CLIMA. Alterações climáticas. barragens e regadio no Sul. vâo limitar. em diferentes países, devido à ocorrência de eventos climáticos extremos

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Exemplo 3. Operação de uma albufeira. IST: Gestão Integrada de Bacias Hidrográficas Rodrigo Proença de Oliveira,

Transcrição:

Barragem doalqueva: aquecimento global ameaça viabilidade da aposta no regadio CLIMA Alterações climáticas vâo limitar barragens e regadio no Sul IPCC alerta para probabilidade de "falhas sistémicas" envolvendo vários sectores, em diferentes países, devido à ocorrência de eventos climáticos extremos Ricardo Garcia mais barragens e apostar na agricultura de regadio são algumas opções recentes de Portugal que Construir poderão estar em causa no futuro, devido à subida do termómetro global, segundo um novo relatório da ONU sobre as alterações climáticas. Uma Europa mais quente irá enfrentar mais "falhas sistémicas", afectando inúmeros sectores e países ao mesmo tempo. Com um clima mais seco e menos água nos rios, a produção hidroeléctrica no Sul da Europa pode cair até 15% em 2050, em relação a 2005. Pelo mesmo motivo, a rega não será boa alternativa para compensar os efeitos das alterações climáticas na agricultura, onde pode haver perdas até 25%, num cenário extremo. A contradição entre as apostas de hoje e o que pode acontecer no futuro é um dos alertas que emergem do novo relatório do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), cuja síntese é divulgada hoje em Yokohama, no Japão. É o segundo volume de uma série de três sobre as causas, as consequências e as soluções daquele que é tido como o

maior desafio da civilização humana neste século. Cientistas e governos discutiram palavra a palavra, em Yokohama na útlima semana, a redacção final do "sumário para decisores políticos", um documento com cerca de 30 páginas que é agora divulgado. O resumo baseia-se num documento maior, com mais de 2000 páginas, que avaliam minuciosamente o que a ciência sabe sobre os impactos do aquecimento global, que será disponibilizado nos próximos dias. Segundo o rascunho final deste documento alargado, visto pelo PÚ- BLICO, os impactos na Europa - que ocupam um dos 30 capítulos do relatório - serão sentidos sobretudo nos países do Sul, como Portugal. Sectores como a saúde, o turismo, a energia, as florestas e a agricultura serão particularmente afectados. O relatório porá em evidência a complexa ramificação de efeitos que os europeus vão sentir. Um bom exemplo é o da energia. As necessidades de aquecimento podem diminuir 11% a 20% até 2050 e as de arrefecimento podem subir 74% a 118% até 2100. Como há menos casas hoje com ar condicionado do que com aquecimento central, o saldo final pode ser positivo. Ou seja, a Europa vai consumir menos electricidade para produzir calor e frio. O sistema eléctrico vai ter, no entanto, de se preparar para mais picos de consumo no Verão, sobretudo em países que hoje têm temperaturas moderadas nessa estação. Além disso, a forma como a electricidade será produzida enfrentará novas dificuldades. Até 2050, não estão previstas grandes alterações na energia eólica, mas na segunda metade do século o seu potencial pode decrescer. Com as mudanças regionais na quantidade de chuva, a produção hidroeléctrica pode aumentar 5% a 14% na Escandinávia, mas diminuir em 6% a 36% na Europa continental e 5% a 15% na Europa do Sul até 2100. As centrais térmicas enfrentarão problemas com os seus sistemas de arrefecimento no Verão, devido ao menor caudal dos rios. Pode haver uma queda de 6% a 19% na sua operação durante o Verão. Na agricultura, o Norte da Europa sairá beneficiado, com aumento na produtividade, mas o Sul poderá sofrer grandes prejuízos. Se a temperatura média na região subir 5,4 graus Celsius - um cenário extremo -, as culturas de sequeiro podem ter perdas de até 25% em 2080, sacrificando 1% ao PIB. Aumentar o regadio "pode não ser uma opção viável", devido à redução da água que corre nos rios e está depositada no subsolo, segundo a versão preliminar do relatório. Um estudo referente à Itália, citado no documento, estima que os custos do regadio podem subir até 27%. O risco de incêndios florestais vai aumentar ainda mais no Sul da Europa, com estações de fogos mais longas, mais dias de perigo elevado e um aumento da área em ardida em três a cinco vezes, num dos cenários mais desfavoráveis de subida da temperatura até 2100. Eventos extremos Um dos principais alertas do relatório refere-se ao aumento da probabilidade de que eventos extremos, como ondas de calor e cheias na Europa, causem "falhas sistémicas" em vários sectores, de vários países, ao mesmo tempo. Ondas de calor mais frequentes não só aumentarão a mortalidade no Verão, sobretudo no Sul da Europa, como terão efeitos simultâneos na agricultura, florestas, produção e uso de energia, transportes, turismo, produtividade do trabalho e construções. 0 mesmo vale para as cheias no litoral - como as que ocorreram neste último Inverno em Portugal. Se nada for feito, espera-se que a população em risco na costa, em toda a UE, no final do século aumente em 775 mil a 5,5 milhões de pessoas e que os custos atinjam 17 mil milhões de euros por ano. A palavra-chave obrigatória é adaptação, já que muitos efeitos apontados no relatório serão sentidos com um aumento de apenas um grau Celsius em relação a meados do século XIX. E a temperatura média da Terra já subiu 0,8 graus e na Europa 1,3 graus. Algumas estimativas colocam o custo desta adaptação em 3500 milhões de euros por ano para o litoral, em 2100, e de 7900 milhões de euros por anos para as cheias dos rios, em 2080. 0 relatório do IPCC salientará que medidas de adaptação podem ser eficazes na protecção dos riscos da subida do nível do mar. E irá referir também que muitos países europeus já têm estratégias climáticas para o futuro. Mas alerta para o facto de não haver provas de que estejam mais bem preparados para enfrentar um dos maiores problemas previstos, as ondas de calor. O leque de possíveis efeitos das alterações climáticas é enorme. A diversidade de animais e plantas pode diminuir no Sul da Europa e aumentar no Norte. As aves, por exemplo, podem passar a fazer os seus ninhos até 550 quilómetros a nordeste de onde hoje fazem, em 2100. O relatório citará também efeitos em áreas tão específicas como a produção de vinhos, os acidentes rodoviários ou o património cultural. Em Setembro passado, o IPCC já tinha divulgado um primeiro relatório a realçar a responsabilidade humana no aquecimento global mais recente e a projectar um aumento de até 4,8 graus na temperatura e uma subida de até 82 centímetros no nível médio do mar até 2100. Em Junho, será divulgado um terceiro relatório sobre o que fazer para minimizar o problema. Os três relatórios formam a quinta avaliação do conhecimento científico sobre as alterações climáticas feita pelo IPCC desde a sua criação em 1988. A avaliação anterior era de 2007. A população em risco no litoral da União Europeia será de 5,5 milhões de pessoas em 2100

Os alertas do IPCC Algumas conclusões globais do relatório Situação actual A Terra já está a enfrentar impactos "abrangentes e consequentes" das alterações climáticas. Por exemplo, mudanças no padrão de chuvas e o derretimento da neve e do gelo estão já a alterar o regime hidrológico. Na biodiversidade, também já se nota alteração na distribuição de algumas espécies. Alimentação É um dos grande alertas: a produtividade agrícola, a nível mundial, pode cair até 2% por década ao longo do século. Mas o consumo de alimentos poderá subir 14% por década, até 2050. Com apenas um grau Celsius a mais do que os níveis pré-industriais, haverá perdas nas culturas de trigo, arroz e milho nas regiões tropicais e temperadas. Noutras zonas do globo, pode haver ganhos. Água Haverá menos água disponível nas regiões secas subtropicais, mas mais nas altas latitudes. Num cenário com uma população mundial 7% maior do que a de hoje, por cada grau a mais no termómetro global, haverá menos 20% de disponibilidade de água. Cheias Até 2100, centenas de milhões de pessoas estarão em risco de ser afectadas por cheias no litoral, a maior parte na Ásia. Nos próximos cem anos, o número de pessoas expostas a uma cheia numa bacia hidrográfica será três vezes maior no pior cenário (até 4,8 graus de aumento da temperatura), em comparação com o menos grave (até 1,7 graus). Conhecimento A literatura científica sobre os impactos e a adaptação às alterações climáticos mais do que duplicou entre 2005-10, mas há menos estudos nos países em desenvolvimento. Entrevista Ricardo Garcia 0físico Filipe Duarte Santos, da Universidade de Lisboa, foi um dos revisores do relatório do IPCC. Coordenador dos primeiros estudos multidisciplinares sobre o impacto das alterações climáticas em Portugal, foi agora escolhido pelo Governo para rever a estratégia de gestão das zonas costeiras. Qual é a principal nova mensagem deste relatório? O mais importante são as implicações sobre a segurança alimentar a nível global. No quarto relatório [de 2007] não estava dito com tanta clareza. Este quinto relatório evidencia uma preocupação muito grande nessa área a médio e longo prazo. Quais são os sinais de alarme? São sobretudo os fenómenos meteorológicos extremos. Por exemplo, uma seca grave numa região que desempenha um papel importante no abastecimento de cereais. Um caso concreto foi a 'Não há maneira de fazer parar a subida do nível do mar' grande seca e onda de calor na Rússia em 2009/2010. A Rússia deixou de exportar e isso teve repercussões mundiais, os preços aumentaram. Como tudo indica que no futuro teremos fenómenos extremos mais frequentes, o impacto na produção agrícola será significativo. As ondas de calor serão um dos principais impactos no Sul da Europa. Está a ser feito o suficiente em termos de adaptação em Portugal? Tem sido feito um trabalho bastante bom pela Direcção-Geral de Saúde e pelo Instituto Ricardo Jorge. Existe um sistema de alerta, o ícaro, que é bastante bom. Mas temos falhas que resultam também da situação de crise permanente. Sabendo que o mar vai avançar em Portugal, devemos proteger ou demolir as construções em zonas de risco? Há três tipos de resposta. Uma é a protecção. É o que se faz na Holanda: eles têm uma linha, que é a da costa em 1990, que consideram como "fronteira da guerra". Vão defendê-la. Não é uma estratégia que se possa adoptar para toda a costa portuguesa. Outra opção é acomodar, ou seja, uma protecção mais flexível com a ajuda da natureza, iniciativas de defesa sem obras de engenharia pesadas. E finalmente há outra estratégia que é a retirada. Mas tem de ser muito bem pensada, com a participação das populações. E a informação é essencial. Sem que as pessoas tenham um conhecimento do que se está a passar e do que se irá passar com a subida do nível do mar, o diálogo é extremamente difícil. O IPCC diz que com um grau a mais na temperatura global haverá impactos importantes. Isto significa que o limite de dois graus adoptado internacionalmente já não é seguro? Há um artigo recente que calcula qual é a subida do nível médio do mar que está comprometida com um aumento de um grau na temperatura global. É de 2,3 metros, ao longo de muitos

séculos. Não temos maneira de fazer parar isso. Na Costa da Caparica, há 126 mil anos, quando a temperatura global era dois graus mais elevada do que agora, o nível médio do mar era cerca de quatro metros mais alto. É muito arriscado dizer que está tudo bem até dois graus. Os relatórios do IPCC põem um ponto final nas vozes cépticas quanto ao aquecimento global? Creio que não. Há pessoas que defendem que não há alterações climáticas ou de que há imensas dúvidas, sem grande fundamento científico. E isto é alimentado por pessoas que fazem disso uma forma de visibilidade. Portanto, não vai calar os cépticos. É um fenómeno que nos vai acompanhar nos próximos 100, 200 anos. Mesmo quando o nível médio do mar tiver subido um metro, continuará a haver cépticos.