Habilidade manual do paciente hemiplégico comparado ao idoso saudável



Documentos relacionados
AVALIAÇÃO DA HABILIDADE MANUAL DA MÃO SADIA DO HEMIPLÉGICO ATRAVÉS DO PURDUE PEGBOARD TEST COMPARANDO COM A MÃO NÃO DOMINANTE DO IDOSO SAUDÁVEL

Comparação da força da musculatura respiratória em pacientes acometidos por acidente vascular encefálico (AVE) com os esperados para a idade e sexo

Doença de Alzheimer: uma visão epidemiológica quanto ao processo de saúde-doença.

Fisioterapia no Acidente Vascular Encefálico (AVE)

CARACTERÍSTICAS POSTURAIS DE IDOSOS

TÍTULO: AUTORES: INSTITUIÇÃO ÁREA TEMÁTICA: INTRODUÇÃO

INDICADORES SOCIAIS E CLÍNICOS DE IDOSOS EM TRATAMENTO HEMODIALÍTICO

CAPACIDADE FUNCIONAL E QUALIDADE DE VIDA DO PACIENTE COM DEMÊNCIA DE ALZHEIMER

Acta Ortopédica Brasileira ISSN versão impressa

PROCESSO DE PRESCRIÇÃO E CONFECÇÃO DE ÓRTESES PARA PACIENTES NEUROLÓGICOS EM UM SERVIÇO DE TERAPIA OCUPACIONAL

CONDIÇÃO BUCAL DO IDOSO E NUTRIÇÃO: REFLEXÕES DA EXPERIÊNCIA EXTENSIONISTA.

FACULDADE DE MEDICINA/UFC-SOBRAL MÓDULO SISTEMA NERVOSO NEUROANATOMIA FUNCIONAL. AVC Isquêmico. Acd. Gabrielle Holanda. w w w. s c n s. c o m.

A EFETIVIDADE DA REABILITAÇÃO VESTIBULAR NA SÍNDROME LABIRÍNTICA PERIFÉRICA IRRITATIVA

TREINO COGNITIVO E ENVELHECIMENTO: na busca da autonomia dos idosos

OUTUBRO. um mes PARA RELEMBRAR A IMPORTANCIA DA. prevencao. COMPARTILHE ESSA IDEIA.

Introdução: a população idosa está aumentando, e com ela existe a necessidade de estudarmos

10º Congreso Argentino y 5º Latinoamericano de Educación Física y Ciencias

3 Método. 3.1 Sujeitos

TÉCNICA DE MIRROR VISUAL FEEDBACK EM PACIENTE HEMIPARETICO NO PÓS- ACIDENTE VASCULAR ENCEFÁLICO

Saúde da mulher em idade fértil e de crianças com até 5 anos de idade dados da PNDS 2006

TÍTULO: "SE TOCA MULHER" CONHECIMENTO DAS UNIVERSITÁRIAS SOBRE O CÂNCER DE MAMA

RESUMO PARA O CONGRESSO AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA 2011

Título: Autores: Unidade Acadêmica: INTRODUÇÃO

ATENDIMENTO DOMICILIAR FISIOTERAPEUTICO PARA PORTADOR DE ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL NO ESTÁGIO AGUDO

CORRELAÇÃO DA INSUFICIÊNCIA RENAL E ANEMIA EM PACIENTES NORMOGLICEMICOS E HIPERGLICEMICOS EM UM LABORATÓRIO DA CIDADE DE JUAZEIRO DO NORTE, CE

TÍTULO: CORRELAÇÃO ENTRE COGNIÇÃO E FUNCIONALIDADE EM IDOSOS INSTITUCIONALIZADOS. CATEGORIA: CONCLUÍDO ÁREA: CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E SAÚDE

CARACTERÍSTICAS SOCIODEMOGRÁFICAS DE IDOSAS. UM OLHAR PARA VIÇOSA, MINAS GERAIS, BRASIL

O resultado de uma boa causa. Apresentação de resultados da campanha pela Obesidade do programa Saúde mais Próxima

Cap. 12 Testes Qui- Quadrados e Testes Não-Paramétricos. Statistics for Managers Using Microsoft Excel, 5e 2008 Prentice-Hall, Inc.

RESUMOS SIMPLES...156

3.2 Descrição e aplicação do instrumento de avaliação

Causas de morte 2013

Azul. Novembro. cosbem. Mergulhe nessa onda! A cor da coragem é azul. Mês de Conscientização, Preveção e Combate ao Câncer De Próstata.

SITUAÇÃO DOS ODM NOS MUNICÍPIOS

ÍNDICE DE QUALIDADE DE VIDA DO TRABALHADOR DA INDÚSTRIA - SESI/SC

MORBIDADES AUTORREFERIDAS POR IDOSOS ATENDIDOS EM UM AMBULATÓRIO DE GERIATRIA

PNAD - Segurança Alimentar Insegurança alimentar diminui, mas ainda atinge 30,2% dos domicílios brasileiros

Risco de Morrer em 2012

Transformando a pergunta de pesquisa em estratégia de busca. Elisabeth Biruel BIREME/OPAS/OMS

Modelo de Atenção às Condições Crônicas. Seminário II. Laboratório de Atenção às Condições Crônicas. O caso da depressão. Gustavo Pradi Adam

ESCOLIOSE Lombar: Sintomas e dores nas costas

PERFIL DE IDOSOS RESIDENTES EM UMA INSTITUIÇÃO DE LONGA PERMANÊNCIA NA CIDADE DE MOSSORÓ

Epidemiologia. Profa. Heloisa Nascimento

Apresentação. Introdução. Francine Leite. Luiz Augusto Carneiro Superintendente Executivo

O retrato do comportamento sexual do brasileiro

6 Análise de necessidades

ANS Longevidade - Custo ou Oportunidade. Modelos de Cuidados à Saúde do Idoso Rio de Janeiro/RJ 25/09/2014

Efeito agudo do treino de Pilates sobre as dores de costas em Idosos

Habilidade manual do idoso que vive com a família comparada com o idoso institucionalizado

Últimas evidências da efetividade das vacinas contra o HPV. Perspectivas clínicas

CLASSIFICAÇÃO DOS DISTÚRBIOS TIREOIDIANOS EM USUÁRIOS DE UM LABORATÓRIO DE ANÁLISES CLÍNICAS

Avaliação antropométrica de idosas participantes de grupos de atividades físicas para a terceira idade.

HIPERTENSÃO ARTERIAL SISTÊMICA: HÁ DIFERENÇA NA DISTRIBUIÇÃO ENTRE IDOSOS POR SEXO?

EFETIVIDADE DA ESCOLA DE COLUNA EM IDOSOS COM LOMBALGIA

A percepção do handicap em adultos candidatos ao uso de aparelhos. auditivos. Fabiane Acco Mattia Fonoaudióloga Especialização em Audiologia

APARELHO DE AMPLIFICAÇÃO SONORA INDIVIDUAL: ESTUDO DOS FATORES DE ATRASO E DE ADIAMENTO DA ADAPTAÇÃO

MS divulga retrato do comportamento sexual do brasileiro

Pnad: Um em cada cinco brasileiros é analfabeto funcional

AVALIAÇÃO NEUROPSICOLÓGICA DE IDOSOS USUÁRIOS DE PSFs NA CIDADE DE RECIFE-PE*

CAUSAS DE MORTE NO ESTADO DE SÃO PAULO

A EVITABILIDADE DE MORTES POR DOENÇAS CRÔNICAS E AS POLÍTICAS PÚBLICAS VOLTADAS AOS IDOSOS

AVALIAÇÃO DA CAPACIDADE DE EXERCÍCIO DE IDOSOS COM LOMBALGIA E SUA INTERFERÊNCIA NA QUALIDADE DE VIDA

PERFIL DA POPULAÇÃO ATENDIDA PELA LIGA DE OFTALMOLOGIA EM CIDADE DO INTERIOR GOIANO

Expectativa de vida do brasileiro cresce mais de três anos na última década

Retrato da. Cidade de Lisboa. Observatório de Luta Contra a Pobreza na. Cidade de Lisboa

Como Selecionar Projetos Seis Sigma

RASTREAMENTO DO CÂNCER DE COLO UTERINO EM MULHERES IDOSAS NO MUNICÍPIO DE LAGOA SECA/PB

Em 2013 perderam-se anos potenciais de vida devido à diabetes mellitus

PROGRAMA ATIVIDADE MOTORA ADAPTADA

norma técnica Padrão de Segurança e Saúde: avaliação do desempenho em segurança e saúde das empresas colaboradoras Código: NT GN-SP.

NÍVEL DE CONHECIMENTO DOS PROFISSIONAIS ENFERMEIROS SOBRE A SAÚDE DO HOMEM NO MUNICÍPIO DE CAJAZEIRAS-PB.

DOCUMENTO TÉCNICO DO PROJETO

ANÁLISE DAS CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS DE PACIENTES DIABÉTICOS PARA PREVENÇÃO DE COMPLICAÇÕES

Fatores que interferem na qualidade de vida de pacientes de um centro de referência em hipertensão arterial

A PRÁTICA DA TERAPIA OCUPACIONAL NA ESTIMULAÇÃO COGNITIVA DE IDOSOS QUE FREQUENTAM CENTRO DE CONVIVÊNCIA.

Critérios para Admissão em Longo e Curto Internamento e Unidade de Dia

ÍNDICE INSTITUIÇÃO TÍPICA DO TERCEIRO SETOR DE BELO HORIZONTE A Instituição Típica do Terceiro Setor por Principal Área de Atividade...

Governo lança campanha de prevenção dos riscos do consumo de bebidas alcoólicas Resultados das pesquisas:

ENQUALAB 2013 QUALIDADE & CONFIABILIDADE NA METROLOGIA AUTOMOTIVA. Elaboração em planos de Calibração Interna na Indústria Automotiva

Pesquisa revela o maior medo dos paulistas.

A ATIVIDADE FÍSICA ENQUANTO FATOR MOTIVACIONAL PARA IDOSOS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA REABILITAÇÃO PROCESSO SELETIVO 2013 Nome: PARTE 1 BIOESTATÍSTICA, BIOÉTICA E METODOLOGIA

Doenças Crônicas. uma nova transição. Paulo A. Lotufo. FMUSP Coordenador do Centro de Pesquisa Clínica e Epidemiológica da USP

A Influência da instrução verbal e da demonstração no processo da aprendizagem da habilidade parada de mãos da ginástica artística.

Realização: Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política da UFSC, em convênio com a Federação Nacional dos Jornalistas FENAJ

EFEITOS DA PARTICIPAÇÃO NO PROGRAMA MENTE ATIVA NO EQUILÍBRIO E COGNIÇÃO DE PARTICIPANTE COM DOENÇA DE ALZHEIMER

A situação do câncer no Brasil 1

Apêndice IV ao Anexo A do Edital de Credenciamento nº 05/2015, do COM8DN DEFINIÇÃO DA TERMINOLOGIA UTILIZADA NO PROJETO BÁSICO

HORÁRIO DAS AVALIAÇÕES 2015

PERFIL DE IDOSOS COM ALTERAÇÕES PODAIS ATENDIDOS EM UM AMBULATÓRIO DE GERIATRIA

AVALIAÇÃO DO EQUILÍBRIO DINÂMICO E DIFICULDADES FUNCIONAIS DE INDIVÍDUOS COM SEQUELA DE ACIDENTE VASCULAR ENCEFÁLICO

Maria Inês Gazzola Paulino

QUEIXAS E SINTOMAS VOCAIS PRÉ FONOTERAPIA EM GRUPO

CURSO PRÉ-VESTIBULAR UNE-TODOS: CONTRIBUINDO PARA A EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA NA UNIVERSIDADE DO ESTADO DE MATO GROSSO *

TÍTULO: CARACTERÍSTICAS DOS IDOSOS COM OSTEOARTROSE EM TRATAMENTO FISIOTERAPÊUTICO EM GRUPO NA CLÍNICA DE FISIOTERAPIA DA UNAERP

MODIFICAÇÕES NA FLEXIBILIDADE E NA FORÇA MUSCULAR EM PACIENTES COM DOR LOMBAR TRATADOS COM ISOSTRETCHING E RPG

ANÁLISE DA QUALIDADE DE VIDA DE PACIENTES COM DOENÇA DE PARKINSON SUBMETIDOS AO TRATAMENTO FISIOTERAPÊUTICO NO SOLO E NA ÁGUA

A Meta-Analytic Review of Psychosocial Interventions for Substance Use Disorders

Transcrição:

Habilidade manual do paciente hemiplégico comparado ao idoso saudável Manual skills in hemiplegic patient compared to healthy elderly Gabriela Lopes Gama 1, Morgana Menezes Novaes 1, Carlúcia Itamar Fernandes Franco 2, Doralúcia Pedrosa de Araújo 2, Gilma Serra Galdino 3 RESUMO É frequente que pacientes pós Acidente Vascular Cerebral (AVC) apresentem alterações na habilidade manual do membro superior (MS) contralateral à lesão. Durante a reabilitação desses pacientes, geralmente, é priorizado o lado contralateral á lesão, levando o lado ipsilateral a ser considerado como referência, ou seja, sadio. Entretanto, alguns estudos têm demonstrado uma redução no desempenho motor do MS ipisilateral a lesão em pacientes hemiplégicos pós-avc. Objetivo. Avaliar a habilidade manual de pacientes pós- AVC e de idosos saudáveis através do Purdue Pegboard Test e compará-las. Método. Foram selecionados dois grupos, o primeiro; composto por 15 idosos saudáveis e o segundo; composto por 15 indivíduos hemiplégicos pós-avc em sua fase crônica. Os idosos saudáveis foram orientados a encaixar a maior quantidade possível de pinos na prancha do Purdue Pegboard Test durante 30s, por três tentativas consecutivas, usando o MS não dominante. Já os pacientes pós- AVC foram orientados a realizar o mesmo procedimento usando do MS saudável. Resultados. Os idosos obtiveram média de encaixes superior aos pacientes pós-avc em todas as tentativas (p<0,05). Conclusão. Foi observado comprometimento da habilidade manual da mão sadia do hemiplégico quando comparada à mão não dominante do idoso saudável. Unitermos. Acidente Cerebrovascular, Hemiplegia, Idoso, Reabilitação. Citação. Gama GL, Novaes MM, Franco CIF, Araújo DP, Galdino GS. Habilidade manual do paciente hemiplégico comparado ao idoso saudável. ABSTRACT Patients after stroke present changes in the manual dexterity of the contralateral upper limb (UL) During the rehabilitation of these patients is common prioritized the contralateral limb, leading the ipsilateral side to be considered as a reference, or health. However, some studies have shown a reduction in motor performance of ipsilateral UL in hemiplegic patients after stroke. Objective. To evaluate the manual ability of post-stroke patients and healthy elderly with the Purdue Pegboard Test and compare them. Method. Two groups were selected, one composed of 15 healthy elderly and other; composed of 15 poststroke hemiplegic patients in chronic phase. The elderly subjects were instructed to fit the largest possible number of pins on the board of the Purdue Pegboard Test for 30s, for three consecutive attempts, using the non-dominant-limb The other group was instructed to perform the same procedure using the healthy limb. Results. The elderly had a higher average of fittings pins than the post-stroke patients in all attempts (p<0,05) Conclusion. It was observed that the manual ability of the healthy hand of hemiplegic patients was impaired when compared with the non-dominant hand of healthy elderly. Keywords. Stroke, Hemiplegia, Elderly, Rehabilitation. Citation. Gama GL, Novaes MM, Franco CIF, Araújo DP, Galdino GS. Manual skills in hemiplegic patient compared to healthy elderly. Trabalho realizado na Clínica Escola do Departamento de Fisioterapia da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), Campina Grande-PB, Brasil. 1. Acadêmica de fisioterapia, Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), Campina Grande-PB, Brasil. 2. Fisioterapeuta, Dotoura, professora do departamento de fisioterapia da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), Campina Grande-PB, Brasil. 3. Neurologista, Mestre, professora do departamento de fisioterapia da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), Campina Grande-PB, Brasil. Endereço para correspondência: Gabriela L Gama R. Rodrigues Alves, 413, 1506 CEP 58400-550, Campina Grande-PB, Brasil. E-mail: gabrielalopesgama@gmail.com Artigo Original Recebido em: 04/08/09 Aceito em: 04/04/10 Conflito de interesses: não Rev Neurocienc 2010;18(4):443-447 443

INTRODUÇÃO O Acidente Vascular Cerebral (AVC) é considerado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como uma síndrome que se caracteriza pelo desenvolvimento de sinais clínicos resultantes de distúrbios, sejam estes globais ou focais, da função cerebral 1. O mesmo ocorre com mais frequência em indivíduos do sexo masculino e em indivíduos da raça negra 2. Sua incidência aumenta com a idade, dobrando a cada década de vida após os 55 anos e tendo pico entre a sétima e a oitava década de vida, quando se somam alterações cardiovasculares e metabólicas relacionadas com a idade 3,4. Nos últimos anos vem crescendo o número de novos casos de AVC em indivíduos com faixa etária entre 40 e 59 anos, sendo reflexo dos maus hábitos de vida adotados pela sociedade moderna 5,6. Dos pacientes que sofrem AVC, um terço morrerá e um terço ficará com sequelas graves, o que o tornará dependente do cuidado de terceiros 7. A maior parte da recuperação neurológica e funcional desses pacientes ocorre após os seis primeiros meses do episódio, todavia, o tempo e o grau desta recuperação estão diretamente relacionados com o grau de lesão inicial 8,9. A disfunção motora mais evidente após um AVC é a hemiplegia ou a hemiparesia que são entendidas como alterações sensórias motoras totais ou parciais, respectivamente, do dimídio corporal contralateral ao hemisfério cerebral acometido 10. Uma das principais queixas dessess indivíduos que sofreram AVC são as alterações motoras no membro superior (MS) do lado plégico/parético, as quais levam ao sério comprometimento da destreza necessária para a execução de atividades manuais da vida diária 11. A dificuldade para utilização do MS plégico/parético leva ao uso quase que constante do MS ipsilateral ao hemisfério cerebral lesado, que é menos afetado, e consequentemente ao desuso do MS mais afetado, ou seja, o membro contralateral a lesão. Esse comportamento caracteriza uma adaptação compensatória 12. Durante o processo de reabilitação em pacientes após um AVC, são enfatizadas atividades sobre o hemicorpo plégico/parético, a fim de recuperar suas funções motoras, sendo o lado ipisilateral ao hemisfério cerebral lesado frequentemente considerado como referência, representando assim, o lado sadio 13. Todavia, estudos têm demonstrado uma redução no desempenho sensorial e motor do MS ipisilateral ao hemisfério cerebral lesado em pacientes hemiplégicos/hemiparéticos pós- AVC 14. Apesar de estudos realizados anteriormente, a habilidade manual e seus processos de reabilitação em pacientes hemiplégicos/hemiparéticos pós-avc ainda são pouco descritos na literatura e representam um desafio para os estudiosos. Sendo assim, o estudo a seguir tem como objetivo avaliar a habilidade manual de pacientes pós- AVC e de idosos saudáveis através do Purdue Pegboard Test e compará-las, a fim de contribuir para análise e compreensão do comportamento motor da mão do hemiplégico/hemiparético, além de buscar evidências a respeito das necessidades de cada dimídio corporal desses pacientes durante o processo de reabilitação. MÉTODO Durante o estudo foi realizada uma pesquisa de caráter analítico do tipo experimental e transversal, de abordagem quantitativa nas dependências da Clínica Escola do Departamento de Fisioterapia da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), na Clínica Escola da União de Ensino Superior de Campina Grande (UNESC) e no Centro de Convivência do Idoso da cidade de Campina Grande, nos meses de fevereiro e março de 2009. Amostra A amostra estudada foi composta por 30 indivíduos de ambos os sexos divididos em dois grupos. O primeiro grupo, denominado grupo controle (GC), foi formado por 15 sujeitos saudáveis com idade superior a 65 anos e o segundo grupo, denominado grupo experimental (GE), foi composto por 15 sujeitos hemiplégicos/hemiparéticos com diagnóstico clínico de AVC há mais de seis meses de qualquer idade. Foram excluídos da pesquisa indivíduos que apresentavam afasia de compreensão, deficiência visual não corrigida, escore no mini exame do estado mental (MEEM) abaixo do esperado para a escolaridade, sujeitos que faziam uso de medicamentos que afetavam o desempenho motor, e indivíduos que tinham realizado prática motora antes do teste. Os indivíduos que se disponibilizaram a participar da pesquisa assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, segundo a Resolução 196/96. O trabalho foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Estadual da Paraíba (no 0312.0.133.000.07). Procedimentos A pesquisa foi iniciada pela aplicação, em ambos os grupos, Mini Exame do estado mental (MEEM) corrigido para a escolaridade, traduzido e adaptado 15, a fim de rastrear alterações cognitivas nas unidades de 444 Rev Neurocienc 2010;18(4):443-447

análise. Em seguida foram registradas informações gerais de cada um dos indivíduos que fizeram parte da amostra, como idade, sexo e nível de escolaridade, seguida pela determinada da preferência lateral dos indivíduos do GC através do inventário de dominância lateral de Edinburgh 16. Para o GE, após o registro dos dados gerais, foram registradas informações sobre a doença atual, como o hemicorpo corporal comprometido e o tempo decorrido após o episódio de AVC, a partir de seus prontuários individuais. Por fim, foi realizado, em ambos os grupos, de forma individual e em um único encontro, o teste de destreza manual utilizando o Purdue Pegboard Test (Figura 1) segundo a forma de sub-teste adaptado 13. Baseado neste, foram colocados nos recipientes superiores do aparelho apenas pinos metálicos e o paciente deveria manipulá-los tão depressa quanto possível, em um período de 30 segundos, durante três tentativas consecutivas. Os indivíduos do GE manipularam os pinos apenas com a mão sadia, já os indivíduos do GC realizaram o mesmo procedimento, todavia foi utilizado apenas o MS não dominante. RESULTADOS Dos indivíduos que fizeram parte do GC, quatro eram do gênero masculino (26,7%) e 11 eram do gênero feminino (73,3%). Os mesmo apresentaram idade variando entre 65 e 84 anos, sendo que a média foi de 75,67±5,54. O nível de escolaridade desse grupo variou entre zero e dezessete anos, com média de 4,2±6,28. O GE foi formado por 10 indivíduos do gênero masculino (66,70%) e cinco do gênero feminino (33,30%). A idade desses sujeitos variou entre 36 e 66 anos, com média de 51,73±9,55 e seu nível de escolaridade variou entre zero e vinte e um anos, com média de 7,33±5,80 (Gráfico 1). Gráfico 1. Distribuição por gênero dos sujeitos estudados. Figura 1. Instrumento de Purdue Pegboard Test. Fonte: Araújo (2007) 14. Análise Estatística Para análise estatística dos resultados foi utilizado o software SPSS versão 16.0 for Windows. Esta análise foi realizada através de estatísticas descritivas (percentuais, médias e desvio padrão) e do teste Mann Whitney para comparação de médias. Os resultados desse último teste foram considerados significativos quando apresentaram p<0,05. Dos indivíduos que fizeram parte do GC, todos os homens relataram utilizar preferencialmente a mão direita, para a realização das atividades pré-estabelecidas pelo Inventário de Edinburg e apenas, uma das mulheres desse grupo relatou utilizar preferencialmente a mão esquerda, durante a realização da maioria das atividades mencionadas. Dentre os homens do GE, seis tiveram o hemisfério cerebral direito afetado, apresentando, consequentemente, alterações sensoriais e/ou motoras no hemicorpo esquerdo. Das cinco mulheres que participaram desse grupo, três apresentaram alterações sensoriais e/ou motoras no hemicorpo esquerdo. O tempo decorrido do último episódio de AVC para o GE, tendo como referência o dia da coleta de dados, variou entre 7 e 108 meses com média de 42,46±32,91meses. Quanto ao escore obtido durante o MEEM, os indivíduos do GC apresentaram escore variando entre 19 e 30 pontos, com média de 23,53±4,19 e os indivíduos do GE obtiveram valores variando entre 16 e 28 pontos, com média de 23,13±4,10. Foram considerados com déficit cognitivo, e assim excluídos da Rev Neurocienc 2010;18(4):443-447 445

amostra indivíduos analfabetos com pontuação inferior a 15 pontos, indivíduos que apresentaram nível de escolaridade entre um e onze anos com pontuação inferior a 22 pontos ou indivíduos com nível de escolaridade maior que onze anos com pontuação inferior a 27 pontos 17. A primeira tentativa de encaixe dos pinos durante procedimento experimental com o Purdue Pegboard Test teve média de pinos encaixados 9,87±1,55 para o GC e para o GE de 8,4±1,76 (p=0,019), a segunda tentativa teve média de pinos encaixados de 11,13±1,12 no GC e 9,4±2,23 no GE (p=0,022) e a terceira tentativa teve média de pinos encaixados de 11,73±1,28 no GC e 9,93±2,4 no GE (p=0,019) (Gráfico 2). DISCUSSÃO Os resultados obtidos mostraram que o GC foi formado em sua maioria por indivíduos do gênero feminino e com uma baixa média de escolaridade, estando de acordo com o perfil dos idosos brasileiros 18. De forma geral, nove a cada dez indivíduos tem como preferência lateral o dimídio direito, sendo assim denominadas destras 19. Tal dominância também foi encontrada entre os indivíduos do GC do estudo apresentado. A faixa etária do GE corroborou com estudos recentes que descreveram os maus hábitos de vida adotados pelo homem contemporâneo como causa da incidência cada vez mais precoce do AVC 5. Além disso, Gráfico 2. Média de pinos encaixados nas três tentativas consecutiavs com o Purdue Pegboard Test. A média de pinos encaixados durante as três tentativas consecutivas foi de 10,91±1,52 para o GC e de 9,24±2,19 para o GE (p< 0,001); (Gráfico 3). Gráfico 3. Média geral de pinos encaixados nas três tentativas com o Purdue Pegboard Test. a prevalência de AVC no sexo masculino 20 também foi encontrada este grupo. Todos os sujeitos que participaram da pesquisa independentemente de grupo, obtiveram pontuação no MEEM compatível com sua escolaridade, descartando com isso, a presença de algum tipo de demência que poderia ter interferido no desempenho durante o teste com o Purdue Pegboard Test. A partir da análise dos dados, foi demonstrada uma menor habilidade manual no lado ipisilateral ao hemisfério cerebral lesado em indivíduos hemiplégicos ou hemiparéticos pós- AVC quando comparados com a habilidade manual do lado não dominante de indivíduos saudáveis com 65 anos ou mais, estando de acordo com estudos anteriores que descreveram uma redução na habilidade manual do lado ipisilateral ao hemisfério cerebral acometido em hemiplégicos ou hemiparéticos 14,20. 446 Rev Neurocienc 2010;18(4):443-447

CONCLUSÃO A habilidade manual é essencial para a realização de atividades cotidianas, para a promoção da independência dos indivíduos e de uma melhor qualidade de vida. Indivíduos hemiplégicos/hemiparéticos que sofreram AVC, frequentemente apresentam um visível comprometimento na habilidade motora do lado contralateral a lesão. O estudo exposto demonstrou e existência de uma diminuição na habilidade manual do lado ipisilateral a lesão, o qual muitas vezes é considerado sadio, em indivíduos após AVC, quando comparada a habilidade manual da mão não dominante de idosos saudáveis. Tal resultado demonstrando a necessidade de novas perspectivas de programas de reabilitação que dêem ênfase a atividades em ambos os dimídios corporais de sujeitos hemiplégicos/hemiparéticos pós-avc, a fim de melhorar sua capacidade funcional e o tornando mais independente, na busca constante de uma melhor qualidade de vida para esses indivíduos. REFERÊNCIAS 1.Aguiar PT, Rocha TN, De Oliveira ES. Escalas de controle de tronco como prognóstico funcional em pacientes após acidente vascular encefálico. Acta Fisiatr. 2008;15:160-4. 2.Umphred DA. Fisioterapia Neurológica. 4ª. Ed. São Paulo: Manole, 2004, 118p. 3.O sullivan, SB, Schmitz, TJ. Fisioterapia: Avaliação e tratamento. 4ª. Ed. Rio de Janeiro, Manole, 2005, 1152p. 4.Zétola VHF, Nóvak EM, Camargo CHF, Carraro Júnior H, Coral P, Muzzio JA, et al. Acidente Vascular Cerebral em pacientes jovens. Arq.Neuropsiquiat 2001;59:740-5. 5.Mazolla D, Polese JC, Schuster RC, De Oliveira SG. Pacientes acometidos por acidente vascular encefálico assistidos na clinica de fisioterapia neurológica da universidade de Passo Fundo. Rev Bras Prom Saúde 2007;20:22-7. 6.Silva CO, Ribeiro M, Battistela LR. Avaliação da dor no ombro em pacientes com acidente vascular cerebral. Rev Acta Fisiatr 2000;7:78-83. 7.Downie PA. Neurologia para Fisioterapeutas. 4ª. ed,. São Paulo: Editora Panamericana, 1987, 454p. 8.Ernest E. A review of stroke reabilitation and phisyoterapy. Stroke 1990;21:1081-5. 9.Trevisan CM. Efeitos da Imagem mental na reabilitação da função motora do membro superior na hemiplegia após-acidente vascular encefálico (Tese) Brasília: UNB, 2007, 129p. 10.Stokes M. Neurologia para fisioterapeutas. São Paulo: Premier, 2000, 314p. 11.Barreca S, Wolf SL, Fasoli S, Bohannon R. Treatment interventions for the paretic upper limb of stroke survivors: a critical review. Neurorehabil Neural Repair 2003;17:220-6. 12.Uswatte G, Foo WL, Olmstead H, Lopez K, Holand A, Simms LB. Ambulatory monitoring of arm movement using accelerometry: an objective measure of upper-extremity rehabilitation in persons with chronic stroke. Arch Phys Med Rehabil2005;86:1498-501. 13.Desrosiers J, Bourbonnais D, Bravo GPM, Guay M. Performance of the unaffected upper extremity of elderly stroke patients. Stroke 1996;27:1564-70. 14.Araújo DP. Determinação e modulação da excitabilidade cortical pela estimulação magnética transcraniana (Tese). Brasília: UNB, 2007, 101p. 15.Lourenço RA, Veras RP. Mini-Exame do Estado Mental características psicossomáticas em idosos ambulatoriais. Rev Saúde Pub 2006;40:712-9. 16.Paroli, LA, Teixeira R. Assimetrias Laterais em Ações Motoras: Preferência Versus Desempenho. Motriz 2000;6:1-8. 17.Bertolucci PH, Brucki SM, Campacci SR, Juliano Y. O mini-exame do estado mental em uma população geral: impacto da escolaridade. Arq Neuropsiquiat 1994;52:1-7. 18.Camarano AA. O envelhecimento da população brasileira: uma contribuição demográfica. Rio de Janeiro: IPEA, 2002, 26p. 19.Guyton AC, Hall JE. Tratado de Fisiologia Médica. 10ª. ed,. Rio de JaneiroGuanabara Koogan, 2002, 1256p. 20.Lima AC. Avaliação funcional do membro superior homolateral em indivíduos com acidente vascular encefálico (Tese). Brasília: UNB, 2007, 84p. Rev Neurocienc 2010;18(4):443-447 447