fls. 358 Despacho Agravo de Instrumento Processo nº 2186562-30.2016.8.26.0000 Agravante: GANADERIA BRASIL INDUSTRIA E COMÉRCIO DE ACESSÓRIOS DE MODA LTDA. Agravado: LEVIS STRAUSS DE ESPAÑA S.A. Número de 1ª Instância: 1089842-09.2016.8.26.0100 Comarca/Vara: São Paulo - 27ª Vara Cível Juiz(a): Vitor Frederico Kümpel Relator(a): CLAUDIO GODOY Órgão Julgador: 2ª CÂMARA RESERVADA DE DIREITO EMPRESARIAL Vistos. Cuida-se de recurso de agravo de instrumento interposto contra decisão que indeferiu antecipação de tutela requerida para o fim de que a ré fosse impedida de prosseguir na prossecução de efeitos de sentença arbitral estrangeria sem a sua prévia homologação pelo Superior Tribunal de Justiça. Argumenta a agravante, em sua irresignação, que a ré vem contatando parceiras contratuais no País a fim de evitar negociações acerca de licença objeto de arbitragem, colocando em risco sua receita, tudo sem antes submeter a sentença arbitral estrangeira a homologação no sentido de se obter o devido exequatur. Afirma que, assim, está inclusive impedida de opor as irregularidades que assegura tisnarem o procedimento de arbitragem, imposto para se dar, segundo argumenta, no quintal da empresa estrangeira licenciadora. Defende que a homologação não é necessária apenas para a execução, senão para o próprio reconhecimento da sentença estrangeira arbitral, conforme artigo 35 da Lei 9.307/96, portanto
fls. 359 independentemente de qual seja a natureza do provimento obtido, destarte não apenas condenatório, senão também declaratório ou constitutivo. Requer antecipação dos efeitos da tutela recursal. É o relatório. Não se entende de conceder a antecipação recursal. Certo que a sentença arbitral estrangeira dependa de homologação para surtir efeitos no Brasil. Expressam-no os artigos 35 da Lei 9.307/96 e 960, parágrafo 3º, do CPC/2015. Também é certo que o exequatur condiciona não apenas a execução da sentença estrangeira, calhando aqui a alusão expressa do artigo 35, antes citado, também ao reconhecimento da deliberação arbitral. Mas é preciso ter presente a exata compreensão do que seja este reconhecimento. Na lição de Carlos Alberto Carmona, acostumou-se a doutrina a atestar que as expressões não se equivalem, pois o escopo do reconhecimento da sentença consistiria na atribuição, à decisão arbitral, de valor igual àquele de uma sentença proferida pelo Estado que examina o pedido, enquanto que, com a execução, objetiva-se o adimplemento da decisão. A primeira, então, constituiria providência defensiva (faria valer na ordem interna do Estado requerido a autoridade da coisa julgada que emana da decisão, impedindo nova discussão sobre a matéria), enquanto a segunda teria
fls. 360 caráter coercitivo (permitindo à parte a utilização dos meios coativos necessários à satisfação do direito reconhecido na decisão). Em termos rigorosamente lógicos, a conjunção alternativa (ou) empregada no caput do art. 34 estaria equivocada, pois para executar a sentença arbitral estrangeria, será preciso, previamente, reconhece-la. (Carlos Alberto Carmona, Arbitragem e Processo, 3ª ed., Atlas, p. 438) Seja como for, feita a diferenciação, com o reconhecimento se tencionaria a obtenção dos mesmos efeitos e autoridade de coisa julgada da sentença estrangeria, como se proferida em jurisdição estatal ou arbitral local. Mas, por isso mesmo, efeitos que não se liguem exatamente com o ato decisório, como aponta Barbosa Moreira, podem surtir independentemente da homologação, assim tomada, ainda na lição do autor, e como exemplo, a demonstração da existência em si do fato da arbitragem estrangeira, afinal que se pode receber enquanto documento que é (Comentários ao CPC. 11ª ed. Forense. v. V. p. 79). Em palavras textuais, possível sem a homologação utilizar-se do documento estrangeiro para provar o próprio fato` da prolação de uma sentença, pela Justiça de outro Estado (Idem, ibidem). Pois, em princípio, é o que se parece colher das mensagens de fls. 297 e 301 dos autos de origem. Não cabe inibir a agravada de ato conservativo, apenas, de seu pretenso direito, assim de comunicação da ocorrência em si da arbitragem e de seu resultado de solução do ajuste de licença concedida à agravante. Isto ainda que a sentença arbitral não se tenha homologado e mesmo que a
fls. 361 recorrente não esteja impedida de também comunicar o fato a terceiros eventuais interessados. Dito de outro modo, ao lado da eficácia da sentença arbitral resolutória do ajuste e condenatória da agravante por inúmeras faltas contratuais (consta referência à omissão em aprovar linha de produtos, fabricar outros com qualidade inferior, subestimar receitas reduzindo o valor de royalties pagos, quebra da exclusividade, móvel não só da resolução, mas da fixação de indenização de quase seiscentos mil dólares), há o fato em si da ocorrência da arbitragem e de seu resultado, objeto de comunicação possível como tal, algo diverso de se pretender extrair efeitos jurídicos que pressupõem alteração concreta de relação da mesma natureza que em razão do contrato resolvido se estabeleça, assim pela sentença arbitral juridicamente afetada. De outro lado, aduzindo a agravante que o procedimento arbitral se reveste de inúmeras irregularidades e que aguardava o requerimento de homologação para poder alegá-las, impende anotar que, datada a sentença de 2015, em nenhum momento desde então consta ajuizada pela recorrente qualquer feito anulatório, ainda que no País de origem do painel (v.g. José Antônio Fichtner, Sérgio Nélson Mannheimer e André Luís Monteiro. Novos temas de arbitragem. FGV ED. p. 387; TJSP, Ap. civ. n. 0014578-23.2004.8.26.0100, rel. Des. Francisco Loureiro, j. 03.04.2014). É dizer então que, condenada pela sentença arbitral, e mesmo autorizada a ainda comercializar o estoque até agosto de 2015, passado este prazo e nenhuma irregularidade
fls. 362 foi levantada em sede própria de sorte a inquinar o procedimento arbitral. Com isso, por ora, mesmo sem homologação, resta ainda o fato em si da ocorrência da arbitragem e de seu resultado, cuja comunicação não se impede, a priori, a despeito da ausência da homologação e sempre ressalvada discussão indenizatória sobre eventual abuso com que as mesmas comunicações se façam, mas o que aparentemente não se integra à causa do pedido presente da recorrente, ao menos não além do que se ligue à ausência de exequatur. Processe-se, pois, sem a liminar. Dispensadas informações, aguarde-se a consumação da citação a fim de que a agravada seja intimada a responder o recurso. Após, tornem. Faculto aos interessados manifestação, em cinco dias, de eventual oposição ao julgamento virtual, nos termos do art. 1º da Resolução 549/2011, do Órgão Especial deste Tribunal, publicada no DJe de 25 de agosto de 2011 e em vigor desde 26 de setembro de 2011. Int. São Paulo, 26 de setembro de 2016 CLAUDIO GODOY relator