A NATUREZA JURÍDICA DO ARTIGO 28, DA LEI /2006
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1 A NATUREZA JURÍDICA DO ARTIGO 28, DA LEI /2006 Emilly Caroline Costa da Silva Tedesco¹ Luana Carolina Rohde² Milena Thaís Kerkhoff Utzig³ Pâmela Muriel Bolfe 4 RESUMO: A lei /2006, conhecida como nova lei de drogas em detrimento da lei 6.368/1976, trouxe nova roupagem à política criminal brasileira. Ao trazer algumas peculiaridades, tem-se como um dos pontos mais controvertidos o disposto no artigo 28, quanto à singularidade da sua natureza jurídica. Esse estudo, portanto, tem por objetivo analisar a natureza jurídica do art. 28, da lei /2006, haja vista as divergências doutrinárias existentes, as quais levaram as discussões à Suprema Corte por meio do Recurso Extraordinário /SP. O tema foi abordado de forma dialética, cujo objetivo foi a contraposição das visões doutrinárias a fim de se obter uma conclusão a respeito do assunto haja vista a realidade observada na sociedade brasileira. Como resultado dessa verificação, tem-se o posicionamento majoritário que preconiza o art. 28, da lei /06, como crime que foi despenalizado. Entretanto, a análise do tema não se faz simples. Palavras-chave: Despenalização do art. 28, Lei /06; Descriminalização; Recurso Extraordinário /SP. 1. INTRODUÇÃO O panorama legislativo brasileiro modifica-se de forma gradual de acordo com as demandas sociais imbricadas, as quais impulsionam o legislador a fazer as reformas e substituições necessárias na legislação já existente. Entretanto, não é sempre que a técnica legislativa se mostra clara ou tem seus objetivos explícitos, ocasionando amplos debates entre os aplicadores do direito a esse respeito. Não obstante, a lei nº /2006 é palco de debates por parte da doutrina, principalmente quanto ao disposto no art. 28, não se tendo um posicionamento firmado quanto a natureza desse ilícito penal. Nesse espeque, não se compreende de forma plena se o objetivo do legislador foi descriminalizar a conduta em questão, despenalizá-la, ou até mesmo se o que foi previsto nesse dispositivo seria inconstitucional. Diante do exposto, este estudo encontra-se dividido da seguinte forma: na segunda seção vislumbra-se breves considerações sobre a lei /2006; na terceira, há a abordagem do artigo 28 sob o ponto de vista da despenalização; na quarta seção, a abordagem remete-se à possível descriminalização da conduta do art. 28, da referida lei; e, por último, na quinta seção, tem-se o julgamento do Recurso Extraordinário nº /SP, pelo STJ, cuja argumentação central corrobora pela inconstitucionalidade do art. 28, da lei / FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 2.1 BREVES CONSIDERAÇÕES ACERCA DA LEI Nº , DE 23 DE AGOSTO DE 2006 A lei , de 23 de agosto de 2006, surge em um contexto ambíguo ao que diz respeito a política criminal de drogas em nosso país. Tendo de um lado, uma tendência ¹ Aluna do 4º ano do Curso de Direito, Universidade Estadual do Oeste do Paraná, emillytedesco@outlook.com. ² Aluna do 4º ano do Curso de Direito, Universidade Estadual do Oeste do Paraná, luanacarolina_rohde@hotmail.com. ³ Aluna do 4º ano do Curso de Direito, Universidade Estadual do Oeste do Paraná, milena.utzig@yahoo.com.br. 4 Aluna do 4º ano do Curso de Direito, Universidade Estadual do Oeste do Paraná, pamelamurielbolfe@gmail.com.
2 fortemente criminalizante, e, de outro, aponta para a presença de discursos contrahegemônicos que buscam discutir políticas sociais sobre o uso de drogas. É em face do expressivo aumento do consumo de drogas no país que ocorreram profundas discussões em torno do assunto, o que levou a reformulação na política de combate e prevenção das drogas com o surgimento da Lei nº de A nova Lei de Drogas trata como objeto da conduta criminosa apenas a droga em si, nas leis anteriores eram tratadas por substâncias entorpecentes ou capazes de determinar dependência física ou psíquica, e deveria especificar em lei quais eram essas drogas, atualmente, trata-se de lei penal em branco, onde complementa o seu texto com outras leis previstas no ordenamento. Um dos dispositivos de maior impacto modificativo se refere ao novo tratamento penal dado ao usuário de drogas, que atualmente encontra-se tipificado no art. 28 da nova Lei. A grande discussão do artigo 28 da Lei de Drogas se deu com a forma mais branda de punir usuários de drogas. Os crimes são caracterizados por utilizar como punição a pena de detenção ou reclusão, de acordo com o artigo primeiro da Lei de introdução do Código Penal, diferentemente do artigo 28 da Lei de Drogas que não utiliza nenhuma dessas formas para punir o usuário de drogas, abancando então uma discussão acerca da sua natureza jurídica. Nasce, com isso, uma grande celeuma: tendo em vista que o art. 28 não mais continha pena privativa de liberdade, é possível afirmar que houve a descriminalização da conduta de portar drogas para consumo pessoal? Qual a natureza jurídica do art. 28? Para Cleber Masson (apud, Mello, 2017) o debate ultrapassa conjecturas meramente doutrinárias, uma vez que veicula implicações práticas. Visto que, aferindo os arts. 2º e 107 do Código Penal, sabe-se que uma abolitio criminis configura causa de extinção de punibilidade, operando a cessação da execução e dos efeitos penais da sentença condenatória, inclusive os secundários, como a reincidência e maus antecedentes. Em suma, três correntes surgiram a partir dessa discussão. A primeira delas, cujo maior expoente é o professor Luís Flávio Gomes, afirma que houve uma descriminalização formal da conduta de portar drogas para consumo pessoal, de modo que o art. 28 representaria uma infração penal sui generis, já que não se encaixaria no conceito de crime nem na definição de contravenção penal. Em outras palavras, a inovação trazida pela Lei de Drogas de 2006 retira o caráter criminoso do fato mas não retira do campo do direito penal (apud Mello, 2014). A segunda corrente, minoritária em comparação às demais, aproveita muito da tese anterior, mas vai além: defende ter havido uma descriminalização substancial, ou seja, houve um verdadeiro abolitio criminis, de modo que o art. 28 sequer faria parte do Direito Penal, da mesma forma que não integraria o Direito Administrativo, passando a pertencer ao Direito judicial sancionador, seja quando a sanção alternativa é fixada em transação penal, seja quando imposta em sentença final, no procedimento sumaríssimo da lei dos juizados (apud Mello, 2014). Por fim, a terceira posição, que é majoritária, assevera que o art. 28 ostenta status de crime, tendo ocorrido apenas uma despenalização, a qual pode ser caracterizada da seguinte forma: significa adotar processos ou medidas substitutivas ou alternativas, de natureza penal ou processual, que visam, sem rejeitar o caráter criminoso da conduta, dificultar, evitar ou restringir a aplicação da pena de prisão ou sua execução ou, pelo menos, sua redução. 2.2 DESPENALIZAÇÃO DO ART. 28, DA LEI /2006 O art. 28 da Lei nº /06 pune quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em
3 desacordo com determinação legal ou regulamentar. As penas consistem em advertência sobre os efeitos das drogas, prestação de serviços à comunidade e medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo. Nota-se, portanto, que a posse de drogas para uso pessoal não resulta em nenhuma espécie de privação de liberdade, o que, desde a entrada em vigor da Lei nº /06, motiva discussões acerca da natureza jurídica da infração, isto é, se ainda permanece a natureza de infração penal ou se houve a descriminalização. No julgamento do RE /RJ, o STF reputou que a posse de drogas para consumo próprio mantém a natureza criminosa, diferindo das demais figuras delituosas apenas quanto às consequências, já que não se aplica pena privativa de liberdade. Ocorrência, pois, de despenalização, entendida como exclusão, para o tipo, das penas privativas de liberdade: POSSE DE DROGA PARA CONSUMO PESSOAL: (ART. 28 DA L /06 NOVA LEI DE DROGAS): NATUREZA JURÍDICA DE CRIME 1. O art. 1º da LICP que se limita a estabelecer um critério que permite distinguir quando se está diante de um crime ou de uma contravenção não obsta a que Lei ordinária superveniente adote outros critérios gerais de distinção, ou estabeleça para determinado crime como o fez o art. 28 da L /06 pena diversa da privação ou restrição da liberdade, a qual constitui somente uma das opções constitucionais passíveis de adoção pela Lei incriminadora (CF/88, art. 5º, XLVI e XLVII). 2. Não se pode, na interpretação da L /06, partir de um pressuposto desapreço do legislador pelo rigor técnico, que o teria levado inadvertidamente a incluir as infrações relativas ao usuário de drogas em um capítulo denominado Dos Crimes e das Penas, só a ele referentes. (L /06, Título III, Capítulo III, arts. 27/30). 3. Ao uso da expressão reincidência, também não se pode emprestar um sentido popular, especialmente porque, em linha de princípio, somente disposição expressa em contrário na L /06 afastaria a regra geral do C. Penal (C. Penal, art. 12). 4. Soma-se a tudo a previsão, como regra geral, ao processo de infrações atribuídas ao usuário de drogas, do rito estabelecido para os crimes de menor potencial ofensivo, possibilitando até mesmo a proposta de aplicação imediata da pena de que trata o art. 76 da L /95 (art. 48, 1º e 5º), bem como a disciplina da prescrição segundo as regras do art. 107 e seguintes do C. Penal (L , art. 30). 6. Ocorrência, pois, de despenalização, entendida como exclusão, para o tipo, das penas privativas de liberdade. 7. Questão de ordem resolvida no sentido de que a L /06 não implicou abolitio criminis (C. Penal, art. 107). II. Prescrição: Consumação, à vista do art. 30 da L /06, pelo decurso de mais de 2 anos dos fatos, sem qualquer causa interruptiva. III. Recurso extraordinário julgado prejudicado. O tribunal, contudo, julga atualmente o recurso extraordinário nº , no qual se discute a constitucionalidade do art. 28. Para Gilmar Mendes, as sanções descritas no dispositivo passam a ter caráter exclusivamente administrativo, pois a punição criminal estigmatiza o usuário e compromete medidas de prevenção e redução de danos, bem como gera uma punição desproporcional ao usuário, violando o direito à personalidade. Os ministros Roberto Barroso e Edson Fachin também consideraram inconstitucional a criminalização, mas limitaram seus votos à maconha, a que se referem os fatos tratados no recurso. O STJ tem seguido o mesmo entendimento firmado pelo STF no RE , isto é, considera que a conduta de posse de droga para uso pessoal mantém a natureza criminosa, apesar da despenalização promovida pela Lei nº /06. Reinaldo Daniel Moreira (apud Maluly, 2014) lembra que o Deputado Paulo Pimenta, relator do Projeto de Lei que deu origem ao diploma em apreço, claramente não deu a entender que o intuito da lei era a descriminalização do uso. Conclui o doutrinador:
4 Trata-se, de fato, o artigo 28 da Lei nº , de previsão singular no ordenamento secundário da descrição típica de penas distintas das privativas de liberdade e, de multa, medida de caráter nitidamente despenalizador. Contudo, ao que parece, este fator, por si só, não pode conduzir ao entendimento de que a conduta ali prevista fora descriminalizada (cf. Algumas considerações acerca da pretensa descriminalização do uso de entorpecentes pela Lei nº /2006, Boletim do IBCCrim nº 169, dezembro de 2006, apud Maluly, 2014). Dessa forma, não importando o argumento que se adote, a manutenção da classificação de crime ou adoção de uma terceira classificação pelo denominado sistema tripartido, a punição da conduta prevista no artigo 28 da Lei nº /06 somente com penas alternativas não retira o seu caráter criminoso, devendo-se falar, em verdade, na ocorrência de uma despenalização, em virtude do abrandamento das penas. 2.3 DESCRIMINALIZAÇÃO DO ART. 28, DA LEI /2006 Em contrapartida ao entendimento daqueles que defendem a despenalização do art. 28 da Lei /06, encontra-se parcela da doutrina que afirma que, na verdade, houve a descriminalização do art. 28 da Lei nº /06, posto que sua nova redação, não mais prevê pena restritiva de liberdade e multa, o que ocorria com sua versão anterior, dada pela revogada Lei nº 6.368/76. Assim, observa-se a relevante diferença entre os dois artigos, sendo o primeiro pertencente à revogada lei de drogas (Lei nº 6.368/76) e o segundo, atual redação dada pela Lei nº /06: Art. 16. Adquirir, guardar ou trazer consigo, para o uso próprio, substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena - Detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e pagamento de (vinte) a 50 (cinquenta) dias-multa. (BRASIL, 1976) Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas: I - advertência sobre os efeitos das drogas; II - prestação de serviços à comunidade; III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo. 1º Às mesmas medidas submete-se quem, para seu consumo pessoal, semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de pequena quantidade de substância ou produto capaz de causar dependência física ou psíquica. (...) (BRASIL, 2006) Como se percebe, a nova redação da tipificação penal somente pune o infrator por meio de penas alternativas, aplicando-se assim, advertência sobre os efeitos das drogas, prestação de serviços à comunidade, ou ainda, medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo. Desta forma, em consequência à redação mais branda dada pela Lei /06 ao antigo tipo penal, parte da doutrina passou a sustentar o entendimento de que houve uma descriminalização formal da conduta, mesmo que a posse de droga para consumo pessoal não tenha sido legalizada. Tal posicionamento é liderado pelo jurista Luiz Flávio Gomes e fundamentado pelo disposto no art.1º da Lei de Introdução ao Código Penal, o qual define crime utilizando como critério o tipo de pena atribuída ao fato. Art 1º Considera-se crime a infração penal que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente
5 com a pena de multa; contravenção, a infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente. (BRASIL, 1941) Quanto ao conceito do que seria descriminalização, Gomes (2016), afirma que descriminalizar é retirar de algumas condutas o seu caráter de criminosas, e em consequência, o fato descrito na lei penal deixa de ser crime (deixa de ser infração penal). Acrescenta ainda, que a descriminalização pode ser dividida em duas espécies, sendo classificada como: a) "Descriminalização Penal", que "retira o caráter de ilícito penal da conduta, mas não a legaliza", e b) "Descriminalização Plena ou Total", a qual "afasta o caráter criminoso do fato e lhe legaliza totalmente". (GOMES, 2006, p.108). Do conceito apresentado pelo jurista, conclui-se que o mesmo entende haver uma descriminalização penal sobre o tipo descrito no art.28 da Lei de Drogas, vez que apesar de retirar o caráter de ilicitude da pena da conduta, não a legaliza. Concluindo, tem-se que o jurista entende: Ora, se legalmente (no Brasil) crime é a infração penal punida com reclusão ou detenção (quer isolada ou cumulativa ou alternativamente com multa), não há dúvida que a posse de droga para consumo pessoal (com a nova Lei) deixou de ser crime porque as sanções impostas para essa conduta (advertência, prestação de serviços a comunidade e comparecimento a programas educativos art. 28) não conduzem a nenhum tipo de prisão. Aliás justamente por isso, tampouco esta conduta passou a ser contravenção penal (que se caracteriza pela imposição de prisão simples ou multa). Em outras palavras: na nova Lei de drogas, no art.28, descriminalizou a conduta da posse de droga para consumo pessoal. Retirou-lhe a etiqueta de infração penal porque de modo algum permite a pena de prisão. E sem pena de prisão não se pode admitir a existência de infração penal no nosso país. (...) A posse de droga para consumo pessoal passou a configurar uma infração sui generis. (GOMES, 2006, p. 109). Outrossim, com base nos apontamentos do jurista Luiz Flávio Gomes, infere-se que ocorreu a descriminalização do art. 28, da lei /06, pois a conduta descrita não possui como punição o status de pena ou mesmo contravenção penal, ainda, que não tenha sido legalizada pelo legislador pátrio. 2.4 O RECURSO EXTRAORDINÁRIO /SP Além das controvérsias acima citadas, outro assunto muito questionado é acerca da inconstitucionalidade do art. 28 da Lei de Drogas, situação fática que enquanto não for devidamente resolvida implica em insegurança ao nosso ordenamento jurídico. Um posicionamento que vem se fortalecendo, o qual é defendido por inúmeros juristas, sustenta que houve a violação de princípios constitucionais, sendo os principais a dignidade da pessoa humana, a intimidade e a isonomia. Nesse âmbito, argumentam que, É hora de olhar para o tal art. 28: Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas (...). Transbordando a ação para terceiros, não há mais falar em consumo pessoal. Para a conformação típica, presume-se o isolamento dos efeitos da conduta no próprio agente. Todo o cenário contemplado no art. 28 pressupõe a não irradiação do fato para além da murada da vida privada, ambiente este que está protegido pelo inc. X do art. 5.º da CR, e, por isso, não pode ser objeto de criminalização. (GARCIA, s/d)
6 O que falta para finalizar as divergências acerca da inconstitucionalidade é o Julgamento do Recurso Extraordinário /SP, o qual foi interposto contra a prisão de Francisco Benedito de Souza, no ano de 2011, acusado de portar três gramas de maconha em sua marmita, sendo condenado pelo crime de posse de drogas previsto no art. 28 da Lei de Drogas. A sua defesa sustentou que tal criminalização viola o artigo 5º, X, da Constituição Federal de 1988, segundo o qual são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. Em contrapartida, houve a resposta do Ministério Público, o qual sustentou que o bem protegido pelo dispositivo é a saúde pública, pois a conduta do indivíduo que traz consigo drogas para uso próprio, contribui para a proliferação do vício na sociedade (RODRIGUES, 2016). Nessa linha, os adeptos de tal posicionamento justificam que a simples posse de entorpecentes coloca em perigo a saúde pública, tendo em vista o risco de difusão da droga, ademais, serve de fomento para o tráfico de drogas (COUTO; SILVA, 2015). O julgamento do Recurso iniciou somente no ano de 2015 pelo Supremo Tribunal Federal, e foi votado pelos ministros Gilmar Mendes, Edson Fachin e Roberto Barroso, sendo que os três votos deliberaram pela inconstitucionalidade do art. artigo 28 da Lei nº /06, porém cada voto com suas peculiaridades. O ministrou relator Gilmar Mendes pediu a descriminalização de todas as drogas e sustentou em seu voto que: É possível assentar que a criminalização do usuário restringe, em grau máximo, porém desnecessariamente, a garantia da intimidade, da vida privada e da autodeterminação, ao reprimir condutas que denotam, quando muito, autolesão, em detrimento de opções regulatórias de menor gravidade. Nesse contexto, resta evidenciada, também sob essa perspectiva, a inconstitucionalidade da norma impugnada, por violação ao princípio da proporcionalidade (MENDES, 2015). No que tange ao Ministro Edson Fachin, este optou por restringir seus votos apenas ao uso de maconha, pois esta era a droga portada pelo réu que originou e impulsionou o recurso em tela. Assim sendo, em virtude da complexidade inerente ao problema jurídico que está sob a análise do Supremo Tribunal Federal no presente recurso extraordinário, propõe-se estrita observância às balizas fáticas e jurídicas do caso concreto para a atuação da Corte em seara tão sensível: a definição sobre a constitucionalidade, ou não, da criminalização do porte unicamente de maconha para uso próprio em face de direitos fundamentais como a liberdade, autonomia e privacidade. E já em sua parte final, é importante destacar as seguintes deliberações do Ministro: Diante do exposto, voto pelo provimento parcial do recurso nos seguintes termos, para: (i) Declarar a inconstitucionalidade do art. 28 da Lei , sem redução de texto, específica para situação que, tal como se deu no caso concreto, apresente conduta que descrita no tipo legal tiver exclusivamente como objeto material a droga aqui em pauta; (ii) Manter, nos termos da atual legislação e regulamento, a proibição inclusive do uso e do porte para consumo pessoal de todas as demais drogas ilícitas (FACHIN, 2015). Por fim, o Ministro Roberto Barroso, votou de forma semelhante à Fachin, contudo, segundo Miguel de Almeida Rodrigues (2016), ele foi um pouco mais ousado, pois considerou ser importante a criação de critérios que diferenciem o consumo pessoal do tráfico, e definiu, de acordo com a legislação portuguesa, as quantidades mínimas que
7 definem se a destinação da droga é para uso pessoas (25 gramas de maconha e 6 plantas fêmeas). O processo, porém, está suspenso devido o pedido de vista feito pelo ministro Teori Zavascki, que lamentavelmente faleceu em janeiro de Agora só resta aguardar o voto do novo Ministro Alexandre de Moraes para que a situação seja finalmente concluída. 3. CONCLUSÕES O presente artigo buscou analisar a natureza jurídica do artigo 28, da atual lei de drogas, verificando se esse dispositivo tem caráter de despenalização, descriminalização ou em última instância, se este é o caso de um dispositivo inconstitucional. Concretiza-se a importância da reflexão dessa temática, visto que não há consenso doutrinário a respeito desse tipo penal, que permanece com sua natureza jurídica obscura até os dias de hoje, passados dez anos da publicação da lei /2006. Fato que levou ao STF o Recurso Extraordinário nº /SP, que - a par das reflexões sobre a despenalização ou descriminalização revela que o posicionamento dos Ministros pendem para o a lado de declarar inconstitucional o art. 28, da lei de drogas. Nesta senda, o Recurso Extraordinário nº /SP ainda precisa ser votado pelo Ministro Alexandre de Moraes, para que haja a finalização de seu julgamento. Entretanto, apesar de a corrente majoritária estabelecer que o art. 28 tem natureza de despenalização, pode-se inferir, de imediato, que o julgamento desse recurso extraordinário será decisivo para o aclaramento sobre a natureza jurídica do art. 28, da lei /2006, determinando a sua permanência ou possível exclusão da legislação penal, caso seja julgado pela sua inconstitucionalidade. REFERÊNCIAS ARAUJO PORTELA, André Luiz. DESCRIMINALIZAÇÃO OU DESPENALIZAÇÃO? In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XI, n. 49, jan Disponível em: < Acesso em out BRASIL. Constituição Federal, Disponível em: < >. Acesso em: 07 out Decreto Lei n /1941. Disponível em: < Acesso em: 05 out. de 2017;. Lei n /2006. Disponível em: < Acesso em: 05 out Lei n /1976. Disponível em: < Acesso em: 05 de outubro de 2017; BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n /rj. Relator: PERTENCE, Sepulveda. Publicado no DJ de p Disponível em Acesso em: out Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário. RE /SP. Primeira Turma. Relator (a): Gilmar Mendes. Brasília, 20 de agosto de Disponível em:
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