Fórum Jurídico. Julho 2014 Contencioso INSTITUTO DO CONHECIMENTO AB. 1/5
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1 Julho 2014 Contencioso A Livraria Almedina e o Instituto do Conhecimento da Abreu Advogados celebraram em 2012 um protocolo de colaboração para as áreas editorial e de formação. Esta cooperação visa a divulgação periódica de artigos breves e anotações nas plataformas electrónicas e digitais da Livraria Almedina. Para aceder, clique aqui. COMENTÁRIO AO ACÓRDÃO N.º 117/14.4TJCBR.C1 DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA, DE 27 DE MAIO DE 2014: REALIZAÇÃO DE ACTOS NOTARIAIS POR ADVO- GADO ESTAGIÁRIO Manuel Sá Martins, Advogado, Abreu Advogados 1. O Tribunal da Relação de Coimbra veio retomar querela sobre a questão da legitimidade dos Advogados Estagiários para a prática de reconhecimentos simples e com menções especiais, presenciais e por semelhança, bem como para a autenticação de documentos particulares, com a mesma força probatória que se verificaria se tais actos tivessem sido realizados com intervenção notarial. Conforme se pode ler no sumário do acórdão em apreço: I O artigo 38º do DL nº 76-A/2006, de 29/03, indica de modo taxativo as entidades que podem, no respeito pelas leis notariais, reconhecer assinaturas, autenticar documentos particulares e traduções. II É inaplicável o disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 189º do EOA na medida em que a prática dos actos, por advogado-estagiário, que a lei acomete aos solicitadores, é supervisionada e orientada pelo respectivo patrono. III A autenticação de documento de confissão de dívida feita por advogado-estagiário viola o disposto no artigo 38º do DL nº 76-A/2006, de 29.3, e o nº 3 do artigo 363º do CC, este na interpretação de que para além dos Notários as entidades taxativamente enunciadas naquele decreto-lei têm idênticas competências em sede de reconhecimentos e autenticação no respeito pelas leis notariais. Tais considerações sumárias são objecto de desenvolvimento na fundamentação jurídica pronunciada pelos Juízes Desembargadores da Relação Conimbricense, nos seguintes termos: 1/5
2 [É discutível se] um advogado-estagiário pode proceder a «reconhecimentos simples e com menções especiais, presenciais e por semelhança, autenticar documentos particulares e certificar ou fazer certificar traduções de documentos nos termos previstos na lei notarial». Defende a apelante que a alínea a) do nº 1 do artigo 189º do EOA uma vez obtida a cédula profissional como advogado estagiário, este pode autonomamente, mas sempre sob orientação do patrono, praticar ( ) todos os actos da competência dos solicitadores permite aos advogados-estagiários reconhecer assinaturas, autenticar documentos e traduções. Em nosso modesto ver, a autenticação de documento ( ) de confissão de dívida feita por advogado-estagiário viola o disposto no artigo 38º do DL nº 76-A/2006, de 29.3 e o n.º 3 do artigo 363º do CC, este na interpretação de que para além dos Notários as entidades taxativamente enunciadas naquele decreto-lei têm idênticas competências em sede de reconhecimentos e autenticação no respeito pelas leis notariais. É certo que o EOA confere ao advogado-estagiário a possibilidade de praticar todos os actos que a lei permite aos solicitadores e daí que a apelante interprete esta norma no sentido de lhe estender as competências que aquele artigo 38º confere às entidades neles indicadas e nas quais se incluem os solicitadores. Todavia, a apelante esquece-se que a competência a que faz referência a alínea a) do n.º 1 do artigo 189º do EOA não é autónoma mas antes se trata da possibilidade que a lei confere ao advogado-estagiário de praticar os actos que o Estatuto da Câmara dos Solicitadores possibilita aos solicitadores, mas tal prática não pode deixar de ser supervisionada, acompanhada e orientada pelo seu patrono, o que no limite significa que o patrono é o responsável pelos actos que o seu advogado-estagiário pratique. Salvo melhor opinião, entendemos que o artigo 38º do DL nº 76-A/2006, de 29.3, indica de modo taxativo quais as entidades que possam usar daquelas competências e se o legislador não incluiu os advogadosestagiários foi justamente por considerar a sua falta de autonomia para a prática de actos nº 1 do artigo 189º do EOA e daí não o ter integrado na lista das entidades que quis taxativamente indicar naquele norma artigo 9º do CC. Que o advogado-estagiário possa, orientado pelo seu patrono, praticar os actos da competência dos solicitadores não se discute, mas que possa estender-se tal regime alínea a) do nº 1 do artigo 189º do EOA ao artigo 38º do DL nº 76-A/2006, de 29.3, não é suportado por qualquer norma artigo 10º do CC nem foi essa a intenção do legislador que quis de forma expressa indicar taxativamente quem podia reconhecer assinaturas e autenticar documentos particulares, não cabendo na sua previsão o advogadoestagiário por se encontrar numa fase da sua vida profissional tutelada por um advogado/a que assume a posição de «patrono», ou seja, a de alguém que o vai orientar e ajudar a dar, em segurança, os primeiros passos numa carreira profissional ética e profissionalmente muito exigente. Observando o teor do aresto, facilmente constatamos o seu potencial impacto na prática jurídico-forense em Portugal, pois, como é consabido, ao transitarem para a fase complementar do estágio e no âmbito da sua actividade, os advogados estagiários têm copiosamente efectuado actos relativos à certificação de conformidade de fotocópias com os documentos originais que lhe sejam apresentados, diversos tipos de reconhecimentos e autenticações de documentos. Ora, caso seja acolhida a apreciação normativa acima referenciada, toda esta actividade será posta em causa, lançando-se na treva os inúmeros actos de reconhecimento, certificação e autenticação já praticados por advogados estagiários, ficando estes, no futuro, (ainda mais) limitados no espectro da sua intervenção. 2/5
3 2. Sendo certo que o n.º 1 do artigo 2.º do Código do Notariado determina que o órgão próprio da função notarial é o notário, a verdade é que o artigo 3.º do mesmo diploma legal estabelece algumas excepções a tal princípio, consagrando a alínea d) deste preceito que excepcionalmente, desempenham funções notariais: ( ) d) As entidades a quem a lei atribua, em relação a certos actos, a competência dos notários. Ora, actuando no domínio da autenticação, certificação e do reconhecimento de assinaturas em documentos, o Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29 de Março, no seu artigo 38.º, preceitua o seguinte: 1 Sem prejuízo da competência atribuída a outras entidades, as câmaras de comércio e indústria, reconhecidas nos termos do Decreto-Lei n.º 244/92, de 29 de Outubro, os conservadores, os oficiais de registo, os advogados e os solicitadores podem fazer reconhecimentos simples e com menções especiais, presenciais e por semelhança, autenticar documentos particulares, certificar, ou fazer e certificar, traduções de documentos nos termos previstos na lei notarial. 2 Os reconhecimentos, as autenticações e as certificações efectuados pelas entidades previstas nos números anteriores conferem ao documento a mesma força probatória que teria se tais actos tivessem sido realizados com intervenção notarial. 3 Os actos referidos no n.º 1 apenas podem ser validamente praticados pelas câmaras de comércio e indústria, advogados e solicitadores mediante registo em sistema informático, cujo funcionamento, respectivos termos e custos associados são definidos por portaria do Ministro da Justiça ( ). A regra normativa em causa é um passo no sentido da simplificação, no nosso ordenamento jurídico, do regime dos reconhecimentos de assinaturas e autenticação e tradução de documentos, pela via da atribuição, nomeadamente, aos advogados e aos solicitadores, as competências notariais supra melhor identificadas. É certo que o n.º 1 da disposição legal transcrita não se refere expressamente aos advogados estagiários. Não obstante, haverá que reflectir sobre se não deverão os mesmos, desde que estejam já na segunda fase do estágio e actuem sob orientação do respectivo patrono, considerar-se incluídos naquela previsão e ter competência para praticar tais actos. A matéria em apreço subsume-se a uma questão de carácter profissional relativa ao exercício da advocacia, pelo que não pode ser encarada sem a devida ponderação dos princípios, regras, usos e praxes que fluem dos preceitos constantes do Estatuto da Ordem dos Advogados (doravante EOA ) e correspectivo universo normativo. Assim, cumpre invocar aqui a alínea a) do n.º 1 do artigo 189.º do EOA, nos termos da qual, estando o advogado estagiário na indicada fase do estágio ou seja, tendo sido aprovado nas provas de aferição e obtido a respectiva cédula de advogado estagiário e actuando sob a orientação do patrono, pode o mesmo praticar todos os actos da competência dos solicitadores. 3/5
4 Note-se que o actual EOA, aprovado pela Lei n.º 15/2005, de 26 de Janeiro, precede no tempo a publicação do sobredito Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29 de Março, pelo que, aquando da redacção do artigo 38.º deste segundo diploma, o legislador insofismavelmente teria conhecimento de que todos os actos da profissão de solicitador podem ser exercidos por advogado estagiário. Não obstante, não optou por excluir expressamente o advogado estagiário dessa competência. Em face do exposto, salvo melhor opinião, não podemos sufragar o entendimento proferido pela Relação de Coimbra, no seu acórdão de 27 de Maio de 2014, considerando antes que a alínea a) do n.º 1 do artigo 189º do EOA nos termos do qual, uma vez obtida a cédula profissional como advogado estagiário, este pode, autonomamente, mas sempre sob orientação do patrono, praticar ( ) todos os actos da competência dos solicitadores, em conjugação com o disposto no n.º 1 do artigo 38.º do Decreto-Lei n.º 76-A/2006, permite aos advogados-estagiários reconhecer assinaturas, autenticar documentos particulares e certificar traduções. Neste sentido, já se pronunciaram, entre outros, o Parecer do Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados proferido na Consulta n.º 31/2007 (disponível in e o Parecer n.º 67/PP/2008-P do Conselho Distrital do Porto dessa Ordem, nos termos dos quais: [o legislador atribuiu], nomeadamente, aos advogados e aos solicitadores, algumas competências anteriormente reservadas aos notários, a saber: a. Certificar a conformidade de fotocópias com os documentos originais apresentados e proceder à extracção das mesmas para esse efeito. b. Fazer reconhecimentos simples e com menções especiais, presenciais ou por semelhança. c. Autenticar documentos particulares. d. Certificar, ou fazer e certificar, traduções de documentos. Contudo, os Decretos-Lei n.º 28/2000, de 13 de Março, n.º 237/2001, de 30 de Agosto e n.º 76-A/2006, de 29 de Março nada referem quanto à legitimidade dos advogados estagiários para a prática dos mesmos. [É nosso entendimento] que foi vontade expressa do legislador equiparar, em termos de competência para a prática de actos profissionais, o advogado estagiário ao solicitador Artigo 189º, n.º 1, a) do EOA. [Nestes termos] o advogado estagiário, que se encontre na segunda fase do estágio, tem competência para certificar a conformidade de fotocópias com os documentos originais apresentados e proceder à extracção das mesmas para esse efeito, fazer reconhecimentos simples e com menções especiais, presenciais ou por semelhança, autenticar documentos particulares e certificar, ou fazer e certificar, traduções de documentos, ou seja, tem competência para praticar todos os actos previstos no Decreto-Lei n.º 28/2000, de 13 de Março, no Decreto-Lei n.º 237/2001, de 30 de Agosto e no Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29 de Março. 4/5
5 Também na doutrina assim se pronunciou Edgar Valles, Actos Notariais do Advogado, 5ª ed., Almedina, Coimbra, 2009, pp. 55/56. Igualmente na jurisprudência, o próprio Tribunal da Relação de Coimbra, em acórdão ulterior proferido em 3 de Junho de 2014, no âmbito do processo n.º 4790/11.7TBLRA.C1 (in apoiou essa compreensão: De acordo com o artigo 38º do Decreto-Lei nº 76-A/2006, de 29/03, a extensão do regime dos reconhecimentos de assinaturas às entidades e profissionais indicados no respectivo nº 1 aí se incluindo os advogadosestagiários da segunda fase do estágio que actuem sob orientação do patrono abrange todos os reconhecimentos de assinaturas, simples ou com menções especiais, sem qualquer exclusão ( ). Embora o n.º 1 da disposição legal transcrita [o o artigo 38º do Decreto-Lei n.º 76-A/2006] se não refira expressamente aos advogados estagiários, devem os mesmos, desde que estejam já na segunda fase do estágio e actuem sob orientação do patrono, considerar-se incluídos na previsão, pois que, nos termos do artº 189º, nº 1, al. a) do Estatuto da Ordem dos Advogados, estando na indicada fase do estágio e actuando sob a referida orientação, podem praticar todos os actos da competência dos solicitadores e a estes é ali feita explícita menção. 5/5 Este Fórum Jurídico contém informação e opiniões de carácter geral, não substituindo o recurso a aconselhamento jurídico para a resolução de casos concretos. Para mais informações, por favor contacte-nos através do apc@abreuadvogados.com ABREU ADVOGADOS JUlHO 2014 Lisboa Porto Funchal LISBOA PORTO MADEIRA Av. das Forças Armadas, º Lisboa, Portugal Tel.: (+351) Fax.: (+351) lisboa@abreuadvogados.com Rua S. João de Brito, 605 E - 4º Porto Tel.: (+351) Fax.: (+351) porto@abreuadvogados.com Rua Dr. Brito da Câmara, Funchal Tel.: (+351) Fax.: (+351) madeira@abreuadvogados.com ANGOLA (EM PARCERIA) BRASIL (EM PARCERIA) CABO VERDE (EM PARCERIA) CHINA (EM PARCERIA) MOÇAMBIQUE (EM PARCERIA) TIMOR-LESTE (JOINT OFFICE)
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