AGRAVO DE INSTRUMENTO N.º , DE CURITIBA 22.ª VARA CÍVEL

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1 AGRAVO DE INSTRUMENTO N.º , DE CURITIBA 22.ª VARA CÍVEL AGRAVANTE : MARCOS ALBERTO BULIK E OUTROS RELATOR : JUIZ Francisco Pinto RABELLO FILHO Justiça gratuita Assistência judiciária Presunção do órgão jurisdicional, desde logo, de que como os requerentes têm dinheiro a levantar, por força do inventário (arrolamento), têm eles condições de arcar com o valor das custas e despesas processuais Inviabilidade do veto jurisdicional Suficiência, num primeiro momento, da afirmação de inexistência de condições de suportabilidade das despesas processuais sem prejuízo próprio ou da família, para obtenção integral do benefício, que antes de tudo é direito fundamental do cidadão, assegurado pela Constituição da República Inexistência de incompatibilidade entre o art. 5., inc. LXXIV, da Constituição Federal (CF) e o art. 4. da Lei n /50 Princípio do acesso à Justiça Inafastabilidade do controle jurisdicional CF, art. 5., incs. XXXV e LXXIV. Para ter acesso gratuito à Justiça o cidadão não precisa comprovar, desde logo, que necessita dos benefícios da assistência judiciária, bastando assim afirmar na petição inicial, não havendo que se falar, nessa trilha procedimental inaugural, em incompatibilidade entre o artigo 5., inciso LXXIV, da Constituição da República e o artigo 4. da Lei n , de Vistos, relatados e discutidos estes autos de agravo de instrumento n.º , de Curitiba, 22.ª Vara Cível, em que são agravantes Marcos Alberto Bulik e outros.

2 Agravo de instrumento n.º (8.ª Câmara Cível) Página 2 de 7 Exposição 1. Marcos Alberto Bulik, Silvino Souza Ribeiro e Regina dos Santos interpõem o presente agravo de instrumento contra respeitável decisão interlocutória (fs. 34-6) proferida pelo digno juiz de direito da 22.ª Vara Cível da capital no pedido de arrolamento que formularam, em virtude da morte de Silvandira Ribeiro Bulik, esposa do primeiro e filha dos dois outros peticionários, deixando R$ ,68 em conta corrente bancária Dita decisão, em apertada síntese, indeferiu em favor dos requerentes os benefícios da assistência judiciária, porque apenas a União e os Estados-Membros é que prestam assistência judiciária, devendo a parte comprovar o estado de necessidade, as custas processuais têm caráter alimentar para os escrivães e seus funcionários e o valor que os requerentes pretendem levantar por si só comprova terem condições de arcar com as despesas processuais e honorários advocatícios O ilustre desembargador Ivan Bortoleto desde logo concedeu aos agravantes, neste recurso, os benefícios da gratuidade processual (f. 43). Informações foram prestadas (fs ), colhendo-se em seguida a opinião do Ministério Público, emitida pelo digno procurador de justiça Paulo Roberto Lima dos Santos, que veio no sentido de ser provido o agravo (fs. 60-5). Voto 2. O recurso merece conhecimento, na medida em que estão presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, assim os intrínsecos (cabimento,

3 Agravo de instrumento n.º (8.ª Câmara Cível) Página 3 de 7 legitimação e interesse em recorrer), como os extrínsecos (tempestividade, regularidade formal, inexistência de fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer e preparo dispensado). 3. O direito à obtenção de assistência judiciária integral advém, antes e desde logo, da Constituição Federal, com superior dignidade de direito fundamental do cidadão, como está no inciso LXXIV do artigo 5., no sentido de que o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos Não se pode deixar de notar que Marcos Alberto, o viúvo, está desempregado, sobrevivendo de bicos e metade de pensão deixada pela de cujus. Silvino, com 75 anos de idade, e Regina, com 66, os pais da falecida, moram no interior da Bahia; ele, antigo empregado de uma chácara, vive hoje da aposentadoria que recebe; ela, que também mal assina o nome, é dona de casa sem nenhuma renda. O dinheiro que a falecida deixou em conta corrente, não autoriza, por isso só, dizer-se, objetivamente, que com isso eles tiraram a sorte grande e agora têm plenas condições de pagar as despesas do arrolamento, a menos que se queira dizer que eles poderiam privar-se desse bem, que precisam inventariar, justamente para que possam pagar as custas do inventário, que seria despautério e angústia kafkiana a mais não poder Não há como se possa presumir que essa gente reúne condições de pagar as custas e as despesas processuais. É exatamente o contrário que se passa, a partir do exame da mencionada prescrição, da Constituição da República, descendo-se até aquela do artigo 4. da Lei n , de 1950, com exigir somente que o jurisdicionado afirme não reunir condições de arcar com as despesas processuais sem prejuízo seu ou de sua família, para já aí ter direito ao

4 Agravo de instrumento n.º (8.ª Câmara Cível) Página 4 de 7 benefício, sem mais, à face da presunção iuris tantum de veracidade da afirmação, cabendo à parte contrária, querendo, opor impugnação, sendo do impugnante o ônus da prova destruidora do direito à gratuidade processual (Lei cit., art. 5. ). 4. Aliás, abro aqui um parêntese por não resistir aos gritos de minha consciência, principaliter a propósito de meu papel social de magistrado, e aí dentro, claro, meu dever de atuar também visando a larguear, ao invés de estreitar, cada vez mais, o pórtico que vai dar na Justiça, cidadela última e supina do cidadão; é, a olhos vistos, o prazeroso cumprimento do dever que tem o Estado-juiz de sempre fazer brilhar o excelso princípio constitucional do acesso à justiça (CF, art. 5., inc. XXXV), de longe valor muito e muito superior num Estado Social e Democrático de Direito. Mal-arranjada tapeação seria, ao cidadão, verdadeiro dono do Poder (CF, art. 1. e único), em que se insere o Judiciário (CF, art. 2. ), se lhe fosse dada apenas a mera possibilidade de ir ao Judiciário, mas do mesmo passo lhe fosse exigido pagamento de valor que lhe é insuportável; de tola construção retórica não passaria o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, na medida em que ao jurisdicionado estaria sendo concedida nada mais do que meia-justiça, se tanto. 5. A Suprema Corte tem, mesmo, do exame dos dois dispositivos constitucionais mencionados, ressaltado que (...) num primeiro momento a forma adequada para se requerer o benefício da justiça gratuita e assistência judiciária é por simples declaração na petição inicial, sendo presumidas verdadeiras as questões apontadas. Num segundo instante, e Caso seja necessário, a forma adequada para se contestar o benefício será através da impugnação ao mesmo, quando ambas as partes terão oportunidade para provar o alegado. Desta forma, verifica-se que não há contrariedade entre a norma legal e

5 Agravo de instrumento n.º (8.ª Câmara Cível) Página 5 de 7 o dispositivo constitucional inserto no art. 5, inciso LXXIV Na esteira desse raciocínio, tem sido decidido: Agravo regimental em agravo de instrumento. Assistência judiciária gratuita. Incompatibilidade entre o texto legal e o preceito constitucional. Simples declaração na petição inicial. A declaração de insuficiência de recursos é documento hábil para o deferimento do benefício da assistência judiciária gratuita, mormente quando não impugnada pela parte contrária, a quem cumpre o ônus da prova capaz de desconstituir o direito postulado. Incompatibilidade entre o texto legal e o preceito constitucional. Inexistência. Agravo regimental improvido. 2 AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONCESSÃO DE JUSTIÇA GRATUITA. PRESCINDE DE COMPROVAÇÃO. REEXAME DE FATOS E PROVAS. INVIABILIDADE DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. 1. Prescinde de comprovação para obtenção da assistência judiciária gratuita. (...) Agravo regimental a que se nega provimento. 3 CONSTITUCIONAL. ACESSO À JUSTIÇA. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA. Lei 1.060, de C.F., art. 5, LXXIV. I. A garantia do art. 5, LXXIV assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos não revogou a de assistência judiciária gratuita da Lei 1.060, de 1950, aos necessitados, certo que, para obtenção desta, basta a declaração, feita pelo próprio interessado, de que sua situação econômica não permite vir a Juízo sem prejuízo da sua manutenção ou de sua família. Essa norma infraconstitucional põe-se, ademais, dentro do espírito da Constituição, que deseja que seja facilitado o acesso de 1 STF, 2.ª Turma, AI (AgRg) RS, unânime, rel. min. Maurício Corrêa, j. 26/6/1995, in RTJ 158/963 (965). 2 STF, 2.ª Turma, AI (AgRg) RS, unânime, rel. min. Maurício Corrêa, j. 26/6/1995, in RTJ 158/ são do original os destaques em itálico. 3 STF, 2.ª Turma, AgRg no AI RS, unânime, rel. min. Maurício Corrêa, j. 04/02/2003, in DJU 28/02/2003.

6 Agravo de instrumento n.º (8.ª Câmara Cível) Página 6 de 7 todos à Justiça (C.F., art. 5, XXXV). II. R.E. não conhecido RS etc No mesmo sentido: RE RS, RE PR, RE 5.2. Também assim tem decidido invariavelmente este Tribunal de Justiça, v.g.: acórdão (8.ª Câmara Cível, Bortoleto), acórdão (8.ª Câmara Cível, Karam), acórdão (ex-tapr, 9.ª Câmara Cível, Aniceto), acórdão (ex-tapr, 9.ª Câmara Cível, Wilde), acórdão (ex-tapr, 9.ª Câmara Cível, Wilde), acórdão (ex-tapr, 9.ª Câmara Cível, Lélia), acórdão (ex-tapr, 9.ª Câmara Cível, Barry), acórdão (ex-tapr, 9.ª Câmara Cível, Neiva), acórdão (ex-tapr, 9.ª Câmara Cível, Luiz Lopes), acórdão (ex-tapr, 6.ª Câmara Cível, Rabello), acórdão (ex- TAPR, 6.ª Câmara Cível, Rabello), acórdão (ex-tapr, 7.ª Câmara Cível, Martelozzo), acórdão (ex-tapr, 1.ª Câmara Cível, Marcus Vinicius), acórdão (ex-tapr, 10.ª Câmara Cível, Arida), acórdão (ex-tapr, 8.ª Câmara Cível, Dimas), acórdão (ex-tapr, 10.ª Câmara Cível, Macedo), acórdão (ex-tapr, 7.ª Câmara Cível, Mattar), acórdão (ex-tapr, 6.ª Câmara Cível, Maria José), acórdão (ex-tapr, 8.ª Câmara Cível, Dimas), acórdão (ex-tapr, 1.ª Câmara Cível, Arquelau), acórdão (ex-tapr, 7.ª Câmara Cível, Martelozzo). 6. Passando-se as coisas desta maneira, meu voto é no sentido de que se dê provimento ao recurso, para que os agravantes tenham os benefícios da assistência judiciária, na forma da Lei n /50. 4 STF, 2.ª Turma, RE RS, unânime, rel. min. Carlos Velloso, j. 26/11/1996, in DJU 28/02/1997, p

7 Agravo de instrumento n.º (8.ª Câmara Cível) Página 7 de 7 Decisão 7. À face do exposto, ACORDAM os integrantes da Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em dar provimento ao recurso, nos termos do voto do relator Participaram do julgamento, além do signatário (relator), os Senhores Desembargadores Carvílio da Silveira Filho (Presidente com voto) e Arno Gustavo Knoerr. Curitiba, 13 de outubro de 2005 (data do julgamento). Juiz Francisco Pinto Rabello Filho RELATOR