Envelhecimento: Mitos e realidades das despesas de saúde e segurança social. Pedro Pita Barros Faculdade de Economia Universidade Nova de Lisboa

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Envelhecimento: Mitos e realidades das despesas de saúde e segurança social Pedro Pita Barros Faculdade de Economia Universidade Nova de Lisboa

Background - envelhecimento Inversão da pirâmide etária (transição já se iniciou base menos larga) 2

Background despesas com saúde Sempre a crescer Tendência comum a despesa pública e a despesa privada Envelhecimento frequentemente associado com essa tendência Qual a relação entre economia, despesas com saúde e envelhecimento? 3

Crescimento da despesa em saúde Em valor per capita em % do PIB 4

rácios de dependência Mais pronunciado (ainda) entre 65 e 80 do que acima 80 anos 5

Esperança de vida à nascença Ganhos claros em termos de tempo de vida 6

Relação entre crescimento da despesa em saúde e envelhecimento? Três formas de procurar uma resposta: 1. Análise de regressão procura de factores explicacvos, a nível agregado, da evolução da despesa em cuidados de saúde 2. Análise de decomposição efeito da alteração da estrutura demográfica tudo o resto constante. 3. Análise de procura de cuidados de saúde e de carga de doença a nível individual 7

Relação entre crescimento da despesa em saúde e envelhecimento? Usando valores agregados (desde 1980, antes não havia SNS, sistema diferente) Relação mulcvariada (análise de regressão) entre crescimento da despesa em saúde (per capita) e crescimento do PIB e variação da proporção da população com mais de 65 anos e com mais de 80 anos Proporção da saúde no PIB face ao PIB per capita, e à proporção da população com mais de 65 anos e com mais de 80 anos 8

Análise da taxa de crescimento da despesa: Crescimento do rendimento é o principal factor associado com o crescimento da despesa per capita em saúde Efeito é 1:1 1% de aumento no rendimento está associado com um 1% de aumento na despesa per capita em saúde população mais rica tende a gastar mais em saúde Mas se fosse a única explicação rácio despesa em saúde sobre PIB deveria ser constante, mas é crescente Alterações na composição demográfica da população não têm efeito significacvo no crescimento da despesa per capita em saúde - seja a percentagem de população acima de 65 anos ou acima de 80 anos. 9

Relação entre crescimento da despesa per capita em termos nominais e variação da percentagem da população com mais de 65 anos não há relação sistemácca 10

Análise das despesas de saúde em proporção do PIB De acordo com o resultado associado com taxas de crescimento, tem- se que este rácio evolui devagar Que factores adicionais ao rendimento são relevantes? Ou seja, o que faz subir este rácio? PIB per capita (em termos reais) está associado com um maior peso da saúde no PIB % Pop acima de 65 está associado com menor rácio % Pop cima de 80 está tendencialmente associado com maior rácio (mas sem significância estanscca) 11

Análise de decomposição: uma contabilidade simples Em que medida o aumento da população com mais de 65 anos explica o aumento das despesas per capita, se tudo o resto cvesse permanecido constante? Suponhamos que pessoas com 65+ anos gastam per capita 4x mais do que uma pessoa abaixo de 65 anos Uma despesa per capita de 361 (a preços de 2000) implica 270 para <65 anos, 1078 para +65 anos Aplica- se estes valores à nova estrutura 12

Decomposição 1980 1990 2000 2005 População total (em milhares) 9766 9983 10266 10549 População com 65+ anos (%) 11,30% 13,40% 16,20% 17,10% Despesa em saúde per capita 42 315 1058 1437 Despesa em saúde per capita (preços de 2000) 361 541 1058 1231 1980 1990 2000 2005 valor per capita <65 anos 270 386 712 814 valor per capita +65 anos 1078 1544 2848 3254 estrutura demográfica do ano 361 541 1058 1231 estrutura demográfica de 2005 408 584 1077 1231 crescimento por efeito demográfico 12,99% 7,92% 1,82% 0,00% 13

Análise de decomposição (4x) em média anual taxa de crescimento da despesa em saúde 2005/1980 2005/1990 2005/2000 per capita (nominal) 15,18% 10,65% 6,31% per capita (real) 5,03% 5,63% 3,08% per capita (envelhecimento) 0,49% 0,51% 0,36% per capita (envelhecimento e inflação) 10,14% 5,29% 3,53% per capita devida a outros factores 4,57% 5,09% 2,69% despesa total (envelhecimento e crescimento populacional) 0,80% 0,88% 0,91% 14

(10x) em média anual taxa de crescimento da despesa em saúde 2005/1980 2005/1990 2005/2000 per capita (nominal) 15,18% 10,65% 6,31% per capita (real) 5,03% 5,63% 3,08% per capita (envelhecimento) 0,92% 0,94% 0,65% per capita (envelhecimento e inflação) 10,62% 5,74% 3,83% per capita devida a outros factores 4,12% 4,64% 2,40% despesa total (envelhecimento e crescimento populacional) 1,24% 1,31% 1,20% 15

Envelhecimento no sencdo de alteração da estrutura demográfica, não tem grande efeito Temos que procurar explicação noutros aspectos novas tecnologias, aumento de preços, alargamento da cobertura efeccva da população, etc Mas NÃO o envelhecimento por si 16

Porquê então o mito tantas repecdo de associar as despesas com saúde em envelhecimento? Primeira razão: Ignora- se o perfil temporal de despesas com saúde o grande volume de despesas em cuidados de saúde na idade adulta é nos dois anos antes da morte Envelhecimento significa transferir esta despesa para um momento mais tardio O efeito de transferência fica mascarado nas estansccas 17

Segunda razão: Confusão entre alterações da estrutura demográfica e inovação tecnológica parte da inovação tecnológica, que tem elevados custos, é usada pela população mais idosa Há inovação direccionada para a população idosa, mas os custos daí derivados não resultam da alteração da estrutura demográfica, e sima das novas tecnologias Demografia tem evolução lenta; mais lenta do que é companvel com a evolução da despesa em saúde 18

Terceira razão: Confusão entre despesas em saúde e despesas com segurança social (pensões) O envelhecimento tem consequências directas muito mais fortes sobre o sistema de pensões - e há uma importação por semelhança no discurso público. 19

Para compreender melhor o que está em causa, há que descer ao nível da uclização de cuidados de saúde Ver o que se passa a nível micro ao nível das decisões individuais Ucliza- se os dados do Inquérito Nacional de Saúde (enquanto não houver o SHARE) 20

% que reporta Saúde "Boa & Muito boa por faixa etária 1 0,9 0,8 0,7 0,6 0,5 0,4 0,3 0,2 0,1 0 0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 55 60 65 70 75 80 85 90 95 100 105 110 21

Algumas condições crónicas, por faixa etária (% que reporta) 0,6 0,5 0,4 Diabetes 0,3 Hipertensão Reumatologia Enfarte 0,2 AVC 0,1 0-5 5 15 25 35 45 55 65 75 85 22

Uclização de consultas Consultas médias per capita por faixa etária 7 6 5 4 3 2 1 0 0 20 40 60 80 100 120 23

Total de consultas por faixa etária (consultas por pessoa x #pessoas) 1000 900 800 700 600 500 400 300 200 100 0 0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 55 60 65 70 75 80 85 90 95 100 105 110 24

Idosos tendem a ter menor saúde, mas efeito menos pronunciado a parcr dos 65 Idosos tendem a ter mais doenças crónicas, mas o grande crescimento é antes dos 65 Idosos tendem a uclizar mais consultas, mas em número absoluto são muito menos a parcr dos 70-75 anos não é por aqui que está a aumentar a sua despesas 25

% que tomou medicamentos, por faixa etária 1,2 1 0,8 0,6 0,4 0,2 0 0 20 40 60 80 100 120 26

Número médio de consultas por pessoa Percentagem que tomou medicamentos nas duas úlsmas semanas Faixa etária: 25-64 1,01 0,53 Faixa etária: +65 anos 1,58 0,83 Faixa etária: +80 anos 1,43 0,84 Com as devidas ressalvas, não parece haver um salto inesperado na uclização de cuidados de saúde há um aumento de uclização que se vai fazendo ao longo da vida da pessoa. 27

O aumento da uclização de medicamentos (num sencdo muito lato de % de pessoas que tomou medicamentos nas duas úlcmas semanas, sem consideração da intensidade) também não parece explodir a idades mais avançadas 28

E a economia? Até agora, apenas se viu o impacto do envelhecimento nos custos em saúde Mas gastar mais em saúde também gera mais esperança de vida, mais envelhecimento, e esse efeito é visto como um aspecto posicvo Efeito indirecto sobre crescimento económico (a necessitar de ser medido) tendo uma esperança de vida mais elevada, haverá uma tendência para invescr mais em educação (e ao longo da vida), aumento de capital humano, o que tende a favorecer o crescimento económico 29

Conclusão Envelhecimento: Cria pressão sobre as pensões a pagar Não é o principal factor de crescimento da despesa em saúde A prazo pode ter efeitos posicvos sobre o crescimento económico, via invescmento em capital humano ao longo da vida (efeito a necessitar de reflexão e medição apropriadas) 30

Obrigado pelo vosso tempo! 31

Resultados detalhados 32

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