Dossiê: Paisagens sonoras. Dossier: Soundscapes
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- Afonso Vilarinho Barreto
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1 Dossiê: Paisagens sonoras Dossier: Soundscapes Tarsila Chiara A. S. Santana Mestranda em Antropologia Social -PPGAS/UFRN Pesquisadora do NAVIS - Núcleo de Antropologia Visual da UFRN tarsila.chiara@gmail.com 12
2 Dossiê: Paisagens sonoras Apresentação Os estudos sobre a música constituem um campo de conhecimento variado, mas pouco debatido nos circuitos antropológicos. Como capacidade humana e sistema cultural, a música gera outros tipos de ação social e modos de pensamento, nesse sentido a música é tanto reflexiva quanto gerativa. Nestes estudos, a música figura como um objeto de pesquisa híbrido, ou seja, pertencente à musicologia e à antropologia. Esta natureza híbrida, por sua vez, tem sido apropriada produtivamente pelo campo da etnomusicologia. Uma das finalidades dos estudos etnomusicólogos consistiria, pois, em perceber como os sentidos da música são produzidos pelas pessoas. Sentidos estes que estão marcados por uma variedade de situações sociais, os quais também são produzidos em diferentes contextos sociais. É importante destacar, nesse sentido, que as pessoas têm diferentes percepções da música, bem como da experiência musical. Estas diferentes maneiras pelas quais os símbolos musicais são significados pelas pessoas, por sua vez, assinalam que a música é um fato social. Na antropologia, em particular, entender a música como uma capacidade humana também implica experienciá-la por meio do trabalho de campo. O trabalho do antropólogo começa, pois, por problematizar uma teoria geral da música, porque tal trabalho deve levar em consideração as diferentes maneiras cognitivas e sensoriais pelas quais as pessoas experenciam a música, bem como os sentidos daquilo que elas definem como música. De tal modo, um olhar antropológico sobre a música não pode se prender a produção de análises definitivas da experiência musical. Muito embora tal olhar não desconsidere a importância de se estudar os estilos e os períodos da história da música, por exemplo, tem-se como perspectiva que a música, como sistema cultural e experiência humana, se estende para além de um período particular da história ou das próprias partituras musicais. Neste sentido, há muito tempo a música figura como objeto do pensamento antropológico. Por não se desvincular da prática antropológica, a música tem sido pensada a partir de diferentes abordagens e passado por variadas reformulações, principalmente nos campos da antropologia/etnografia da música ou sonoridade, pois enquanto recurso conceitual e analítico, a música é um dispositivo central da reflexão antropológica nestes campos de estudo. 13
3 Os artigos reunidos no presente dossiê, no entanto, não têm a pretensão de discutir os vastos debates que marcam estes campos de conhecimento antropológico. Estes artigos também não pretendem elaborar uma reconstrução conceitual do conceito de música na antropologia. Os artigos aqui reunidos procuram, mais precisamente, discutir os significados particulares que a música adquiriu em seus diferentes trabalhos de campo. As experiências etnográficas descritas não se reduzem, portanto, a um problema particular dos campos de conhecimento mencionados acima. Antes, buscam se situar em um campo mais fluído de produção do conhecimento antropológico. Os dois primeiros artigos têm como objeto de estudo o samba enquanto gênero musical. O primeiro, de Fernanda Kalianny Martins Sousa, doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Estadual de Campinas, intitulado Nesse meu Brasil todo mundo bate tambor : análise do show de 40 anos da carreira artístico-política de Leci Brandão, traz uma etnografia da celebração dos quarentas anos de carreira de Leci Bradão. Nascida em 1944, na cidade do Rio de Janeiro, Leci é uma mulher negra, compositora e de origem humilde. Como nos mostra a autora, Leci se tornou compositora por causa do amor. Sua primeira composição, em meados da década de 1960, é um samba no estilo bossa nova. Para a autora tal observação se faz necessária uma vez que a bossa nova era um dos estilos musicais que melhor sintetizava o processo de modernização pelo qual o país passava naquele período. No decorrer do artigo, a autora apresenta um pouco da trajetória pessoal, política e artística de Leci. A celebração dos quarentas anos de carreira da artista não pode, então, ser pensando fora deste contexto descrito por Fernanda Sousa. O segundo, de Sara Carla Nuño de La Rosa García, mestra em Antropologia Social pelo Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, é intitulado Ensaiei meu samba o ano inteiro : Um percurso histórico pelo universo do samba por meio de um espetáculo performático. Neste artigo, a autora apresenta uma análise etnográfica do espetáculo Ensaiei meu samba o ano inteiro, do Grupo Parafolclórico da Universidade Federal do Rio Grande do Norte [UFRN]. A partir de uma perspectiva comparativa, García discute o samba, como gênero musical e coreográfico. A comparação é estabelecida, nesse sentido, entre os elementos sociais, musicais e coreográficos. Para tanto, a autora apresenta um dos espetáculos encenados pelo Grupo Parafolclórico da UFRN: Ensaiei meu samba o ano inteiro. Em tal espetáculo, como nos mostra a autora, é possível visualizar performaticamente um percurso 14
4 Dossiê: Paisagens sonoras Apresentação histórico da evolução do samba no Brasil a partir da encenação de mais de dez coreografias. Na cena teatral apresentada, o batuque, o lundu, o samba de roda, o maxixe, o samba canção, o samba gafieira e o samba enredo são ressignificados. Os dois últimos artigos têm em comum experiências musicais do Norte e Nordeste do país, principalmente o processo de ressignificação pelos quais se dão as novas influências e invenções musicais, destacando os seus aspectos criativos e renovados de sentidos. O artigo de Andrey Faro de Lima, Doutor em Ciências Sociais e Antropologia pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia da Universidade Federal do Pará, é intitulado A Nova Música Paraense e a busca pelo sotaque perdido: diferentes performances, velhas narrativas, antigos dilemas. Neste artigo, o autor discute como produtores, músicos e gestores paraenses e de outros estados e regiões se engajam, em âmbito nacional, na articulação e divulgação da Nova Música Paraense. Segundo o autor, esta música está ancorada em três eixos estéticos, a saber: a influência da música caribenha e/ou latino-americana; a atualização do brega, com suas variantes e ramificações; e a utilização de tecnologias e recursos contemporâneos relativos aos processos de produção, reprodução, circulação e consumo musical. Trata-se de uma análise antropológica que privilegia a dimensão retórico-performática das elaborações identitárias, bem como enfatiza as narrativas que hegemonicamente tecem considerações sobre a Nova Música Paraense. Este esforço reflexivo do autor se dá a partir de entrevistas junto a personagens que estão engajados nesse processo narrativo. Por fim, o artigo de Tarsila Chiara A. S. Santana, mestranda em Antropologia Social do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, intitulado Música bagaceira e malícia: sentidos erótico-dançantes da infregatividade entre homens com práticas homoeróticas em Recife, enuncia os modos de expressão da música eletrônica dançante denominada pelos seus interlocutores de bagaceira. A partir da extensão de significados oferecidos pelos seus interlocutores, a autora coloca em relevo a noção de bagaceira como um novo referente para que se possa melhor entender a música eletrônica dançante em Recife. Muito embora a autora contraste este estilo musical com outros estilos, tal contraste não significa, contudo, uma distinção essencializada. Ao contrário, a autora procura mostrar a interdependência entre estes diferentes estilos musicais. No contexto recifense, as expressões erótico-dançantes da 15
5 infregatividade são produzidas pelos efeitos sonoros da música eletrônica dançante bagaceira. Sentidos erótico-dançantes estes que também incorporam a noção de malícia. Neste sentido, infregatividade e malícia são duas expressões erotizadas fundamentais na performatização das danças particularizadas. 16
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