AVALIAÇÃO TECNOLÓGICA DE BISCOITOS SEM GLÚTEN ELABORADOS COM FARINHA E FARELO DE ARROZ L. H. da Silva 1, D. R. Arce 2, P. F. P. da Costa 1 1- Docentes do Curso de Ciência e Tecnologia de Alimentos Universidade Federal do Pampa - campus Itaqui CEP: 97650-000 Itaqui RS Brasil, Telefone: +55 (55) 3432-1850, Ramal 3813 e-mail: leomarsilva@unipampa.edu.br. 2- Acadêmica do Curso de Ciência e Tecnologia de Alimentos Universidade Federal do Pampa campus Itaqui e-mail: daniellearce@hotmail.com. RESUMO Objetivou-se avaliar o efeito da substituição parcial da farinha de arroz (FA) por farelo de arroz (FRA) em formulações de biscoitos livres de glúten e lactose, sem adição de açúcar e gorduras trans. Foram desenvolvidos cincos formulações com substituição da FA por FRA nas proporções: F0 (100:0%), F1 (90:10%), F2 (80:20%), F3 (70:30%) e F4 (60:40%) respectivamente. Avaliou-se a perda de peso, o diâmetro, a espessura, o volume específico e a dureza dos biscoitos. Os resultados indicaram que o aumento na substituição de FA por FRA promoveu aumento na perda de peso, no diâmetro, na espessura, no volume especifico e na dureza dos biscoitos. A elaboração de biscoitos com substituição da FA por até 20% de FRA, apresentou características tecnológicas aceitáveis, não influenciando negativamente o volume e a textura dos biscoitos, além de apresentar potencial de melhor valor nutricional e propriedades funcionais. ABSTRACT The objective of this study was to evaluate the effect of partial substitution of rice meal (RM) on rice bran (RB) in gluten and lactose free biscuit formulations, without addition of sugar and trans fats. Five formulations were developed with replacement of RM by RB in the proportions: F0 (100:0%), F1 (90:10%), F2 (80:20%), F3 (70:30%) and F4 (60:40%) respectively. The weight loss, the diameter, the thickness, the specific volume and the hardness of the biscuits were evaluated. The results indicated that the increase in the replacement of RM by RB promoted an increase in weight loss, diameter, thickness, specific volume and hardness of biscuits. The preparation of biscuits with RM substitution up to 20% of RB presented acceptable technological characteristics, not negatively influencing the volume and texture of biscuits, besides presenting potential of better nutritional value and functional properties. PALAVRAS-CHAVE: Glúten free; farelo de arroz; biscoitos. KEYWORDS: Gluten free; rice bran; cookies. 1. INTRODUÇÃO Os biscoitos são produtos de panificação de grande interesse comercial, dadas as suas características de produção, comercialização e consumo, demanda elevada, relativamente longa vida de prateleira e boa aceitação, particularmente entre crianças e adolescentes. Nos últimos anos a pesquisa no desenvolvimento de novos produtos alimentícios tem voltada a sua atenção para temas como, produtos livres de livres de glúten, de lactose, redução de calorias, sem adição de açúcar e
gorduras trans, combinados com ingredientes que apresentem propriedades funcionais (Silva et al., 2009; Moraes et al., 2010; Zucco et al., 2011). O aproveitamento industrial de produtos derivados do arroz, como farinha e farelo de arroz na obtenção de produtos alimentícios para fins especiais e com propriedades funcionais pode ser uma alternativa viável, pois a farinha de arroz apresenta maior digestibilidade, maior valor biológico e elevado quociente de eficiência proteica, apesar de sua deficiência em lisina, é rica em minerais e vitaminas do complexo B (Teba et al., 2010). Além disso, pelo seu baixo índice glicêmico pode auxiliar na prevenção de doenças do aparelho digestivo, cardiovasculares e no controle do diabetes. Como não possuem as proteínas formadoras do glúten na sua constituição é também utilizada na dieta dos portadores de doença celíaca (Severo et al., 2010). A doença celíaca é considerada uma enteropatia crônica autoimune, caracterizada principalmente pela inflamação do intestino delgado e induzida por intolerância à ingestão de alimentos que contenham proteínas do glúten encontradas principalmente no trigo, aveia, triticale, centeio e cevada (Araújo et al., 2010). O tratamento consiste exclusivamente em dieta isenta de glúten. Entretanto, fontes alternativas são necessárias para suprir as necessidades fisiológicas desses indivíduos, destacando-se o arroz e seus derivados, produtos livres de frações proteicas de glutenina e gliadina (Baldi, 2013). A utilização do farelo de arroz para consumo humano no Brasil ainda é bastante reduzida, no entanto, a tendência do mercado mundial e as pesquisas apontam para promissoras aplicações desse produto, principalmente devido ao seu elevado valor nutricional e a presença de compostos antioxidantes, que são benéficos á nutrição humana (Maragno & Kuhn, 2015). No desenvolvimento de novos produtos com fins especiais e com apelo nutricional mais saudável, devido à substituição de ingredientes tradicionais, tais como o açúcar, que vem sendo cada vez mais substituídos por adoçantes naturais, como a stévia, a qual possui um grande poder adoçante, cerca de 300 vezes maior que a sacarose, não produz cáries e é isento de calorias (Abdel-Rahman et al. 2011). A elaboração de biscoitos a base de farinha de arroz enriquecido com farelo de arroz pode ser uma alternativa viável para o consumo de produtos livres de glúten com maior valor nutricional e com propriedades funcionais. Este trabalho teve como objetivo avaliar o efeito da substituição parcial da farinha de arroz por farelo de arroz nas características tecnológicas de formulações de biscoitos livres de glúten, lactose, sem adição de açúcar e gorduras trans. 2. MATERIAL E MÉTODOS 2.1 Matérias-primas Na elaboração dos biscoitos foi utilizado farelo de arroz (FAR) doado pela empresa local de beneficiamento de arroz, sendo os demais ingredientes da formulação, tais como: a farinha de arroz (FA), o óleo de coco, edulcorante stévia, sal refinado, fermento químico e bicarbonato de sódio, foram obtidos em estabelecimentos comerciais locais. 2.2 Elaboração dos biscoitos a base de farinha e farelo de arroz As formulações dos biscoitos foram desenvolvidas com base na formulação proposta por Assis et al. (2009) com devidas modificações, sendo realizadas substituições da farinha de trigo, do açúcar e da gordura vegetal hidrogenada, por farinha de arroz, farelo de arroz, stévia e óleo de coco, visando
desenvolver uma formulação de biscoitos livre de glúten e lactose, sem adição de açúcar e gordura trans, porém com adição de fibras que pode melhorar o valor nutricional. Foram desenvolvidas cinco formulações com substituição parcial de farinha de arroz (FA) por farelo de arroz (FRA) nas seguintes proporções: F0 (controle 100% FA); F1 (90:10%); F2 (80:20%); F3 (70:30%) e F4 (60:40%), respectivamente. Os demais ingredientes permaneceram constantes nas diferentes formulações de biscoitos, sendo os valores calculados em relação à quantidade de farinha e farelo de arroz, na proporção de 30% óleo de coco, 44% de stévia, 21% de água, 0,9% de sal, 2,1% de fermento químico e 2,0% de bicarbonato de sódio. No preparo da massa, os ingredientes foram pesados em balança analítica e acondicionados em um recipiente, onde foram misturados para a obtenção da massa dos biscoitos. Em seguida a massa foi divida em porções de 15 a 14 g, modelada manualmente em formato circular, colocadas em formas retangulares untadas e levadas ao forno em temperatura de 170ºC de 15 a 20 minutos, passado este tempo os biscoitos foram resfriados a temperatura ambiente, pesados e acondicionados em embalagens de polietileno até o momento da realização das análises. 2.3 Avaliações Tecnológicas dos Biscoitos As análises físicas realizadas nos biscoitos foram determinações de peso, diâmetro e espessura, avaliados antes e após a cocção. A pesagem foi realizada em balança digital semi-analitica. O diâmetro e a espessura foram medidos com o auxílio de um paquímetro e o fator de expansão foi obtido pela razão entre os valores de diâmetro e espessura dos biscoitos. O volume específico foi determinado pelo o método de deslocamento de sementes de painço, de acordo com o método 72-10 da AACC (2000). A textura instrumental (dureza) dos biscoitos foi determinada utilizando-se Texturômetro, modelo CT3-4500, marca Brookfield. Foram utilizadas as seguintes condições: Plataforma de teste retangular TA-JTPP, sonda de corte retangular TA47 (60 mm de comprimento e 30 mm de altura), teste: normal, força inicial: 4,5 g, deformação: 3 mm, velocidade do teste: 0,5 mm/s. A análise foi realizada em triplicata e os resultados expressos em g (gramas). 2.4 Análise Estatística Os dados obtidos foram analisados utilizando-se o software Action Stat (Estatcamp, 2014), avaliando a análise de variância (ANOVA) e o teste de Tukey para comparação das médias, considerando um nível de significância de 5%. 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO As características tecnológicas, tais como diâmetro, espessura, fator de expansão, volume e textura dos biscoitos influenciam tanto nas propriedades industriais, interferindo na padronização e embalagem do produto final, quanto na aceitabilidade dos biscoitos pelos consumidores. Na Tabela 1, estão apresentados os resultados das avaliações tecnológicas dos biscoitos elaborados com farinha e farelo de arroz. Observa-se que o aumento da adição de farelo de arroz na formulação influenciou significativamente os parâmetros físicos dos biscoitos, de modo geral, após o forneamento houve aumento da perda de peso (PPDF) dos biscoitos variando entre 0,53 g (F0) até 1,03 g (F4), aumento no diâmetro dos biscoitos (ADDF) que passou de 0,24 cm (F0) para 0,36 cm (F4) e na espessura (AEDF) que variou de 0,33 mm (F0) para 0,40 mm (F4). Estes resultados estão de acordo com os
obtido por Feddern, et al. (2011), que elaboraram biscoitos com farelo de arroz e observaram um aumento dos valores de diâmetro, de espessura e uma diferença de até 1,0 g na massa dos biscoitos antes e depois do forneamento. Tabela 1 - Avaliação tecnológica das formulações dos biscoitos com diferentes concentrações de farelo de arroz Parâmetros Formulações de biscoitos F0 F1 F2 F3 F4 PPDF (g) 0,53±0,03 d 0,82 ± 0,02 c 0,99±0,01 b 1,02±0,01 ab 1,03±0,01 a ADDF (cm) 0,24±0,04 b 0,33±0,05 a 0,33±0,01 a 0,31±0,01 a 0,36±0,01 a AEDF (mm) 0,33±0,04 b 0,33±0,02 b 0,41±0,02 a 0,38±0,01 ab 0,40±0,02 a FE 5,81±0,11 c 6,21±0,07 b 6,46±0,02 a 6,12±0,07 b 6,25±0,05 b VE (cm 3.g -1 ) 1,03±0,01 c 1,07±0,02 b 1,07±0,01 b 1,10±0,01 b 1,18±0,03 a Dureza (g) 100,66±2,41 d 130,66±0,98 c 171,83±4,36 b 191,9±3,43 a 198,36±6,61 a Médias de três repetições ± Desvio-padrão seguidas de letras iguais na mesma linha indicam não haver diferença significativa entre os resultados, para (p<0,05). As formulações representam a proporção entre a adição de FA e FRA, onde F0 (100:0%), F1 (90:10%), F2 (80:20%), F3 (70:30%) e F4 (60:40%) respectivamente. PPDF - Perda de peso depois do forneamento; ADDF- Aumento de diâmetro depois do forneamento; AEDF Aumento da espessura depois do forneamento; FE- fator de expansão; VE- volume específico. Em relação aos valores de fator de expansão, volume específico e dureza dos biscoitos, observa-se na Tabela 1, que o aumento da adição de farelo de arroz na formulação promoveu aumento no fator de expansão dos biscoitos, o qual passou de 5,81 (F0) para 6,46 (F2) e um aumento de aproximadamente 14,56% nos valores de volume específico, os quais passaram de 1,03 cm 3.g -1 (F0) para 1,18 cm 3.g -1 (F4). No caso da textura houve um aumento nos valores de dureza dos biscoitos em 97,06%, passando de 100,66 g (F0) para 198,36% (F4). Este comportamento pode estar relacionado com a maior incorporação de proteínas, fibras e lipídeos, presentes no farelo de arroz, que influenciam nas propriedades de tecnológicas dos biscoitos (Moraes et al., 2010; Feddern, et al., 2011; Mariani et al., 2015). Em um estudo de Assis et al. (2009) com biscoitos elaborados com a substituição de farinha de trigo por farinha de aveia e farelo de arroz, foram encontrados valores de volume específico que variaram entre 0,92 e 1,76 cm 3. g -1. Os autores atribuíram esse aumento no volume específico devido às fibras presentes no farelo de arroz, que apresentam uma grande capacidade absorção de água. Sudha et al. (2007) observaram que a dureza de biscoitos aumentou com o aumento da adição de 10% para 40% farelo de aveia em formulações de biscoitos, sendo este comportamento associado à quantidade de fibras presentes no farelo de aveia. De modo geral, os produtos de panificação disponíveis hoje no mercado, livres de glúten são caracterizados pela baixa qualidade tecnológica, nutricional e sensorial, quando comparado com os produtos convencionais à base de farinha de trigo, pois o glúten é responsável pelas características de volume e textura dos produtos. Diante disto, a elaboração de biscoitos livres de glúten com adição de matérias-primas de elevado valor nutricional, com o caso do farelo de arroz, pode ser uma alternativa viável para melhorar o valor nutricional desses produtos (Araújo et al. 2010; Maragno et al 2015). Neste estudo foi possível desenvolver formulações de biscoitos livres de glúten e lactose a base de farinha de arroz e com adição de até 20% de farelo de arroz, conferindo aos biscoitos maior diâmetro, espessura, fator de expansão, volume específico e maior crocância. Além de apresentar potencial de melhor valor nutricional.
4. CONCLUSÃO Os resultados obtidos no trabalho permitem concluir que o aumento na substituição de FA por FRA promoveu aumento na perda de peso, no diâmetro, na espessura, no volume especifico e na dureza dos biscoitos. A elaboração de biscoitos com substituição da FA por até 20% de FRA, resultou em características tecnológicas aceitáveis, não influenciando negativamente o volume e a textura dos biscoitos livres de glúten, além de apresentar potencial de melhor valor nutricional e propriedades funcionais. 5. AGRADECIMENTOS A Pró-Reitoria de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação (PROPPI) da UNIPAMPA e ao Núcleo de Pesquisa em Tecnologia de Grãos e Produtos Amiláceos (NUTEGRA) da UNIPAMPA Campus Itaqui, pelo apoio ao projeto. 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AACC - American Association of Cereal Chemists (2000). Approved Methods. 10 ed. Saint Paul. Abdel-Rahman, A., Anyangwe, N., Carlacci, L., Casper, S., Danam, R. P., Enongene, E. & Hines, F. (2011). The safety and regulation of natural products used as foods and food ingredients. Toxicological Sciences, 123(2), 333-348. Araújo, H. M. C., Araújo, W. M. C., Botelho, R. B. A., & Zandonadi, R. P. (2010). Doença celíaca, hábitos e práticas alimentares e qualidade de vida. Revista de Nutrição, 23(3), 467-474. Assis, L. M., Zavareze, E. D. R., RADÜNZ, A. L., DIAS, Á., Gutkoski, L. C., & Elias, M. C. (2009). Propriedades nutricionais, tecnológicas e sensoriais de biscoitos com substituição de farinha de trigo por farinha de aveia ou farinha de arroz parboilizado. Alimentos e Nutrição Araraquara, 20(1), 15-24. Baldi, J. S. (2013). Produto de panificação (bolo) a partir da farinha de arroz, maçã e soja. Trabalho de Conclusão de Curso (Tecnologia em Alimentos). Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Campo Mourão. ESTATCAMP (2014). Software Action. Estatcamp- Consultoria em estatística e qualidade, São Carlos - SP, Brasil. Disponível em: http://www.portalaction.combr/. Acesso em 02/03/2018. Feddern, V., Durante, V. V. O., de Miranda, M. Z., & Mellado, M. D. L. M. S. (2011). Avaliação física e sensorial de biscoitos tipo cookie adicionados de farelo de trigo e arroz. Brazilian Journal of Food Technology, 14(4), 267-274. Maragno, V. P., & Kuhn, R. C. (2015). Estabilidade do farelo de arroz sob diferentes tratamentos: micro-ondas, peletização e desengorduramento. Journal of Health Sciences, 15(1). Mariani, M., de Oliveira, V. R., Faccin, R., de Oliveira Rios, A., & Venzke, J. G. (2015). Elaboração e avaliação de biscoitos sem glúten a partir de farelo de arroz e farinhas de arroz e de soja. Brazilian Journal of Food Technology, 18(1), 70. Moraes, K. S., da Rosa Zavareze, E., de Miranda, M. Z., & de las Mercedes Salas-Mellado, M. (2010). Avaliação tecnológica de biscoitos tipo cookie com variações nos teores de lipídio e de açúcar. Tecnologia de Alimentos, Campinas, v. 30, p. 233-242. Severo, M. G., de Moraes, K., & Ruiz, W. A. (2010). Modificação enzimática da farinha de arroz visando à produção de amido resistente. Química Nova, 33(2), 345-350.
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