a presunção de que se trata de domínio pleno, quanto na verdade se cuida de terrenos de marinha. Assim, descabe o argumento de que apenas pessoas mais abastadas são penalizadas com a cobrança de foros, taxas de ocupação e laudêmios. A realidade de muitos municípios demonstra que isso não é uma regra, pois a grande maioria dos que se vêem obrigados a suportar tais pagamentos são cidadãos de classe média e classe média baixa. Há ainda a considerar o exagero da tributação, eis que aqueles que possuem ou vivem em imóveis situados em terrenos de marinha pagam o foro ou a taxa de ocupação conjuntamente com o Imposto Predial e Territorial Urbano IPTU. Não bastasse isso, a legislação obriga que se pague também laudêmio sobre as benfeitorias construídas pelo particular, significando que a União angaria receita até mesmo sobre algo que foi realizado às exclusivas expensas do contribuinte. De toda sorte, no que concerne ao Projeto sob exame, sua aprovação não ocasionará, em princípio, perda de renda pública, mas tão-somente transferência entre entes federativos beneficiários, ou seja, da União para os Estados ou Municípios. De fato, a União deixaria de receber o foro de 0,06% anualmente sobre o valor do terreno, em caso de ser alienado, 5% sobre o valor do terreno e benfeitorias nas transferências inter-vivos, mas o Município passaria a tributar não apenas sobre o domínio útil, mas sobre o domínio pleno, tanto no imposto sobre a propriedade urbana

(IPTU), quanto no imposto de transmissão. Por seu turno, os Estados passariam igualmente a tributar sobre a propriedade plena nas transmissões causa-mortis e nas transferências a título gratuito, como nas doações, dações em pagamento e incorporação do bem de pessoa física à pessoa jurídica. Projeto em causa, a saber: 10)- Passemos a examinar o que expressamente pretende o a)- A par de extinguir o instituto do terreno de marinha e seus acrescidos, declara que tais bens continuam como domínio da União as áreas nas quais tenham sido edificados prédios públicos que abriguem órgãos ou entidades da administração federal, inclusive instalações de faróis de sinalização náutica ; as que tenham sido regularmente destinadas à utilização por prestadores de serviços públicos concedidos ou permitidos pela União ; as destinadas ao adestramento das Forças Armadas ou que sejam de interesse público, nos termos da lei (art. 3º., inciso I, alíneas a, b e c); b)- Propõe o Projeto que passem ao domínio pleno dos Estados onde se situam, as áreas nas quais tenham sido edificados prédios públicos que abriguem órgãos ou entidades da administração estadual ; as que tenham sido regularmente destinadas à utilização por prestadores de serviços públicos concedidos ou permitidos pelos Estados (art 3º inciso II, alíneas a e b ); Tais proposições preservam, portanto, no domínio da União, as áreas onde existem prédios públicos nos quais funcionem órgãos ou entidades da administração federal, bem assim aquelas utilizadas por prestadores de serviços públicos concedidos ou permitidos, como portos, atracadouros, estaleiros, etc., e ainda as que se destinam ao treinamento militar ou que sejam, genericamente, de interesse público, conforme seja assim legalmente definido.

domínio da União. Há, assim, um largo espectro de áreas mantidas sob o Por outro lado, as áreas onde hajam edificações destinadas a órgãos ou entidades da administração estadual, e as que são utilizadas por prestadores de serviços públicos concedidos ou permitidos pelos Estados, passariam ao domínio pleno dos respectivos Estados onde se situam. Cabe lembrar que o novo Código Civil, em seu art. 2.038, proibiu a constituição de enfiteuses e subenfiteuses, mantendo apenas as existentes, evidenciando, a nosso juízo, a percepção do legislador de que se trata de instituto arcaico e cuja obsolescência vem sendo objeto de consenso pela comunidade jurídica. 11)- Por outro lado, propugna a PEC que permaneçam sob domínio pleno dos respectivos donatários as áreas doadas mediante autorização em lei federal (art. 3º., inciso III). Ora, se os donatários já possuem o domínio pleno, o Projeto vem apenas explicitar e consolidar situação já existente, não havendo reparos a fazer quanto a esse aspecto. 12)- O Projeto pretende transferir ao domínio pleno dos Municípios as áreas não enquadradas em qualquer das hipóteses anteriores, as que contenham edificações de prédios públicos abrigando órgãos ou entidades da administração municipal e as atualmente locadas ou arrendadas a terceiros pela União (art. 3º., iniciso IV, alíneas a, b, c). De igual modo não vemos aí razão para impugnar, visto que ditas áreas continuarão sob domínio pleno de ente público. 13)- Em seu último dispositivo, o Projeto postula, na alínea a do inciso V do art. 3º., a transferência do domínio pleno em favor dos respectivos foreiros, desde que quites com suas obrigações, das áreas que estejam sob contrato de aforamento. Tal propositura permitiria, a nosso juízo, acabar com a instituição obsoleta da área foreira, que nenhuma função possui senão a de aumentar a

carga tributária dos contribuintes, com a cobrança de foros, taxas de ocupação e laudêmios, sem contar a burocracia a enfrentar quando da alienação do imóvel e a própria dificuldade para demarcar a linha de preamar média de 1831, objeto de centenas ou até milhares de processos judiciais. 14)- Entretanto, carecem de reparo os dois últimos itens do Projeto (alíneas b e c do inciso V), que visam transferir o domínio pleno aos cessionários das áreas que lhes foram cedidas pela União, e aos ocupantes de áreas e terrenos sob sua posse, quites com suas obrigações. Isto porque muitas áreas cedidas pela União foram certamente com uma determinada finalidade, tal como para serviços portuários, ou reparos e/ou fabricação de embarcações, clubes esportivos, estacionamento de barcos (marinas), sinalização náutica, etc., não podendo simplesmente ser transferida a propriedade plena aos cessionários, sob pena de ocorrer enriquecimento sem causa, vedado em nossa legislação ( arts. 884 e segs. do Código Civil). Por maior razão, deverá ser inadmitida a atribuição do domínio pleno aos meros ocupantes de terrenos, ainda que contribuintes e com sua taxa de ocupação em dia. Seria conferir a propriedade a quem nunca a teve, possibilitando, outrossim, a ocorrência e legitimação de ocupações irregulares com o fito de obter o título dominial. CONCLUSÃO Por todo o exposto, o presente voto é pela rejeição do parecer do relator e pela aprovação da PEC no. 399/2011, com a extinção do instituto do terreno de marinha e seus acrescidos, excluindo-se, porém, do Projeto, as áreas cedidas e as que são objeto de ocupação, que permaneceriam no domínio da União. Tal exclusão poderá ser melhor definida no regulamento preconizado no art...da proposição. Rio de Janeiro, 07 de março de 2012 Jacksohn Grossman