6 Cultura e ideologia
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- Sebastiana Varejão Caminha
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1 Unidade 6 Cultura e ideologia É comum dizer que um indivíduo é culto porque fala vários idiomas. Há quem afirme que a cultura de um povo é mais sofisticada e complexa que a de outro. Esse tipo de avaliação, baseada no senso comum, comporta elementos ideológicos. Afinal, o que significam cultura e ideologia, termos tão usados em nosso cotidiano?
2 Os significados de cultura O francês Félix Guattari ( ) reuniu o significado de cultura em três grupos: Cultura-valor aparece na ideia de cultivar o espírito. Define um julgamento de valor sobre quem tem ou não cultura. Cultura-alma coletiva sinônimo de civilização. Todas as pessoas, grupos e povos têm cultura e identidade cultural. Cavalhada em Pirenópolis, Goiás, em 2003: cultura como marca de identidade. Marcos André/Opção Brasil Imagens
3 20th Century/Divulgação Capítulo Cultura-mercadoria é a cultura de massa. Compreende bens ou equipamentos culturais (como cinemas, bibliotecas e aqueles que trabalham nesses estabelecimentos), além dos conteúdos teóricos e ideológicos de produtos (como filmes, discos e livros) que estão disponíveis no mercado. Cena do filme Cruzada, sucesso de bilheteria, dirigido por Ridley Scott (2005). Cultura como mercadoria.
4 Cultura segundo a Antropologia Para o antropólogo inglês Edward B. Tylor, cultura é o conjunto de conhecimentos, crenças, arte, moral, direito, costumes e hábitos de uma sociedade. Trata-se de uma visão universalista. O alemão Franz Boas demonstrou que as diferenças entre grupos e sociedades humanas eram culturais, e não biológicas. A visão dele era particularista.
5 Para o inglês Bronislaw Malinovsky, as culturas seriam sistemas funcionais e equilibrados, formados por elementos interdependentes. Sendo interdependentes, esses elementos não poderiam ser examinados isoladamente. As estadunidenses Ruth Benedict e Margareth Mead procuraram investigar as relações entre cultura e personalidade.
6 Ruth Benedict desenvolveu o conceito de padrão cultural e identificou dois tipos culturais extremos: apolínico representado por indivíduos conformistas, tranquilos, solidários, respeitadores e comedidos; dionisíaco reúne os ambiciosos, agressivos e individualistas.
7 WernerForman/Corbis/Latin Stock Capítulo Margareth Mead investigou o modo como os indivíduos recebiam os elementos de sua cultura e como isso formava sua personalidade. Tampão de flauta usada em cerimônia dos Mundugumor, povo da Nova Guiné estudado por Margareth Mead. Datação da peça não identificada. Com base em seus estudos, a antropóloga concluiu que a diferença das personalidades não está vinculada a características biológicas, como o sexo, mas à maneira como em cada sociedade a cultura define a educação das crianças.
8 Thinkstock/Getty Images Capítulo Para o belga Claude Lévi-Strauss ( ), a cultura é um conjunto de sistemas simbólicos, entre os quais se incluem a linguagem, as regras matrimoniais, a arte, a ciência, a religião e as normas econômicas. Lévi-Strauss analisou o que era comum e constante em todas as sociedades as regras universais e os elementos indispensáveis para a vida social. Demonstrou que os elementos essenciais da maioria dos mitos se encontravam em todas as sociedades ditas primitivas.
9 Convivência com a diferença: o etnocentrismo Os seres humanos tendem a tomar seu grupo ou sociedade como medida para avaliar as demais. Cada grupo ou sociedade considera-se superior e olha com desprezo os outros, tidos como estranhos ou estrangeiros. Na Antiguidade, os romanos chamavam de bárbaros os que não eram de sua cultura. Para os europeus do Renascimento, os povos da América eram selvagens. Fundação Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro Exotismo para consumo europeu: índios Umauá, na Amazônia, fotografados em 65 por Albert Frisch. Imagens como essa foram reproduzidas às centenas no século XIX.
10 O etnocentrismo, termo utilizado para designar essa tendência, gera intolerância e preconceito cultural, religioso, étnico e político. Em nossos dias ele se manifesta, por exemplo, na ideologia racista da supremacia do branco sobre o negro ou de uma etnia sobre as outras. Manifesta-se, também, na ideia de que a cultura ocidental é superior, e os povos de outras culturas devem assumi-la, modificando suas crenças, normas e valores.
11 Trocas culturais e culturas híbridas O pensador argentino Néstor García Canclini observou que, até o século XIX, as relações culturais ocorriam entre grupos próximos, familiares e vizinhos, com poucos contatos externos. No início do século XX, a possibilidade de trocas culturais aumentou com o desenvolvimento dos transportes e dos meios de comunicação.
12 JBC Capítulo Hoje, as tecnologias de comunicação permitem que as trocas culturais sejam feitas em tal quantidade que não se sabe mais a origem delas. Culturas locais se mesclam a expressões culturais, principalmente dos Estados Unidos e de alguns países europeus, formando uma imensa cultura mundial. As expressões de grupos ou de regiões coexistem com essas culturas híbridas. Capa do mangá japonês Inu-Yasha, lançado no Brasil em No mundo globalizado, os produtos culturais circulam sem fronteiras.
13 Thinkstock/Getty Images Para o sociólogo holandês Joost Smiers, é importante preservar as formas particulares, grupais, regionais ou nacionais para que se alcance uma democracia cultural de fato. Para ele, o obstáculo a vencer é a dominação cultural.
14 Cultura erudita e cultura popular A separação entre cultura popular e cultura erudita está relacionada à divisão da sociedade em classes. De acordo com essa classificação, há uma cultura dos segmentos populares e outra identificada com as elites. Thinkstock/Getty Images
15 Acervo Museu Villa-Lobos Capítulo A cultura erudita abrangeria expressões artísticas como a música clássica de padrão europeu, as artes plásticas, o teatro e a literatura de cunho universal. Como qualquer mercadoria, alguns desses produtos culturais podem ser comprados e até deixados de herança como bens físicos. O maestro Heitor Villa-Lobos rege a orquestra da Rádio Gazeta em São Paulo, em 1957.
16 Marcelo Min/Agência Fotogarrafa Capítulo A cultura popular encontra expressão nos mitos e contos, na dança, na música e no artesanato. Inclui expressões surgidas nos meios urbano e rural. Demonstra haver constante criação e recriação no universo cultural de base popular. Show do grupo Racionais MC s em São Paulo, 2003.
17 A palavra cultura vem do latim e designa o ato de cultivar a terra. Está, assim, vinculada ao ato de trabalhar, a uma ação determinada. Nesses termos, todos têm acesso à cultura, pois todos podem trabalhar. Se alguém compra um livro, um disco ou um quadro, vai ao teatro ou ao cinema, adquire, mas não produz cultura. Isso caracteriza o consumo de uma mercadoria como qualquer outra. Não ter acesso a esses bens, não significa, portanto, não ter cultura.
18 Thinkstock/Getty Images Capítulo Para o pensador brasileiro Alfredo Bosi, a cultura é alguma coisa que se faz, e não apenas um produto que se adquire. Quando afirmamos que ter cultura significa ser superior e não ter cultura significa ser inferior, utilizamos a condição de posse de cultura como elemento de diferenciação social e imposição de uma superioridade que não existe. Isso é ideologia.
19 University of Oklahoma Libraries Capítulo A ideologia, suas origens e perspectivas O conceito de ideologia é moderno. Antes da Idade Moderna, a realidade era explicada pelos mitos ou pelo pensamento religioso. O termo ideologia foi inicialmente utilizado pelo francês Destutt de Tracy ( ) como ciência da gênese das ideias. Em 22, a palavra foi utilizada por Napoleão Bonaparte com o sentido de ideia falsa ou ilusão. Frontispício de Instauratio magna, de Francis Bacon. A publicação de 1620 incluía estudo que expressou umas das primeiras ideias sobre ideologia.
20 Augusto Comte retomou o sentido de ideologia usado por Tracy, acrescentando outro o de conjunto de ideias de determinada época. Para Karl Marx, a ideologia é um sistema elaborado de representações e de ideias que correspondem a formas de consciência que os homens têm em determinada época. De acordo com ele, as ideias dominantes em qualquer época são sempre as de quem domina a vida material e, portanto, a vida intelectual.
21 Segundo Émile Durkheim, o cientista deve deixar de lado as noções pré-científicas e as ideias subjetivas. São essas noções e ideias que ele entende por ideologia, ou seja, o contrário de ciência. De acordo com Karl Mannheim, as ideologias são sempre conservadoras, pois expressam o pensamento das classes dominantes, que visam à estabilização da ordem. Em oposição, utopia é o pensamento das classes oprimidas, que buscam a transformação social.
22 Editora Abril Capítulo A ideologia no cotidiano Nas relações entre as pessoas, uma série de elementos ideológicos se manifestam por meio de ações, palavras e sentimentos. No capitalismo, a ideologia se expressa, por exemplo, no discurso que procura ocultar as contradições existentes na sociedade. Baseado em categorias genéricas, esse discurso transmite uma ideia de uniformidade. Felicidade: fórmula prometida em chamada de revista (2006). A celebração da felicidade obscurece as dificuldades que cada um enfrenta em seu cotidiano.
23 A crença na verdade inquestionável do conhecimento científico talvez seja a maior de todas as expressões ideológicas presentes em nosso cotidiano. Da busca do sentido da vida às possibilidades de sucesso, a ciência seria a grande solução para todos os problemas, males e enigmas. No entanto, o pensamento científico se distancia da ideia de verdade absoluta. Ele é histórico e tem validade temporária, sendo a dúvida seu maior valor.
24 Exercícios 1. Leia o texto abaixo e, com base no que você estudou, responda às perguntas formuladas pelo autor. No mundo globalizado em que vivemos, tendo nosso cotidiano invadido por situações e informações provenientes dos mais diversos lugares, é possível afirmar que haja uma cultura pura? Até que ponto chegou o processo de mundialização da cultura? Nelson Dacio Tomazi
25 Dado Galdieri/Folha Imagem Bruno Miranda/Folha Imagem Capítulo 2. Observe as imagens e discuta com os colegas a seguinte questão: existe uma juventude, como prefere o discurso ideológico, ou jovens em situações diversas? O jovem fotografado em canavial no interior de São Paulo, em 2000, precisa cortar 300 metros de cana-de-açúcar por dia. Não sobra tempo para estudar, ao contrário da vestibulanda fotografada na capital paulista, que pôde se dedicar aos estudos e procura seu nome na lista de aprovados da Unesp, em 2006.
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