Registro: 2017.0000343788 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº 0001545-63.2014.8.26.0116, da Comarca de Campos do Jordão, em que é apelante SKY BRASIL SERVIÇOS LTDA, é apelado VICTOR HUGO DOS SANTOS DA SILVA (JUSTIÇA GRATUITA). ACORDAM, em 32ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso, com observação. V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores KIOITSI CHICUTA (Presidente), FRANCISCO OCCHIUTO JÚNIOR E LUIS FERNANDO NISHI. São Paulo, 18 de maio de 2017. Kioitsi Chicuta RELATOR ASSINATURA ELETRÔNICA
COMARCA: Campos do Jordão 1ª Vara Juiz Mateus Veloso Rodrigues Filho APTE. : Sky Brasil Serviços Ltda. APDO. : Victor Hugo dos Santos da Silva VOTO Nº 35.996 EMENTA: Prestação de serviços. TV por assinatura. SKY. Declaratória de inexistência de relação jurídica c.c. indenização por danos morais. Ação julgada procedente. Contratação com menor absolutamente incapaz e inserção do nome em órgão de proteção ao crédito por dívida de TV por assinatura. Aplicação do artigo 166 do Código Civil. Falta de capacidade do agente. Negócio nulo que não produz efeitos. Danos morais. Inscrição restritiva que atinge direitos da personalidade. Valor da indenização mantido. Percentual dos honorários majorados. Recurso desprovido, com observação. Nos termos do art. 166 do Código Civil é nulo o negócio jurídico celebrado por absolutamente incapaz. Diante da falta de requisito do art. 104 do CC, não há qualquer elemento que possa validar o negócio, pois imposta a sanção pela norma jurídica, de ordem pública. A inserção do nome do autor, menor, no rol dos inadimplentes causa dano moral e enseja indenização, cujo valor de R$ 7.000,00 é mantido porque razoável segundo os critérios orientadores. O percentual da verba honorária é majorado para 20% diante da expressão numérica sobre o valor da condenação a fim de remunerar dignamente o advogado. Trata-se de recurso interposto contra r. sentença de fls. 77/80 que julgou procedente a ação para declarar nulo o contrato e condenar a ré ao pagamento de indenização por danos morais de R$ 7.000,00, devidamente corrigido a partir desta data acrescido de juros de 1% ao mês desde a citação, além de honorários fixados em 10% do valor da condenação. Alega a ré que os pagamentos das mensalidades foram Apelação nº 0001545-63.2014.8.26.0116 Campos do Jordão VOTO Nº 35996 2/6
efetuados através de boleto bancário, o que causa estranheza, sendo pouco crível a alegação de desconhecimento, pois fraudadores não se preocupariam em efetuar pagamento, sendo que a representante do autor confirma não ter efetuado pagamento de modo que não sofreu prejuízo econômico. Invoca a possibilidade de terceiro, em posse dos documentos, ter efetuado a contratação. Entende que cabia à parte autora comprovar os fatos alegados e a ré não tinha outra opção senão proceder como solicitado pelo suposto estelionatário. Indica que em consulta atualizada não foi encontrada inscrição em nome do autor por parte da Sky. Sustenta a inexistência de danos morais, sendo caso de mero aborrecimento, sem prova de repercussão do dano, pleiteando, ainda, redução do valor. restaram encaminhados a este E. Tribunal. Processado o recurso com preparo e contrarrazões, os autos O Ministério Público pugnou pelo desprovimento do recurso, considerando a falta de prova de transação comercial e a responsabilidade pelo apontamento indevido que gera permanente risco a direito de personalidade. É o resumo do essencial. Consta da sentença de procedência que é incontroversa a menoridade do contratante, faltando elemento essencial ao negócio, qual seja, capacidade civil, a ensejar nulidade. Anota que ainda que se cogite de fraude, cabe à empresa verificar adequadamente a documentação do contratante, sendo indevida a cobrança e a restrição do nome. Declarou inexigível o débito em discussão. Concluiu pela lesividade da inscrição restritiva caracterizadora de dano moral. Importa para solução da lide que, embora a ré não faça qualquer referência na apelação acerca do fundamento jurídico posto na sentença, o contratante é menor impúbere (art. 3º, CC), sendo a lei expressa acerca da nulidade do negócio jurídico praticado pelo absolutamente incapaz, nos termos do inciso I, do art. 166 do CC. Diante da falta de requisito do art. 104 do CC, não há qualquer Apelação nº 0001545-63.2014.8.26.0116 Campos do Jordão VOTO Nº 35996 3/6
elemento que possa validar o negócio, pois imposta a sanção pela norma jurídica de ordem pública. O nulo não se convalida. Não há condicionantes na lei civil para a nulidade, pois não se revela interesse para o incapaz, sendo ainda constatado que o endereço indicado no documento de fl. 18 é diverso daquele indicado na inicial. Vale lembrar, ainda, a regra do art. 1691 do CC que impede que os pais contraiam obrigações em nome dos filhos que ultrapassem simples administração, exceto por necessidade e com autorização do juiz (ar. 1691, CC). Sobre a questão da fraude, a prestadora de serviços contratados tem obrigação de aferir a documentação e principalmente a capacidade da parte. Logo, diante do teor art. 166 do CC, o negócio é nulo e em consequência não produz efeitos, sendo indevida a cobrança e abusiva a inscrição. No caso, há responsabilidade da ré pelo pagamento da indenização por dano moral em decorrência da indevida inclusão do nome do autor nos órgãos de proteção ao crédito, pois mesmo não tendo qualquer vínculo com a ré, teve o nome inscrito nos órgãos de proteção ao crédito. A ofensa decorrente da inclusão do nome do autor nos órgãos de proteção ao crédito, por ato indevido da apelada, o que gera inequivocamente humilhação, constituindo tal fato violação do patrimônio ideal formado pela imagem idônea, ao bom nome e a credibilidade, em razão da inclusão do seu nome nos órgãos de proteção ao crédito. A ré, como prestadora de serviços, não se desincumbiu de suas obrigações legais, causando desgaste emocional que foge a normalidade dos casos, interferindo no comportamento psicológico do indivíduo. Não se trata de mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada e que, no dizer de Sérgio Cavalieri Filho, "fazem parte da normalidade do nosso dia-a-dia, no trabalho, no trânsito, entre os amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a Apelação nº 0001545-63.2014.8.26.0116 Campos do Jordão VOTO Nº 35996 4/6
ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo" (cf. "Responsabilidade Civil", pág. 105). Sobre dano moral, diz Carlos Alberto Bittar que na "concepção moderna da teoria da reparação dos danos morais prevalece, de início, a orientação de que a responsabilização do agente se opera por força do simples fato da violação... o dano existe no próprio fato violador, impondo a necessidade de resposta, que na reparação se efetiva. Surge ex facto ao atingir a esfera do lesado, provocando-lhe as reações negativas já apontadas. Nesse sentido é que se fala em damnum in re ipsa. Ora, trata-se de presunção absoluta ou iure et de iure, como a qualifica a doutrina. Dispensa, portanto, prova em contrário. Com efeito corolário da orientação traçada é o entendimento de que não há que se cogitar de prova de dano moral" (Reparação Civil por Danos Morais, Editora Revista dos Tribunais, 2ª ed., págs. 202/204). O arbitramento da indenização por dano moral deve ser feito com moderação, tendo em vista a natureza do dano, suas consequências nas vidas e nas condições econômicas das partes. A mensuração dos danos morais tem se constituído em verdadeiro tormento para os operadores do direito, não fornecendo o legislador critérios objetivos a serem adotados. Atribui-se ao Juiz arbítrio prudencial, com enveredamento da natureza jurídica da indenização como ressarcitória e punitiva, mas não a ponto de transformar a estimativa como resultado de critérios meramente subjetivos, ofertando a doutrina, dentre outros, análise de pormenores importantes como: a) o grau de reprovabilidade da conduta ilícita; b) a intensidade e duração do sofrimento experimentado pela vítima; c) a capacidade econômica do causador do dano; d) as condições pessoais do ofendido (cf. Antonio Jeová Santos, Dano Moral Indenizável, Editora Revista dos Tribunais, 4ª edição, pág. 186). A indenização, como anota o já citado Antonio Jeová Santos, "não pode servir de enriquecimento indevido para a vítima. Idêntico raciocínio é Apelação nº 0001545-63.2014.8.26.0116 Campos do Jordão VOTO Nº 35996 5/6
efetuado em relação ao detentor do comportamento ilícito. Uma indenização simbólica servirá de enriquecimento indevido ao ofensor que deixará de desembolsar quantia adequada, enriquecendo-se com o ato hostil e que desagradou, de alguma forma, algum ou quaisquer dos direitos da personalidade" (ob. cit., pág. 199). Com base nesses critérios e considerando as peculiaridades do caso, o valor fixado em R$ 7.000,00 mostra-se adequado para ressarcir os danos morais sofridos, condizente com a intensidade e duração dos transtornos experimentados, bem como a conduta ilícita da ré e sua capacidade econômica. O sofrimento não pode se converter em móvel de "lucro capiendo", nem a indenização pode se transformar em símbolo, sem caráter punitivo, dada a condição pessoal da ofensora. Diante do interesse de menor, a quantia decorrente da condenação deverá ficar retida em depósito judicial. Por fim, os honorários advocatícios devem ser majorados para o percentual de 20% considerando a representação econômica sobre o valor da condenação, a fim de remunerar dignamente o advogado, nos termos do 11, do art. 85 do CPC. observação. Isto posto, nega-se provimento ao recurso, com KIOITSI CHICUTA Relator Apelação nº 0001545-63.2014.8.26.0116 Campos do Jordão VOTO Nº 35996 6/6