Universidade Estadual de Santa Cruz. Reitora: Adélia Maria Carvalho de Melo Pinheiro Vice-Reitor: Evandro Sena Freire. Departamento de Letras e Artes



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Universidade Estadual de Santa Cruz Reitora: Adélia Maria Carvalho de Melo Pinheiro Vice-Reitor: Evandro Sena Freire Departamento de Letras e Artes Diretor: Isaías Francisco de Carvalho Vice-Diretor: Fernando José Reis de Oliveira Rodovia Jorge Amado (BA-415), km 16 Campus Soane Nazaré de Andrade CEP 45662-900 Ilhéus Bahia Brasil Endereço eletrônico: letras@uesc.br Sítio eletrônico: http://www.uesc.br/dla/index.php Fone/Fax: 55 73 3680-5088 EID&A Revista Eletrônica de Estudos Integrados em Discurso e Argumentação ISSN 2237-6984 Editores Eduardo Lopes Piris Emília Mendes Isabel Cristina Michelan de Azevedo Moisés Olímpio Ferreira Paulo Roberto Gonçalves Segundo Endereço eletrônico: revista.eidea@gmail.com Sítio eletrônico: http://www.uesc.br/revistas/eidea Indexada em:

EID&A: Revista Eletrônica de Estudos Integrados em Discurso e Argumentação Departamento de Letras e Artes Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC) Editores Eduardo Lopes Piris Emília Mendes Isabel Cristina Michelan de Azevedo Moisés Olímpio Ferreira Paulo Roberto Gonçalves Segundo Conselho editorial Ana Maria Di Renzo (UNEMAT) Ana Zandwais (UFRGS) Anna Flora Brunelli (UNESP) Carlos Piovezani (UFSCar) Christian Plantin (ICAR/CNRS) Cristian Tileaga (U.Loughborough) Christiani Margareth de Menezes e Silva (UESC) Eduardo Chagas Oliveira (UEFS) Edvânia Gomes da Silva (UESB) Eliana Alves Greco (UEM) Eugenio Pagotti (UFS) Evandra Grigoletto (UFPE) Fabiana Cristina Komesu (UNESP) Fabiele Stockmans de Nardi (UFPE) Galia Yanoshevsky (U.Tel-Aviv) Gilberto Nazareno Teles Sobral (UNEB) Grenissa Bonvino Stafuzza (UFG) Guylaine Martel (U. Laval) Helena Nagamine Brandão (USP) Ivo José Dittrich (UNIOESTE) John E. Richardson (U.Newcastle) José Niraldo de Farias (UFAL) Juan Eduardo Bonnin (UBA) Juan Marcelo Columba-Fernández (UPEA) Juciane dos Santos Cavalheiro (UEA) Leonildo Silveira Campos (UMESP) Lineide Salvador Mosca (USP) Luciana Salazar Salgado (UFSCar) Luciano Novaes Vidon (UFES) Manuel Alexandre Júnior (U.Lisboa) Marc Angenot (U.MacGill) Márcia Regina Curado Pereira Mariano (UFS) Maria Adélia Ferreira Mauro (FOCSP) María Alejandra Vitale (UBA) Maria Amélia Chagas Gaiarsa (UCSAL) Maria de Lourdes Faria dos Santos Paniago (UFG) Maria Eliza Freitas do Nascimento (UERN) Maria Emília de Rodat de A. Barreto Barros (UFS) Maria Helena Cruz Pistori (PUCSP) Maria Rosa Petroni (UFMT) Maria Teresinha Py Elichirigoity (UFRGS) Marianne Doury (CNRS) Marie-Anne Paveau (U.Paris XIII) Marinalva Vieira Barbosa (UFTM) Marisa Grigoletto (USP) Maurício Beck (UESC) Nelson Barros da Costa (UFC) Pedro Luis Navarro Barbosa (UEM) Ricardo Henrique Resende de Andrade (UFRB) Rui Alexandre Grácio (U.Nova de Lisboa) Ruth Amossy (U.Tel-Aviv) Ruth Wodak (U.Lancaster) Sheila Vieira de Camargo Grillo (USP) Sírio Possenti (UNICAMP) Sophie Moirand (U.Paris III) Soraya Maria Romano Pacífico (USP) Thierry Guilbert (U. Picardie) Valdemir Miotello (UFSCar) Valdir Heitor Barzotto (USP) Vânia Lúcia Menezes Torga (UESC) Viviane Cristina Vieira Sebba Ramalho (UnB) Viviane de Melo Resende (UnB) Wander Emediato de Souza (UFMG) William Augusto Menezes (UFOP) William M. Keith (U.Wisconsin) Zilda Gaspar Oliveira de Aquino (USP) Revisores Alice Vasques de Camargo Anna Carolina Araújo Giselle Luz Laurenci Barros Esteves Leonardo Dalvo Silva de Andrade Roberto Santos de Carvalho Capa e logotipo Laurenci Barros Esteves Diagramação Eduardo Lopes Piris

Revista Eletrônica de Estudos Integrados em Discurso e Argumentação JORNALISMO ONLINE E A REALIDADE REEMPACOTADA André Luiz Silva i Resumo: Tomando como base a Teoria Semiolinguística, de Patrick Charaudeau, mais especificamente, o livro Discurso das mídias (2010), neste trabalho, propõe-se apresentar, discutir e, em certo sentido, atualizar os conceitos apresentados pelo pensador francês em relação à construção de sentido no discurso jornalístico. Uma vez que a obra em questão é de 1997, período em que a internet ensaiava seus primeiros passos e, consequentemente, o jornalismo online, torna-se necessário rever as considerações apresentadas por Charaudeau, adequando-as a esse novo e revolucionário meio de informação. Para isso, buscou-se analisar os portais folha.com e oglobo.com, oriundos, respectivamente, dos jornais Folha de S. Paulo e O Globo. A partir dos dados coletados, é possível perceber uma superestimação do quesito atualidade por parte dos portais, nos quais 85% das notícias da home page são atualizadas em um intervalo de seis horas. Com isso, observa-se, em boa parte dos casos, maior publicação de matérias procedentes de agências de notícias, o que subverte o papel do jornalista, de observador do mundo a descrever e a comentar para reempacotador de conteúdos. Palavras-chave: Análise do discurso. Jornalismo online. Notícia. Construção de sentido. Abstract: Based on the Semiolinguistic Theory, Patrick Charaudeau, more specifically, the book Discurso das mídias (2010), this work intends to present, discuss and to update the concepts presented by the French scholar regarding the construction of sense in journalistic discourse. Since the work is from 1997, a period when the internet was rehearsing its first steps and so was the online journalism it becomes necessary to review the considerations presented by Charaudeau, adapting them to this new and revolutionary way of information. For this, we have analyzed the portals folha.com and oglobo.com, which come respectively from the newspapers Folha de S. Paulo and O Globo. Based on the data collected, it is possible to realize an overestimation of this question today by the portals, in which 85% of the news of the home page are updated at an interval of six hours. Thus, there is, in most cases, a greater publication of stories coming from news agencies, which subverts the role of the journalist, observer of the world to describe and comment to repackager of content. Keywords: Discourse analysis. Online journalism. News. Construction of meaning. 37 i Mestrando em Estudos de Linguagens pelo Centro Federal de Educação Tecnológica (CEFET-MG), Brasil. E-mail: andre.alvaresesilva@gmail.com.

Introdução Uma notícia é, por definição, efêmera. Dura tanto quanto um relâmpago, o instante de sua aparição Patrick Charaudeau Baseando-se nos conceitos de Patrick Charaudeau (2010) acerca do contrato de comunicação midiática e das estratégias de construção da notícia, o presente trabalho analisa a maneira como estes dois construtos estão presentes entre os meios noticiosos da internet. Nessa amálgama, com base em livros, pesquisas e manuais de redação, instigantes hipóteses e inferências são suscitadas acerca da visão dos meios de comunicação a respeito da sua praxis e do seu público. Dessa maneira, na primeira parte, busca-se apresentar a noção de contrato, bem como de estratégia de construção da notícia, sobretudo em relação aos critérios de seleção dos fatos. Se nos tradicionais meios noticiosos impresso, rádio e TV a obsessão pelo presente, pela atualidade é uma das principais (ou a principal) estratégias para a seleção de um fato como sendo digno de ser noticiado, como isso se dá nos meios noticiosos da internet? O segundo tópico deste artigo procura demonstrar, por meio de breves análises dos portais de notícias folha.com e oglobo.com, de que maneira os conceitos apresentados por Charaudeau (2010) vão ao encontro de ou de encontro ao que é feito pelas redações online. De maneira pretensa, adequações e atualizações em relação às teorias do autor serão propostas, a fim de aproximar tais conceitos daquilo que atualmente é produzido e pensado pela instância midiática 1. 1 Do contrato de comunicação à atualidade como estratégia De maneira objetiva, a noção de contrato de comunicação, seja midiático ou não, pressupõe que os atores envolvidos na interação comunicacional estão, explícita ou implicitamente, envoltos por certos princípios e regras, quase sempre de forma tácita, a partir dos quais se dá a interação. A quebra 38 1 São todos os atores envolvidos no processo de construção da notícia (jornalistas, pauteiros, editores, fotógrafos etc.), bem como de outras áreas (administrativa, financeira etc.).

ou o desconhecimento desse contrato gera mal-entendidos e desentendimentos entre os coenunciadores 2. O necessário reconhecimento recíproco das restrições da situação pelos parceiros da troca linguageira nos leva a dizer que estes estão ligados por uma espécie de acordo prévio sobre os dados desse quadro de referência. Eles se encontram na situação de dever subscrever, antes de qualquer intenção e estratégia particular, a um contrato de reconhecimento das condições de realização da troca linguageira em que estão envolvidos: um contrato de comunicação (CHARADEAU, 2010, p. 68 grifo do autor). Todo contrato de comunicação é regido por dois níveis de competência (CHARAUDEAU; MAINGUENEAU, 2008, p. 101-102): um situacional e outro comunicacional/discursivo ou dados externos e dados internos na teoria charaudiana. O situacional diz respeito à capacidade do sujeito de perceber as condições de produção linguageira, isto é, a identidade do(s) parceiro(s) envolvido(s) na troca; a finalidade ou objetivo do ato; o propósito o tema em voga; e o dispositivo, em outras palavras, as circunstâncias da interação. (i) A identidade se refere aos traços identitários dos parceiros da troca e a como esses influenciam e interferem na interação. Essas identidades se subdividem em pessoal (externa) que revela traços psicossociais do sujeito (idade, sexo, etnia etc.) e discursiva (interna) isto é, o lugar onde o sujeito se coloca no ato de linguagem. (ii) A finalidade no contrato comunicacional passa por um universo paradoxo, em que os objetivos ou as visadas (CHARAUDEAU, 2010, p. 86-91) ora buscam captar pela informação (credibilidade), ora pela dramatização ou patemização (captação). (iii) Outro aspecto do nível situacional é o propósito. Esse diz respeito ao tema em questão e à ciência dos coenunciadores em relação a ele. (iv) Por último, tem-se o dispositivo, em outras palavras, o meio pelo qual e/ou o ambiente em que se dá a interação entre a instância midiática e a instância receptora 3. Diferentemente dos dados externos, os dados internos são estritamente linguageiros. É nesse espaço onde a ideia de encenação é mais presente e o 2 A ideia de coenunciador postula que os atores envolvidos se influenciam mutuamente, exercendo papéis ativos durante o momento de interação. Ver: MAINGUENEAU, Dominique. Termos-Chave 39 da análise do discurso. Belo Horizonte: Editora UFMG, 1998. 3 Em Maingueneau (2005, p. 71), o dispositivo aparece denominado como mídium: [...] não é um simples meio de transmissão do discurso, mas que ele imprime um certo aspecto a seus conteúdos e comanda os usos que dele podemos fazer.

sujeito falante adota estratégias variadas para efetuar seu ato de linguagem [...] (MAINGUENEAU, 1998, p. 130) 4. 2 Atualização, atualidade e a efemeridade da notícia Em se tratando de estratégias discursivas da mídia, é de extrema importância compreender a maneira pela qual se dá o processo de construção da notícia, desde o acontecimento até sua publicização, bem como os critérios de seleção. Nesse sentido, abordar-se-á a noção de notícia a partir de seus pressupostos teóricos e sua aplicação nos meios noticiosos da internet, especificamente, nos portais folha.com e oglobo.com. Na estratégia de seleção dos fatos, dar-se-á ênfase à ideia de atualidade. Antes de qualquer coisa, torna-se salutar conceituar alguns termos recorrentes neste trabalho. Para a prática jornalística dos portais de informação, utilizar-se-á o termo jornalismo online, que, segundo Luciana Mielniczuk, está associado à ideia de conexão em tempo real, em que há um fluxo de informações permanente e quase sempre instantâneo (BAHIA; RIGUEIRA, 2010, p. 50). Entretanto, tem-se ciência de outros termos que caracterizam o espaço jornalístico na internet, a saber: ciberjornalismo, jornalismo digital, webjornalismo, jornalismo eletrônico 5. Na curta história do jornalismo online, conforme apresenta Bahia e Rigueira (2010), três são os movimentos suscitados: inicialmente, na primeira geração, tem-se a simples reprodução dos textos publicados em jornais impressos na internet; por conseguinte, na segunda fase, já se percebe a inserção de elementos próprios e característicos do novo meio, como o uso de links e do correio eletrônico; só na terceira geração é que de fato jornalismo online lança mão de idiossincrasias próprias e se desprende das publicações impressas. A convergência de mídias, o uso de hiperlinks, a interatividade entre os jornalistas e o público, e a publicação (atualização) de notícias em tempo real 6 são algumas características dessa fase. 4 Este trabalho, no entanto, ficará no nível dos dados externos. O trabalho não irá se aprofundar em questões referentes aos dados internos (modos de discurso, estratégias de captação e/ou credibilidade etc.). 40 6 Simultaneamente ou numa relação de cotemporalidade, nas palavras de Charaudeau (2010). 5 Neste trabalho, optou-se por não aprofundar nas distinções entre tais termos por não ser esta a proposta em discussão.

Essa evolução do jornalismo online possibilitou o surgimento de seis particularidades comuns ao meio: a multimidialidade ou convergência de mídias (TV, rádio, impressa); a interatividade entre instância produtora e instância receptora; a hipertextualidade 7, isto é, os diversos caminhos possíveis; a personalização dos conteúdos; a memória ou o espaço ilimitado para se armazenar as notícias; e a instantaneidade de atualização. Outra característica intrínseca ao jornalismo para web diz respeito ao processo de produção das notícias. Segundo Bahia e Rigueira (2010), grande parte do conteúdo publicado pelos meios noticiosos na internet são oriundos de agências de notícias espalhadas pelo mundo 8. Muitas das vezes, o papel dos jornalistas passa pela reorganização e adequação (troca do título, inclusão de hiperlinks e de mídias, escolha de foto etc.) dos materiais enviados pelas agências. Esse processo, chamado de empacotamento ou reempacotamento, faz parte do dia a dia das redações online. Com base na afirmação de Charaudeau de que [...] para que o acontecimento exista é necessário nomeá-lo (2010, p. 131 grifo do autor), pode-se compreender que a notícia é um construto, um fragmento do real. Nesse sentido, a realidade é um estar aí, um mundo a significar, um universo de possibilidades. A partir do momento em que a instância midiática elege e determina um acontecimento como digno de ser socializado, esse passa por inúmeros filtros ou pontos de vista particulares dos profissionais (jornalistas, revisores, editores), do próprio veículo (questões ideológicas, financeiras) e outros. E assim se diz que a notícia é construída. Outrossim, Charaudeau (2010) define notícia como um conjunto de informações que se relaciona a um mesmo espaço temático, tendo um caráter de novidade, proveniente de uma determinada fonte e podendo ser diversamente tratado (2010, p. 132 grifo de autor). De todas essas características, propor-se-á ir mais afundo na noção de novo. A ideia de novidade na notícia aparece de duas maneiras: na forma de acontecimento inédito, ainda não abordado pela instância midiática; e como retroalimentação de uma notícia que se prolongue. 41 7 Assim como Ribeiro (2006), acredita-se que o hipertexto não é uma invenção das novas mídias. 8 Vale salientar que 90% das notícias que circulam pelo mundo são oriundas de quatro agências de notícias: United Press Internacional (UPI), Associated Press (AP), Agence France Press (AFP) e Reuters (ARONCHI DE SOUZA, 2005).

Uma notícia, nas mídias, tem uma definição mais extensiva; ela pode, por exemplo, ser repetida guardando um certo frescor (na matracagem), mas sob a condição de que permaneça no quadro de uma atualidade imediata. Com efeito, a notícia só tem licença para aparecer nos organismos de informação enquanto estiver inscrita numa atualidade que se renova pelo acréscimo de pelo menos um elemento novo; além do mais, é preciso que esse elemento novo seja portador de uma forte carga de inesperado para evitar o que as mídias mais temem e que depende da representação que têm a esse respeito, a saber: a saturação. Daí esse desfile de notícias, uma eliminando a outra, rapidamente relegadas no armário de achados e perdidos ou daí saindo sempre que a atualidade do insólito o exige (CHARADEUAU, 2010, p. 134 grifo do autor). Em tempos de internet e de portais de informações em tempo real, a ideia de saturação proposta por Charaudeau vem ganhando outros contornos. Como se vê (Tabelas 2 e 3), a obsessão pelo presente, pela atualidade e pela urgência da informação tem feito com que os portais de informações - a partir de produção própria, de matérias oriundas de outros meios noticiosos e de materiais enviados por agências de notícias espalhadas pelo mundo - pratiquem a saturação às avessas. Tabela 1 Dados coletados às 6 horas de 11 de abril de 2011 6 horas Chamadas 9 Fotos folha.com 66 20 oglobo.com 63 16 Fonte: Elaboração própria 10. Tabela 2 Dados coletados às 12 horas de 11 de abril de 2011 12 horas Chamadas Fotos Novas notícias 11 folha.com 74 21 90% oglobo.com 62 17 80% Fonte: Elaboração própria. Tabela 3 Dados coletados às 18 horas de 11 de abril de 2011 18 horas Chamadas Fotos Novas notícias 12 folha.com 92 29 90% oglobo.com 60 21 85% Fonte: Elaboração própria. 9 Entende-se por todos os materiais noticiosos da página, exceto publicidade, blogs e chamadas para outros sites. 42 10 Os dados coletados das tabelas 1, 2 e 3 são de 11 de abril de 2011 nos horários de 6h, 12h e 18h. 11 Número de novas chamadas que apareciam na capa dos portais entre 6h01 e 12h. 12 Número de novas chamadas que apareciam na capa dos portais entre 12h01 e 18h.

A partir dessa saturação, é possível perceber que o processo de transformação 13 formulado por Charaudeau ganha diferentes contornos em relação à etapa de produção da informação. Por vezes, em função da urgência de se informar, os portais de notícias lançam mão de conteúdos oriundos de agências de notícias, assessorias de imprensa e outros 14, dando ênfase à quantidade de conteúdo, bem como a sua mobilidade e atualização. Nesse sentido, a instância de produção da informação não capta o fato diretamente do real ( mundo a descrever e a comentar ), mas a partir do que é fornecido (ou não) pelas agências de notícias, isto é, a realidade reempacotada (Figuras 1 e 2). Essa ideia já vigora em alguns portais, estando presente, inclusive, no Manual de Redação do Último Segundo, o portal online de notícias do IG: O Último Segundo coloca as informações que recolhe ao alcance dos interessados por todos os meios eletrônicos existentes e por aqueles que vierem a ser inventados. É uma empresa geradora e reempacotadora de conteúdo, de informação confiável. Consegue isso por meio de alianças e parcerias com terceiros, tanto no Brasil como no exterior, nas áreas de captação e de distribuição de informações (MANUAL DE REDAÇÃO DO ÚLTIMO SEGUNDO, 2007, s/p). Assim, o esquema proposto por Charaudeau para exemplificar o processo de produção e de recepção da notícia pode se alterar em se tratando de portais: Mundo a descrever e a comentar Instância de produção da informação Mundo descrito e comentado Instância de recepção interpretação Mundo interpretado Processo de transnsformação Processo de interpretação Processo de transação Figura 1 Esquema do processo de produção e recepção da notícia (CHARAUDEAU, 2010, p. 42). 43 13 [...] consiste em transformar o mundo a significar em mundo significado, estruturando-o segundo certas categorias [...] (CHARAUDEAU, 2010, p. 41). 14 Não que outros meios não usem conteúdos de agências e assessoria, mas nos meios noticiosos da internet isso é mais recorrente em função do dinamismo característico do meio.

Reempacotamento Instância de produção da informação Mundo descrito e comentado Instância de recepção interpretação Mundo interpretado Processo de transnsformação Processo de transação Figura 2 Esquema do processo de produção e recepção da notícia em portais da internet Essa nova instância no processo de produção pode ser percebida, sobretudo, quando se observa a home page dos portais de informação. Analisando as tabelas 2 e 3, nota-se que em seis horas mais 50 notícias novas foram publicadas, ou 80% do portal foi atualizado. Deve-se lembrar que não foram levadas em conta as editorias ou rubricas na concepção de Charaudeau especificamente, só as home page. Considerações finais A partir das análises empreendidas nos portais de informação folha.com e oglobo.com, sob a luz da teoria charaudiana acerca do contrato de comunicação e das estratégias de construção da notícia especificamente a noção de atualidade, foi possível perceber que a ideia de saturação proposta pelo autor francês pode se dar não só pela ausência de notícias, mas também pelo excesso. Afinal de contas, quem lê tanta notícia? Da mesma maneira, nota-se, nesse dinâmico e urgente processo de significação do mundo, como descreve o Manual de Redação do Último Segundo, muito mais uma estratégia de captação, que visa a produzir um objeto de consumo segundo uma lógica comercial [para] captar as massas [e] sobreviver à concorrência (CHARAUDEAU, 2010, p. 86), do que necessariamente uma estratégia de credibilidade, que quer informar o público a respeito de algo. A edição da home page deve ser dinâmica e reservar surpresas a cada nova visita do leitor. Isto vai garantir o crescimento da 44 frequência da visitação desta página (MANUAL DE REDAÇÃO DO ÚLTIMO SEGUNDO, 2007, s/p grifo meu).

Referências ARONCHI DE SOUZA, José Carlos. Seja o primeiro a saber A CNN e a globalização da informação. São Paulo: Editora Summus, 2005. BAHIA, Ana L.; RIGUEIRA, Marina R. Internet e reconfiguração da prática jornalística: a editoria internacional dos jornais Folha de S. Paulo, Estado de São Paulo e em seus respectivos portais. 2010. Disponível em: <http://www.slideshare.net/edvaldosouza/manual-de-redao-ltimo-segundo>. Acesso em 11 mai. 2011. p. 48-58. CHARAUDEAU, Patrick. Discurso das mídias. 2 ed. São Paulo: Contexto, 2010. CHARAUDEAU, Patrick; MAINGUENEAU, Dominique. Dicionário de análise do discurso. 2 ed. São Paulo, 2008. INTERNET GRÁTIS. Manual de redação do Último Segundo. Disponível em: <http://www.slideshare.net/edvaldosouza/manual-de-redao-ltimo-segundo >. Acesso em 9 mai. 2011. MAINGUENEAU, Dominique. Termos-chave da análise do discurso. Belo Horizonte: Editora UFMG, 1998. MAINGUENEAU, Dominique. Análise de textos de comunicação. São Paulo: Cortez, 2005. p. 71-83. RIBEIRO, Ana E. Leituras sobre hipertexto: trilhas para o pesquisador. In: SIMPÓSIO NACIONAL DE LETRAS E LINGUÍSTICA E SIMPÓSIO INTERNACIONAL DE LETRAS E LINGUÍSTICA, 11 e 1, 2006, Uberlândia-MG. Anais. Recife: Núcleo de Estudos do Hipertexto (NEHTE), 2006. Disponível em: <http://www.ufpe.br/nehte/artigos/leituras %20sobre%20hipertexto.pdf>. Acesso em: 26 set. 2011. 45