Conflito de identidade: a relação entre o desemprego masculino e a violência contra a mulher em Vitória ES ( ) ALEX SILVA FERRARI

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Transcrição:

Conflito de identidade: a relação entre o desemprego masculino e a violência contra a mulher em Vitória ES (2002-2010) ALEX SILVA FERRARI MARIA BEATRIZ NADER A segunda metade do século XX foi marcada por transformações sociais, políticas e tecnológicas, sendo um divisor nos estudos sociais. Uma nova sociedade, que se reconstruía após a eclosão de duas grandes guerras que alteraram a dinâmica política e social, necessitava de novas formas, temas e aproximações nas pesquisas que buscavam entender e explicar esse novo momento na história da humanidade. A partir da década de 1970, por exemplo, os estudos sobre a questão da violência cresceram exponencialmente, uma vez que esta passou a ser encarada como um problema social, abandonando-se a ideia de que seria uma característica inata ao ser humano (ALVES, S. B.; DINIZ, N. M. F. 2005). Ao desmistificar a violência esses estudos não só, em sua maioria, recusaram a sua interpretação inaditista, mas também estabeleceram que ela acontece de forma permanente, podendo ser encontrada nas mais diversas formas de organização social, espaços e tempos. Para além de seu caráter permanente, a violência ainda assume posição ambígua, podendo ser vista como um componente positivo ou negativo, dependendo contexto, sociedade e tempo em que é empreendida. Macia Celícia Minayo e Edinilsa de Souza afirmam que esse caráter ambíguo e permanente da violência, somando ao fato de ser um comportamento apreendido e enraizado culturalmente, resultou na inclusão deste constructo nos padrões intrapsíquicos dos indivíduos, criando a falsa impressão de que seria uma característica inata da humanidade (MINAYO C. S.; SOUZA E. R, 1999, p. 11). Dada à sua complexidade, seu estudo da violência demanda a interpretação de suas inúmeras faces e usos, abrindo inúmeras possibilidades de pesquisas a respeito do assunto. Juntamente a emergência dos estudos sobre a violência, a questão da mulher ganhou notoriedade também na segunda metade do século XX. O movimento feminista, que começou a tomar forma já no final do século XIX e foi ganhando força durante o século seguinte, Mestrando do programa de pós-graduação em História Social das Relações Políticas da Universidade Federal do Espírito Santo, bolsista pela Fundação de Amparo a Pesquisa de Espírito Santo (FAPES). Professora Titular do Programa de pós-graduação mestrado e doutorado em História Social das relações Políticas da UFES. Vitória. Brasil.

2 buscou, e ainda busca, resignificar o lugar da mulher na sociedade, lutando pela igualdade social entre os sexos, a fim de questionar a hierarquia sexual que por muito tempo permeou as relações entre homens e mulheres. Esse movimento levou as mulheres à conquista do direito ao voto, da inserção na educação formal e no mercado de trabalho, realocando assim o papel da mulher na sociedade. Entretanto, esses avanços iniciais não representam o todo no que diz respeito às bandeiras feministas na busca pela igualdade. Após a conquista de espaço no mundo público e no mercado de trabalho, outras questões permaneceram vigentes ao debate como, por exemplo, as questões envolvendo a sexualidade, a maternidade e a violência contra a mulher. No Brasil a questão da ganhou destaque durante a década de 1970, quando casos famosos de assassinatos passaram a ter destaque na mídia impulsionando o debate acerca da questão. Um dos casos que marcaram esse período foi o assassinado de Ângela Diniz, socialite assassinada por seu ex-companheiro, o empresário conhecido como Doca Street. Este não aceitava o fim o relacionamento que mantinha com Ângela, pondo fim à vida dela. Em meio à cobertura midiática e a indignação popular, Street foi absolvido em um primeiro julgamento no qual sua defesa alegou que o acusado agiu em legítima defesa da honra, fundamentando o caso na desqualificação da imagem da vítima, publicamente conhecida por seu estilo de vida e liberdade sexual. O movimento feminista então iniciou campanhas nacionais de combate à violência contra a mulher, que acarretaram na condenação de Street em um segundo julgamento. Esse e outros casos denunciados pela imprensa foram propulsores da luta feminista pelo fim da violência contra a mulher. Para além das campanhas nacionais, o movimento atuou diretamente na política governamental buscando a mudança da legislação e políticas públicas que protegessem as mulheres, ao passo que também trabalhariam para a erradicação da violência contra elas. Uma das principais ações implantadas na época, e que ainda tem papel crucial no combate a esse tipo de violência nos dias de hoje, é a Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher, mai conhecida como DEAM. A primeira dessas delegacias foi inaugurada em 1985 em São Paulo e no mesmo ano o estado do Espírito Santo também inaugurou a sua unidade na capital, na cidade de Vitória.

3 A unidade capixaba era conhecida como DEAM-ES e funcionava em uma sala na sede da superintendência da Polícia Civil na cidade de Vitória até o ano de 2002. Após a criação de outras delegacias especializadas em outros municípios do estado, a DEAM-ES passou a atender somente à cidade de Vitória, sendo agora identificada como DEAM-Vitória, e desde 2002 a delegacia tem funcionado em instalações independentes. A implantação e manutenção dessas unidades especializadas no estado do Espírito Santo tem imensa importância no combate à violência contra a mulher, uma vez que seus números no estado e na sua capital são alarmantes. Segundo o Mapa da Violência formulado pelo Instituto Sangari e publicado no ano de 2012, o estado é o que possui a maior média de assassinato de mulheres por cada cem mil habitantes, 9,8, sendo a média nacional dos estados brasileiros de 4,6. Já a cidade de Vitória também figura em primeiro lugar entre as capitais brasileiras com a média de 13,2 assassinatos de mulheres para casa cem mil habitantes, sendo a média entre as capitais de 5,4. Não apenas os números relativos à violência contra a mulher são alarmantes no estado, mas de forma geral a violência tem se mostrado um problema no Espírito Santo. No ano de 2014 a atualização do Mapa da Violência, que outrora apontou o estado como campeão no número de assassinato de mulheres, trouxe novamente a unidade federativa capixaba em primeiro lugar no número de assassinatos, sendo 47,4 homicídios para cada cem mil habitantes, enquanto a média nacional é de 21,7. A região metropolitana do estado, composta por sua capital, Vitória, e as cidades de Cariacica, Serra, Vila Velha e Viana, também apresenta números impressionantes, ocupando o décimo quinto lugar no ranking de cidades mais violentas do mundo, com a taxa de homicídios de 57 para cada cem mil habitantes, segundo levantamento feito pela organização não governamental mexicana Conselho Cidadão pela Seguridade Social Pública e Justiça Penal. Todavia, esses são dois problemas que devem ser analisados separadamente, uma vez que o estudo da violência contra a mulher possui especificidades que não são comtempladas ao falarmos da violência de forma geral. Historicamente o uso da violência contra a mulher nas relações familiares foi incentivado, ratificado e legitimado como forma de punir comportamentos desviantes do sexo feminino, garantindo aos homens o status dominante sobre as mulheres (LAGE, L.; NADER, M. B., 2014). Esta prática fez da unidade doméstica

4 locus privilegiado dessa violência, assim como retificou o seu caráter de gênero, uma vez que ser mulher apregoaria ao agressor o direito de atentar contra a integridade da vítima, a fim de subjuga-la. Uma vez que a violência objetiva a (des)individualização da vítima pelas relações de poderes nela contidas(alves, S. B.; DINIZ, N. M. F. 2005), nas relações de gênero ela é exercida pela parte que contem a maior porção de poder, a fim de dominar a que possui a menor porção dele (ALMEIDA, 1998.). Almeida ainda assevera que o uso da violência é um dos recursos utilizado pelo agente dominante quando o indivíduo a ser dominado não consente as outras formas de dominação, sendo necessário o uso de uma ação objetificadora, como a violência, para atingir tal objetivo. As DEAMs cumprem importante papel no estudo desses acontecimentos. Os registros das denúncias feitas nas delegacias especializadas são fontes singulares para o estudo da violência de gênero contra a mulher. Nos Boletins de Ocorrência (BOs), são registrados não só os dados socioeconômicos da vítima e do autor, além do relato narrado pela vítima acerca do fato, mas também o cruzamento destas informações permitem um olhar mais aprofundado e esclarecedor de como esses acontecimentos se desenrolam e suas motivações. Mapeamento da violência contra a mulher em Vitória-ES Tento em mente a riqueza dos BOs enquanto fonte para o estudo da violência contra a mulher, o Laboratório de Estudos de Gênero, Poder e Violência da Universidade Federal do Espírito Santo (LEG-UFES), sob a coordenação da Profª Drª Maria Beatriz Nader, iniciou no ano de 2009 o levantamento das denúncias registradas na DEAM/Vitória com o objetivo de mapear a violência contra a mulher na capital do Espírito Santo. Inicialmente pretendeu-se catalogar todos os registros feitos durante a primeira década do século XX (2001-2010), entretanto, só encontravam-se disponíveis nas dependências da DEAM/Vitória os arquivos referentes às denúncias feitas entre os anos de 2003 e 2010. Os registros referentes aos anos de 2001 e 2002 haviam sido transferidos para o arquivo geral da Polícia Civil. Em parceria com a Superintendência da Polícia Civil e a Secretaria Municipal de Cidadania da Prefeitura de Vitória, o LEG-UFES conseguiu ter acesso aos BOs referentes aos dois primeiros anos da década. Ao se levantar o material entregue pelo Arquivo Geral, constatouse que, apesar dos registros do ano de 2002 estarem completos, o ano de 2001 não apresentava o registro de, pelo menos, três meses. Desta forma o levantamento se restringiu

ao período compreendido entre os anos de 2002 e 2010, objetivando-se o mapeamento mais fidedigno da violência. O processo de coleta dos dados envolveu uma equipe de aproximadamente vinte pesquisadores oriundos dos cursos de graduação e pós-graduação em História da UFES e se estendeu até o ano de 2014. A coleta dos dados consistiu em um primeiro momento na cópia do conteúdo do BO para uma ficha confeccionada para o projeto, e no segundo momento a inserção dos dados coletados em um banco do Microsoft Access, que possibilita o cruzamento das informações e facilita a análise dos dados fornecidos pelo boletim. Foram catalogadas 12.255 ocorrências no período analisado. Os BOs contém dados socioeconômicos da vítima e do agressor como, por exemplo, a idade, cor da pele, profissão e endereço de ambas as partes, assim como dados relacionados ao fato, como o horário e local, e se houve testemunhas e em caso positivo, o grau de parentesco da testemunha com a vítima ou o autor. Os boletins também contam com o campo Relato da vítima onde o agente policial registra a descrição narrada pela vítima sobre a agressão. Todas essas informações foram inseridas no bando de dados permitindo o estudo quali-quantitativo dos casos de violência. Por fim, os BOs também contam com o campo motivação, onde podemos encontrar uma categorização criada para listar os motivos que levaram a prática da violência. As categorias utilizadas para o preenchimento deste campo estão descritas na Tabela 1: Tabela 1 Motivação dos casos registrados na DEAM/Vitória entre os anos de 2002 e 2010 1 Motivação Número de Registros Ciúme e outras situações 4.374 Problemas familiares 3.326 Álcool, droga e outras situações 2.358 Desemprego e problemas financeiros 1.342 Outras motivações imediatas 3.922 Fonte: Boletins de Ocorrência de DEAM-Vitória Vale destacar que as motivações registras nos BOs tem estreita relação com a ideia do senso comum no que diz respeito aos possíveis motivos para a violência doméstica. A pesquisa 5 1 Para a catalogação dos registros foram contabilizadas a frequência em que uma motivação foi registrada, uma vez que muitos boletins apresentam mais de uma motivação para o fato.

6 realizada pelo instituto Patrícia Galvão em parceria com o instituto AVON 2 apurou quais seriam, na opinião dos entrevistados, os motivos da violência doméstica contra a mulher, 38% apontaram o uso de álcool/alcoolismo como motivador, 36% a agressividade e o sentimento de posse do homem sobre a mulher, 15% que seria a mulher quem provoca as agressões e 8% alegam que razões financeiras seriam por que a violência acontece. Desta forma, faz-se necessário um olhar mais apurado a fim de promover uma análise mais sólida dos casos de violência contra a mulher que ocorreram em Vitória-ES. A pesquisa desenvolvida junto ao Programa de Pós-Graduação em História (PPGHIS) da UFES, da qual trata este trabalho, selecionou trabalhar com os casos em que o desemprego masculino foi motivador da violência contra a mulher. Como exemplo de como se deve ter um olhar mais crítico acerca das informações contidas nos BOs, dos 1.342 registros onde constam a motivação como sendo desemprego e problemas financeiros, apenas 52 citam diretamente o desemprego como motivação direta para a violência. Estes números precisam ser problematizados e abordados sob uma perspectiva diferente, dada a importância do trabalho para a identidade masculina, e como o desemprego a atinge, muitas vezes de maneiras sutis, e pode ser fator gerador de violência. O desemprego como fator de (des)identidade masculina O desemprego está ligado diretamente à incapacidade masculina de continuar a desempenhar o seu papel de prover a sua família, sendo assim um duro golpe na identidade do homem, e pode ser encarado como um estigma a ser encoberto a fim de não sofrer sanções sociais de seus iguais sendo encarado como inferior por não se encaixar no que seria considerado normal em seu grupo de convivência (GOFFMAN, 1988). A identidade masculina está entrelaçada com sua atividade profissional, o desempenho de uma atividade remunerada fora do lar foi incorporada ao papel social masculino, fazendo do trabalho o regulador de sua identidade. Embora o trabalho tenha, no Brasil, sido encarado como algo de menor valor social até meados do século XIX devido a sua ligação estrita com a escravidão e os seguimentos mais 2 Pesquisa nacional realizada em fevereiro de 2009, sobre a violência contra a mulher, encomendada pelo instituto Avon ao Ibope, com apoio do instituto Patrícia Galvão. Nessa pesquisa foram realizadas 2002 entrevistas pessoais em todos os estados brasileiros, capitais e regiões metropolitanas. Disponível em <http://agenciapatriciagalvao.org.br/wp-content/uploads/2009/08/pesq_ibope_2009.pdf> acesso em 15 de jan. de 2015.

7 pobres da população, desde o nascimento da república brasileira buscou-se a valorização da atividade profissional, principalmente como função primordial para a construção moral do homem (COLBARI, A. L., 1995). Desde então o trabalho tem sido regulador da vida do indivíduo do sexo masculino, sendo por ele que as atividades ditas masculinas dentro da organização social são possibilitadas. Desta forma, ao estar desempregado o homem perde o referencial, sua subjetividade sofre um grande golpe, mas para além das questões pessoais, no seu circulo social seu valor é diminuído. Ao perder o posto de trabalho, o homem fica aberto ao julgamento da falha, do fracasso. Nolasco (1995) ao tratar da construção subjetiva da masculinidade ressalta o valor da competição na constituição da sua identidade, o homem deve sempre buscar ser o melhor, ter mais. A situação de desemprego, por outro lado, impossibilita que esse quadro ideal da masculinidade contemporânea aconteça, a competitividade masculina é impossibilitada pelo não exercício de uma atividade remunerada, o homem desempregado sente-se um pária diante do seu grupo de convivência, um estigmatizado, uma parte fundamental de seu papel social é posta em xeque. O proposito de manter seu papel social de gênero é ter o controle dos membros da família, garantir que a imagem de ser forte, viril e potente transpareça através do sucesso orçamentário do lar, o que não é mais possível diante da falta de uma atividade remunerada. Nestes casos, a violência pode ser um dos caminhos escolhidos por esse homem para lidar com essa situação, uma vez que é legitimada culturalmente desde a época colonial, sendo uma forma de objetificar e diminuir a sua vítima (ALVEZ; DINIZ, 2005). Dessa forma, pelo uso da força o homem garantiria sua dominação sobre sua companheira, assegurando seu status social e reafirmando sua identidade masculina, mesmo estando em situação de desemprego. Autores desempregados nas denúncias da DEAM/Vitória: resultados preliminares Como anteriormente apontado, no levantamento das ocorrências da DEAM/Vitória acerca das motivações registradas nos BOs, o número de casos que citavam o desemprego diretamente como motivação para a violência somam um total de 52 boletins. Todavia, a natureza subjetiva dos danos advindos do não exercício de uma atividade remunerada nos levou a uma mudança na seleção dos casos a serem analisados na pesquisa. Optou-se por trabalhar apenas com os casos em que o autor era do sexo masculino e que a vítima o identificou no momento

do registro da ocorrência como desempregado, ou afirmou que ele não exercia atividade remunerada. Foram então catalogados 1.170 casos que atendiam a seleção feita pela pesquisa, representando aproximadamente 9,5% do total de casos registrados no período. Selecionados os casos a serem trabalhados, deu-se início ao cruzamento dos dados e análise, onde já foi possível obter alguns resultados preliminares que abrem o caminho para a desmistificação e entendimento desse tipo de violência. O primeiro cruzamento feito diz respeito à motivação para a agressão. Mesmo que esse registro seja feito com base no senso comum, ele pode nos auxiliar no entendimento do desenrolar dos fatos que levaram à agressão. Tabela 2 Comparação do número de registros de motivações geral e das ocorrências do autores desempregados 3 Motivação Número de registros - geral Número de registros - autores desempregados Ciúme e outras situações 4.374 (35,69%) 328 (28,03%) Problemas familiares 3.326 (27,13%) 152 (12,99%) Álcool, droga e outras situações 2.358 (19,24%) 207 (17,69%) Desemprego e problemas financeiros 1.342 (10,95%) 114 (9,74%) Outras motivações imediatas 3.922 (32%) 278 (23,76%) Total 12.964 1052 Fonte: Boletins de Ocorrência de DEAM-Vitória Como pode-se observar, a principal especificidade nesse cenário dos registros analisados pela pesquisa em relação ao quadro geral de denúncias, diz respeito a diminuição da participação dos problemas familiares e o ciúme e outras situações no quadro de motivações. É possível observar também que nos casos selecionados para a pesquisa as motivações tendem a se repetir em menor frequência, demostrando uma quantidade menor de BOs que foram preenchidos com mais de uma motivação. No caso do número geral de registros, a soma da frequência de cada motivação é superior ao número total de BOs, tendo sido excluído desse total os boletins onde não foi informada a motivação que representam aproximadamente 15% dos casos o que significa que houve um número muito maior de boletins preenchidos com mais de uma motivação. Já nos casos de agressores desempregados, a soma das 8 3 Para a catalogação dos registros foram contabilizadas a frequência em que uma motivação foi registrada, uma vez que muitos boletins apresentam mais de uma motivação para o fato. Neste gráfico foram adicionados a porcentagem aproximada de cada campo de motivação, a fim de facilitar a comparação entre os dois cenários expostos na tabela.

9 frequências é um pouco inferior ao número total de 1170 BOs, tendo desconsiderado os casos não informados, que somam pouco mais de 9% do total. Ao observarmos a tabela tendo em mente essa relação, as motivações relacionadas ao uso de drogas lícitas e ilícitas ganham destaque, uma vez que mantem uma porcentagem muito próxima ao número geral, mas nos casos envolvendo autores desempregados aparecem com mais frequência como sendo a única motivação identificada para a ocorrência. Entretanto o uso de entorpecentes como motivação para atos violentos deve ser questionado, uma vez que não é responsável pela agressividade de seus consumidores, sendo necessário problematizar o consumo dessas drogas inseridas no contexto social e psicológico, possibilitando assim um olhar mais apurado da participação dessas substâncias no processo que leva a agressão (MINAYO C. S., 1998). É preciso também o estudo da relação entre o consumo dessas substâncias com o desemprego, uma vez que um desses fatores pode ser a causa do outro, tendo forte impacto para a consumação do ato de violência. No segundo levantamento de dados, observou-se que os números relacionados a violência conjugal, aquela em que o agressor mantem relação afetiva com a vítima como, por exemplo, marido ou companheiro, não é diretamente proporcional aos casos de violência conjugal envolvendo autores desempregados, como pode ser observado no Gráfico 1: Gráfico 1 - Autores desempregados e violência conjugal Casos de violência conjugal Número de ocorrências com autores desempregados Casos de violência conjugal praticado por autores desempregados 619 549 534 496 482 422 441 504 535 192 115 125 67 54 16 147 96 98 123 85 43 49 38 39 21 231 85 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 Fonte: Boletins de Ocorrência da DEAM/Vitória

10 Como exemplo dessa desproporcionalidade, no ano de 2004, apesar da queda no número de casos de violência conjugal ser muito pequena, os casos desse tipo de violência envolvendo autores desempregados tiveram uma queda expressiva, sendo o total de 67 casos no ano de 2003, para 16 no ano de 2004. Assim como nos anos de 2008 e 2009, apesar do aumento dos números de casos de agressão de mulheres por seus maridos e companheiros ter aumentado de um ano para outro, no cenário onde o autor está desempregado, o número de registros sofreu ligeira queda. A resposta para esse fenômeno pode ser encontrada se relacionarmos os números da violência perpetrada por autores que não exercem atividade remunerada à taxa de desocupação de homens e mulheres no período analisado. 4 Na Tabela 3 pode-se observar essas taxas no Espírito Santo, segundo a Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios (PNAD) publicada anualmente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), de 2002 à 2010: Tabela 3 Taxa de desocupação masculina e feminina (2002-2010) Ano Taxa de desocupação masculina (%) Taxa de desocupação feminina (%) 2002 31,3 52,4 2003 32,1 51,0 2004 28,8 50,9 2005 29,8 50,8 2006 29,0 49,9 2007 33,1 52,4 2008 29,6 50,1 2009 30,9 49,4 2010 31,3 51,0 Fonte: PNAD IBGE A partir dos números referentes ao exercício de atividade remunerada tanto por homens como por mulheres, foi possível observar que houve relação entre o aumento ou queda da taxa de desocupação de homens e mulheres e a frequência dos casos envolvendo autores desempregados, como pode ser observado no Gráfico 2: 4 Nesta pesquisa optou-se pelo uso da taxa de ocupação como variável, em detrimento da taxa de desemprego. Uma vez que a taxa de desemprego só contempla o índice de pessoas que perderam suas posições no mercado de trabalho, ao contrário da taxa de ocupação, que abrange a totalidade da População Economicamente Ativa que está trabalhando, sendo os desocupados aqueles que estão em busca ou não de emprego. Acreditamos que esse índice forneça um retrato melhor do grupo ao qual a pesquisa se dedica.

11 Gráfico 2 - Taxa de ocupação por sexo e taxa de ocorrência com autores desempregados Taxa de desocupação masculina Taxa de registros com autores desocupados Taxa de desocupação feminina 52.4 51 50.9 50.8 49.9 52.4 50.1 49.4 51 31.3 32.1 28.8 29.8 29 33.1 29.6 30.9 31.3 17.11 11.32 4.31 8.9 14.23 9.1 10.83 6.97 17.31 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 Fonte: Boletins de ocorrência da DEAM/Vitória e PNAD - IBGE Retomando os casos citados anteriormente, a taxa de desocupação masculina no ano de 2004 foi menor que no ano de 2003, ao passo que a feminina se manteve estável, tendo uma queda de apenas 0,1%, ou seja, nesse período havia mais homens exercendo alguma atividade remunerada do que mulheres. Esse quadro reflete uma situação ideal dentro da construção dos papeis sociais baseados em uma lógica patriarcal, como exposto anteriormente, isso explicaria o porquê de apesar da pouca diferença no número de casos de violência conjugal entre os anos de 2003 e 2004, este teve uma taxa menor de casos envolvendo autores desempregados, devido a diminuição da taxa de desocupação masculina, ao passo que a feminina permaneceu praticamente a mesma. Assim como no ano seguinte, o aumento na taxa masculina provocou o aumento dos casos selecionados para a pesquisa, passando de 4,31% para 8,9%. Essa relação pode ser explicada pela inversão de papéis que acontece nesse cenário. O aumento da presença feminina no mercado de trabalho alinhado ao não exercício de atividade remunerada pelo homem, coloca a primeira na posição de provedora da unidade doméstica, lugar que outrora foi apanágio do segundo. A dominação antes exercida pelo homem e viabilizada por seu papel de provedor, não mais se justifica, uma vez que a mulher agora é a única fonte de renda da família, cabendo a ela a administração do lar. Como dito anteriormente, essa situação gera o conflito do homem com sua identidade, atinge sua

12 masculinidade levando a busca pela retomada do domínio sobre a mulher, que nos casos aqui apresentados, acontece por meio da violência. Tendo em mente que a violência é uma forma de buscar a reposição do status de dominação perdido, analisou-se a diferença com relação aos tipos de violência praticados por autores desempregados em relação aos tipos de violência registrados em todo o período. O resultado pode ser visto nos gráficos 3 e 4: Gráfico 3 - Tipos de violência - geral Psicológica Fìsica Moral Patrimonial Sexual 3% 1% 15% 47% 34% Gráfico 4 - Tipos de violência - autores desempregados Pscicológica Física Moral Patrimonial Sexual 2% 0% 11% 35% 52% Os casos envolvendo autores desempregados tendem a envolver formas mais agressivas de violência. No que diz respeito à violência psicológica, expressa nos BOs principalmente por ameaças e perseguição, os casos selecionados para a pesquisa tem um aumento de 5% em relação aos outros registros, e 1% na modalidade de violência física. As ameaças, em sua

13 maioria contra a vida da vítima, somam 310 casos, aproximadamente 26% do total. É importante ressaltar que os números apresentados nos gráficos 3 e 4 refletem a frequência em que os tipos de violência foram perpetrados, sendo que em alguns registros são encontrados mais de um tipo de violência combinados. Se analisarmos as várias formas de violência combinadas, aquelas perpetradas por autores desempregados ainda se destacam na agressividade. A taxa de boletins onde foi registrada a prática de violência física combinada com a psicológica é de aproximadamente 8% nos casos gerais, e de pouco mais de 11% nos casos envolvendo autores desempregados. Por ultimo, apurou-se que a distribuição dos casos analisados pela pesquisa no espaço geográfico da cidade de Vitória/ES não obedece à mesma lógica dos demais casos registrados na delegacia especializada. A capital do estado do Espírito Santo é composta por nove regiões administrativas que são divididas a partir da posição geográfica e dados socioeconômicos dos bairros. Conforme se pode observar nos gráficos 5 e 6, apesar da Região 4 ocupar o primeiro lugar em número de denuncias nos cenários, algumas mudanças significativas ocorrem nos casos estudados pela pesquisa. Gráfico 5 - Número de ocorrências por regiões administrativas 2,764 861 1,422 1,353 1,043 796 1,800 658 807 Fonte: Boletins de ocorrência da DEAM/Vitória

14 Gráfico 6 - Número de ocorrências por região administrativa - autores desempregados 193 273 90 106 69 77 164 43 37 Fonte: Boletins de ocorrência da DEAM/Vitória Considerações finais O estudo sobre a violência contra a mulher na cidade de Vitória/ES ainda tem muitas frentes a serem desbravadas para o entendimento deste fenômeno, mas o mapeamento feito pelo LEG- UFES já avançou significantemente nesse sentido, abrindo caminho para que pesquisadoras e pesquisadores interessados nesta questão. No que tange ao papel do desemprego masculino nesses casos, a partir dos resultados preliminares aqui expostos, acredita-se que a pesquisa sobre a qual trata esse trabalho, demostra que ele é um motivador da violência perpetrada contra as mulheres da capital do Espírito Santo. Todavia, os dados aqui expostos só representam uma parte dos cruzamentos possíveis do conteúdo dos boletins de ocorrência. A fase final da pesquisa buscará o mapeamento completo dos casos motivados pelo desemprego do autor, além da construção do perfil socioeconômico dele e da vítima, que é fundamental para entender a dinâmica que envolve esse tipo de violência. Para além da exposição das especificidades que compõem o conjunto de denúncias contra autores de violência que não exercem atividade remunerada, almeja-se a análise de relatos das vítimas que ajudem a entender as dinâmicas dessas relações e dos fatos ocorridos, promovendo assim o entendimento desses acontecimentos.

15 Por último, tem-se como objetivo a demonstração que esses casos são resultado da permanência de práticas patriarcais na sociedade contemporânea, que ainda estão presentes nas relações de gênero. Assim como a demonstração de que essas práticas sobrevivem por meio de um conceito de masculinidade que ainda está atrelado a uma ideia patriarcal de relações sociais, sendo incompatível com a ressignificação do lugar social da mulher, que pode ser observada nas ultimas décadas. Referencial teórico ALMEIDA, S. S. de. Feminicídio: algemas (in)visíveis do público-privado. Rio de Janeiro: Reinverter 1998. ALVES, S. B.; DINIZ, N. M. F. "Eu digo não, ela diz sim": a violência conjugal no discurso masculino. Revista Brasileira de Enfermagem, Brasília, v. 58, n. 4, jul./ago. 2005. COLBARI, A. L.. Ética do trabalho. São Paulo: Letras e Letras; Vitória-ES: FCAA-UFES, 1995 GOFFMAN, Erving. Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. 4. ed. - Rio de Janeiro: Zahar, 1982 LAGE, L.; NADER, M. B. Violência contra a mulher: da legitimação à condenação social. In PEDRO, J. M. PINSKY, C. B. Nova história das mulheres. São Paulo: Contexto, 2014 MINAYO C. S. Complexidade das relações entre drogas, álcool e violência. Cad Saúde Pub 1998. ; SOUZA, E. R. de. É possível prevenir a violência? Reflexões a partir do campo da saúde pública. Ciência & Saúde Coletiva, 1999. NOLASCO, S.. O mito da masculinidade. 2ª ed. Rio de Janeiro: Rocco, 1995. WAISELFISZ, J. J. Mapa da violência: homicídio de mulheres. Rio de Janeiro: CEBELA/FLACSO, 2012. Disponível em <http://www.mapadaviolencia.net.br/pdf2012/mapa2012_mulher.pdf> acesso de 22 de jan. de 2015

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