Eficiência dos métodos de avaliação clínico (teste de O Brien) e de imagem (artrorressonância magnética) no diagnóstico das lesões SLAP no ombro *

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Transcrição:

Eficiência dos métodos de avaliação clínico (teste de O Brien) e de imagem (artrorressonância magnética) no diagnóstico das lesões SLAP no ombro 461 ARTIGO ORIGINAL Eficiência dos métodos de avaliação clínico (teste de O Brien) e de imagem (artrorressonância magnética) no diagnóstico das lesões SLAP no ombro * Efficiency of the evaluation, clinical (O Brien test) and imaging (Arthro-MRI) methods in the diagnosis of shoulder SLAP lesions GLAYDSON GOMES GODINHO 1, JOSÉ MÁRCIO ALVES FREITAS 2, FLÁVIO DE OLIVEIRA FRANÇA 3, ALEXIA ABUHID LOPES 4, ADRIANO JORDÃO MILAZZO 5, CRISCHIMAN DAL ZOTTO 5 RESUMO Objetivo: Avaliar a eficiência do teste de O Brien e da artrorressonância (artro-rm) no diagnóstico da lesão SLAP. Métodos: Foi feito estudo prospectivo de 75 pacientes com suspeita clínica e/ou em estudo por imagem de lesão SLAP. Todos os pacientes foram submetidos à cirurgia artroscópica para confirmar ou não a lesão. As análises dos resultados foram feitas através do índice de concordância kappa e teste exato de Fisher. Resultados: Tanto o teste de O Brien quanto a artro-rm não se mostraram elementos seguros de diagnóstico. A sensibilidade e especificidade do teste de O Brien foram de, respectivamente, 66,7% e 25%; a sensibilidade e especificidade do exame de artro-rm, respectivamente, de * Trabalho realizado pelo grupo de cirurgia de ombro e cotovelo do Hospital Ortopédico-AMR e Hospital Belo Horizonte, Belo Horizonte (MG) Brasil. 1. Chefe do Serviço de Cirurgia do Ombro dos Hospitais Ortopédico-AMR e Belo Horizonte. Belo Horizonte (MG) Brasil. 2. Assistente do Serviço de Cirurgia do Ombro dos Hospitais Ortopédico- AMR e Belo Horizonte. Belo Horizonte (MG) Brasil. 3. Assistente do Serviço de Cirurgia do Ombro do Hospital Ortopédico-AMR. Belo Horizonte (MG) Brasil. 4. Radiologista do Axial-Centro de Imagem, Belo Horizonte (MG), Brasil, 5- Residente do Serviço de Cirurgia do Ombro do Hospital Ortopédico-AMR. Belo Horizonte (MG) Brasil. Endereço para correspondência: Rua Prof. Otavio Coelho de Magalhães, 111, Mangabeiras 30210-300 Belo Horizonte (MG) Brasil. Tel.: 55 31 3289-1212. E-mail: centrodeestudosho@hotmail.com Recebido em 26/1/ 06. Aprovado para publicação em 6/12/ 06. Copyright RBO2006 54,9% e 50%. A associação dos métodos diagnósticos diminui a sensibilidade (47,1%), porém aumenta a especificidade (70,8%). Conclusão: As lesões SLAP continuam sendo de difícil diagnóstico. Não existe teste clínico ou exame de imagem que possa diagnosticá-la com eficiência. A artroscopia continua sendo o melhor procedimento no diagnóstico dessa lesão. Descritores Articulação do ombro/cirurgia; Articulação do ombro/ lesões; Instabilidade articular; ; Imagem por ressonância magnética; Estudos prospectivos ABSTRACT Objective: To evaluate the efficiency of the O Brien test and of arthroresonance (Arthro-MRI) in the diagnosis of SLAP lesion. Method: A prospective study of 76 patients with clinical and/ or imaging study suspicion of SLAP lesion. All patients were submitted to arthroscopic surgery to confirm the lesion. Results analysis was performed by the Kappa concordance index and by Fisher s Exact test. Result: Neither the O Brien test nor the Arthro-MRI showed to be safe for diagnosis. The sensitivity and the specificity of the O Brien test were 66.7% and 25%, respectively; and the sensitivity and specificity of the Arthro-MRI examination were 54.9% and 50%, respectively. The association of diagnostic methods decreases the sensitivity (47.1%), but increases the specificity (70.8%). Conclusion: SLAP lesions continue to be difficult to diagnose. There is no clinical test or imaging study that may diagnose them efficiently. Arthroscopy still is the best procedure to diagnose SLAP lesions. Keywords Shoulder joint/surgery; Shoulder joint/ injuries; Joint instability; Arthroscopy; Magnetic ressonance imaging; Prospective studies

462 Godinho GG, Freitas JMA, França FO, Lopes AA, Milazzo AJ, Dal Zotto C INTRODUÇÃO A lesão ântero-póstero-superior do lábio glenóideo (lesão SLAP) tornou-se reconhecida como uma causa clínica importante de dor no ombro. Essa porção do lábio é funcionalmente importante porque age como estabilizador dinâmico na inserção do tendão da cabeça longa do bíceps junto à glenóide. São lesões mais freqüentes em atletas (principalmente em arremessadores), podendo estar presentes também em indivíduos que sofrem queda com apoio no membro superior em abdução e flexão, mecanismo que provoca tração no tendão da cabeça longa do bíceps (1). O objetivo do trabalho é avaliar a especificidade e sensibilidade do teste clínico de O Brien e exame de imagem por artrorressonância magnética (artro-rm), através da confirmação ou negação de sua positividade pelo procedimento artroscópico. MÉTODOS No período compreendido entre dezembro de 2000 e julho de 2005 foram submetidos à artroscopia de ombro, no Hospital Ortopédico-AMR e Hospital Belo Horizonte, em Belo Horizonte (MG), 78 pacientes com suspeita diagnóstica clínica e/ ou por imagem de artro-rnm, de lesão SLAP. Para a realização deste estudo, foram excluídos três pacientes que apresentavam prontuários incompletos. Os 75 pacientes restantes foram avaliados clinicamente por meio do teste de O Brien. A pesquisa diagnóstica por imagem foi feita através da artro- RNM, realizada por uma única médica radiologista, especialista em sistema músculo-esquelético (figura 1). Os diagnósticos foram confirmados ou não, através da artroscopia (figura 2). O teste clínico de O Brien, utilizado por nós, foi descrito em 1998 e é executado em dois tempos: primeiro, com o paciente fletindo o ombro em 90º e aduzindo 15º com o cotovelo em extensão e antebraço em pronação (polegar aponta para o solo). Nesse momento solicita-se ao paciente realizar força de elevação do membro superior, contra a resistência do examinador. No segundo momento, repete-se o teste com o membro em supinação. Consideramos o teste positivo quando no primeiro momento há dor anterior no ombro e, no segundo momento, ocorra alívio da mesma (2) (figura 3). As análises dos resultados foram feitas através do índice kappa e do teste exato de Fisher, para avaliar a concordância entre o teste clínico de O Brien e a artro-rm, comparadas com a artroscopia (padrão ouro). A interpretação estatística do índice kappa pode ser demonstrada através do quadro 1. RESULTADOS Das 75 artroscopias realizadas, 51 demonstraram lesão tipo SLAP, enquanto que 24 não a demonstraram. Das 51 artroscopias que foram positivas para lesão tipo SLAP, em 34 pacientes (66,7%) o teste de O Brien fora positivo e, em 28 (54,9%), o Figura 1 Artro-RNM demonstrando lesão SLAP (ombro direito)

Eficiência dos métodos de avaliação clínico (teste de O Brien) e de imagem (artrorressonância magnética) no diagnóstico das lesões SLAP no ombro 463 Figura 2 Diagnóstico artroscópico de uma lesão SLAP do tipo II. Setas indicam zona de desinserção e fragmentação labial. G glenóide; L lábio; B tendão longo do bíceps. QUADRO 1 Interpretação da estatística kappa Intervalo Interpretação < 0,40 Concordância fraca 0,40 0,75 Concordância de razoável a boa 0,75 Concordância excelente exame de artro-rm fora sugestivo de lesão SLAP. Das 24 artroscopias negativas para lesão SLAP, 18 pacientes (73,9%) apresentavam teste de O Brien positivo e 12 (30%), exame de artro-rm sugestivo de lesão SLAP. Conforme demonstrado na tabela 1, encontramos para o teste de O Brien sensibilidade de 66,7% e especificidade de 25%, tendo como padrão o resultado obtido pela artroscopia. Conforme demonstrado na tabela 2, encontramos para o exame de artro-rm sensibilidade de 54,9% e especificidade de 50%, tendo como padrão o resultado obtido pela artroscopia. Quando analisamos a associação do teste de O Brien com a artro-rm para diagnosticar a lesão SLAP, considerando apenas quando há a concordância entre os dois métodos e a artroscopia, notamos redução na sensibilidade (47,1%) com considerável melhora da especificidade (70,8%), conforme demonstrado pela tabela 3. Figura 3 Teste de O Brien TABELA 1 Avaliação da acuidade do resultado do teste de O Brien pela artroscopia Teste de O Brien Positivo Negativo Positivo 34 18 Negativo 17 06 Total 51 24 Nota: Acuidade do teste! Sensibilidade = 66,7% Especificidade = 25,0% Falso-positivo = 34,6% Falso-negativo = 73,9% Resultados corretos = 53,3%

464 Godinho GG, Freitas JMA, França FO, Lopes AA, Milazzo AJ, Dal Zotto C Artro-RM TABELA 2 Avaliação da acuidade do resultado da artro-rm pela artroscopia Positivo Negativo Total Positiva 28 12 40 Negativa 23 12 35 Total 51 24 75 Nota: Acuidade do teste! Sensibilidade = 54,9% Especificidade = 50,0% Falso-positivo = 30,0% Falso-negativo = 65,7% Resultados corretos = 53,3% TABELA 3 Avaliação da acuidade do resultado do teste de O Brien e da artro-rm considerando ambas as variáveis positivas pela artroscopia Teste de O Brien e da artro-rm combinados Positivo Negativo Total Positivo 24 07 31 Negativo 27 17 44 Total 51 24 75 Nota: Acuidade do teste! Sensibilidade = 47,1% Especificidade = 70,8% Falso-positivo = 22,6% Falso-negativo = 61,4% Resultados corretos = 54,7% Quando consideramos correto o diagnóstico quando há concordância com a artroscopia de pelo menos um dos métodos, notamos grande aumento na sensibilidade (74,5%), porém há significante piora na especificidade (4,2%), conforme demonstrado pela tabela 4. TABELA 4 Avaliação da acuidade do resultado do teste de O Brien e da artro-rm considerando pelo menos uma das variáveis positiva pela artroscopia Teste de O Brien e da artro-rm combinados Positivo Negativo Total Positivo 38 23 61 Negativo 13 01 14 Total 51 24 75 Nota: Acuidade do teste! Sensibilidade = 74,5% Especificidade = 4,2% Falso-positivo = 37,7% Falso-negativo = 92,9% Resultados corretos = 52,0% Aplicando-se o índice de concordância kappa, observamos que é fraca a concordância entre o teste de O Brien e o exame de artro-rm, conforme demonstrado pela tabela 5. TABELA 5 Avaliação de concordância entre os resultados do teste de O Brien e artro-rm Resultado de O Brien Teste artro-rm Positivo Negativo Positivo 31 (41,3) 21 (28,0) Negativo 09 (12,0) 14 (18,7) Total 40 35 Nota: Índice de concordância kappa = 0,18; p = 0,101 Os valores entre parênteses referem-se aos percentuais em relação ao total de 75 pacientes. DISCUSSÃO A lesão tipo SLAP teve sua anatomofisiopatologia melhor compreendida com o avanço técnico e aprimoramento de seu diagnóstico através da artroscopia da articulação glenoumeral. Desde então vem-se buscando um exame clínico ou por imagem capaz de predizer a lesão com sensibilidade e especificidade confiáveis. Snyder descreveu as lesões que acometem a região ânterosúpero-posterior do lábio glenóideo, denominando-as superior labrum anterior and posterior lesions (lesões SLAP) (1). O mecanismo mais comum de lesão é pela associação de forças de compressão na superfície articular superior com força proximal de subluxação na cabeça umeral (1). Vários testes clínicos têm sido propostos para o diagnóstico da lesão SLAP: palm up test; compressão axial; teste de O Brien (2-4). Snyder afirma que o diagnóstico da lesão SLAP através do exame físico é de exclusão (1). O Brien et al descreveram um teste que leva o nome do autor principal para o diagnóstico da lesão SLAP. Demonstraram e relataram que o teste apresenta sensibilidade de 100% e especificidade de 98,5% para o diagnóstico de lesão SLAP (2). Parentis et al demonstraram, por meio de estudos em cadáveres, que o teste de O Brien se tornava positivo quando o membro se encontra em rotação interna, pois nessa posição há o contato do tendão subescapular e do tubérculo menor com os segmentos superior, anterior e posterior do lábio doente, ocasionando a dor. Quando se muda o membro para rotação externa, a dor desaparece, pois nessa posição não há nenhum contato ósseo ou tendíneo com o lábio acometido (5).

Eficiência dos métodos de avaliação clínico (teste de O Brien) e de imagem (artrorressonância magnética) no diagnóstico das lesões SLAP no ombro 465 Nakagawa et al relataram sensibilidade de 71% com teste de O Brien para lesões tipo SLAP, recomendando o seu uso no diagnóstico desse tipo de lesão. Nesse mesmo trabalho, demonstraram sensibilidade de 100% com teste de compressão axial (4). Chidambaram et al descreveram sensibilidade de 48% do teste de O Brien quando utilizado para o diagnóstico das lesões do tipo SLAP e opinaram que nenhum teste, isoladamente ou associado, é confiável para diagnóstico dessa lesão (6). Guanche et al pesquisaram o uso de mais de seis testes para o diagnóstico de lesão SLAP e concluíram que o melhor seria o de O Brien, apontando sensibilidade de 63% e especificidade de 73% (7). Berg et al demonstraram sensibilidade de 87,5% para o teste tipo O Brien para predizer lesão SLAP (8). Cordasco et al afirmaram que a lesão SLAP deve sempre ser suspeitada em pacientes com dor crônica no ombro, apresentando quadro clínico inespecífico, facilmente confundido com outras doenças, até mesmo alterações acromioclaviculares (9). Embora sejam conhecidos vários métodos clínicos para o diagnóstico da lesão SLAP, assim como nós, outros autores optaram pela utilização do teste de O Brien. Há, entretanto, grande discordância de opinião entre eles, em relação à sensibilidade e à especificidade demonstrada, que varia de 48% a 100% (4,6-7). Nossos resultados mostram especificidade para o teste de O Brien de 25% e sensibilidade de 66,7% à luz da artroscopia. Quando comparamos nossos resultados com os da literatura, podemos constatar que os dados da nossa pesquisa se assemelham aos da literatura no que se refere à sensibilidade. Encontramos em relação à especificidade um percentual baixo (25%), sendo contraditórios os artigos que relatam dados variando de 73 a 98,5%. Essa grande variação encontrada pode resultar da dificuldade inerente ao diagnóstico da lesão, tanto quanto da interpretação do exame clínico. LaBan et al concluíram que tanto a radiografia simples como a contrastada e a ecografia não têm valor como método diagnóstico. Concluíram que a artroscopia do ombro, a tomografia computadorizada, a artrografia e a ressonância magnética (RM) têm sensibilidade e especificidade relativamente iguais na visibilização da lesão labial (10). Bernageau assegurou que a artro-rm é mais eficaz e deve ser considerada como procedimento de eleição (11). Cartland et al, baseados em estudo realizado em 10 pacientes nos quais a RM não permitiu o diagnóstico em nenhum deles, concluíram que esse é um exame sem especificidade e sensibilidade (12). Smith et al realizaram estudo por RM em seis pacientes que também foram submetidos à artroscopia do ombro. Encontra- ram quatro lesões SLAP, mas somente uma apresentou suspeita baseada em dados clínicos pré-operatórios (13). Field et al detectaram a lesão por intermédio da RM em quatro de 13 pacientes examinados (14). Para Snyder et al, a RM e a artrotomografia ajudam no diagnóstico, mas não têm definição acurada (15). Waldt et al demonstraram sensibilidade de 82% e especificidade de 98% com artro-rm no diagnóstico da lesão SLAP (16). Herold et al relataram sensibilidade de 91% e especificidade de 85% utilizando artro-rm para diagnóstico de lesão SLAP (17). Bencardino et al obtiveram com a artro-rm sensibilidade de 89% e especificidade de 91% (18). Lill et al afirmaram que com a artro-rm obtiveram sensibilidade e especificidade de 100% ao estudar as lesões labiobicipitais (19). Dificuldade observamos ao comparar os resultados obtidos pelo exame por imagem (artro-rm), já que encontramos autores que relatam baixa eficácia desse exame (12-14), ao passo que outros demonstram alta eficácia do mesmo (15-18). Nossos dados mostram especificidade de 50% e sensibilidade de 54,9% confirmadas por artroscopia. Alguns autores apresentaram dados para sensibilidade e especificidade da artro-rm muito acima dos encontrados em nosso estudo, variando de 82 a 100% para sensibilidade e de 85 a 100% para especificidade (16-18). Isso se deve provavelmente ao fato de esse procedimento ser examinador-dependente. Não encontramos trabalhos na literatura que tenham feito a associação do exame de imagem com o exame clínico e o diagnóstico artroscópico. Demonstramos, porém, que a associação de exames não melhora a qualidade do diagnóstico, sendo o diagnóstico definitivo somente obtido por meio da artroscopia. Avaliando os resultados quando há concordância entre os dois métodos e a artroscopia, notamos que a especificidade aumenta para 70,8% e a sensibilidade diminui para 47,1%. Situação inversa é demonstrada quando há concordância da artroscopia com pelo menos um dos métodos, apresentando, assim, aumento da sensibilidade para 74,5% e piora da especificidade para 40,2%. Para o diagnóstico artroscópico da lesão SLAP seguimos os critérios propostos por Field et al: condromalácia da glenóide superior; hemorragia sublabial; separação maior ou igual a 3-4mm entre o lábio e a glenóide quando o bíceps se encontra sob tensão; e lesão labial em alça de balde (14). Essas são características dos tipos II a IV de lesão. O diagnóstico pode passar despercebido ou confundir-se com aspectos que são variações da anatomia normal, como a

466 Godinho GG, Freitas JMA, França FO, Lopes AA, Milazzo AJ, Dal Zotto C inserção regular, porém frouxa do lábio, a forma labial meniscóide, ou a fragmentação labial comumente vista em pacientes na faixa etária acima de 50 anos de idade e que constitui lesão degenerativa e não lesão SLAP do tipo I. Nesse grupo de pacientes, o diagnóstico diferencial entre lesão SLAP e degeneração labial deve ser feito com base na história clínica, sendo recomendado por nós que se considere lesão degenerativa, e não SLAP, quando não há história de trauma e o paciente não é atleta arremessador. CONCLUSÃO O diagnóstico clínico da lesão SLAP é extremamente difícil e as queixas de dor e incapacidade progressiva são muito vagas. Não existe teste clínico ou exame de imagem que possa diagnosticá-la com boa eficácia, como foi mostrado em nossos resultados de baixa sensibilidade e especificidade. A associação dos métodos diagnósticos aumenta a especificidade, porém diminui a sensibilidade, não tendo sido encontrado qualquer trabalho em que fosse feita essa associação para nossa comparação. A artroscopia continua sendo o melhor método a adotar como auxiliar no diagnóstico dessa lesão. REFERÊNCIAS 1. Snyder SJ. Superior labrum, anterior to posterior lesions of the shoulder. In: Snyder SJ. Shoulder arthroscopy. 2nd ed. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins; c2003. p.147-65. 2. O Brien SJ, Pagnani MJ, Fealy S, McGlynn SR, Wilson JB. The active compression test: a new and effective test for diagnosing labral tears and acromioclavicular joint abnormality. Am J Sports Med. 1998;26(5):610-3. 3. Holtby R, Razmjou H. Accuracy of the Speed s and Yergason s tests in detecting biceps pathology and SLAP lesions: comparison with arthroscopic findings. Arthroscopy. 2004;20(3):231-6. 4. Nakagawa T, et al. Clinical findings and operative results of SLAP lesion in baseball players [abstract]. J Shoulder Elbow Surg. 2004;13(5):E46. 5. Parentis MA, Jobe CM, Pink MM, Jobe FW. An anatomic evaluation of the active compression test. J Shoulder Elbow Surg. 2004;13(4):410-6. 6. Chidambaram R, Mok D. Clinical signs for SLAP lesions are they reliable? [abstract]. J Bone Joint Surg Br. 2004;86-B(Suppl 1):101. 7. Guanche CA, Jones DC. Clinical testing for tears of the glenoid labrum. Arthroscopy. 2003;19(5):517-23. 8. Berg EE, Ciullo JV. A clinical test for superior glenoid labral or SLAP lesions. Clin J Sport Med. 1998;8(2):121-3. 9. Cordasco FA, Steinmann S, Flatow EL, Bigliani LU. Arthroscopic treatment of glenoid labral tears. Am J Sports Med. 1993;21(3):425-30;discussion 430-1. 10. LaBan MM, Gurin TL, Maltese JT. Slip of the lip-tears of the superior glenoid labrum-anterior to posterior (SLAP) syndrome. A report of four cases. Am J Phys Med Rehabil. 1995;74(6):448-52. 11. Bernageau J. Le bourrelet glénoidien. Ann Radiol (Paris). 1995;38(5): 266-74. 12. Cartland JP, Crues JV 3rd, Stauffer A, Nottage W, Ryu RK. MR imaging in the evaluation of SLAP injuries of the shoulder: findings in 10 patients. AJR Am J Roentgenol. 1992;159(4):787-92. 13. Smith AM, McCauley TR, Jokl P. SLAP lesions of the glenoid labrum diagnosed with MR imaging. Skeletal Radiol. 1993;22(7):507-10. 14. Field LD, Savoie FH 3rd. Arthroscopic suture repair of superior labral detachment lesions of the shoulder. Am J Sports Med. 1993;21(6):783-90;discussion 790. 15. Snyder SJ, Karzel RP, Del Pizzo W, Ferkel RD, Friedman MJ. SLAP lesions of the shoulder. Arthroscopy. 1990;6(4):274-9. 16. Waldt S, Burkart A, Lange P, Imhoff AB, Rummenny EJ, Woertler K. Diagnostic performance of MR arthrography in the assessment of superior labral anteroposterior lesions of the shoulder. AJR Am J Roentgenol. 2004;182(5):1271-8. 17. Herold T, Hente R, Zorger N, Finkenzeller T, Feuerbach S, Lenhart M, Paetzel C. [Indirect MR-arthrography of the shoulder-value in the detection of SLAP-lesions]. Rofo. 2003;175(11):1508-14. German. 18. Bencardino JT, Beltran J, Rosenberg ZS, Rokito A, Schmahmann S, Mota J, et al. Superior labrum anterior-posterior lesions: diagnosis with MR arthrography of the shoulder. Radiology. 2000;214(1):267-71. 19. Lill H, Lange K, Reinbold WD, Echtermeyer V. [MRI arthrography improved diagnosis of shoulder joint instability]. Unfallchirurg. 1997; 100(3):186-92. German.