Monitoramento ambiental de lagoas inseridas na planície de inundação do médio Araguaia, com base em imagens Landsat (MSS e TM)



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Transcrição:

Monitoramento ambiental de lagoas inseridas na planície de inundação do médio Araguaia, com base em imagens Landsat (MSS e TM) Suzana Maria Loures de Oliveira Marcionílio 1 Maria Tereza Ribeiro Alves 1 Manuel Eduardo Ferreira 2 Genival Fernandes Rocha 2 João Carlos Nabout 1 1 Universidade Estadual de Goiás UEG/UnUCET/BIOECOL Caixa Postal 459, 75132-400 tete_florestal@hotmail.com; suzanaloures@hotmail.com; jcnabout@gmail.com 2 Universidade Federal de Goiás UFG/IESA/LAPIG Caixa Postal 131, 74001-970 manuel@iesa.ufg.br; gfernandesr@gmail.com Abstract. Studies to discriminate the land use and land cover changes in watershed tributaries have shown expressiveness due to the agro-pastoral activities influences on the quality of inland waters. In order to analyze this conversion rate around thirty ponds inserted in the Middle Araguaia watershed, during 1976-2011 period, we used a LANDSAT-TM and MSS sensor imagery to quantify the remaining vegetation, pasture and agriculture activities. Our results show an intensive conversion of the natural areas in disturbed areas (around the ponds) The rate of conversion of natural areas in disturbed (APPs within 100 m) ranged from 0.01% to 53.3% over the 35anos analysis (1976-2011), and converting the soil was checked using 22 to ponds and 8 remained intact. The grazing activity ranged from 0.21% to 21.1% for the same period, while the activity of agriculture had a significant increase of 0.01% will be 53.3%. The last period (2000-2011) was the most intense in terms of anthropic conversion, with more than half of the ponds presenting some disturbance, which coincides with the activities of agriculture and pasture in the Araguaia River basin (since 1970 s), principally in Goias and Mato Grosso states. Key-words: Landsat, land use, Araguaia river, flood plain, ponds 1. Introdução A preocupação com as consequências das ações antrópicas sobre planícies de inundação é crescente no cenário internacional (Wen et al., 2012; Rheinhardt et al., 1998; Chalupová et al., 2012; Brison e Malvaréz, 2002). Planícies inundáveis são paisagens heterogêneas, formando um mosaico de habitats aquáticos e terrestres interligados. A configuração, composição e o grau de conectividade hidrológica entre estes habitats determinam a biodiversidade do ecossistema como um todo (Tonolla et al., 2012). O conhecimento sobre estes sistemas ainda é muito restrito, com um agravante das transformações das áreas alagáveis em áreas antropizadas, fazendo com que tais ambientes se percam antes mesmo de serem estudados (Wen et al., 2012). Na Europa, Austrália e Estados Unidos essas áreas foram intensamente modificadas, e estudos apontam para a necessidade de gestão das áreas alagáveis na América do Sul para que não ocorra situação semelhante (Brison e Malvaréz, 2002). 7731

A bacia hidrográfica do rio Araguaia é uma destas regiões no mundo. Com uma extensa e bem desenvolvida planície de inundação (Aquino et al., 2008), e com um sistema lacustre igualmente desenvolvido, estas lagoas possuem várias formas, podendo ou não se conectar ao canal principal durante a temporada de seca. Com a temporada de chuva, e a consequente inundação da planície, o ambiente é marcado pela formação de lagos sazonais e pela redefinição dos lagos perenes (Morais et al., 2005; Santos e Burjack, 2007). Desta forma, ao longo do ano, este sistema lacustre apresenta grande relevância para o canal principal, contribuindo principalmente com a sua biodiversidade (Morais et al., 2005). Em termos de fisiográficos, esta bacia é composta pelos biomas Cerrado (maior parte) e Amazônia (Santos e Burjack, 2007), ambos ameaçados pelas alterações antrópicas motivadas pela expansão agropecuária. No caso do Cerrado, apesar de ser reconhecido como um dos hotspots mundiais para a conservação da biodiversidade (Myers et al., 2000), este tem sofrido severas modificações, sobretudo na área de estudo, já apresentando uma taxa de conversão acima dos 40% (Ferreira et al., 2007; Mascarenhas et al., 2009; Sano et al., 2010). Assim, faz-se necessário um acompanhamento destes ambientes lacustres, com atenção especial aos níveis de conservação e intensidade de mudanças do uso do solo, para fins de análises ecológicas. Neste sentido, a referida pesquisa tem por objetivo calcular a taxa de mudança da paisagem nas áreas circundantes às lagoas perenes no médio curso do rio Araguaia, em quatro momentos (1976, 1990, 2000 e 2011), por meio de mapeamento via imagens de satélites (sensores Landsat MSS e TM). 2. Materiais e Métodos 2.1. Área de estudo O rio Araguaia está inserido na grande bacia Araguaia-Tocantins, uma das regiões com maior diversidade do continente, visto que possui áreas de savanas ao sul e de floresta Amazônica ao norte (Latrubesse e Steveaux, 2006; Aquino et al., 2008; Morais et al., 2005; Trancoso et al., 2005; Sawakuchi e Ballester, 2009). A sua bacia, com uma área de 377.000 km 2, drena as nascentes de rios de vários estados, destacando-se Goiás, Mato Grosso, Tocantins e Pará (Morais et al., 2005). O médio curso do rio Araguaia (Latrubesse e Steveaux, 2002), onde se localiza a área de estudo, estende-se por quase 1.100 km, de Registro do Araguaia até Conceição do Araguaia, abrigando uma planície de inundação bem desenvolvida, incluindo a planície aluvial da Ilha do Bananal (Latrubesse e Steveaux, 2006). Os canais principais desenvolvem uma ampla planície aluvial, com uma grande quantidade de sistemas lacustres, entre estes as lagoas (Morais et al., 2005). Os lagos da planície aluvial são formados no entorno do fluxo fluvial, onde o canal principal exerce grande influência devido às migrações que sofre. A área estudada está entre as cidades de Aruanã-GO e São Felix do Araguaia-TO (Figura1). Esta região possui clima bem definido, com uma época seca (maio a setembro) e outra chuvosa (outubro a abril). Durante a época de chuva, há o espalhamento de água pela planície, alterando a paisagem por seis meses. 7732

Figura 1. Localização das lagoas estudadas na planície inundável do médio curso do rio Araguaia. 2.2. Base de dados e Procedimentos de análise Inicialmente, quanto ao mapeamento das lagoas na planície aluvial do rio Araguaia, este foi realizado via interpretação visual de imagens Landsat-TM 5 (30 metros de resolução espacial) para o ano de 2011, com base também em cenas de alta resolução espacial, via plataforma de análise Google Earth (entre 1 e 10 metros de resolução espacial), nas datas disponíveis (normalmente entre 2006 e 2010). Para o período de análise mais recente (2011), a classificação do uso do solo na região circundante às lagoas foi realizada com base também nas imagens Landsat-TM 5. As cenas, disponibilizadas gratuitamente pelo Instituto Nacional de Pesquisa Espaciais (INPE, http://www.dgi.inpe.br/cdsr), foram de 223/67 a 223/70, com data de registro em 03/05/2011; esta data é considerada como de cheia na região do Araguaia, com baixa nebulosidade, o que favoreceu a identificação das lagoas. Posteriormente, realizou-se uma correção geométrica destas cenas, com base em cenas do projeto Geocover (NASA/USGS), com a respectiva criação de mosaicos para a região estudada. Para os demais anos de análise do uso do solo, foram empregadas cenas/mosaicos de imagens Landsat-MSS para 1976, além de mosaicos Landsat-TM (projeto Geocover) para os anos de 1990 e 2000. A partir da definição das áreas de estudo (i.e., delimitação das lagoas e aplicação de um buffer de 10 km em torno das mesmas), foram mapeadas as seguintes classes de uso do solo: vegetação remanescente, pastagem (cultivada / nativa) e agricultura. Dentre as técnicas de processamento de imagens empregadas nos mapeamentos, destacase o uso de um Modelo Linear de Mistura Espectral para o realce entre as classes de Cerrado e uso antrópico (Ferreira et al., 2007), com aplicação de segmentação de imagens (apenas no mosaico de 2011), seguida pelo método de classificação supervisionada MaxVer (para todos os mosaicos), a partir da coleta de amostras de pixels para as referidas classes temáticas. 7733

Na fase de análises geoestatísticas, um novo buffer de 100 metros foi criado em torno de cada uma das 30 lagoas perenes, e aplicado sobre cada um dos mosaicos mapeados (1976, 1990, 2000 e 2011), com o intuito de se verificar o quanto de remanescentes de vegetação foi convertido em classes de uso antrópicas, ao longo do período 1976 a 2011. A distância de 100 m foi estabelecida de acordo com o atual Código Florestal Brasileiro. 3. Resultados e Discussão Dentre as 30 lagoas perenes mapeadas, 10 se encontram no Estado de Goiás, 13 no Estado do Tocantins e 7 no Estado do Mato grosso. No primeiro ano de análise (1976), 27 lagoas apresentavam apenas a vegetação natural em suas Áreas de Preservação Permanente (APPs com 100 m), enquanto apenas 3 apresentavam áreas convertidas para pastagem e agricultura. No ano de 1990, houve um aumento do número de lagoas circundadas com uso antrópico, sendo 3 apresentando áreas convertidas para pastagem e outras 2 com agricultura. Em 2000, 7 lagoas apresentaram atividade de pastagem e 2 para agricultura, enquanto que em 2011 houve uma redução significativa da taxa de remanescentes na área de estudo, com um respectivo aumento da taxa de conversão para pastagens (observada em torno de 16 lagoas) e agricultura (observada em torno de 19 lagoas). A tabela 1 trás um resumo desta análise. A taxa de conversão das áreas naturais em antropizadas (dentro das APPs de 100 m) variou de 0,01% á 53,3% ao longo dos 35anos de análise (1976-2011), sendo que a conversão do uso do solo foi verificada para 22 lagoas e 8 se mantiveram intactas. A atividade de pastagem variou de 0,21% á 21,1% para o mesmo período, enquanto a atividade de agricultura teve um aumentou expressivo entre 0,01% á 53,3%, como observado nas Figuras 2 e 3. 7734

90 80 70 60 % Remanescente % Pastagem % Agricultura 50 40 30 20 10 0 1976 1990 2000 2011 Uso do solo Figura 2. Taxa de conversão para 30 lagoas na planície do Médio Araguaia, entre 1976 a 2011. Figura 3. Exemplo de uso do solo na lagoa identificada como 18, no período de 1976 a 2011. 7735

Desde 1970, o bioma Cerrado como um todo vem passando por intensas transformações, devido principalmente à expansão agropecuária, com incentivos do governo federal e estados, para a abertura de novas áreas de pasto e agricultura na região do Planalto Central brasileiro. E como constatado neste estudo, os dois biomas que compõem a vegetação natural das lagoas estão recebendo intensas modificações antrópicas. Neste caso, a bacia do rio Araguaia é uma das regiões mais atingidas, com impactos ambientais sobretudo nos sistemas hidrológicos, já confirmados por Morais (2002) e Coe et al. (2011). Segundo Sawakuchi (2010), o uso do solo próximo às regiões de inundação é limitado. Devido aos regimes de inundação e aos solos que se caracterizam como pobres para atividades agrícolas, as taxas de conversão na bacia do rio Araguaia é maior nas bordas da planície inundável, enquanto as taxas de conversão nas lagoas de inundação são menores. Em grande maioria, estas áreas inundáveis são utilizadas para pastagem durante a época de estiagem. Ainda assim, é possível observar que as lagoas estudadas apresentaram uma maior taxa de conversão a partir do ano de 2000. Ao observar o tipo de ocupação do solo para as lagoas, discriminando-as por Estados, nota-se que Tocantins mantém o maior número de lagoas com áreas intactas (5 lagoas),seguido do Estado do Mato Grosso com 2 lagoas e Goiás com uma lagoa intacta no período analisado (1976-2011). Porém os Estados de Goiás e Mato Grosso apresentaram um maior uso diversificado entre pastagem e agricultura. com uma maior taxa de desmatamento de Cerrado; em fato, o alto curso do rio Araguaia, que compõe esta bacia, está localizado justamente entre estes dois Estados, sendo portanto a área mais danificada. Já Tocantins é um dos Estados com menor taxa de conversão de Cerrado (Sano et al., 2010), segundo dados do mapeamento PROBIO (MMA, ano-base 2002). Por outro lado, a Ilha do Bananal e as diversas reservas indígenas ao longo do percurso do rio Araguaia em Tocantins podem estar favorecendo na preservação do entorno destas lagoas (Sawakuchi, 2010). 4. Conclusões O médio curso do rio Araguaia (entre Goiás e Mato Grosso) apresenta como grande diferencial uma extensa planície de inundação. Apesar de todos os limitantes físicos à conversão destas áreas, o desmatamento tem sido intenso desde a década de 1970. Apesar de possuir atenuantes, como as áreas de proteção ambiental, as lagoas da planície de inundação do Araguaia começam a sofrer com o desmatamento, apresentando conversões para classes de uso antrópico. Por apresentar um complexo sistema ecológico, com a interação entre os componentes hidrológicos e biodiversidade, as alterações que ocorrem nestas lagoas possuem elevada relevância e, por isto, devem ser acompanhadas de forma sistemática. Neste caso, os métodos de monitoramento via sensoriamento remoto demonstraram ser de extrema utilidade, com baixo custo de implementação e elevada precisão de mapeamento. Agradecimentos Ao CNPq e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (FAPEG), pelo auxílio financeiro ao referido projeto (processo 563834/2010-2 / CNPQ). Os dois primeiros autores são bolsistas de pós-graduação da CAPES e FAPEG, respectivamente. Agradecimentos são extensíveis ao Laboratório de Processamento de Imagens e Geoprocessamento (LAPIG), da Universidade Federal de Goiás, pelo apoio técnico e acadêmico na obtenção das bases de dados e análises. 7736

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