20 - AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO DE UM REATOR DE PIRÓLISE NO TRATAMENTO DE UMA AMOSTRA SIMULADA DE RESÍDUOS SÓLIDOS DE SERVIÇOS DE SAÚDE

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20 - AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO DE UM REATOR DE PIRÓLISE NO TRATAMENTO DE UMA AMOSTRA SIMULADA DE RESÍDUOS SÓLIDOS DE SERVIÇOS DE SAÚDE Gilberto Caldeira Bandeira de Melo (1) Engenheiro Químico (1982) e Mestre em Engenharia Sanitária e Ambiental (1990) pela UFMG. Doutor em Ciências de Engenharia (Dr.-Ing.) pela Universidade de Karlsruhe, Alemanha (1995). Professor associado ao Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental (DESA-UFMG) desde 1996. Artur Tôrres Filho Engenheiro Agrônomo pela UFV (1983). Especialista em Engenharia Sanitária (1996), Engenharia de Segurança do Trabalho (1998) e Mestre em Meio Ambiente, Saneamento e Recursos Hídricos (2005) pela UFMG. Sócio-diretor da empresa Engenho Nove Engenharia Ambiental Ltda. Maeli Estrela Borges Urbanista (1969) pela Escola de Arquitetura da UFMG e graduação em Engenheiros Arquitetos (1967) pela Escola de Arquitetura da UFMG. Especialização em Engenharia Sanitária (1970) pela Escola de Engenharia da UFMG. Pedro Alvarenga Bicalho Engenheiro Ambiental pela Universidade FUMEC (2005). Especialista em Engenharia Sanitária pela UFMG (2006). Victor Bustani Valente Engenheiro Ambiental e Sanitarista pela UFSC (2007). Endereço (1) : Av. do Contorno, 842, 7 andar Centro Belo Horizonte Minas Gerais CEP: 30.101-060 Brasil Tel: +55 (31) 3409-1934 Fax: +55 (31) 3409-1879 - e-mail: gilberto@desa.ufmg.br RESUMO O aumento indiscriminado na geração de resíduos sólidos, associado à falta de tratamento e disposição final adequados, vem exigindo a adoção de novas estratégias de ação para este setor, sendo busca por novas alternativas de tratamento, que sejam técnica e economicamente viáveis, umas dos principais temas abordados por especialistas da área. Especificamente com relação aos Resíduos Sólidos de Serviço de Saúde (RSSS), por causa do rigor atribuído ao processo de tratamento resultante do seu potencial infeccioso, a dificuldade de encontrar soluções é ainda maior. Uma alternativa pouco difundida, mas que já é utilizada para o tratamento de diferentes tipos de resíduos é a pirólise. Apesar de a mesma apresentar uma série de vantagens, são poucos os estudos que abordam a sua utilização no tratamento de RSSS. Com objetivo de avaliar a viabilidade técnica e ambiental desse processo, realizou-se um experimento onde uma amostra simulada de RSSS foi carbonizada num reator de pirólise construído em escala piloto. A metodologia para avaliação da eficiência desse sistema consistiu em analisar as concentrações dos principais compostos das emissões atmosféricas e compará-las com os padrões estabelecidos na legislação, com destaque para as Dioxinas e Furanos, que são atualmente os maiores limitantes para tratamentos térmicos. Além disso, verificou-se ainda a classificação dos resíduos após o tratamento, a fim de avaliar se os mesmos poderiam ser dispostos em aterros sanitários, juntamente com os resíduos comuns. Finalmente, a redução de 89% da massa da amostra após a passagem pelo reator, o enquadramento dos principais parâmetros avaliados aos padrões de emissão e a classificação do resíduo como não perigoso, foram resultados importantes na avaliação desse processo, tornando-o uma alternativa promissora para o tratamento de RSSS. PALAVRAS-CHAVE: Tratamento de resíduos, RSSS, Pirólise. INTRODUÇÃO A problemática da geração de resíduos sólidos tem grande relevância, não só no meio científico, mas principalmente no cenário das administrações municipais, pela estreita relação existente entre o ambiente e a qualidade de vida do homem, pelas crescentes proporções da geração de resíduos, bem como pelas conseqüências danosas advindas de um manejo inadequado do lixo. ABES Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 1

Especificamente em relação aos Resíduos Sólidos de Serviços de Saúde (RSSS), verifica-se ainda uma ausência de orientação técnico-científica consolidada, onde as discussões sobre os riscos potenciais, assim como as possibilidades de manejo e tratamento dessa categoria de resíduos, são entrecortadas por estereótipos e escassa disponibilidade de informações com rigor científico, sobretudo no que diz respeito à forma de tratamento e destinação final (Machado e Moraes, 2004). O aumento da quantidade de leis que dispõe sobre o tema, juntamente com o maior rigor no julgamento de questões relativas à degradação ambiental, proporcionou uma busca por novas alternativas de tratamento para estes resíduos. Nota-se, contudo, que os problemas relativos aos RSSS persistem e o principal motivo para a ineficiência no setor é a inviabilidade econômica dos processos. Tratamentos como a incineração e plasma, apesar de ocasionarem uma redução acima de 90% em peso e volume do resíduo, possuem algumas desvantagens que podem inviabilizar a sua implantação, como por exemplo, alto custo inicial, de manutenção e operação e necessidade de mão-de-obra especializada. Alternativas um pouco menos onerosas, como valas sépticas, desinfecção química e autoclaves, além de não garantirem a mesma eficiência na destruição dos organismos patogênicos, não possuem a mesma capacidade de redução do peso/volume dos resíduos. Realizada com admissão restrita de ar e em temperaturas mais baixas que na incineração, mas suficientes para garantir a inertização dos resíduos (valores em torno de 500 C), a pirólise é um processo ainda pouco utilizado para o tratamento de resíduos. A redução de massa e volume proporcionado por essa tecnologia e sua simplicidade operacional, fazem dela uma alternativa de tratamento promissora. Além disso, a descentralização do tratamento proporcionada por pequenos reatores pirolíticos permite que o resíduo seja tratado na própria unidade de geração, evitando problemas com seu acondicionamento, coleta e transporte. Do ponto de vista energético, o processo também pode ser considerado vantajoso, pois admite, através da decomposição térmica, a recuperação de energia, quando os resíduos apresentam frações orgânicas, seja de origem biogênica ou mineral. Atualmente no Brasil, a pirólise é empregada principalmente no processamento do xisto betuminoso, mas encontra-se sendo utilizada também na transformação de biomassa em fontes renováveis de energia e combustíveis, para obtenção de micro-sílica a partir de casca de arroz, na recuperação de resíduos derivados do plástico e recuperação dos metais preciosos como o ouro, a prata e a platina provenientes dos componentes eletrônicos de computadores, televisores, aparelhos de som entre outros. A pirólise é também largamente utilizada na produção de carvão vegetal para uso siderúrgico. Um dos motivos que tornam esse processo pouco utilizado em escala comercial para o tratamento de resíduos é que ainda existem muitas indefinições relacionadas à sua operação. Acredita-se, por conseguinte, que o estudo da viabilidade técnica e ambiental da pirólise poderá constituir-se em uma base de dados importante para a aplicação das técnicas propostas no tratamento de resíduos sólidos de serviços de saúde. OBJETIVOS Estudar a viabilidade técnica e ambiental da utilização do processo de pirólise como tratamento de resíduos sólidos de serviços de saúde, através de um experimento utilizando uma amostra simulada destes resíduos em um reator de pirólise construído em escala piloto, onde foram avaliados: a redução mássica dos RSSS, após o tratamento; a concentração nos gases dos parâmetros óxidos de nitrogênio (NO x ), HCl, Cl 2, compostos orgânicos voláteis (VOC s), material particulado, dioxinas e furanos, comparando os valores obtidos com aqueles dipostos na Resolução CONAMA nº 316/02 e a Norma Alemã - Technische Anleitung zur Reinhaltung der Luft TA Luft 1 ; 1 A norma TA-Luft foi substituída pela Diretiva Européia 2000/76/EC de 4/12/00, e esta diretiva apresenta limites para o carbono orgânico total, e não para o VOC. Como o experimento descrito neste artigo utilizou-se da metodologia de amostragem do VOC, será feita a comparação dos resultados com os valores prescritos pela TA-Luft. ABES Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 2

a classificação do resíduo resultante do processo de pirólise (material carbonizado) segundo a NBR 10.004/04, verificando a possibilidade de disposição em aterros sanitários após o tratamento; METODOLOGIA A metodologia empregada para elaboração deste trabalho compreendeu, numa primeira etapa, a preparação de uma amostra artificial de RSSS e, numa segunda etapa, o tratamento térmico desta amostra em um reator de pirólise, construído em escala piloto. Durante esta etapa, análises foram realizadas a fim de verificar a viabilidade técnica e ambiental do tratamento e classificar o resíduo sólido gerado. CARACTERIZAÇÃO DO APARATO EXPERIMENTAL O reator utilizado no processo é composto por um cilindro metálico externo, com 700 mm de diâmetro, e um cilindro metálico interno, com 300 mm de diâmetro (câmara de pirólise) (Figura 1). O reator é construído em aço carbono e possui uma altura de 2,8 metros. Figura 1: Aparato experimental utilizado O combustor de biomassa (Figura 2) é composto por um silo de abastecimento construído em chapas de aço carbono, onde se introduz a biomassa utilizada para geração de energia térmica. Esta biomassa é transportada para uma câmara de combustão através de um transportador helicoidal acoplado a um conjunto moto-redutor, localizado no fundo do silo, sendo que a taxa de alimentação e a quantidade de combustível transportado é regulada por um painel eletrônico localizado na parte posterior do silo. A queima deste combustível, auxiliada por um compressor que insufla ar dentro da câmara, gera a chama responsável pelo aquecimento do reator de pirólise. ABES Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 3

Figura 2: Combustor de biomassa Utilizou-se como fonte de energia térmica no processo o cavaco de madeira termoprocessado (Figura 3). Este combustível é proveniente do processamento termo-mecânico de resíduos de madeira e da lenha, em fornos rotativos a 300º C, nos quais são eliminados problemas associados à umidade e à desuniformidade das matérias-primas. Figura 3: Cavaco de madeira termoprocessado ELABORAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO DA AMOSTRA SIMULADA DE RSSS Optou-se por se utilizar uma amostra simulada por dois motivos: evitar a burocracia relativa à obtenção destes resíduos em hospitais, os quais podem conter órgãos e/ou fluidos humanos que apresentem riscos potenciais à saúde, e para priorizar a replicabilidade do resíduo, caso se pretenda utilizá-lo em outros ensaios. Além disso, o peso da amostra, devido à capacidade do reator, não poderia ultrapassar 20 kg. Resíduos dos grupos C e D não foram inseridos na amostra, pois devem receber tipos de destinação diferentes ao tratamento térmico. ABES Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 4

Desta forma, utilizou-se uma amostra simulada com a composição gravimétrica dada na Tabela 1, apresentada a seguir. Tabela 1: Relação dos componentes usados na formação de uma amostra simulada da composição de resíduos de serviços de saúde. Componente Composição Classificação (RDC ANVISA 306/2004) Número de unidades Peso aproximado (kg) Avental descartável manga longa de TNT 100% polipropileno atóxico 10 0,488 Luvas cirúrgicas de látex Látex 100 0,660 Ataduras de crepom 60% algodão, 28% poliamida, 12% poliéster 8 0,210 Gaze 100% Algodão 500 0,250 Algodão hidrófilo 100% algodão 2 1,116 Esparadrapo impermeável Tecido 100% algodão A1 4 0,530 Sondas Foley Siliconizada Látex e silicone 2 0,027 Cânulas de Guedel PVC 2 0,017 Sacos de lixo (50 L) 80% polietileno alta densidade 50 0,325 Bolsa para coleta de sangue CPDA-1 Bolsa plástica 3 0,329 Tubo para coleta de sangue Polipropileno transparente 50 0,460 Cateter nasal para oxigênio tipo óculos PVC 4 0,068 Sangue Sangue bovino - 5,0 Peças anatômicas Órgãos de suínos A2-4,3 Produto Hormonal Levonorgestrel 1 cx. Produto Digitálico Digoxina 1 cx Produto Antimicrobiano Azitromicina 1 cx. 0,016 Produto imunossupressor Prednisona B 1 cx. Esterilizante químico Fosfato Trissódico 1 un.(250 ml) 0,275 Soro fisiológico 0,9% cloreto de sódio 1 un.(250 ml) 0,267 Agulhas Aço inox 12 0,004 Cateter intravenoso Plástico e metal 2 0,006 Lâminas p/bisturi Aço inox 10 0,008 E Cabo de bisturi Aço inox 1 0,024 Vidros quebrados Vidro - 0,200 Seringas com agulhas (20 ml) Plástico e metal 6 0,072 TOTAL 14,652 kg PIRÓLISE DA AMOSTRA Após determinação dos parâmetros a serem analisados no processo e a aquisição dos elementos constituintes da amostra de RSSS, a próxima etapa da pesquisa constitui-se na carbonização dessa amostra com o monitoramento dos parâmetros propostos. A preparação da amostra resumiu-se na mistura aleatória dos resíduos. A amostra gerada (Figura 4) foi ensacada em sacos de polietileno e inserida no reator de pirólise. ABES Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 5

Figura 4: Amostra de RSSS após mistura dos componentes Os RSSS foram alimentados na câmara de pirólise por uma abertura superior, que foi em seguida fechada, garantindo a ausência de oxigênio no processo. A chama proveniente da câmara de combustão entra no cilindro externo através de um duto, aquecendo a câmara de pirólise. A dinâmica do processo pode ser resumida através da figura abaixo. Figura 5: Processo de tratamento de resíduos por pirólise. Como pode ser visto na Figura 5, os RSSS foram introduzidos na câmara de pirólise pela abertura superior (01), que em seguida foi fechada. Os cavacos de madeira (combustível utilizado no processo) foram introduzidos no silo de alimentação (02) que, através de uma rosca sem fim, abasteceu a câmara de combustão (03), para geração da energia térmica. A chama radiante, juntamente com o calor gerado pela convecção dos gases da queima de biomassa, aqueceu externamente a câmara de pirólise (05), promovendo as reações de degradação térmica. No interior da câmara de pirólise, à medida em que o processo de degradação térmica avançava, formava-se uma atmosfera redutora, com deficiência de oxigênio, concentrando carbono na massa ABES Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 6

de resíduo tratada. Os gases e vapores formados no reator de pirólise foram encaminhados para a zona de pósqueima pela tubulação de retorno (04). Nesse ponto, os gases entram em contato com a chama proveniente da câmara de combustão, servindo como combustível auxiliar para suprir parcialmente as necessidades do processo. Após o término do processo e resfriamento do reator, os resíduos carbonizados foram removidos pela abertura inferior (06) e classificados segundo a NBR 10.004/04. O tempo considerado para carbonização dos resíduos foi estabelecido pelo tempo de amostragem de Dioxinas e Furanos, que ocorreu simultaneamente ao processo (aproximadamente 8,5 horas). Os gases gerados no sistema de pirólise, que consistem na exaustão do pós-queimador (que, por sua vez, consiste dos gases formados da queima do combustível auxiliar, mais os gases formados na queima dos voláteis oriundos da câmara de pirólise) foram amostrados na chaminé, para avaliar as emissões atmosféricas do processo. Os resíduos carbonizados foram recolhidos após resfriamento e enviados para análise de extrato lixiviado e solubilizado, para sua caracterização segundo a NBR 10.004/04. Além disso, mediu-se a massa do resíduo final, de modo a avaliar a redução proporcionada pelo processo após o tratamento. RESULTADOS E DISCUSSÃO Os resultados obtidos no experimento realizado encontram-se apresentados abaixo. O reator apresentou uma eficiência na redução mássica dos resíduos de 89%, próxima a níveis que geralmente se obtém com a incineração. O resíduo carbonizado é visualizado na Figura 6. Figura 6: Amostra dos RSS após o tratamento no reator de pirólise. As concentrações dos seus principais compostos oriundos dos efluentes da chaminé do reator de pirólise, obtidos nas campanhas de monitorização encontram-se contidos na Tabela 2: ABES Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 7

Tabela 2 Concentrações dos compostos amostrados nos gases de exaustão do reator de pirólise Parâmetros Unidade Média das Amostras Valor limite Concentração de Material Particulado mg/nm³ 222,5 70 Concentração de HCl mg/nm³ 0,5 80** Concentração de NOx mg/nm³ 209,4 560** Concentração de Dioxinas e Furanos ng/nm³ 0,16 0,5** Benzeno mg/nm³ 0,2453 100*** Tricloroeteno mg/nm³ 0,2437 100*** Tolueno mg/nm³ 0,2647 100*** Etilbenzeno mg/nm³ 0,2141 100*** m p-xileno mg/nm³ 0,1967 100*** Concentração de VOC s* o-xileno mg/nm³ 0,0371 100*** Estireno mg/nm³ 0,0409 100*** n-alcanos (C5-C10) mg/nm³ 0,00837 100*** Isopropilbenzeno mg/nm³ 0,0119 100*** n-propilbenzeno mg/nm³ 0,01427 100*** 1,3,5 trimetilbenzeno mg/nm³ 0,01427 100*** 1,2,4- trimetilbenzeno mg/nm³ 0,03107 100*** sec-butilbenzeno mg/nm³ 0,01616 100*** * Relação de Compostos Orgânicos Voláteis detectados nas medições dos gases de exaustão ** Valores limites na legislação adotada como referência (CONAMA,2002) ***Valores limites na legislação adotada como referência (TA Luft) O resultado das concentrações de Materiais Particulados foi acima do padrão limitante determinado tanto na Resolução CONAMA Nº 316/02, de 70 mg/nm³, quanto na DN COPAM 011/86, de 150 mg/nm³. Este valor foi acima do esperado, já que em outros testes realizados no mesmo reator, as concentrações haviam sido consideravelmente inferiores. Acredita-se que o motivo para o ocorrido tenha sido a utilização de um combustível auxiliar (cavaco) de granulometria inferior ao usualmente utilizado, que gerou uma maior quantidade de partículas leves, mais facilmente carreadas pela corrente de ar. Contudo, este parâmetro não é considerado como limitante para a utilização do tipo de tratamento estudado, uma vez que significativas reduções dos níveis de material particulado nas emissões podem ser alcançadas com ajustes básicos no sistema, como troca do combustível utilizado ou ajustes no sistema de coleta de partículas. As concentrações de ácido clorídrico e as suas taxas de emissão apresentaram valores abaixo daqueles estabelecidos na Resolução CONAMA Nº 316/02. Enquanto a mesma define uma concentração máxima de 80 mg/nm³ e taxas de até 1,8 kg/h, a concentração média desse composto foi de 0,5 mg/nm³ e as taxas de emissão não ultrapassaram 0,0002 kg/h. Verificou-se também que as emissões de NOx, CO e Dioxinas e Furanos ficaram abaixo dos padrões limitantes. A grande maioria dos compostos orgânicos voláteis não foi detectada nas emissões em nenhuma das três amostragens realizadas e, dos compostos que apresentaram alguma concentração, nenhum teve um valor acima do limite estabelecido pela legislação alemã (TA-Luft) de 100 mg/nm 3. De acordo com os ensaios realizados, o resíduo resultante do processo de pirólise (resíduo carbonizado) foi classificado como resíduo classe II A Não Inerte, uma vez que apresentou as substâncias Cloretos, Fenóis totais, Fluoreto, Manganês e Sódio solubilizadas em concentração superior àquelas estabelecidas no ANEXO G Padrões para ensaio de solubilização da NBR 10.004 (ABNT, 2004). CONCLUSÃO Após avaliar o desempenho do reator de pirólise em escala piloto, para tratamento de uma amostra simulada de RSSS, pode-se concluir: ABES Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 8

As concentrações de compostos clorados nas emissões atmosféricas foram significativamente inferiores às máximas permitidas na legislação utilizada como referência, o que coloca o processo de pirólise como vantajoso em relação ao processo de incineração, cuja atmosfera oxidante favorece a formação desses compostos. A concentração de cloretos no resíduo carbonizado apresentou-se com uma concentração superior ao limite estabelecido para o extrato solubilizado, de acordo com a Norma Técnica Brasileira utilizada como referência para classificação de resíduos. Dessa forma, pode-se concluir a partir destes resultados, que os compostos clorados não apresentaram tendência à volatização durante a pirólise, ou ainda, que estes compostos são destruídos na zona de pós queima, justificando também dessa forma as baixas concentrações de dioxinas e furanos nas emissões; A classificação do resíduo carbonizado como classe II A possibilita sua disposição final em aterros sanitários, juntamente com resíduos domésticos, com a vantagem adicional de não contribuir com a geração de chorume nas células de aterramento; Os resultados obtidos indicam que a tecnologia de tratamento térmico de RSSS por pirólise pode ser considerada uma alternativa promissora e segura, em relação aos aspectos ambientais. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 10004: Resíduos Sólidos - Classificação. Rio de Janeiro, 2004. 71 p. 2. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 10005: Procedimento para obtenção de estrato lixiviado de resíduos sólidos. Rio de Janeiro, 2004. 16 p. 3. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 10006: Procedimento para obtenção de estrato solubilizado de resíduos sólidos. Rio de Janeiro, 2004. 3 p. 4. BRASIL, Agência Nacional de Vigilância Sanitária Resolução da Diretoria Colegiada nº 306, de 07 de dezembro de 2004. Dispõe sobre o Regulamento Técnico para o gerenciamento de resíduos de serviço de saúde. Diário Oficial da União. Brasília, DF, 05 de março de 2003. 5. BRASIL, Conselho Nacional do Meio Ambiente Resolução CONAMA nº 316, de 29 de outubro de 2002 Dispõe sobre procedimentos e critérios para o funcionamento de sistemas de tratamento térmico de resíduos. Diário Oficial da União. Brasília, DF, 20 de novembro de 2002. 6. MACHADO, N. L., MORAES, L. R. S. Sistemas de tratamento e destino final de resíduos sólidos de serviços de saúde. 21º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 2001. 7. MACHADO, N. L., MORAES, L. R. S. RSSS: Revisitando as soluções adotadas no Brasil para tratamento e destino Final. Artigo Técnico. Vol. 9 - Nº 1 - jan/mar 2004, 55-64. ABES Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 9