C. de Carli, M.S. Pacheco, S.C. Pinho
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- Mônica de Andrade Klettenberg
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1 NANOENCAPSULAÇÃO DE QUERCETINA ATRAVÉS DO MÉTODO DO PONTO DE INVERSÃO DA EMULSÃO (EIP): CONDIÇÕES DE PROCESSO E ESTABILIDADE FÍSICO- QUÍMICA DAS NANODISPERSÕES C. de Carli, M.S. Pacheco, S.C. Pinho Departamento de Engenharia de Alimentos Universidade de São Paulo, Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos CEP: Pirassununga SP Brasil, Telefone: (19) Fax: (19) (cynthiadcarli@usp.br) RESUMO - a quercetina possui alto potencial antioxidante e por isso há grande interesse da indústria alimentícia na utilização desse bioativo como aditivo natural. Entretanto, devido à sua relativa hidrofobicidade, fato que prejudica sua aplicação e acessibilidade, ela impõe dificuldades quanto a seu emprego. Nanoemulsões encapsulando quercetina foram produzidas pelo método do ponto de inversão da emulsão. As melhores formulações apresentaram composição com 20% de óleo de girassol, 25% de Tween 80, 20% de glicerol e 0,30% de quercetina, produzidas com impelidor tipo âncora com velocidade de agitação de 500 rpm. As formulações mostraram-se estáveis com relação ao tamanho médio das gotículas e com cerca de 70% de preservação de quercetina encapsulada durante o período de 90 dias de armazenamento. Os dados também indicam que a inversão de fase catastrófica ocorreu devido à formação de emulsões múltiplas. Portanto, estas nanoemulsões podem ser uma alternativa promissora e com possível aplicação em matrizes alimentícias. ABSTRACT quercetin has a high antioxidant potential and so there is great interest in the food industry in the use of this bioactive as a natural additive. However, due to their relative hydrophobicity, a fact that undermines its implementation and accessibility, it imposes difficulties as sue employment. Nanoemulsions encapsulating quercetin were produced by the emulsion inversion point method. The best formulations had the composition of 20% sunflower oil, 25% Tween 80, 20% glycerol and 0.30% quercetin, produced with anchor type impeller with stirring speed 500 rpm. The formulations were stable with respect to the average size of the droplets and about 70% preservation of quercetin encapsulated during the period of 90 days of storage. The data also indicate that the catastrophic phase inversion occurred due to the formation of multiple emulsions. Therefore, these nanoemulsions may be a promising alternative with possible application in food matrices. PALAVRAS-CHAVE: nanoemulsões; encapsulação; quercetina; ponto de inversão da emulsão KEYWORDS: nanoemulsions; encapsulation; quercetin, emulsion inversion point 1. INTRODUÇÃO A quercetina é um flavonoide encontrado na sua forma glicosilada e em grandes concentrações em diversos vegetais, como a cebola e a couve. O grande interesse em seu estudo provém do fato de possuir alta atividade antioxidante (Piskula et al., 2012). No entanto, a quercetina
2 possui relativa hidrofobicidade, e, portanto, pode apresentar dificuldade ao ser incorporada em formulações alimentícias de base aquosa. Para contornar este problema tecnológico, diversos estudos envolvendo microencapsulação da quercetina em matrizes lipídicas vêm sendo desenvolvidos. Alguns dos sistemas lipídicos utilizados para encapsular moléculas bioativas e melhorar a sua dispersibilidade em meios aquosos, bem como sua biodisponibilidade, são os lipossomas (Alexopoulou et al., 2006), partículas lipídicas sólidas (Li et al., 2009) e as nanoemulsões (Xu, 2014; Yang et al, 2012). As nanoemulsões são emulsões com tamanho médio de gota entra nm (Mason et al. 2006) e necessitam da aplicação de energia para serem formadas. Tal energia pode ser proveniente de dispositivos mecânicos tais como homogeneizadores de alta pressão e microfluidizadores, sendo que neste caso os processos são classificados como métodos de alta energia. No entanto, se a energia for proveniente de alteração da energia química dos componentes, estes processos são denominados métodos de baixa energia (McClements e Rao, 2011). Os métodos de baixa energia estão sendo amplamente pesquisados uma vez que permitem a produção de gotas com tamanho muito reduzido, necessitam de equipamentos de menor custo e são menos destrutivos quando comparados aos métodos de alta energia (McClements, 2012, Yang et al.; 2012). O método do ponto de inversão da emulsão é um dos métodos de baixa energia e ocorre através da inversão de fase catastrófica, no qual a razão das fases oleosa e aquosa é alterada, mas as propriedades do tensoativo permanecem constantes. Inicialmente ocorre adição da fase aquosa na fase oleosa que deve conter um tensoativo hidrofílico. Em concentrações baixas da fase aquosa, gotas de água são formadas dentro da fase oleosa (emulsão A/O). No entanto, quando o teor de água crítico é excedido, a taxa de coalescência das gotículas de água excede a taxa de coalescência de gotículas de óleo, assim, o equilíbrio entre a coalescência e a quebra das gotículas não pode mais ser mantido, ocorrendo à formação de emulsões múltiplas e após, as fases se invertem passando de uma emulsão A/O para O/A (Sajjadi et al., 2004). Com o aumento do volume da fase aquosa, ocorre a migração do tensoativo da fase oleosa para a aquosa, visto que se trata de um tensoativo hidrofílico. Durante esta dispersão do tensoativo ocorre a emulsificação e modificações em sua estrutura; passando por estruturas intermediárias, como lamelar e bicontínua até o ponto de inversão (EIP), e finalmente, decompondo em gotículas de óleo menores (Jahanzad et al., 2009). Devido ao aumento do volume de água no sistema, a partir de uma emulsão de A/O forma-se uma emulsão múltipla (O/A/O), e, finalmente, uma emulsão O/A com gotículas de tamanho reduzido (Jahanzad et al., 2009). Dento do contexto exposto, o objetivo deste trabalho visa à produção de nanoemulsão encapsulando quercetina, bem como a caracterização desses sistemas em termos de diâmetro médio de partícula, estudo da vida de prateleira e determinação da capacidade antioxidante in vitro e em produto cárneo. 2. MATERIAL E MÉTODOS 2.1 Material As nanoemulsões foram produzidas com óleo de girassol (Cargill, Mairinque, SP, Brasil), Tween 80 e glicerol obtidos da Synth (Diadema, SP, Brasil). A quercetina foi obtida de Sigma-Aldrich (St. Louis, MO, EUA). Água deionizada foi obtida de sistema de ultrapurificação (Direct Q3, Millipore, Billerica, MA, EUA). Para a determinação da quercetina encapsulada foi utilizado o solvente dimetilsulfóxido (Synth, Diadema, SP, Brasil) e membranas de 0,45 μm (Millex LCR, Millipore, Billerica, MA, EUA). Todos os reagentes usados foram de grau analítico.
3 2.2 Produção Das Nanoemulsões Encapsulando Quercetina Pelo Método Do Ponto De Inversão Da Emulsão (EIP) As nanoemulsões foram produzidas pelo método EIP conforme adaptações da metodologia (Borrin, 2016). Inicialmente, a fase oleosa foi preparada por mistura do óleo de girassol com o tensoativo (Tween 80) e a quercetina nas concentrações de 0,15 e 0,30 % (m/m), utilizando-se agitação magnética durante 15 min. A fase aquosa composta por água e glicerol na concentração de 20%, foi adicionada à fase oleosa utilizando-se uma bomba peristáltica (Masterflex Easy-Load II, Cole-Parmer, Vernon Hills, IL, EUA) com vazão de 12 ml/min, enquanto o sistema era mecanicamente agitado (impelidor tipo Cowles, a 500 rpm). Depois de se completar a adição da fase aquosa à fase oleosa, a dispersão resultante continuou a ser agitada mecanicamente durante 30 min. A fase oleosa foi fixada em 20% (m/m) e o valor de SOR (surfactant/oil ratio) em 1,25. Os ensaios foram realizados a 25º C. 2.3 Determinação De Diâmetro Médio E Distribuição De Tamanho De Gota As medidas de tamanho de partícula, de distribuição de tamanho de partícula e da polidispersidade das nanoemulsões foram realizadas por espalhamento de luz quasi-elástico em equipamento Zeta Plus (Brookhaven Instruments Company, EUA) operado a 25 ºC e equipado com um laser He-Ne (627 nm) posicionada para um ângulo de incidência de 90 º. Antes da análise as amostras foram diluídas com água deionizada (Millipore) para evitar o espalhamento múltiplo de luz. As análises de dados foram realizadas pelo software incluso no sistema (90Plus). 2.4 Quantificação De Quercetina Encapsulada A quercetina encapsulada nas nanoemulsões foi determinada através da extração do bioativo com (DMSO), usando uma diluição de 40x no solvente orgânico. A concentração de quercetina foi determinada medindo-se a absorbância das amostras a 373 nm, a qual foi, em seguida, convertido em concentração e quercetina utilizando uma curva padrão com R = 0, Determinação Do Ponto De Inversão Da Emulsão As medidas de condutividade elétrica durante a inversão de fases, ou seja, enquanto ocorre à adição da fase aquosa na fase oleosa, foi feita utilizando-se um condutivímetro (DM-32, Digimed, São Paulo, SP, Brasil) na temperatura de 25 C. 2.6 Determinação Da Tensão Interfacial As medidas de tensão superficial foram realizadas em tensiômetro automático, modelo OCA-20 (Dataphysics Germany, Filderstadt, Alemanha), no qual a tensão das dispersões (tensoativo em água e tensoativo com quercetina em água) foi determinada pelo método da gota pendente. A imagem da gota foi capturada usando uma câmera CCD, que através da captura da imagem analisa o formato da gota por assimetria de eixos (ADSA - axisymmetric drop shape analysis). Todos os ensaios foram conduzidos a 25 C.
4 2.7 Análises Estatísticas Para obtenção das análises estatísticas dos resultados, foi utilizado o software estatístico Assistat 7.7 beta, o qual foi utilizado para aplicação do teste de médias (Tukey), ao nível de 5% de significância, aos dados obtidos. 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO 3.1 Condições De Produção Das Nanoemulsões Pelo Método Do Ponto De Inversão Da Emulsão (EIP) E Estabilidade As condições de produção das nanoemulsão foram determinadas a partir de trabalho anterior do grupo de pesquisa com algumas alterações. A inversão de fases ocorrida durante a adição de fase aquosa sobre a fase oleosa contendo tween 80 pode ser comprovada através de ensaios de condutividade elétrica. Conforme mostrado na Figura 1, a condutividade elétrica permaneceu baixa quando na fase do processo em que a água não havia sido adicionada em grande quantidade, indicando que o óleo de girassol ainda era a fase contínua. De acordo com a curva de condutividade, a concentração crítica de água para a inversão de fase catastrófica ocorreu quando cerca de 30% da fase aquosa foi adicionado no sistema, caracterizado por um aumento brusco na condutividade, e neste ponto pode-se considerar que ocorreu a inversão da emulsão A/O para O/A. Este comportamento foi observado também, para sistema semelhante, por Borrin et al. (2016). Figura 1: Curva de condutividade vs. quantidade adicionada de fase aquosa, durante o processo de nanoemulsificação pelo método EIP. Fonte: própria
5 Em relação à estabilidade durante a armazenagem (nanoemulsões sem quercetina), os dados são mostrados na Tabela 1, e pode-se avaliar que as nanoemulsões se mantiveram extremamente estáveis em relação ao diâmetro médio de gota durante todo o período avaliado. Tabela 1: Valores de diâmetros médios hidrodinâmicos das gotas de nanoemulsões. Diâmetro Médio (nm) Dia 0 Dia 15 Dia 30 Dia 60 Dia A ± 2,8 160 A ± 2,0 163 A ± 3,2 164 A ± 2,2 164 A ± 2,2 Fonte: própria *A média das amostras seguida pelas mesmas letras na mesma linha, para cada formulação, não diferem a 5% de significância pelo teste de Tukey. A partir dos resultados obtidos com as nanoemulsões vazias, as nanoemulsões foram produzidas encapsulando-se quercetina. A estabilidade físico-química das nanoemulsões encapsulando quercetina foi avaliada por 90 dias conforme mostrado na Tabela 2. Tabela 2: Avaliação da estabilidade das nanoemulsões contendo quercetina encapsulada pelo período de estocagem de 90 dias. Formulação/ Tempo Parâmetro 0,15% quercetina 0,30% quercetina Dia 0 Dia 30 Dia 60 Dia 90 Dia 0 Dia 30 Dia 60 Dia 90 Diâmetro 167 A ±2,7 174 A ±3,6 177 A ±4,3 179 A ±2,3 169 A ±2,3 168 A ±3,7 170 A ±1,2 169 A ±3,3 Médio (nm) Quercetina 202 A ±1,7 139 B ±1,1 108 C ±2,4 107 C ±2,9 300 A ±6,9 225 B ±1,7 218 B ±2,6 216 B ±1,7 (µg/ml) Fonte: própria *A média das amostras seguida pelas mesmas letras na mesma linha, para cada formulação, não diferem a 5% de significância pelo teste de Tukey. Ambas as formulações produzidas foram bastante estáveis em termos de distribuição de tamanho e os diâmetros médios durante o período de armazenagem A preservação da quercetina encapsulada na formulação com 0,30% inicial foi maior comparada à formulação com 0,15%. Na primeira a preservação atingiu cerca de 70% após o período avaliado enquanto que na segunda formulação a preservação diminuiu muito atingindo 50% do valor inicial. Foram feitas análises de tensão interfacial com o objetivo de avaliar a interação da quercetina e do tensoativo utilizado. Através dos resultados obtidos foi possível observar que o bioativo encontra-se localizado junto à interface do núcleo oleoso da nanoemulsão e não dissolvido completamente no interior das gotas de óleo, este resultado está de acordo com outro trabalho segundo Sardone et al (2004). É interessante ressaltar que a localização do bioativo influência positivamente em aplicações tecnológicas uma vez que este pode estar facilmente disponível. 4. CONCLUSÕES A partir dos dados podemos concluir que foi possível produzir nanoemulsões estáveis pelo método do ponto de inversão da emulsão. As formulações produzidas com Tween 80 se mostraram extremamente estáveis. A formulação escolhida como viável para a encapsulação de quercetina
6 possui relação tensoativo/óleo (SOR = 1,25), 20% de glicerol e 20% de óleo de girassol (% mássicas). Essas formulações apresentaram diâmetros médios e distribuição de tamanho de gotículas estáveis e adequados durante os 90 dias de monitoramento. Portanto, considera-se que esta formulação específica se mostrou viável como matriz lipídica para encapsulação de quercetina. 5. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem à CAPES pela concessão da bolsa de Mestrado da autora C. de Carli e à Pró-Reitoria de Graduação/USP pela bolsa de Iniciação Científica da aluna M.S. Pacheco. 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Alexopoulou, E.; Georgopoulos, A.; Kagkadis, A. K.; Demetzos, C. (2006). Preparation and characterization of lyophilized liposomes with incorporated quercetin. Journal of Liposome Research, 16, Borrin, T, R.; Georges, E. L.; Moraes, I. C.F.; Pinho, S.C. Curcumin-loaded nanoemulsions produced by the emulsion inversion point (EIP) method: An evaluation of process parameters and physicochemical stability. Journal of Food Engineering, v. 169, p. 1-9, Jahanzad, F.; Crombie, G.; Innes, R.; Sajjadi, S. (2009). Catastrophic phase inversion via formation of multiple emulsions: a prerequisite for formation of fine emulsions. Chemical Engineering Research and Design,87(1), Li, H.; Zhao, X.; Ma, Y.; Zhai, G.; Li, L.; Lou, H. (2009). Enhancement of gastrointestinal absorption of quercetin by solid lipid nanoparticles. Journal of Controlled Release, 133, Mason, T., G.; Wilking, J., N.; Meleson, K.; Chang, C., B.; Graves, S., M.(2006). Nanoemulsions: formation, structure, and physical properties. Journal of Physics,18. McClements, D., J.; Rao, J. (2011). Food Grade Nanoemulsions: formulation, fabrication, properties, performance, biological fate and potential toxicity. Food Science and Nutrition, 51(4), McClements, D., J. (2012). Nanoemulsions versus microemulsions: terminology, differences and similarities. Soft Matter, Cambridge, v. 8, Sardone, L.; Pignataro, B.; Castelli, F.; Sarpietro, M., G.; Nicolosi, G.; Marletta, G. (2004). Temperature and pressure dependence of quercetin-3-o-palmitate interaction with a model phospholipid membrane: film balance and scanning probe microscopy study. Journal of Colloid and Interface Science, 271, Sajjadi, S.; Jahanzad, F.; Yianneskis, M. (2004). Catastrophic phase inversion of abnormal emulsions in the vicinity of the locus of transitional enversion. Colloids and Surfaces: Physicochemical and Engineering Aspects, 240, Xu, X. (2014). Improve bioaccessibility of quercetin using pseudo-organogel based nanoemulsions f. Thesis (Master s) New Brunswick Rutgers, The State University of New Jersey, New Brunswick, New Jersey, Yang, Y.; Marshall-Breton, C.; Leser, M., E.; Sher, A., A.; McClements, D., J. (2012). Fabrication of ultrafine edible emulsions: comparison of high-energy and low-energy homogenization methods. Food Hydrocolloids, Amsterdam, v. 29, Piskula, M., K.; Murota, K.; Terao, J.(2012). Bioavailability of flavonols and flavones. Flavonoids and related compounds: bioavailability and function
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