Influência da Moagem de Alta Energia na porosidade de produtos da metalurgia do pó Kahl Zilnyk (UEPG) E-mail: 061040724@uepg.com Osvaldo Mitsuyuki Cintho (UEPG) E-mail: omcintho@uepg.com Resumo: Neste trabalho, foi investigada a influência do tempo de moagem na porosidade final de amostras feitas a partir de aço carbono em pó, processado em moinho do tipo SPEX. As amostras foram submetidas a metalografia quantitativa, para estimar a fração do volume ocupada por poros. Concluiu-se que a porosidade primeiro aumenta com a moagem, e depois diminui até atingir um patamar estável, acompanhando o tamanho de partícula do pó. Palavras-chave: Porosidade, metalurgia do pó, moagem de alta energia, aço eutetóide. 1. Introdução A Metalurgia do Pó, ou powder metallurgy (PM) em inglês, é uma forma de processamento já desenvolvida e bem estabelecida industrialmente para a fabricação de componentes ferrosos e não ferrosos. A PM é economicamente vantajosa frente a outras técnicas de produção, uma vez que minimiza a necessidade de usinagem e acabamento superficial, e mantém uma estreita tolerância dimensional. Geralmente, o processo de fabricação por PM incluía obtenção do pó, o processamento prévio deste pó, compactação a frio, sinterização e acabamento (ROCHMAN, 1999). Por produzir componentes inteiriços a partir de matérias primas em pó, produtos da metalurgia do pó sempre apresentam uma porosidade residual. Em geral deseja-se um produto final com a menor porosidade possível, para que a resistência mecânica não seja comprometida, mas em certas aplicações onde o peso é um fator determinante para a escolha de materiais e processos, um material resistente, ainda que poroso, pode ser preferível, como em aplicações aeronáuticas (por exemplo: ímãs para sensores e motores) ou então na fabricação de mancais auto-lubrificantes (POQUILLON, 2002). A Moagem de Alta Energia (MAE) é uma técnica de processamento de pós que permite a produção de materiais homogêneos partindo da mistura de pós elementares. Desenvolvida a partir da década de 1960, é utilizada para obter materiais nanoestruturados, reações no estado sólido, materiais amorfos, ligas metaestáveis e soluções sólidas supersaturadas. O moinho do tipo SPEX é o de maior poder energético, porém de menor produção, em volume de material. Seu princípio de funcionamento consiste em um recipiente, contendo bolas de moagem e o material a ser moído, vibrando simultaneamente em torno dos três eixos, gerando uma elevadíssima freqüência de choques entre as bolas e as bolas e as paredes do recipiente (SURYANARAYANA, 2001). No início do processo de moagem, as partículas frágeis são fragmentadas e as partículas dúcteis tornam-se achatadas por um processo de microforjamento. As partículas achatadas sofrem soldagem, enquanto as partículas frágeis são distribuídas na superfície do
material mais mole (NOWOSIELSKI, 2005). Com isso, há um aumento do tamanho de partícula, como se observa em (a) e (b) na figura 1. As partículas também sofrem fraturas, as quais tendem a refiná-las. Em um segundo estágio do processo, a fratura torna-se mais comum que a soldagem das partículas. Com o decorrer da moagem, ambos os fenômenos, soldagem e fratura, entram em equilíbrio e o tamanho de partícula segue praticamente constante, como em (c) e (d) na figura 1. O material frágil depositado na superfície do material dúctil é incorporado em sua matriz. Em estágios extremos, ocorre a amorfização do material (SURYANARAYANA, 2001); Figura 1. Variação do tamanho de partícula em função do tempo de moagem para uma liga de tântalo níquel. Retirado de C. Suryanarayana, Progress in Materials Science. N.46, p.33, 2001. Para produtos metalúrgicos, a porosidade geralmente é determinada através do porosímetro de mercúrio ou da adsorção de nitrogênio. Contudo, estas técnicas apresentam inconvinientes: o mercúrio é um metal pesado, tóxico ao organismo, e o nitrogênio um gás inerte, relativamente caro (MOURA, 2007). Para contornar estes problemas, pode-se utilizar o método da Contagem Sistemática Manual de Pontos. Nesta técnica, determina-se a fração volumétrica de uma determinada fase do material através da quantidade existente desta fase em uma secção plana do material. A quantidade de fase presente é determinada sobrepondo a uma fotografia da microestrutura do material uma grade (circular ou quadriculada, como as mostradas na figura 2) e contando os pontos contidos pela fase em questão. Apesar de esta técnica ter sido idealizada para ser usada com micro-constituintes do material, ela pode, com igual eficácia, determinar a porosidade do material, basta considerar os poros como uma segunda fase (ZILNYK, 2008).
Figura 2 - Grades para a contagem sistemática manual de pontos 2. Objetivo Determinar a influência da moagem de ata energia na porosidade de componentes sinterizados, utilizando o método da contagem sistemática manual de pontos para estipular de maneira simples, econômica e confiável a porosidade dos corpos de prova. 3. Materiais e Métodos Ferro e grafite em pó, comercialmente puros, foram misturados na proporção eutetóide (0,76% de C em massa) e processados em um moinho do tipo SPEX com poder de moagem 7:1 pelos tempos de 0,25, 0,5, 0,75, 1, 2, 4, 8 e 12 horas. Amostras de 1 grama dos pós processados foram compactadas uniaxialmente, em matriz rígida sob a tensão de 2 GPa, a temperatura ambiente. Os compactados foram sinterizados à 1200ºC por uma hora em atmosfera de argônio. Depois de embutidos em resina de poliéster, foram lixadas e polidas, segundo a preparação metalográfica convencional. Em um microscópio óptico equipado com câmera digital, foram feitas imagens da superfície da amostra e estimadas as porosidades por meio de contagem sistemática manual de pontos, usando uma grade quadriculada com cem pontos, em 5% da área da amostra, conforme a norma ASTM E 562-02.
4. Resultados e discussão A figura 3 mostra uma fotografia da superfície de cada imagem. Apenas através da sua observação, constata-se qualitativamente que a porosidade aumenta e depois decresce com o aumento do tempo de moagem. Figura 3 - Exemplos de imagens da superfície das amostras utilizilizadas para determinação da porosidade pelo método da contagem sistemática manual de pontos: a) 0,25h, b) 0,5h, c) 0,75h, d) 1h. e) 2h, f) 4h, g) 9h, h) 12h.
Os valores estimados de porosidade através de metalografia quantitativa estão demonstrados na tabela 1 e apresentados em gráfico em função do tempo de moagem na figura 4. Tabela 1 - Valores médios de porosidade Tempo de moagem (horas) Porosidade (%) Desvio Padrão 0,25 4,7 5,5 0,5 5,0 2,1 0,75 7,7 3,6 1 9,6 4,1 2 13,3 4,6 4 18,4 1,9 9 5,4 2,0 12 5,5 1,6 Figura 4. Variação do volume ocupado por poros nas amostras em função do tempo de moagem. O gráfico da figura 2 confirma quantitativamente que no primeiro estágio da moagem a porosidade aumentou, atingindo o valor máximo com 4 horas. Este fato pode ser explicado pelo aumento do tamanho de partícula característico deste estágio do processamento, como visualizado na figura 1. Ao atingir o ponto onde a freqüência de fratura das partículas passa a ser maior que a união a frio delas, o tamanho de partícula cai e juntamente a porosidade é reduzida. Por isso, a amostra moída por 9 horas apresentou porosidade inferior à moída por 4
horas. Uma vez atingindo o equilíbrio entre fratura e união das partículas, o tamanho de partícula e a porosidade mantêm-se constantes, portanto não houve variação expressiva de porosidade para as amostras moídas por mais de 9 horas. O formato da curva de porosidade em função do tempo é bastante semelhante ao de tamanho de partícula durante a moagem, exibido na figura 1, o que sugere que ambas as propriedades estão relacionadas. 5. Conclusão A porosidade de um sinterizado pré-compactado uniaxialmente é proporcional ao tamanho de partícula. Conforme se aumenta o tempo de moagem, diferentes mecanismos atuam sobre o pó (e.g. mudança do formato de partícula, soldagem e fratura), modificando o tamanho de partícula e consequentemente a porosidade dos componentes produzidos a partir deste material. O entendimento de como a moagem de alta energia influência características dos produtos e processos da metalurgia do pó é um caminho para diminuir o tempo de formulação de projetos, bem como reduzir a quantidade de refugo devido a componentes com propriedades insuficientes. Referências D. POQUILLON et al. Cold compaction of iron powders relations between powder morphology and mechanical properties Part I: Powder preparation and compaction. Powder Technology Vol. 126, p. 65 74, 2002. SURYANARAYANA, C. Mechanical alloying and milling. Progress in Material Science. Vol. 46, p. 1-184, 2001. NOWOSIELSKI, R. & PILARCZYK, W. Structure and properties of Fe-6.67%C alloy obtained by mechanical alloying. Journal of Materials Processing Technology, Vol.162-163, p. 373-378, 2005. MOURA, M. J. & FIGUEIREDO, M. M.; Aplicação das Técnicas de Picnometria de Gás e de Porosimetria de Mercúrio. Silva Lusitana. Vol. 10, p. 207-216, 2002. ZILNYK, K.D. & CINTHO, O. M. Avaliação do processo de compactação uniaxial de pós metálicos por meio de ensaios de compressibilidades de alta resolução. Anais do 63º congresso anual da ABM, 2008. ASTM E 562-02 Determining volume fraction by systematic manual point count. ROCHMAN, N. T.; KAWAMOTO, K.; SUEYOSHI, H.; NAKAMURA, Y. & NISHIDA. T. Effect of milling temperature and additive elements on an Fe-C system alloy prepared by mechanical alloying. Journal of Materials Processing Technology, Vol.89-90, p. 367-372, 1999.