Capítulo 3 - Métodos de Conservação de Alimentos: Uso de Calor



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Transcrição:

30 Capítulo 3 - Métodos de Conservação de Alimentos: Uso de Calor O suprimento de alimentos para humanidade necessita ocorrer diariamente, no entanto, a produção de alguns produtos e matéria prima é sazonal. Sendo assim, surge a necessidade da adoção de técnicas de conservaçãos que fundamentam no controle de três agentes de deterioração: (i) microrganismos, (ii) enzimas contidas nos próprios alimentos, e (iii) reações químicas que promovem transformações. Desta forma, é necessário o emprego de processos que possuem por princípios: a) A prevenção ou o retardamento da decomposição microbiana: Isto pode ser feito por meio de operações, tais como: (i) assepsia, (ii) filtração, (iii) centrifugação, (iv) inibição de atividade pelo uso de baixas temperaturas, redução do teor de umidade de alimentos, imposição de condição anaeróbica ou aeróbica, ou adição de aditivos, e (iv) eliminação dos microrganismos pelo uso de calor, radiações, ou germicidas. b) A prevenção ou retardamento da autodecomposição dos alimentos: Isto pode ser feito por meio de operações, tais como: (i) destruição ou inativação de enzimas, e (ii) prevenção ou retardamento de reações químicas, como por exemplo, com o uso de substâncias antioxidantes. Para demonstrar a necessidade do uso do emprego de métodos de conservação de alimentos, Deathrage, citado por Camargo et al. (1989), apresenta, Tabela 1. Os dados referem a uma comparação em que é definido o número de pessoas a alimentar, durante um determinado período de tempo. Isto considerando as possibilidades de não haver desperdício. Os cenários comparados referem ao uso de refrigeração e as condições climáticas pertinentes às regiões frias e quentes. Tabela 1 Período de consumo e número de pessoas necessárias para consumir os produtos, sem desperdício. Número de Pessoas a Alimentar Uso de Sem Refrigeração Refrigeração Climas Frios Climas Quentes Período de Consumo 14 dias 4 dias 1 dia 450 kg de carne de vaca 80 300 1.200 90 kg de carne de porco 14 50 200 2 kg de carne frango 0,25 1 4 9 kg de leite pasteurizado 0,70 2,5 100 Período de Consumo 3 dias 1 dia 0,5 dia 9 kg de leite cru 3 10 20 Período de Consumo 150 dias 40 dias 15 dias 450 kg de maças 12 50 120 Período de Consumo 10 dias 4 dias 2 dias 275 kg de pêssego 45 150 300

31 O método de conservação de alimentos a ser utilizado irá depender de fatores, tais como: (i) natureza do alimento, (ii) período de tempo a conservar, (iii) custo do processo, e (iv) os agentes de deterioração envolvidos. Neste capítulo são discutidos o uso dos processos auxiliares e os métodos de conservação de alimentos utilizando calor. 3.1 Processos auxiliares Dentre os processos auxiliares podem ser citados a assepsia, remoção de microrganismos por meio físico e a imposição de condições anaeróbicas ou aeróbicas. a) Assepsia Em sistemas agroindustriais, o termo assepsia significa a adoção de procedimentos que evitem ou minimizem a contaminação da matéria prima a ser processada, bem como, de seu produto final. Normalmente, os tecidos dos animais ou vegetais ao serem obtidos são livres de microrganismos. A partir de suas obtenções as colônias de microrganismos passam infectá-los e utilizá-los como substrato para o desenvolvimento. Dentre as medidas utilizadas destacam: (i) a limpeza e sanitização do ambiente industrial pelo uso de detergentes tipos alcalinos, ácidos e tensoativos, uso de vapor e/ou água quente e radiação ultravioleta; e (ii) limpeza da matéria prima por meio da remoção de impurezas como restos de vegetais, terra e poeira, o que pode ser feito pelo uso de peneiras, escovas e jatos de água. b) Remoção de microrganismos por meio físico Esta operação não trata de um processo de conservação de alimentos. No entanto em operações como lavagem, remoção de partes deterioradas, filtração, centrifugação e sedimentação, pode ser reduzida a população de microrganismos que atuam sobre um determinado tipo de matéria prima. Desta forma, estes tipos de procedimento podem reduzir a necessidade do emprego emprego de tratamentos térmicos mais severos durante o processamento. c) Imposição de condições anaeróbicas ou aeróbicas. Na indústria pode ser empregada a substituição do ar presente nos alimentos por gases inertes como o gás carbônico, e nitrogênio. Assim, é imposto uma condição anaeróbica. Isto é empregado, principalmente, quando certos esporos de bactérias são resistentes ao calor, no entanto, este são incapazes de desenvolverem na ausência de oxigênio. Por outro lado, há tipos de produtos, infestados por bactérias anaeróbicas, que para dificultar o seu desenvolvimento é recomendado gerar um ambiente com concentração de oxigênio. 3.2 Conservação de alimentos pelo uso do calor Os principais métodos de tratamento térmico são: pasteurização, tindalização, branqueamento, apertização, esterilização e a secagem. A exceção do último tratamento é

32 sabido que alguns fatores intrínsecos e extrínsecos ao produto afetam a resistência dos microrganismos e seus esporos a exposição ao calor. Dentre estes fatores os principais são o ph, o tipo de meio utilizado para transmissão de calor, e a constituição do alimento. O ph afeta acentuadamente a tolerância dos microrganismos ao calor. Quanto mais baixo o ph (maior acidez) menor é a resistência dos microrganismos. Como também, menos estáveis são as proteínas e enzimas, dos alimentos. A maioria dos microrganismos patogênicos são completamente inibidos para valores de ph entre 3,0 a 3,5. Desta forma, a escolha do tipo de tratamento térmico a ser utilizados está altamente relacionado ao ph do alimento. Em razão disto os alimentos são classificados em dois grandes grupos: (i) pouco ácidos ph acima de 4,5, e (ii) ácidos ph abaixo de 4,5. A Tabela 2 apresenta como o ph influência à resistência dos esporos da bactéria Bacillus subtilis. Tabela 2 Resistência térmica dos esporos da bactéria Bacillus subtilis ao ser alterado o valor do ph. ph 4,4 5,6 6,8 7,6 8,4 Tempo, em minutos, para 2 7 11 11 9 destruição a 100 o C Fonte: Williams (1929) citado por Camargo et al (1989) O tipo de meio utilizado para transmissão de calor, está associado quantidade de vapor de água existente no ar utilizado para a condução de calor. O calor seco, baixo valor de umidade relativa, promove o processo de oxidação sobre os microrganismos, enquanto que o calor úmido promove com maior eficiência na coagulação de proteínas dos microrganismos. O que inativa o metabolismo e a procriação. É sabido que os alimentos mais secos demandam maior quantidade de calor para a esterilização do que os alimentos com maior teor de umidade. Quanto à constituição dos alimentos tem-se: (i) a concentração de carboidratos solúveis no meio aumenta a resistência térmica dos esporos, porque há diminuição da atividade aquosa (a a ), além disto os carboidratos funcionam como isolantes térmicos, (ii) a presença de sais inorgânicos, tais como o cloreto de sódio (até 4%) pode aumentar a resistência, mas se a concentração for superior a 8% há decréscimo de resistência, e (iii) as gorduras aumentam a resistência dos esporos, pois aumentam a probabilidade destes usarem a gordura como proteção térmica. 3.2.1 Pasteurização A pasteurização é tipo de tratamento térmico empregado quando: (i) o alimento a ser conservado (exemplo leites e sucos) é susceptível a danos quando da exposição a altas temperaturas, (ii) os agentes microbianos causadores das alterações apresentam baixa termorresistência, e (iii) os agentes competitivos podem ser eliminados sem prejudicar os agentes benéficos, requeridos em um determinado processo de fermentação. Por exemplo na fabricação de iogurtes. Na pasteurização são destruída parte dos microrganismos presentes nos alimentos, sendo recomendado em sequência o emprego de cuidados complementares, como: o uso da refrigeração (caso do leite), a adição de açúcar (leite condensado), e/ou o estabelecimento de condições anaeróbicas como fechamento de recipientes a vácuo.

Os tipos de pasteurização empregados são: 33 (i) Pasteurização rápida (HTST high temperature and short time) como exemplo pode ser citado o beneficiamento de leite. Neste caso, o produto é submetido à temperatura de 72 o C durante 15 segundos e em seqüência é refrigerado a 5 o C. Isto é possível pela passagem do liquido por trocadores de calor a uma vazão que permite o contato do leite com a temperatura 72 o C por 15 segundos; e (ii) Pasteurização lenta (LTLT low temperature, long time) para o leite é empregado a temperatura de 62 o C durante 30 minutos. Este tipo de tratamento é recomendado para pequenas unidades industriais, pois o fator limitante é o tamanho do recipiente a ser utilizado para o aquecimento da matéria prima. 3.2.2 Tindalização Este método foi proposto pelo físico inglês John Tyndall. O processo consiste em submeter o alimento a temperaturas, que podem ser de 60 a 90 o C, durante alguns minutos por várias vezes intercalados de períodos de resfriamento. Assim, o produto é aquecido e em seqüência refrigerado por 24 horas, período em que os esporos tomam a forma vegetativa. Em seqüência procede-se novo aquecimento. O número de aquecimentos pode variar de 3 a 12 para a obtenção do nível de esterilização desejado. A vantagem do método está em preservar as qualidades organolépticas do produto. 3.2.3 Branqueamento Este processo consiste em mergulhar o alimento em água aquecida ou insuflar vapor sobre este, durante um curto espaço de tempo, 2 a 10 minutos. É recomendado o imediato resfriamento em água fria. O branqueamento é indicado para frutas e hortaliças, em que a principal finalidade de inativar enzimas. Este tratamento é comumente recomendado antes dos processos de congelamento, desidratação e apertização. Nestes casos, o tratamento de branqueamento evita a ocorrência da alteração de cor, sabor, aroma, textura e valor nutritivo. No processo de apertização (produção de enlatados) o branqueamento possui por objetivos: (i) remover gases dos tecidos, (ii) inativar enzimas, (iii) promover desinfecção externa do produto e embalagens, (iv) fixar cor e textura, e (v) pré-aquecer o produto, o que diminui o tempo de uso da autoclave. 3.2.4 Apertização O processo de apertização foi patenteado em 1809, pelo confeiteiro parisiense Nicolas Appert. Ele ganho o premio de 12.000 francos por ter descoberto um processo que possibilita a conservação de alimentos por um longo período de tempo. O premio foi proposto em concurso estipulado pelo imperador Napoleão. O processo descoberto por Appert consistia em acondicionar os produtos em jarros hermeticamente fechados com rolhas e então aplicar calor por meios de banhos em água

34 aquecida por um determinado período de tempo. O tempo de aplicação foi definido empiricamente. Em 1810, Peter Durand patenteou o processo semelhante, porém empregando latas. Esta erá confeccionada em chapas de ferro revestidas de estanho. Em 1813 o exército e marinha britânica começou a utilizar carnes, sopas e várias combinações de legumes enlatados. Duas latas deixadas pelo Capitão Edward Parry em sua expedição ao Ártico em 1824, foram descobertas em 1911 (87 anos após) em boas condições. Estas foram abertas e consumidas na Inglaterra e continham ervilha e carne de boi, respectivamente. Um grande impulso ao processo de apertização foi dado em 1904 com a invenção das latas recravadas pela Sanitary Can Company. Até então as latas eram lacradas com o uso de soldas. Na atualidade existem vários modelos de recravadeiras que são as máquinas utilizadas no fechamento das latas. Nota: Para maiores detalhes sobre o uso de latas, vidros e outros tipos de embalagens é recomendado a leitura do Capítulo 6 do livro do Gava (1985). 3.2.4.1 Apertização de Sardinha No Brasil o peixe mais usado como matéria prima em apertização é a sardinha, e em seguida o atum e cavalinha. No processamento da sardinha são desenvolvidas as seguintes operações unitárias: 1. Lavagem e escamação estas operações são feitas simultaneamente em máquinas que dispõem de tambores com telas corrugadas. Durante a passagem é feito a lavagem e remoção das escamas. 2. Evisceração nesta operação são removidas as vísceras e cabeça. A operação pode ser manual ou mecânica. Nesta última as vísceras são removidas a vácuo. No caso de sardinhas cozidas diretamente na lata, nesta etapa também são removidas a cauda e nadadeiras. Operação que é denominada toalete. 3. Salga - a sardinha deve ter concentração de sal próxima a 2 %. A salga é feita em salmoura concentrada o que pode durar de 1 a 1,5 horas. Sardinha a ser acondiciona em óleo demanda maior tempo na salga do que as a serem acondicionadas em molhos de tomate. 4. Cozimento - tem por objetivo remover água dos tecidos dos peixes para torná-los mais resistentes ao manuseio posterior. Geralmente é empregado vapor a baixa pressão. Neste operação até 25 % da água do produto pode ser perdida. 5. Exaustão em latas de pequeno porte esta operação não é realizada. Para maiores é realizada em ambientes a vácuo ou pode ser feita por meio do tratamento branqueamento. Outra forma é o enchimento das latas com óleo ou molhos quentes e procede-se a recravação da lata em seqüência. 6. Recravacão - consiste proceder ao fechamento hermético da lata por meio do equipamento denominado recravadeira. 7. Tratamento térmico Apertização as latas são acondicionas em autoclaves onde são submetidas à alta pressão e temperatura (aproximadamente 120 o C).

35 8. Rotulagem É procedida a rotulagem do produto conforme as normas do Ministério da Agricultura. 9. Embalagem e armazenagem as latas são acondicionadas em caixas de papelão que são encaminhadas aos armazéns de expedição. Lavagem e Escamação Evisceração Salga Cozimento Exaustão Recracação Tratamento Térmico Rotulagem Embamagem e Armazenagem Figura1 Fluxograma de apertização de sardinhas. 3.2.4.2 Equipamentos utilizados na apertização a) Cozedor rotativo Operam a pressão atmosférica ou sob-pressão. Podem ser empregados no tratamento térmico de frutas, hortaliças ou qualquer outro tipo de alimento. Os tipos mais comuns possuem um setor de cozimento e outro de resfriamento. Dentro da estrutura do equipamento existe uma espiral que conduz as latas de uma extremidade à outra. As latas movimentam em razão do movimento giratório do tambor. Pelo fato da constante agitação das latas é acelerada a penetração de calor, o que diminui o tempo de tratamento térmico. b) Autoclave Autoclave também denominada retordas, constitui em um recipiente fechado onde os produtos são submetidos a altas temperaturas sob alta pressão. Nesta condição os produtos podem ser submetidos a temperaturas superiores a 100 o C sem que haja a ebulição da água. O que protege a constituição organoléptica dos alimentos. O princípio de funcionamento das autoclaves é o mesmo das panelas de pressão domésticas. Os tipos mais comuns de autoclave são a fixa e descontínua, podendo ser vertical ou horizontal (Figuras 2 e 3). A principal finalidade da autoclavagem é evitar o desenvolvimento de microrganismos, produzindo em conseqüência um certo cozimento do produto. Antigamente o tempo, temperatura e pressão a serem utilizadas eram definidos empiricamente. Na atualidade estes parâmetros são determinados através estudos científicos altamente desenvolvidos. O vapor é o meio de transferência de calor na maioria das autoclaves. Água aquecida normalmente é utilizada no processamento de produtos acondicionados em vidros c) Esterilizador hidrostático Esterilizador hidrostático (Figura 4) ou autoclave hidrostática é um sistema contínuo com capacidade de processamento de 100 a 1.000 latas por minuto. Basicamente o equipamento consiste em um tudo em U alargado na parte central onde ocorre o tratamento térmico. As extremidades do são colunas cheias de água, sendo a de entrada com água

36 aquecida e a de saída com água fria. As latas ou outros recipientes são conduzidos por meio de esteiras externamente e dentro do equipamento. Figura 2 Uma bateria de autoclaves horizontais Figura 3 Autoclave horizontal de grande porte sendo utilizada na esterilização de substrato para o cultivo de cogumelos 3.2.5 Esterilização Consiste na destruição drástica da população de microrganismos, o que é denominado produtos comercialmente estéril. O tratamento UHT (ultra-high temperature) é muito utilizado no tratamento de cremes utilizados em café, sucos e leite embalado em caixas. Os produtos são submetidos a entre 120 o C por frações de segundos, tendo em seqüência a rápida redução de temperatura, quando então são envasados em recipientes especiais. Por causa do nível de temperatura empregado os produtos podem tem o sabor de cozidos. 3.6 Temperatura e tempo de aquecimento em tratamentos térmicos Para ser definido a termorresistência de uma da espécie de microrganismo é necessário conduzir experimentos que visem determinar qual o tempo necessário de exposição para que seja eliminado 90% da população. Este tempo é uma unidade fundamental para que seja definido o valor da variável D, sendo que:

D T = min Onde, 37 D = é o tempo necessário expresso em minutos para a redução da população viável de microrganismo a um décimo do número inicial, e T = é a temperatura em que fora feito a determinação. Legenda: 1 Primeiro estágio de aquecimento. 2 Selo de água e segundo estágio de aquecimento. 3 Terceiro estágio de aquecimento. 4 Seção de aplicação do tratamento. 10 Primeiro estágio de resfriamento. 10 Segundo estágio de resfriamento. 7 Terceiro estágio de resfriamento. 8 Quarto estágio de resfriamento. 9 Estágio final de resfriamento. 10 Polia superior para o acionamento da correia transportadora. Figura 4 - Esterilizador hidrostático Importante frisar que a determinação da variável D refere à população de um determinado microrganismo, não a população das diversas espécies que estão a infestar o alimento. A importância da determinação do valor da variável D está em poder ser calculado previamente a quantidade de microrganismos a ser destruídos em função do tempo de aquecimento. Por exemplo, se uma população de microrganismo for exposta ao calor por D minutos, ao final ter-se-á destruído 90% dos elementos viáveis. Se for repetido o aquecimento por mais D minutos, a população sobrevivente do primeiro ciclo será reduzida em 90%, e assim sucessivamente. Para ilustrar este raciocínio é apresentada na Tabela 3 a percentagem de bactérias mortas em função do tempo de aquecimento. O valor da variável D é obtido a partir da curva de sobrevivência térmica. A curva (Figura 5) é obtida por meio de um gráfico em escala semilogarítimica. A ordenada, em escala logarítmica, representa o

38 número de células vivas remanescentes de uma suspensão de bactérias (ou esporos), e abscissa corresponde o tempo de aquecimento a um a temperatura constante. Tabela 3 Percentagem de bactérias mortas em função do tempo de exposição ao calor N o de D Tempo (min) N o de bactérias viáveis N o de bactérias mortas Total de bactérias mortas % mortas 0 0 1.000.000 0 0 0 1D 2 100.000 900.000 900.000 90 2D 4 10.000 90.000 990.000 99 3D 6 1.000 9.000 999.000 99,9 6D 12 1 9 999.999 99,9999 8D 16 0,01 0.09 999.999,99 99,999999 Fonte: Camargo et al. (1989) As bactérias empregadas nos testes de enlatamento, dentre outras, são Putrefactive anaerobe e Bacillus stearothermophilus, denominadas como PA 3679 e FS 1518. Conforme as normas americanas em tratamentos térmicos de produtos não ácidos a população de organismo teste PA 3679 deve ser suficiente para reduzir a população inicial de 10 12 indivíduos para 1 individuo. Isto para uma amostra de 1 ml. Portanto o tratamento térmico deve ser suficiente para promover a redução da população em 12 reduções decimais, ou seja 12 D. Para efeito comparativo é sabido: (i) D 250 (250F = 121 o C) para bactéria PA 3679 varia de 1,5 a 3,0 minutos, (ii) D 250 ( 250F = 121 o C) para bactéria FS 1518 varia de 4,0 a 5,0 minutos, e (iii) D 150 ( 150F = 66 o C) para bactérias láticas varia de 0,5 a 1,0 minuto. Normalmente os alimentos recebem o tratamento térmico 12 D, no entanto alimentos ácidos podem receber somente 5 D. Na pasteurização normalmente é um tratamento 4 D, que significa a morte de 99,99% dos microrganismos que se deseja eliminar. No. de sobreviventes / ml 10.000 1.000 100 10 A uma temperatura constate D 10 15 20 30 Tempo - mimuto Figura 5 - Curva de sobrevivência térmica O valor de D pode ser determinado para diversas temperaturas, tais como 100, 105, 110, 115, 120 e 125 o C, podendo ser assim construída uma curva dos valores de D.