A AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA NO TRÂNSITO: DESAFIOS PARA O PSICÓLOGO NO EXERCÍCIO DA ATUAÇÃO



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Transcrição:

A AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA NO TRÂNSITO: DESAFIOS PARA O PSICÓLOGO NO EXERCÍCIO DA ATUAÇÃO Dóris Serena Holmer Biehl Pasquali 1 Vivian de Medeiros Lago 2 RESUMO A avaliação psicológica de condutores é caracterizada por dificuldades e limitações na atuação do psicólogo, necessitando estudos que priorizem pesquisas e qualificação nesta intervenção. O presente trabalho tem como objetivo conhecer a realidade e o desenvolvimento da psicologia do trânsito. Pretende-se destacar a cientificidade deste campo de saber e a importância da avaliação psicológica para a habilitação de condutores, contribuindo com as reais necessidades da sociedade. Neste sentido, foi feito um levantamento bibliográfico de artigos sobre o tema publicados nas bases de dados Pepsic e Scielo que apresentassem em seus títulos referências à avaliação psicológica no trânsito. Foram encontrados 23 artigos, cujos resultados demonstraram, de uma forma geral, a necessidade de maiores estudos e aprofundamentos, como maior capacitação dos profissionais que atuam na área. Foram identificadas escassas as publicações com esta temática e carência expressada pelos autores para elevar a produção científica e aprimorar a capacitação dos profissionais desta área. Conclui-se, como relevante, a atuação do psicólogo com equipes multiprofissionais, envolvido com as políticas de trânsito embasados por uma adequada formação profissional, pois o comportamento humano é complexo e sua avaliação também. Palavras-chave: Psicologia do trânsito. Avaliação psicológica. Formação do psicólogo 1 INTRODUÇÃO Todos os anos, milhões de brasileiros são avaliados psicologicamente para conduzir veículos. A realidade do trânsito hoje, o perfil dos condutores e o aumento da frota automotiva exigem um olhar mais específico e profundo do psicólogo e do 1 Acadêmica da Especialização em Avaliação Psicológica, FACCAT, 2013. 2 Orientadora. Professora do Curso de Psicologia das Faculdades Integradas de Taquara FACCAT, Bacharel em Direito (UFPel), Psicóloga (UCPel), Especializada em Psicologia Jurídica (Universidade Luterana do Brasil), Mestre em Psicologia (UFRGS), Doutora em Psicologia (UFRGS).

2 processo de aprimoramento dos instrumentos de avaliação. A denominada psicologia do trânsito nasce, então, da possibilidade de tornar o trânsito mais seguro, contribuindo para o bem-estar das pessoas em seus deslocamentos (ROZESTRATEN, 1981). A valorização desta área pelos próprios profissionais, sociedade e órgãos competentes conduzem a uma visão ainda mais científica dessa temática. Conforme citam Alchieri e Silva (2010), o Brasil é um dos poucos países em que se exige a avaliação das condições psicológicas para dirigir. Diante do crescente número de veículos e das consequências negativas que acarretam, torna-se imprescindível pensar em novas perspectivas e estratégias para a avaliação de condutores, ampliando conhecimentos e buscando desenvolver outras possibilidades para a área. Segundo Anache e Correa (2010), é incontestável que a avaliação psicológica propicie muitos benefícios no contexto do trânsito. É fundamental aprimorar os estudos acadêmicos, investindo em pesquisas que comprovem e validem novos instrumentos de avaliação e a educação de profissionais e acadêmicos no que se refere à utilização desses instrumentos. É possível observar nos meios de comunicação as dificuldades encontradas no trânsito: acidentes, mortes, deficiências físicas, violência, desequilíbrio emocional, o que está impelindo um olhar e uma cobrança incisiva para os órgãos de trânsito, cabendo a estes pensar meios, juntamente com os psicólogos e profissionais de outras áreas. O Conselho Federal de Psicologia, já no ano de 2000, orientava para a finalidade do uso de técnicas da Avaliação Psicológica no trânsito. Essas técnicas auxiliam a identificar adequações mínimas para o correto e seguro exercício da atividade remunerada ou não de conduzir um veículo automotor, contribuindo para a segurança do condutor, do trânsito e dos demais envolvidos (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2000). Segundo León e Vizzoto (2003), acidentes de trânsito e as influências a eles associados remetem a um problema social, havendo uma necessidade de ampliação de estudos, especialmente no campo comportamental e atitudinal. Neste trabalho, pretende-se destacar a importância da psicologia do trânsito e o apoio fundamental do psicólogo como estudioso do comportamento humano.

3 2 MÉTODO Para atingir o objetivo proposto, pesquisou-se nas bases de dados: Pepsic, Scielo, artigos de periódicos que apresentassem em seus títulos referências à avaliação psicológica no trânsito em nível nacional, englobando as palavras chave: avaliação psicológica, psicologia do trânsito e perfil do psicólogo. É importante salientar que se optou por não se limitar o período de publicação pela possibilidade de encontrar artigos de tempos anteriores, não proporcionando uma visão somente da atualidade, mas contemplando um panorama evolutivo da psicologia do trânsito. Inicialmente, foi realizada uma leitura dos artigos escolhidos que contemplavam as palavras chave, sendo excluídos os que somente focavam instrumentos de avaliação no trânsito, riscos de acidentes de motoristas, políticas no trânsito. Procedeu-se à leitura dos artigos com o objetivo de identificar, refletir e destacar o panorama e as reflexões dos autores em relação à avaliação psicológica. Encontrou-se um total de 23 artigos, distribuídos da seguinte forma: dois na década de 50, um na década de 60, um na década de 80, 19 artigos no período de 2000 a 2011. Identificaram-se trabalhos de investigação teórica, empíricos e alguns por métodos (quantitativo e qualitativo). Observou-se que artigos com o tema em questão foram encontrados mais a partir da primeira década do terceiro milênio, abordando mais especificamente a avaliação psicológica no trânsito, comportamento humano e a psicologia do trânsito. 3 RESULTADOS 3.1 Psicologia do trânsito e o psicólogo A psicologia do trânsito é uma [...] área da psicologia que investiga os comportamentos humanos no trânsito, os fatores e processos externos e internos, conscientes e inconscientes que os provocam ou alteram. (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2000, p. 10). Este conceito remete aos profissionais e estudiosos para a utilização de conhecimentos e instrumentos científicos, com a finalidade de tornar o trânsito mais seguro e contribuir para a saúde mental e bem-estar das pessoas.

4 A psicologia do trânsito iniciou, aproximadamente, em 1920, e, em 1962, ocorreu a criação da lei federal que tornou obrigatória a realização de exames psicotécnicos para todos os candidatos a carteira de habilitação (HOFFMAN e CRUZ, 2003). Cabe destacar que a atuação do psicólogo na avaliação no trânsito iniciou mesmo antes de ser reconhecida a profissão, na década de 60, por meio da Lei nº 4.119 de 27 de agosto de 1962, regulamentada pelo Decreto nº53.464, de 21 de janeiro de 1964. Antes mesmo de ser validada a profissão, o psicólogo já atuava com testes e era requisitado para realizar os exames psicotécnicos, como conceituado nos anos de 1940 e 1950 (SILVA e GÜNTER, 2009). Percebe-se que essa trajetória da psicologia do trânsito, bem como o papel do psicólogo, antecedem a validação da própria profissão. Isso leva a refletir sobre a importância da avaliação psicológica no trânsito, baseando-se em estudos e outras possibilidades para melhor avaliar o perfil dos condutores. O psicólogo do trânsito, com o reconhecimento da psicologia como profissão em 1962, utilizava basicamente a avaliação psicológica. A partir das décadas de 1980 e 1990, esta área iniciou um processo de revisões e atualizações, referenciando uma nova concepção para o psicólogo do trânsito, mais polivalente, capaz de atuar nas áreas de educação, engenharia e fiscalização, intervindo no sistema de trânsito de forma eficiente (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2000). É essencial que o papel do psicólogo siga caminhos mais dinâmicos e de desenvolvimento pessoal dentro da área do trânsito, que ele possa abranger programas de intervenção, ou seja, a educação para o trânsito seguro (PACHINI e WAGNER, 2006). Importantes mudanças ocorreram em relação à capacitação do profissional para trabalhar na área: as avaliações passaram a ser realizadas somente por psicólogos que possuíssem curso de capacitação específico de perito examinador de trânsito, com carga horária mínima de 120horas/aula ( GOUVEIA, et al, 2002). Além disso, nos dias atuais, a exigência é de título de especialista/especialização em Psicologia do Trânsito, regulamentado pelo conselho Federal de Psicologia. Segundo Silva e Günter (2009), a tendência é que os cursos de especialização na área apresentem um aumento de oferta e de procura, pois a formação dos psicólogos não ficará restrita ao perfil de perito de trânsito, tende a haver mais especialistas que entendam às demandas vindas desta área, com o enfoque profissional e científico.

5 3.1 Avaliação psicológica A avaliação psicológica dos candidatos para a carteira Nacional de Habilitação se constitui, ainda nos dias atuais, na principal atividade de grande parte dos psicólogos do trânsito no país. Há mais de 50 anos, esta prática psicológica se inclui no contexto rodoviário, com o propósito de auxiliar na segurança do trânsito, identificando os condutores mais propensos a se envolverem em acidentes. (SILVA e ALCHIERI, 2007). Conforme o Conselho Federal de Psicologia (2000, paginação irregular): As técnicas de avaliação psicológica utilizadas pelos psicólogos do trânsito tem como finalidade auxiliar na identificação de adequações psicológicas mínimas (atenção, inteligência, personalidade) para o correto e seguro exercício da atividade (remunerada ou não) de conduzir um veículo automotor, para tentar garantir segurança do condutor, do trânsito e dos demais envolvidos. De acordo com Rozestraten (2003), nos últimos 40 anos, mínimas mudanças foram percebidas em relação à atuação dos psicólogos no trânsito. Esse fato é percebido pela inadequação de materiais para testagem (visto que os processos de validação e padronização para o contexto do trânsito ainda são escassos), pela redução de programas para esta área e pela inexpressiva atuação dos psicólogos em cursos e congressos sobre esse tema. Sampaio e Nakano (2011) observam que as pesquisas na área demandam atender o que consta na Resolução nº 012/2000 do Conselho Federal de Psicologia (2000) para avaliar o perfil de um condutor de veículos que é submetido à avaliação pericial, embora reconhecendo [...] a impossibilidade de estabelecer um perfil diferenciado para condutores amadores e profissionais, o que será objeto de investigação no futuro. Através dessa resolução, ficou alinhado que o perfil psicológico do candidato a CNH e do condutor de veículos deve considerar nível intelectual, de atenção, psicomotor, personalidade e psicofísico. Nesta apuração, constata-se que, dentro dos instrumentos mais utilizados, três avaliam a personalidade (Teste de expressão gráfica: PMK, questionário de personalidade de Zuckerman Kuhlman e Escala Fatorial de ajustamento emocional: EFN); um avalia a habilidade intelectual (teste conciso de raciocínio); e um a atenção (atenção concentrada). Em relação aos testes utilizados, Silva e Alchieri

6 (2008), após pesquisa em diversos periódicos de psicologia, listaram 22 testes na área do trânsito: 17 de habilidades, quatro de inteligência e um de memória. Os autores chegaram à conclusão de que existe uma diversidade quanto à avaliação do perfil de habilidades e inteligência. Silva e Alchieri (2010, p. 67) referenciam o CFP (2003) e Pasquali (2011). Destacam que: Os problemas se relacionam às propriedades fundamentais dos instrumentos psicológicos, como a validação, a padronização e a normatização e ao processo de testagem, sendo algumas condutas, neste caso, consideradas faltas passíveis de punição conforme o código de ética do psicólogo. O texto contido na resolução do Conselho Federal de Psicologia (CFP) nº012/2000 orienta o psicólogo a utilizar testes que julgue mais adequados ao contexto do trânsito e que garantam sua validade e fidedignidade. Esta escolha só de instrumentos não garante uma seriedade no que tange ao processo se pensarmos na avaliação psicológica em si: não é somente o uso de testes, mas sim um conjunto de requisitos que contemplam esta prática com muito mais subsídios para o profissional no momento da avaliação, ou seja, uma entrevista bem realizada, dinâmicas em que não se coloque o candidato em situações de pressão, observações e, juntamente, alguns instrumentos para apoiar o psicólogo na avaliação do condutor. Este é o momento de reforçar atuação do psicólogo no trânsito, e não são somente os testes, mas os comportamentos humanos. Afinal, dirigir é observar, analisar, prever e antecipar situações, de acordo com Rozestraten (2000). De acordo com Sampaio e Nakano (2011) é possível averiguar que a dificuldade não passa despercebida, pois registram que a falta de critérios no momento de considerar um candidato apto, inapto ou provisoriamente inapto é um problema da avaliação psicológica no trânsito. Dessa forma, percebe-se que a psicologia não tem estabilidade neste meio, pois como já citado, não há uniformidade na prática e os próprios testes que são utilizados para a obtenção da Carteira Nacional de Habilitação são empregados para outros fins (organizacional, clínica, etc.). Isso repercute negativamente para a psicologia, já que se refere à personalidade, comportamento humano e, na circunstância em pauta, nem sempre é possível catalogar o sujeito como apto,

7 inapto e temporariamente apto. Conforme Silva e Alchieri (2008), nenhum estudo até hoje evidenciou critérios para os candidatos a CNH, tanto para habilitação, renovação ou até para infratores. Essa ausência de critérios não tem dado nivelamento à avaliação, deixando para o psicólogo a adoção de particularidades de avaliação para a CNH. Outro importante aspecto que permeia o contexto de avaliação é o estudo do comportamento humano no trânsito, que reuniu vários dados como: ambiente, uso do carro como extensão da casa, educação como promotora de comportamento e o envolvimento da comunidade para redução de acidentes (HOFFMANN, 2003). Os testes psicológicos de desempenho e os testes de personalidade nos levam a uma boa base de informação, pois uma personalidade bem equilibrada é essencial para um comportamento adequado no dia a dia e no trânsito (CHRIST, 2003). É imperativo que os psicólogos se apropriem deste espaço, desenvolvendo ações em benefício do trânsito e dos condutores. Colabora-se, assim, para a construção de ações interdisciplinares, ou seja, para que o psicólogo atue juntamente com outros saberes profissionais da área do trânsito, fortalecendo a sua eficiência. O psicólogo, atualmente, tem atuado somente na avaliação psicológica no trânsito. No entanto, poderia ter maior abrangência de atuação. Poderia atuar, por exemplo, na elaboração de [...] pesquisas no campo de processos psicológicos/ psicossociais/psicofísicos; gerando ações sócio educativas; análise dos acidentes de trânsito e sugestão de como evitar e atenuar suas incidências (HOFMANN e CRUZ, 2003, p. 36). Conforme Silva e Alchieri (2008), durante essas cinco décadas, não evoluíram muito as pesquisas na avaliação psicológica do trânsito, para responder às dúvidas e questões da sociedade sobre sua obrigatoriedade e efetividade que justifiquem o investimento financeiro. O problema ainda reside nos poucos estudos voltados para essa área. Enquanto não forem realizadas essas pesquisas, avaliam-se motoristas com instrumentos que são válidos e fidedignos, mas não são específicos para a área do trânsito. Não existe, por parte do DETRAN, uma normatização dos testes que devam ser utilizados. O psicólogo do trânsito tem uma posição legalmente definida, mas não está melhor instrumentado que os psicólogos de outras áreas (ROZESTRATEN, 1988).

8 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Face ao que foi exposto, é importante realçar o benefício que a psicologia do trânsito proporciona à sociedade. Segundo Rozestraten (2000), o trânsito é um bem social que pertence a todos. Se alguém tem direito, também tem deveres em relação ao outro. Uma consciência de que o trânsito é de todos e para todos. Percebe-se que, na revisão dos artigos abordados neste estudo, o psicólogo é estratégico para a construção de práticas e conhecimentos nesta área. O profissional deverá dar subsídios teóricos e técnicos às novas demandas do trânsito, que surgem a partir do crescente uso do automóvel. É importante que a psicologia do trânsito seja discutida em congressos, cursos e também passe a ser uma disciplina obrigatória nos cursos de graduação de Psicologia, desenvolvendo no aluno um olhar profissional para esta área cada vez mais desafiadora. Em síntese, para a credibilidade da área necessita-se de profissionais competentes, embasados por uma adequada formação profissional e munidos de bons instrumentos, gerando, assim, ações mais qualificadas. O comportamento humano é complexo e sua avaliação também. Neste sentido, uma formação na área da avaliação psicológica tende a minimizar e auxiliar neste processo, tendo tudo a ver com a Psicologia e com a atuação do psicólogo, em uma área que é específica dele, o estudo dos processos mentais. Devem-se incluir os psicólogos em todos os organismos pertencentes ao sistema nacional de trânsito, visando à representação da categoria na construção de políticas de segurança do condutor, bem como informar à sociedade sobre a função social e o serviço prestado pelo psicólogo do trânsito. Esses aspectos reforçam a necessidade de que uma avaliação psicológica seja realizada com qualidade, exigindo do psicólogo a utilização de todos os recursos técnicos dentro de rigorosos critérios, tendo em vista a sua responsabilidade e a sua ação como profissional na área do trânsito. É preciso reforçar a necessidade de investimentos em outras áreas. Além da avaliação de candidatos, o psicólogo poderá atuar na estruturação de programas de intervenção, através de oficinas psicoeducativas direcionadas à conscientização e reflexões para a direção segura (PACHINI e WAGNER, 2006). Devem ser desenvolvidas atividades de conscientização sobre o trânsito e o exercício da

9 cidadania, com a participação da sociedade através de fóruns, seminários, escolas, criando um compromisso social. Somente se faz um trabalho efetivo dividindo a sua atuação com outros saberes, multiplicando olhares, conceitos e percepções diferentes sobre um mesmo foco, contribuindo para uma melhor atuação do condutor no que tange à área emocional, social e nas políticas de trânsito. A Psicologia do trânsito avança por vias promissoras, é cada vez mais reconhecida pela sociedade e autoridades, pela necessidade exigida no trânsito turbulento e caótico de hoje. Um trânsito com segurança resulta de uma boa dose de sensibilidade, de espírito de colaboração e tolerância para solucionar impasses causados por outros motoristas. O trânsito está carente de conhecimentos técnicos, mas está sobretudo carente de respeito humano (ROZESTRATEN, 2003). É necessário visualizar o trânsito como um fenômeno humano, para entendermos os problemas que este nos traz em relação a nossa saúde, bem como os impactos para o nosso bem-estar. Em síntese, deve-se saber que além de um psicólogo avaliando o sujeito, tem que estar um profissional competente, envolvido com as políticas de trânsito e a mobilidade humana e coerente com seu compromisso como cidadão. REFERÊNCIAS ANACHE, A. A.; CORREA B. C. As Políticas do Conselho Federal de Psicologia para a avalição psicológica. Avaliação Psicológica Diretrizes na Regulamentação da profissão. CFP. Brasília: s.n., 2010. ALCHIERI, J.C. Considerações sobre a prática da avaliação psicológica de condutores no Brasil. In: HOFFMANN, M. H.; CRUZ, R. M.; ALCHIERI, J.C.(orgs). Comportamento humano no trânsito. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003. p.251-261. ALCHIERI, J. C.; STROEHER, F. Avaliação Psicológica no trânsito: o estado da arte sessenta anos depois. In CRUZ, R. M.; ALCHIERI, J. C.; SARDA JUNIOR, J. J. (org.). Avaliação e medidas psicológicas: produção do conhecimento e da intervenção profissional. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2002. p.155-170. CONSELHO FEDERAL DE PSCOLOGIA. Caderno de psicologia do trânsito e compromisso social - CPTC. Brasília DF: s.n., 2000.

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