PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC/SP FELIPE BELTRAN KATZ O ICONOSTASIS PAULISTANO

Tamanho: px
Começar a partir da página:

Download "PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC/SP FELIPE BELTRAN KATZ O ICONOSTASIS PAULISTANO"

Transcrição

1 0 PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC/SP FELIPE BELTRAN KATZ O ICONOSTASIS PAULISTANO (Igrejas Orientais em São Paulo: Mediação da Multiplicidade ) MESTRADO EM HISTÓRIA SOCIAL SÃO PAULO 2012

2 1 PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC/SP FELIPE BELTRAN KATZ O ICONOSTASIS PAULISTANO (Igrejas Orientais em São Paulo: Mediação da Multiplicidade ) Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo como exigência parcial para obtenção de título de MESTRE em História Social sob a orientação da Profa. Doutora Maria Izilda Santos de Matos. MESTRADO EM HISTÓRIA SOCIAL SÃO PAULO 2012

3 2 BANCA EXAMINADORA

4 3 AGRADECIMENTOS Gostaria de externar minha gratidão a todos que, por ações ou palavras, colaboraram em todo o processo do trabalho. Agradecer a todos não é tarefa fácil, pois devo a muitos. Mas não posso deixar de mencionar alguns agradecimentos especiais. Agradeço à professora Maria Izilda Santos de Matos, pela orientação e pelas palavras de encorajamento e incentivo. Agradeço aos professores Fernando Torres Londoño e Yvone Dias Avelino, membros da banca do Exame de Qualificação, pela ajuda durante toda a trajetória da pesquisa e as sugestões e críticas para o aprimoramento do trabalho. Agradeço aos professores Antônio Rago Filho e Maria Antonieta Antonacci da PUC- SP e à professora Lená Madeiros de Menezes da UERJ, pela colaboração na elaboração e nas primeiras etapas do trabalho. Agradeço a todos os membros do Curso de Filosofia da PUC-SP, colegas e professores, pela colaboração, compreensão e auxílio intelectual durante todo o processo da pesquisa. Agradeço a todos os membros do Programa de Pós-graduação em História da PUC- SP, coordenadores, professores e colegas, pela conivência e troca de experiências. Agradeço a todos os entrevistados, que cederam um pouco de seu tempo e experiências de vida e colaboraram no trabalho, de maneira definitiva, para a melhor compreensão da situação das Igrejas Orientais na cidade.

5 4 Agradeço a todos os amigos, em especial a Nelson Mendes, pela transcrição das entrevistas, a Gabriel Beçak, pela colaboração com as fotografias, a Fábio de Moraes, por diversas colaborações, e a Heitor Loureiro, colega de mestrado que colaborou em várias etapas da pesquisa devido à proximidade de nossos temas. Finalmente, agradeço a meus familiares, especialmente minha mãe, meu avô, minha avó e meu pai, pela colaboração e incentivo durante a pesquisa.

6 5 É claro, então, que a prudência (sabedoria prática) é uma forma de virtude, e não uma técnica. Havendo, portanto, duas partes da alma dotadas de razão, a prudência deve ser uma forma de virtude de uma das duas, ou seja, da parte que forma opiniões, pois a opinião se relaciona com o que é variável, da mesma forma que a prudência. Aristóteles

7 6 RESUMO O trabalho busca apontar a diversidade do cristianismo oriental paulistano, debruçando-se sobre as Igrejas Orientais. Essas instituições estão associadas a comunidades imigrantes que vieram para São Paulo desde o final do século XIX até a segunda metade do século XX. Entre os grupos cristãos orientais emigrados para a cidade estão árabes, armênios, gregos, russos e ucranianos. Essas comunidades estão divididas em doze Igrejas localizadas em diversos pontos da região metropolitana. A pesquisa apoia-se em depoimentos coletados entre os membros do clero de cada uma dessas Igrejas, alguns fiéis cristãos orientais da cidade e bibliografia acerca da experiência histórica dessas instituições em outras partes do mundo. Longe de ser algo cristalizado, apresentando Ritos e peculiaridades do antigo cristianismo, as Igrejas Orientais na cidade de São Paulo estão inseridas no dia a dia da metrópole. Essas Igrejas pretendem mediar seu passado, associado com a manutenção da fé e cultura das comunidades imigrantes, e a vivência de sua situação paulistana atual. Uma situação em que a primeira geração de imigrantes diminui devido ao envelhecimento e aos fluxos imigratórios que não se renovam. As Igrejas Orientais, de acordo com os depoimentos de clérigos e fiéis, vivem um momento reflexivo de sua trajetória na metrópole. No entanto, o trabalho não deve julgar qual Igreja preserva melhor o passado, mas deve compreender que elas fazem parte do cotidiano da cidade. São Igrejas Orientais paulistanas, portanto, sua situação perpassa apropriações que melhor respondem à sua experiência em São Paulo. Palavras-chave: Imigração, São Paulo, Igreja Ortodoxa, Igrejas Católicas Orientais, Cristianismo Oriental.

8 7 ABSTRACT This work tries to point out the diversity of the oriental Christianity in Sao Paulo, through the oriental churches. These institutions are connected to the immigrant communities that came to Sao Paulo since the 19 th century until the mid 20 th century. Amongst the oriental Christians that have come to the city are Arabs, Armenians, Greeks, Russians and Ukrainians. These communities are divided in twelve different churches, that are located in different areas of the city. The research is based on the collected testimony of each clergy member of each church, some oriental Christians from Sao Paulo and bibliography that studies the historical experience of these institutions in other parts of the world. Far from being something completely strict, presenting Rites and peculiarities of ancient Christianity, the oriental churches of Sao Paulo are inserted in the daily life of the metropolis. These churches try to mediate their past, while maintaining the faith and culture of immigrant groups with their current situation in the city. A situation where the 1 st generation of immigrants is diminishing trough age and the migratory flux is not being renewed. The oriental churches, according to the testimony of clerics and faithful, are experiencing a reflexive moment in their course in the metropolis. However, this work does not try to judge which church best preserves it s past, but understand that they are part of the daily life of the city. They are oriental churches from Sao Paulo, therefore, their situation permeates appropriations that best respond their experience in Sao Paulo. Keywords: Immigration, Sao Paulo, Orthodox Church, Eastern Catholic Churches, Oriental Christianity.

9 8 SUMÁRIO APRESENTAÇÃO...12 CAPÍTULO I ICONOSTASIS PAULISTANO: ESTABELECIMENTO E FORMAÇÃO DAS IGREJAS ORIENTAIS MAPA DO CRISTIANISMO ORIENTAL LADO ORIENTAL DO CRISTIANISMO: IGREJAS ORTODOXAS ORGANIZAÇÃO ECLESIÁSTICA DAS IGREJAS ORTODOXAS FORMANDO UMA κοινóτητα PAULISTANA...48 CAPÍTULO II DISCURSO, FÉ, MEDIAÇÃO E FORMAÇÃO DE IDENTIDADE NA METRÓPOLE PAULISTANA: CLERO ORIENTAL MIMESE: MANUTENÇÃO E FORMAÇÃO DE IDENTIDADES Ritos e Diáspora Relação entre Irmãs IMPERATIVO DA CONTINGÊNCIA: FUTURO DO ICONOSTASIS Apontamentos de Problemáticas Projetos e Perspectivas...88

10 9 CAPÍTULO III MEDIANDO TRADIÇÕES NA METRÓPOLE PAULISTANA: IGREJAS CATÓLICAS ORIENTAIS OS OUTROS CATÓLICOS ROSÁRIO E ICONOSTASIS: ORTODOXOS E CATÓLICOS ORIENTAIS ENTRE O UNIVERSAL E O PARTICULAR: IGREJA CATÓLICA LATINA E CATÓLICOS ORIENTAIS CAPÍTULO IV PARA ALÉM DOS BELOS PORTÕES: APONTAMENTOS DOS FIÉIS CRISTÃOS ESCOLHAS MÚLTIPLAS PERSPECTIVAS PENSANDO O FUTURO DO ICONOSTASIS: APONTAMENTOS CONSIDERAÇÕES FINAIS FONTES E BIBLIOGRAFIA...160

11 10 LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Iconostasis da Catedral Ortodoxa de Antioquia de São Paulo...13 Figura 2 - Igreja do Patriarcado Ortodoxo de Antioquia no bairro do Paraíso...28 Figura 3 - Mapa da cidade com localização das Igrejas Ortodoxas...31 Figura 4 - Igreja Ortodoxa Sirian de Santa Maria na rua Padre Mussa Tuma...41 Figura 5 - Igreja Ortodoxa Ucraniana de São Valdomiro em São Caetano do Sul...58 Figura 6 - Igreja Apostólica Armênia na Avenida Tiradentes...66 Figura 7 - Igreja Ortodoxa Grega no bairro do Brás...69 Figura 8 - Igreja Ortodoxa Copta no bairro do Jabaquara...75 Figura 9 - Igreja Católica Melquita na Avenida Paulista...86 Figura 10 - Igreja Ortodoxa Russa no Exílio na Rua Tamandaré...92 Figura 11 - Igreja Católica Maronita na Rua Tamandaré Figura 12 - Igreja Católica Russa ao lado do Museu Paulista Figura 13 - Igreja Católica Armênia de São Gregório na Avenida Tiradentes Figura 14 - Igreja Católica Ucraniana na Vila Prudente...120

12 11 LISTA DE ABREVIAÇÕES AC - Membro do clero da Igreja Católica Armênia AO - Membro do clero da Igreja Apostólica Armênia CO - Membro do clero da Igreja Ortodoxa Copta GO - Membro do clero da Igreja Ortodoxa Grega MK - Membro do clero da Igreja Católica Melquita MN - Membro do clero da Igreja Católica Maronita PO - Membro do clero da Igreja do Patriarcado Ortodoxo de Antioquia RC - Membro do clero da Igreja Católica Russa RO - Membro do clero da Igreja Ortodoxa Russa no Exílio SO - Membro do clero da Igreja Ortodoxa Sirian UC - Membro do clero da Igreja Católica Ucraniana UO - Membro do clero da Igreja Ortodoxa Ucraniana F-AO - Fiel da Igreja Apostólica Armênia F-MK - Fiel da Igreja Católica Melquita F-SO - Fiel da Igreja Ortodoxa Sirian F-UC1 e F-UC2 - Fiéis da Igreja Católica Ucraniana

13 12 APRESENTAÇÃO Dentro da grande maioria das Igrejas Orientais há uma estrutura muito familiar a essas instituições religiosas: o Iconostasis. O Iconostasis é uma parede onde estão dispostos diversos ícones de vários Santos, da Mãe de Deus e do próprio Jesus Cristo. A localização do Iconostasis é muito importante na construção de uma Igreja Oriental. Ele se situa entre o altar e a nave, marcando distintamente esses espaços. O lado voltado para a nave é onde estão dispostos os ícones; o lado contrário, o das costas do Iconostasis, está voltado para o altar. A circulação entre um lado e outro do Iconostasis se dá por uma passagem: os Belos Portões. A Divina Liturgia, nome dado à celebração religiosa Oriental (equivalente à Missa na tradição Católica Romana), depende muito do Iconostasis. Todas as orações e as leituras do texto sagrado acontecem no altar; no momento da pregação e da comunhão dos féis, o membro do clero atravessa os Belos Porões e dirige-se à nave. A todo momento os fiéis estão voltados para o Iconostasis, onde estão dispostos os ícones. Essa relação do Iconostasis com a Divina Liturgia e sua posição na Igreja Oriental sugerem certas reflexões. O Iconostasis seria a representação da divisão entre dois mundos que se encontram na Igreja: um mundo transcendental, universal e necessário, e um mundo humano, contingente e circunstancial. O lado do altar seria o mundo transcendental, e o lado da nave, o humano. Esse lado do altar é o espaço da oração, da relação com o divino, com o imutável, pois está localizado atrás dos ícones dispostos, de frente para os fiéis. É lá o local da verdade, somente acessível aos membros do clero. Somente quem conhece a oração por completo pode

14 13 penetrar nesse espaço. Esse é o local onde se situa o texto sagrado, a palavra verdadeira, a opinião verdadeira, a ortodoxia, único lugar onde ele pode ser lido de forma plena. Do outro lado do Iconostasis está a nave. Lá estão os fiéis, os homens. É o lugar da contingência, do mutável, do livre arbítrio. Nesse espaço os homens recebem a mensagem de Deus por intermédio da oração vinda do outro lado do Iconostasis. Ali ocorre a pregação, quando o membro do clero passa pelos Belos Portões e vem aos fiéis tratar de assuntos terrenos, com a ajuda do texto sagrado. Nesse local também ocorre a comunhão, quando os fiéis recebem o corpo de Cristo, e o homem torna-se um pouco divino. Figura 1 - Iconostasis da Catedral Ortodoxa de Antioquia de São Paulo. 1 1 Autor: Felipe Beltran Katz. Data: 5/8/2007.

15 14 As Igrejas Orientais também possuem outra particularidade: elas estão sempre associadas às comunidades em que se desenvolveram. Portanto, qualquer Igreja Oriental vem acompanhada de um adjetivo cultural, seja Armênio, Maronita, Ucraniana ou Russa. Assim, o divino e o humano se misturam. No lado transcendental do Iconostasis a oração é feita na língua da Igreja, os textos sagrados estão na língua da Igreja, pois é necessário e divino. No entanto, quando o membro do clero passa pelos Belos Portões e está fora da região de origem da Igreja, a língua é a profana e contingente, no caso de São Paulo, o português. Os fiéis dependem sempre da contingência; o Iconostasis, a parede de ícones que está voltada para eles, só lhes oferece a verossimilhança, um eikos do que é a realidade de Deus. O Iconostasis faz mediação entre dois mundos, entre a Igreja e o fiel, entre o que é certo e o que pode tornar-se certo. Ele é o espaço do meio-termo, onde essas duas experiências se encontram, o único espaço simbólico da Divina Liturgia em que todas as experiências podem ser contempladas. Esse é o espaço deste estudo. Deve-se ter claro que a dissertação buscará esse espaço do Iconostasis, o meio-termo dessas Igrejas que trabalham de forma aparentemente dicotômica. O estudo procurará compreender as relações dessas Igrejas na cidade de São Paulo. No lado do altar do Iconostasis encontra-se o conceito de que essas Igrejas representam comunidades imigrantes que há muito tempo vieram para a cidade de São Paulo e aqui se estabeleceram. Assim, essas Igrejas seriam espaço de manutenção das tradições dessas comunidades, lutando contra qualquer força que tentasse fazer com que elas se modificassem, criando verdadeiros baluartes de cultura grega, armênia ou russa. Nesse lado do Iconostasis, assim como ocorre na Divina Liturgia, existe a necessidade de que esses grupos mantenham sua cultura imutável, pois, como será apontado mais adiante, necessitam disso para manter sua divindade cultural e espiritual.

16 15 Todavia, do lado da nave do Iconostasis encontram-se as ideias de que esses grupos, uma vez que vieram para uma região distante do local de origem, estariam fadados a ser totalmente incorporados à comunidade maior, que seus antigos projetos seriam frustrados e que terminariam como grupo. Tal como na Divina Liturgia, esse lado do Iconostasis trará apenas um entendimento parcial e volátil de sua existência na cidade. O presente trabalho, ao focar justamente o meio-termo dessas duas abordagens, tentará trazer os diversos elementos e as mediações que perpassam a vida dessas Igrejas na cidade de São Paulo. Buscará apresentar como os membros do clero e alguns fiéis, aparentemente em lados opostos do Iconostasis, vivem e se relacionam com a cidade e as demais comunidades Orientais da metrópole e, de certa forma, com a Igreja Católica Latina dominante. Também se verificará que a origem remota dessas comunidades e suas batalhas e medições anteriores moldaram e ainda moldam esses grupos. Esse meio-termo de comunidades religiosas e culturais que, na cidade de São Paulo, mediam suas atitudes contemplando a metrópole na sua atualidade e, concomitantemente, buscam no passado, muitas vezes remoto, certa continuidade no agir faz-me elaborar uma metáfora: um Iconostasis Paulistano. Pois estou na busca de um meio-termo das Igrejas Orientais próprio da cidade de São Paulo. Destarte, tentarei trabalhar com os processos de incorporação dos dois lados do Iconostasis, ainda que não se possa determinar exatamente o início e o final desse processo muitas vezes realizado por essas Igrejas 2. As Igrejas Orientais encontradas em São Paulo são diversas, mas sempre pareceram negligenciadas. Sempre me interessei pelos estudos sobre os diversos grupos imigrantes na cidade. Mas não aqueles grupos já amplamente estudados: italianos, portugueses e japoneses. 2 CHARTIER, Roger. A História Cultural: Entre Práticas e Representações. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, p.17.

17 16 Interessavam-me mais os grupos gregos, armênios e russos. Isso me levou ao primeiro contato com as Igrejas Orientais, pois sabia que aqui na cidade de São Paulo havia uma grande Igreja Ortodoxa no bairro do Paraíso. Pesquisando sobre os armênios, que têm uma comunidade forte em Osasco, onde conheço muitas pessoas, soube que eles também são cristãos orientais. De certa maneira, essa vivência pesou quando pensei em desenvolver meu projeto. No entanto, este trabalho deve ser rigoroso e tentar escapar a qualquer tipo de exotismo, apontando para o fato de que essas Igrejas são objetos históricos com suas características peculiares e evitando preconceitos. Para os Cristãos Orientais, Oriental é um termo que expressa as suas identidades e carregado de valores positivos. Oriente é a direção das orações, a localização bíblica do paraíso terreno, a fonte do nascente e da iluminação do mundo, o quartel de onde vieram os Três Reis Magos, os primeiros gentios a procurar Cristo. Para os Cristãos Ocidentais, o termo Oriental pode carregar um senso de exótico, do remoto, do outro, aquilo que é fora do normal e normativo. As questões levantadas pelo Orientalismo foram até agora confinadas principalmente em discussões que concernem religiões e culturas não- Cristãs, mas Orientalismo pode afetar a percepção e estudo do Cristianismo Oriental. Quando os Ocidentais vêm observar seus companheiros Cristãos no Oriente, eles normalmente exibem atitudes similares àquelas que eles exibem às culturas e religiões Orientais não-cristãs: uma fascinação com o exótico ou uma presunção de superioridade, condescendida a uma realidade estranha vista com uma notável falta de empatia. 3 Esse tipo de presunção de superioridade e essa fascinação com o exótico se entrecruzam, pois, como já apontado, contribuem para disseminar a ideia de que essas Igrejas são objetos estáticos e sem uma experiência real. Isso acompanhado do fato de que são Igrejas 3 PARRY, Ken (et. al.). The Blackwell Dictonary of Eastern Christianity. Oxford: Blackwell, p.xiv.

18 17 que normalmente são negligenciadas, pela sua relação com o que talvez alguns chamem de objetos irreais. Elas também estão, aparentemente, afastadas de uma experiência ocidental, originárias de uma região do planeta onde, para alguns, a superstição e o exotismo grassam: Houve ainda, no Ocidente, uma Modernidade que o Oriente não conheceu. Há entre nós mestres, neste sentido, tais como Freud, Hegel, Marx, Nietzsche e Heidegger que precisam ser ouvidos e conhecidos no Oriente. Através desta tradição moderna, a inteligência ocidental perscrutou os fundamentos da mensagem cristã que não é só patrimônio do Ocidente. A partilha desta inteligência com o Oriente seria frutuosíssima para as duas tradições. Desta forma, o Oriente cristão conseguiria também se expressar culturalmente. 4 Para não aproximar-me dessas afirmações, devo ser cuidadoso e compreender que as Igrejas Orientais têm suas próprias características, sua própria experiência, que, algumas vezes, encontra-se com o cristianismo Ocidental. Mas essas relações não podem ser hierarquizadas. Além desse tipo de abordagem que, de certa maneira, desvaloriza as experiências das Igrejas Orientais, encontrei abordagens que são excessivamente zelosas com relação a elas. Não que isso seja equivocado, mas, se posto de forma exagerada, pode nos levar a uma fascinação do exótico, ou seja, tornar Igrejas objetos estáticos e não históricos: À guisa de conclusão deste artigo, deve ser esclarecida que a Igreja Católica Russa no Exílio, entre as demais, pode ser considerada a que mais fidelidade guarda aos preceitos ortodoxos. Ela não se permitiu mesclar-se com outras igrejas, as quais reprova por deixar-se levar a 4 MARTINS, Antônio Henrique Campolina. Católicos e Ortodoxos: duas tradições na Igreja de Cristo. In: Rhena. Juiz de Fora, v.5, n.20, p.59.

19 18 uma flexibilização exagerada da doutrina ortodoxa, desviando-se da tradição. Manteve-se fiel a seus rituais, à observação do antigo calendário e aos jejuns necessários. 5 No presente estudo tentarei evitar esse tipo de observação. A experiência histórica e cotidiana das Igrejas Orientais na cidade de São Paulo aponta para o fato de que não há uma Igreja mais fiel aos preceitos ortodoxos. Afirmar isso é também afirmar que existe uma verdadeira Igreja Oriental, afastada de toda a experiência e mediação cotidiana 6. Explicar e compreender as Igrejas Orientais na cidade de São Paulo perpassa o apontamento das mediações, tentando conciliar suas antigas referências, sua antiga situação na metrópole e sua luta cotidiana. Essa mediação se dá na prática e é refletida nos depoimentos de membros do clero dessas Igrejas e de alguns fiéis. Todavia, foi necessário abandonar todo tipo de préconceitos para que os depoimentos e, posteriormente, a bibliografia indicassem essas mediações. Quais e quem são as Igrejas Orientais na cidade de São Paulo? Como já mencionado, essas Igrejas têm passados e trajetórias diversas que moldaram pouco a pouco a maneira de interagir com os percalços encontrados e os projetos elaborados. Logo, inicialmente, essa relação entre certas comunidades étnicas e determinada Igreja deve ser realçada. As Igrejas situadas na cidade de São Paulo são doze e estão distribuídas em três famílias: as Igrejas Ortodoxas Calcedonianas, as Igrejas Ortodoxas não Calcedonianas e as Igrejas Católicas Orientais. 5 LOIACONO, Mauricio. A Igreja Ortodoxa no Brasil. Revista da USP. São Paulo, n.67, set./nov p THOMPSON, Edward P. A Miséria da Teoria. Rio de Janeiro: Zahar Editores, p.57.

20 19 O maior desses grupos ou famílias é o Bizantino ou Ortodoxo Calcedônio, contabilizando para a vasta maioria dos Cristãos Orientais; elas são as Igrejas do Império Romano do Oriente e aquelas que emergiram das missões bizantinas. Elas estão (normalmente) em comunhão com o Patriarca de Constantinopla. Depois há o grupo de igrejas chamadas de Oriental Ortodoxa, que prospera nas áreas ao leste do Império Bizantino. Essas são chamadas às vezes de Igrejas não-calcedônias ou pré-calcedônias, pois sua separação aconteceu depois de declinar a aceitar as decisões do Concílio de Calcedônia (451) [...]. A terceira família são as várias Igrejas Orientais que aceitaram a autoridade do Papa de Roma, que são conhecidas como Gregas ou Orientais Católicas. 7 Além dessa diversidade confessional, temos a diversidade étnica, que não necessariamente desassocia-se da confessional. Assim, explicitamente, encontramos na cidade de São Paulo as seguintes Igrejas Orientais: 1 - Igreja Católica Maronita, Católica Oriental, ligada à comunidade árabe (notadamente libanesa); 2 - Igreja Apostólica Armênia, não Calcedoniana, ligada à comunidade armênia; 3 - Igreja Sirian Ortodoxa, não Calcedoniana, ligada à comunidade árabe (notadamente síria); 4 - Igreja Católica Russa, Católica Oriental, ligada à comunidade russa; 5 - Igreja Ortodoxa Russa no Exílio, Calcedoniana, ligada à comunidade russa; 6 - Igreja Católica Armênia, Católica Oriental, ligada à comunidade armênia; 7 - Igreja Ortodoxa Ucraniana, Calcedoniana, ligada à comunidade ucraniana; 7 BINNS, John. An Introduction to the Christians Orthodox Churches. Cambridge: Cambridge University Press, p.9.

21 Igreja Católica Melquita, Católica Oriental, ligada à comunidade árabe; 9 - Igreja Católica Ucraniana, Católica Oriental, ligada à comunidade ucraniana; 10 - Igreja Ortodoxa do Patriarcado de Antioquia, Calcedoniana, ligada à comunidade árabe; 11 - Igreja Ortodoxa Grega, Calcedoniana, ligada à comunidade grega; e 12 - Igreja Ortodoxa Copta, não Calcedoniana, de origem egípcia, porém seus membros, na sua maioria, não são egípcios ou de origem egípcia. O trabalho tentará focar temas relacionados às Igrejas Orientais presentes na cidade de São Paulo, a partir das diversas possibilidades apresentadas pelos depoimentos orais. O primeiro capítulo será uma introdução à trajetória dessas Igrejas. Abordando o aspecto do deslocamento, o destaque será dado à vinda desses grupos cristãos orientais para a cidade e à organização eclesiástica das Igrejas, sugerindo o fato de que essas instituições e os grupos cristãos orientais estão inseridos numa trama internacional, mas, ao mesmo tempo, vivem as peculiaridades da metrópole paulistana. Esse capítulo ressaltará as Igrejas Ortodoxas (Calcedonianas e não Calcedonianas), que sofrem a influência da Igreja Católica Latina. Esta instituição marca profundamente as relações da família Católica Oriental, questão que será aprofundada em capítulo posterior. O segundo capítulo analisará os depoimentos dos membros do clero. Nos depoimentos orais desses indivíduos encontram-se diversos assuntos que podem ser discutidos: relação com outras comunidades cristãs orientais na cidade, ritual, construção de identidade étnica, processo de estabelecimento na metrópole, projetos e dificuldades. Além disso, segundo os depoimentos, o rito, preservado e propagado pelos membros do clero, tem o papel de comunicar valores partilhados no interior do grupo para manter unida aquela

22 21 comunidade 8. Nos depoimentos, os membros do clero parecem ser indivíduos que estão mais associados às mediações que essas Igrejas fazem diariamente. Seriam portadores do discurso oficial de cada Igreja e guardiões 9 do passado e da cultura das comunidades a que estão associados. No entanto, antecipadamente, pode-se afirmar que essas relações são a todo momento perpassadas pelas medições feitas por esses indivíduos, que buscam manter o passado, as origens étnicas dessas Igrejas e a necessária essência de cada uma dessas instituições. Mas, ao mesmo tempo, estão sempre lidando com a atualidade, a expansão ou o recuo de suas comunidades e sua contingência. Porém, não existe nenhuma ideia de essência permanente nem de um texto coletivo único fechado; a mediação, tantas vezes ressaltada, será o ponto de maior importância no debate envolvendo os relatos dos membros do clero. O discurso religioso, longe de ser somente uma experiência com o transcendental, pode ser usado como forma de exercer poder, resistência, autonomia, inserção, manter e criar identidades culturais, entre outras coisas. Na elaboração do trabalho surgiram elementos que apontavam para um discurso de poder dentro da relação entre as Igrejas Orientais e a Igreja Católica Romana. Esse tipo de tensão é mais sensível na associação entre as Igrejas Católicas Orientais e a Igreja Católica Latina. Como já discutido anteriormente, em última instância, as Igrejas Católicas Orientais pertencem à Igreja Católica Romana: Enquanto os Ortodoxos são hostis aos Católicos Gregos, considerando que eles caíram à sedução da herética Igreja Romana, Católicos consideram que eles não são verdadeiramente Católicos, pois não seguem tradições Latinas. Os Católicos Gregos, às vezes vêem a si mesmos como uma ponte entre Oriente e Ocidente, providenciando 8 CONNERTON, Paul. Como as Sociedades Recordam. Oeiras: Celta, p Esse termo remete aos homens-memória de Jacques Le Goff. Indivíduos que são depositários da história "objetiva" e "ideológica" de suas comunidades e Estados. LE GOFF, Jacques. História e Memória. Campinas: Editora UNICAMP, p.425.

23 22 um modelo onde uma futura união pode ser construída, mas mais freqüentemente eles são vistos como uma barreira, providenciando ainda mais argumentações para desacordos e tensões entre as duas grandes tradições do Cristianismo. 10 As Igrejas Católicas Orientais estão numa posição delicada, encontram-se entre a cultura ortodoxa e a cultura católica latina. Esse entre espaços muitas vezes é utilizado como local de poder da Igreja Católica Latina para modernizar os diversos aspectos de suas coirmãs orientais. Esse processo de normatização e descrédito das Igrejas Católicas Orientais pela Igreja Latina é análogo à ideia de que a tradição oriental é inferior à tradição oriental 11. Isso se percebe de forma mais clara com um exemplo: um documento apresenta os erros que os padres latinos apontaram na Igreja Católica Maronita. Eles deveriam ser retirados da liturgia para que essa Igreja pudesse entrar em comunhão com Roma: 1- O Credo Nicenico deve ser revisado para incluir a profissão do Espírito Santo do Pai e do Filho 2- Os Maronitas devem professar duas naturezas, duas vontades e duas ações ou energias em Cristo 3- Eles devem retirar a frase Tu que foste crucificado por nós tenha piedade em nós do Trisagio 4- Devem professar a existência do Purgatório 5- Divórcios nos termos de adultério devem ser proibidos e a Igreja Maronita não deve abençoar o novo casamento de cônjuges que divorciaram-se nesses termos 6- O padre não deve ungir o batizado com a Crisma, pois esta é exclusivamente uma função do bispo 10 BINNS, John. An Introduction to the Christians Orthodox Churches. Cambridge: Cambridge University Press, p O discurso de poder da Igreja Latina trata as Igrejas Católicas Orientais como objetos de um orientalismo. SAID, Edward W. Orientalismo: O Oriente como invenção do Ocidente. São Paulo: Companhia das Letras, p.35.

24 23 7- A Sagrada Comunhão não deve ser administrada aos jovens antes de chegarem à idade da puberdade 12 Mais do que uma série de leis canônicas, o que está presente aqui é um processo de aculturação, de imposição de poder por meio da Igreja. O terceiro capítulo, por seu turno, analisará especificamente as Igrejas Católicas Orientais na cidade de São Paulo. A associação com a Igreja Católica Latina, em última instância, foi feita porque grupos religiosos ortodoxos sentiram a necessidade de aliarem-se a uma instituição mais poderosa, portanto, mais um processo de mediação ocorrido nos locais de origem dessas Igrejas. Contudo, é necessário destacar que essa aliança está longe de ser perfeita e é, como ressaltado anteriormente, perpassada pela questão do espaço intermediário dessas Igrejas. Nos depoimentos dos membros do clero esse tipo de mediação aparece de forma sutil, o discurso nos depoimentos é consensual, mais oficializado, valorizando os aspectos que promoveram a união entre essas Igrejas e a Igreja Latina. Já o quarto e último capítulo analisará depoimentos de fiéis de algumas das Igrejas Orientais da cidade de São Paulo. A escolha desses fiéis foi feita levando em consideração a anterioridade do indivíduo, ou seja, se nasceu dentro de uma comunidade cristã oriental ou tornou-se adepto dela depois da idade adulta. Nesses depoimentos o discurso parece mais distante daquele oficial; a experiência de cada fiel é o que parece ser ressaltado nos relatos. Esses indivíduos também estão num espaço intermediário, mediando suas relações como fiéis de suas Igrejas e sua experiência cotidiana pessoal na cidade. A ressignificação é ponto-chave para se compreender as percepções desses indivíduos. Esses fiéis têm em mente a tradição (muitas vezes como os membros do clero), mas ela varia de acordo com a pessoa 13. Portanto, 12 Apud: MOOSA, Matti. The Maronites in History. Piscataway: Georgias Press, p HALL, Stuart; SOVIK, Liv (Orgs.). Da Diáspora: Identidades e Mediações Culturais. Belo Horizonte: Editora UFMG, p.63.

25 24 não há uma dicotomia entre fiel e membro do clero, mas múltiplas perfectivas em um só indivíduo. Apresentar essas múltiplas relações é procurar apontar as múltiplas mediações feitas no Iconostasis Paulistano. O trabalho buscará trazer novos aspectos para contribuir no diálogo sobre a diversidade cultural da cidade, sobre suas diversas comunidades imigrantes e sobre a diversidade do cristianismo encontrado na metrópole. Todavia, deve-se ter cautela e não tratar a Igrejas Orientais na cidade de São Paulo de forma exótica, desvalorizando ou supervalorizando essas instituições. É preciso perceber que esses indivíduos associados a cada uma delas têm suas perspectivas e subjetividades próprias, e não cumprem um grande papel teórico que trará a verdade sobre a fé ou uma cultura. Mas deve-se ter em mente que o discurso religioso, valorizado neste trabalho, pode ser um elemento de posicionamento político, luta por uma memória, uma experiência pessoal e um elemento capaz de revelar como essas comunidades e Igrejas conseguem mediar suas relações na megalópole paulistana.

26 25 CAPÍTULO I - ICONOSTASIS PAULISTANO: ESTABELECIMENTO E FORMAÇÃO DAS IGREJAS ORIENTAIS O cristianismo oriental paulistano é diverso. Ele é composto por doze Igrejas com graus distintos de relação. Essas Igrejas estão divididas em dois grupos: Igrejas Ortodoxas, que serão analisadas com maior densidade neste capitulo, e as Igrejas Católicas Orientais, que possuem a característica peculiar de pertencer à Igreja Católica (ver capítulo 3). O grupo Ortodoxo, por sua vez, é dividido em duas famílias: as Igrejas Calcedonianas e as não Calcedonianas 14. O corpo documental básico deste capítulo, e de grande parte do trabalho, são os depoimentos dos membros do clero de cada uma dessas Igrejas. Eles seriam os guardiões da memória das Igrejas (ver capítulo 2). No entanto, desde já, alguns apontamentos merecem ser destacados com relação ao uso desses depoimentos no estudo. Na coleta de depoimentos os entrevistados pediram que não fossem identificados. Portanto, para melhor compreensão e assimilação da diversidade desses grupos, cada membro do clero será designado nesta dissertação com um código. A seguir serão apresentadas as denominações das Igrejas Orientais Paulistanas, divididas em seus respectivos grupos, com o código de cada membro do clero entrevistado: 14 As Igrejas Ortodoxas não Calcedonianas são Igrejas que não aceitaram as resoluções do Concílio de Calcedônia no ano de 451, que decidiu sobre a natureza de Cristo. Segundo as resoluções, Cristo teria duas naturezas (physis em grego), uma humana e uma divina. As Igrejas não Calcedonianas acreditam que Cristo possui apenas uma natureza divina; portanto, são pejorativamente chamadas de monofisitas. Os grupos que não aceitaram as resoluções de Calcedônia foram justamente aquelas comunidades na periferia do Império Bizantino, como armênios e egípcios (coptas). BINNS, John. An Introduction to the Christians Orthodox Churches. Cambridge: Cambridge University Press, p Isso denota como a religião pode ser um elemento de resistência e poder.

27 26 Igrejas Católicas Orientais Igreja Católica Maronita (o membro do clero será identificado pelo código MN), Igreja Católica Armênia (AC), Igreja Católica Melquita (MK), Igreja Católica Ucraniana (UC), Igreja Russa Católica (RC). Igrejas Ortodoxas Igrejas Ortodoxas Calcedonianas: Igreja Ortodoxa Grega (GO), Igreja do Patriarcado Ortodoxo de Antioquia (PO), Igreja Ortodoxa Ucraniana (UO) e Igreja Ortodoxa Russa no Exílio (RO). Igrejas Ortodoxas não Calcedonianas: Igreja Apostólica Armênia (AO), Igreja Ortodoxa Sirian (SO) e Igreja Ortodoxa Copta (CO). 1.1 MAPA DO CRISTIANISMO ORIENTAL Na megalópole paulistana as Igrejas Orientais estão distribuídas de forma diversificada. Algumas possuem várias igrejas, como a Igreja Ortodoxa Russa no Exílio, com templos em Moema, Liberdade e Vila Prudente (seu templo original). Outras são muito distantes de seus membros, como a Igreja Católica Ucraniana, conforme afirma UC: [...] a expansão de São Paulo é muito grande e, para participar de nossa celebração, muitas vezes as pessoas tomam três, quatro ônibus. 15 Algumas realizam a celebração da Divina Liturgia 15 Depoimento de membro do clero da Igreja Católica Ucraniana da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 16/06/2010.

28 27 várias vezes aos domingos, como a Igreja Católica Maronita, enquanto outras, uma vez a cada mês (o primeiro domingo do mês), caso da Igreja Católica Russa. Há uma multiplicidade de Igrejas na cidade que vivem as diferentes condições que encontram adaptando-se, procurando um meio-termo entre necessidade e contingência, como o lugar do Inconostasis na Divina Liturgia. Esse é o Iconostasis Paulistano. Observando o mapa da Grande São Paulo e identificando a localização de cada igreja principal das diversas Igrejas Orientais na cidade, compreende-se certa relação entre elas. As Igrejas de origem árabe estão distribuídas bem próximas umas da outras. A Igreja Católica Maronita, com fortes ligações com o Líbano, está localizada na Rua Tamandaré. Bem próximo a essa, no encontro entre a Rua Vergueiro e a Avenida Paulista, está, talvez, a mais notável das Igrejas Orientais de São Paulo: a Igreja do Patriarcado Ortodoxo de Antioquia, instalada numa imensa catedral com cúpulas douradas e arquitetura inspirada na mais famosa Igreja Oriental do mundo, a de Santa Sofia (Santa Sabedoria), na cidade de Istambul. Esta Igreja, muitas vezes encontrada em guias turísticos, passou a ser a principal referência na cidade quando se pensa nas Igrejas Orientais, no entanto, é mais uma das diversas encontradas na megalópole. Além disso, ao contrário do que muitos imaginam, não está relacionada à comunidade russa ou grega, mas à comunidade árabe, notadamente síria.

29 28 Figura 2 - Igreja do Patriarcado Ortodoxo de Antioquia no bairro do Paraíso. 16 Próximo dali, atravessando o viaduto sobre a Avenida Vinte Três de Maio, a pouco mais de uma quadra deste, há a Igreja de Nossa Senhora do Paraíso, que pertence à Igreja Católica Melquita. Essa igreja, que dá nome ao bairro do Paraíso, homenageia essa Virgem do cristianismo oriental. Nas redondezas encontra-se uma das instituições paulistanas relacionadas com a comunidade árabe, o Clube Homs, apontando para o fato de que as Igrejas Orientais estão profundamente relacionadas com suas respectivas comunidades originárias. Mais ao sul, próximo à Avenida José Maria Whitaker, na Vila Marina, está a Igreja Sirian Ortodoxa, na Rua Padre Mussa Tuma, que homenageia o fundador da Igreja. Ao lado desta igreja, a menos de um quilômetro está o Esporte Clube Sírio, uma vez mais relacionado às Igrejas Orientais e às instituições de suas comunidades em diáspora. 16 Autor: Felipe Beltran Katz. Data: 16/9/2011.

30 29 As Igrejas de origem eslava também estão distribuídas praticamente num mesmo espaço, notadamente na Vila Prudente. Segundo os depoimentos, diversas comunidades da Europa Oriental se estabeleceram nesse bairro para escapar das perseguições sofridas pelas minorias, principalmente na primeira metade do século XX, pelas mãos da União Soviética e, posteriormente, da Alemanha nazista. Nessa região encontra-se, na Rua Paratiquara, a Igreja da Santíssima Trindade, sede da Igreja Ortodoxa Russa no Exílio na cidade de São Paulo. Como já mencionado, existem outras paróquias dessa Igreja espalhadas por vários pontos da cidade. Algo excepcional em relação às demais Igrejas Orientais. Mais ao sul, menos conhecida, está a Igreja Nossa Senhora da Glória, na Rua das Valerianas, que pertence à Igreja Católica Ucraniana. Atravessando o rio Tamanduateí e a Avenida dos Estados, está o município de São Caetano do Sul, que possui uma forte comunidade ucraniana relacionada àquela da Vila Prudente. Além disso, há nesse município a sede da Igreja Ortodoxa Ucraniana na Grande São Paulo, a Igreja de São Waldomiro, que está localizada na Rua dos Ucranianos, no bairro Barcelona. Mais distante, no Ipiranga, na Rua dos Sorocabanos, ao lado do Museu Paulista, encontra-se a menor de todas as comunidades de cristãos orientais da cidade: a Igreja Católica Russa. De modo geral, as Igrejas Orientais eslavas estão concentradas num mesmo local, no entanto, a comunidade eslava espalhou-se pela cidade, como aponta o depoimento de UC e a presença da Igreja Ortodoxa Russa no Exílio por diversos bairros da cidade. Outra comunidade de cristãos orientais na cidade é a dos armênios. As Igrejas Orientais desse grupo estão localizadas dos dois lados da Avenida Tiradentes, próximo ao centro de São Paulo. Perto do Museu de Arte Sacra está a Igreja São Gregório o Iluminador, pertencente à Igreja Católica Armênia. O santo homenageado por essa igreja não é de origem armênia, e sugere um pouco de como a Igreja Católica Armênia entende-se dentro do cristianismo oriental e armênio. Do outro lado da Avenida Tiradentes está a Igreja Apostólica

31 30 Armênia, que conta com a maior parte dos fiéis armênios cristãos orientais. Um pouco adiante na avenida existe a Praça Armênia, com um monumento às vítimas do Genocídio Armênio e, mais adiante, a estação Armênia do metrô. Assim, essa região está cercada de referências a essa comunidade. Todavia, são poucos os indivíduos de origem armênia que vivem nessa região. Como muitas outras comunidades imigrantes do Bom Retiro, eles deixaram essa região para se instalar em outras da cidade à medida que enriqueceram (como os judeus). Além disso, os dois clubes dedicados à comunidade estão instalados nos bairros de Alto de Pinheiros e Vila Mariana, mostrando não só a distância dessas instituições das igrejas da comunidade (ao contrário do que se vê no caso da comunidade cristã oriental árabe), como também o progresso material por que ela passou, já que esses bairros são considerados áreas nobres da cidade. A maioria dessas Igrejas instalou-se na cidade ao longo da primeira metade do século XX. Porém, no bairro do Jabaquara, na Rua São Borja, está a Igreja de São Marcos. Uma igreja pertencente à Igreja Ortodoxa Copta inaugurada no ano de A comunidade iniciou-se a partir do trabalho de Don Aghason nos primeiros anos da década de e prosperou a ponto de hoje possuir uma igreja. No entanto, a Igreja Ortodoxa Copta na cidade de São Paulo possui uma peculiaridade em relação às demais Igrejas Orientais na cidade, mas isso será analisado mais adiante. A Igreja Ortodoxa Grega da cidade de São Paulo está localizada na Rua do Bresser, no Brás, que, assim como o Bom Retiro, foi um bairro que agregou diversos grupos imigrantes a partir do início do século XX. Outra igreja dessa comunidade está localizada no bairro do Cambuci, na Rua Albuquerque Maranhão. 17 Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Copta da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 22/08/2010.

32 31 Figura 3 - Mapa da cidade com localização das Igrejas Ortodoxas Mapa elaborado pelo autor a partir do Google Maps (

33 32 O mapa apresentado mostra a localização dessas comunidades e suas Igrejas. Elas estão distribuídas em locais específicos e, de alguma forma, moldaram a região à sua volta, pois há uma forte relação entre essas Igrejas e as comunidades étnicas que elas representam. A partir da localização das igrejas é possível compreender melhor a trajetória desses grupos na cidade, seus locais de chegada e o progresso material de alguns grupos. Conhecendo os locais de encontro dessas comunidades percebe-se o quão diverso pode ser o espaço paulistano, e como muitas vezes elementos deste podem nos escapar. 1.2 LADO ORIENTAL DO CRISTIANISMO: IGREJAS ORTODOXAS Este item irá tratar sobre a relação de muitas dessas comunidades com seus locais de origem. Neste primeiro capítulo, será dada ênfase às Igrejas Ortodoxas. As Igrejas Católicas Orientais, por possuírem a peculiaridade de pertencer à Igreja Católica Romana, merecem ser tratadas de forma distinta. As Igrejas Ortodoxas são aquelas Igrejas que no passado mantiveram relações mais estreitas, conturbadas ou não, com o Império Bizantino. Portanto, desenvolveram um cristianismo em conjunto ou em oposição a essa antiga instituição. As Igrejas não Calcedonianas na cidade de São Paulo, como já dito, estão representadas pela Igreja Apostólica Armênia, a Igreja Sirian Ortodoxa e a Igreja Ortodoxa Copta. Elas têm sua origem no cristianismo criado nas fronteiras do Império Bizantino. Assim sendo: As Igrejas não-calcedônicas estão nas áreas a leste e ao sul do Império Bizantino [...]. O coração dessas Igrejas mantém-se na Armênia, Síria, Egito, Sul da Índia, Etiópia e Eritréia mesmo que as mudanças no mapa político e as migrações tenham dispersado as

34 33 Igrejas de forma mais abrangente. Enquanto tendo suas raízes no Cristianismo do Mediterrâneo oriental, elas desenvolveram-se num ambiente político diferente dos das Igrejas Calcedônicas, numa atmosfera cultural não-grega e não-eslava. 19 Esse aspecto fronteiriço marca profundamente essa família de Igrejas Ortodoxas, pois influiu no seu desenvolvimento em oposição às Igrejas Calcedonianas, associadas ao cristianismo do Império Bizantino. Isso criou uma série de conflitos entre o poder de Bizâncio e seu cristianismo, e as Igrejas não Calcedonianas e seu cristianismo periférico e identidade distinta da grega (bizantina): A doutrina monofisita por sua vez entrou na Armênia através da Mesopotâmia e desenvolveu-se rapidamente, principalmente pelo fato de incentivar o nacionalismo, dando assim incentivo para as hostilidades entre os gregos. 20 Assim sendo, o cristianismo monofisita teria chegado à Armênia pela Mesopotâmia, ou seja, teria ocorrido uma troca entre os grupos religiosos na periferia do Império Bizantino, criando uma hostilidade contra os gregos (bizantinos). Isso reforça o fato de que as relações entre as Igrejas não Calcedonianas e Igrejas Calcedonianas foram tensas. Ocorre que, muitas vezes, um aspecto aparentemente doutrinário de uma disputa religiosa pode ter relação com os demais aspectos de uma comunidade, como a busca de afirmação no exercício do poder ou da resistência. Esses grupos não Calcedonianos pareciam estar resistindo para obter uma autonomia em relação ao poder bizantino. 19 BINNS, John. An Introduction to the Christian Orthodox Churches. Cambridge: Cambridge University Press, p KHATLAB, Roberto. As Igrejas Orientais Católicas e Ortodoxas: Tradições Vivas. São Paulo: AM Edições, p.151. Khatlab, assim como a grande parte dos autores que tratam do cristianismo ocidental, é um homem filiado a alguma Igreja, e isso não deve ser deixado de lado, pois implica uma interpretação peculiar que o autor pode atribuir a um evento específico da história das Igrejas Orientais.

35 34 No entanto, deve haver prudência nessa análise, para evitar certos anacronismos. Chamar de nacionalismo a força de identidade que havia entre os armênios direcionada contra os gregos seria um deles. O nacionalismo, como conceituado, foi uma ideia desenvolvida no século XIX; antes disso havia relações de identidade muito diferentes do que seria um nacionalismo 21. Além disso, chamar de monofisitas os cristãos não Calcedonianos deve ser evitado, pois muitos autores consideram o termo pejorativo. Se por um lado os cristãos não Calcedonianos são um ramo das Igrejas Ortodoxas que se desenvolveu em oposição e, posteriormente, fora do mundo bizantino, o cristianismo Calcedoniano surgiu em conjunto, o que não necessariamente significa sem atritos, com o mundo bizantino. Entre as Igrejas pertencentes à família Calcedoniana presentes em São Paulo, duas estão diretamente associadas à estrutura religiosa e administrativa do Império Bizantino (antes Romano): a Igreja Ortodoxa Grega e a Igreja Ortodoxa do Patriarcado de Antioquia. E duas ligadas às missões religiosas bizantinas entre os eslavos: a Igreja Ortodoxa Ucraniana e a Igreja Ortodoxa Russa no Exílio. Essas duas primeiras Igrejas, de alguma forma, têm estrutura eclesiástica semelhante aos modelos administrativos do Império Romano e, posteriormente, Bizantino, apontando para o fato de que elas, como a Igreja Católica Romana, foram instituições oficiais de um poderoso Estado: Com a Cristianização do Império Romano, os bispos das capitais regionais do império adquiriram reconhecimento formal de sua autoridade sobre as igrejas de suas dioceses imperiais. Roma, Alexandria e Antioquia tornaram-se focos organizacionais da igreja, e o bispo de Constantinopla e Jerusalém foram reconhecidos mais tarde como possuindo honra e autoridade similar, especialmente em 21 HOBSBAWM, Eric J. Nações e nacionalismos desde 1780: programa, mito e realidade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990.

36 35 escutando apelos contra bispos locais e em resolvendo disputas entre eles. Nos concílios de Constantinopla I (381) e Calcedônia (451) a sé de Constantinopla foi reconhecida como segunda em honra à Roma, dando aos bispos das duas capitais do império jurisdição preeminente no Oriente e Ocidente respectivamente. 22 Assim, tendo em vista as semelhanças entre a construção do poder estatal e a estrutura eclesiástica, observa-se uma aproximação do passado dessas Igrejas com elementos do poder bizantino. Em São Paulo, a Igreja Ortodoxa Grega está diretamente associada ao Patriarcado de Constantinopla, também chamado de Ecumênico, pela sua primazia em relação às demais Igrejas Orientais Calcedonianas; e a Igreja Ortodoxa do Patriarcado de Antioquia está ligada à Sé Calcedoniana de Antioquia. As Igrejas Ortodoxas eslavas na cidade de São Paulo estão associadas às missões bizantinas na região da planície do rio Volga, na atual Rússia e Ucrânia. Ambas as Igrejas têm uma origem comum: a conversão ao cristianismo bizantino feita pelo príncipe Vladimir de Kiev no século X 23. Com o tempo, essas Igrejas gradativamente separaram-se. Os grupos que foram absorvidos pelo cristianismo ocidental, principalmente pelas mãos do Estado polonês, e posteriormente pela imigração em massa para a América do Norte (principalmente Canadá), formam o cristianismo ucraniano. Os grupos que se mantiveram distantes da influência do cristianismo ocidental desenvolveram o cristianismo russo. Esse cristianismo ucraniano é forte na diáspora, diferentemente do que ocorre na Ucrânia, em que os anos de dominação russa quase o extinguiram. Com a independência ucraniana após o fim da União Soviética, o cristianismo ucraniano foi retomado, principalmente com a ajuda da diáspora. No entanto, existem ainda disputas com um segmento do cristianismo da Igreja do Patriarcado Russo na Ucrânia: 22 PARRY, Ken (et. al.). The Blackwell Dictionary of Eastern Christianity. Oxford: Blackwell, p WARE, Timothy. The Orthodox Church. Londres: Penguin Books, p.78.

37 36 A situação na Ucrânia é especialmente complexa, pois o Patriarcado de Moscou já foi desafiado diversas vezes através do século XX por igrejas Ucranianas "nacionais". A Igreja Ortodoxa Autocéfala Ucraniana surgiu depois de Foi inicialmente tolerada como parte do esforço do governo Soviético de semear dissidências dentro da Igreja Ortodoxa Russa, mas foi tornada clandestina depois de A Igreja Ortodoxa Autocéfala Ucraniana foi brevemente restaurada durante a 2ª Guerra Mundial no início da ocupação do país pela Alemanha Nazista, mas depois foi forçada para o exílio, onde sobrevive nos Estados Unidos. Quando a Ucrânia tornou-se independente em 1991, o líder da Igreja Ortodoxa Autocéfala Ucraniana retornou à Kiev, onde foi proclamado Patriarca de Kiev e de Toda a Ucrânia. A Igreja Autocéfala Ucraniana com sua sede em Kiev, no entanto, não é reconhecida pelo patriarca ecumênico nem pelo Patriarca de Moscou. 24 Hoje na Ucrânia existe uma disputa entre um cristianismo ucraniano, posto na defensiva, e um cristianismo russo, dominante. No entanto, do ponto de vista da organização eclesiástica, nenhuma das Igrejas Ortodoxas eslavas presentes na cidade de São Paulo tem relação direta com essas disputas específicas. Estão sim associadas a elas por compartilharem um passado comum com essas disputas, por isso a importância de ressaltá-las. Mas elas disputam em um ambiente muito distinto do ucraniano. 24 MAGOCSI, Paul Robert. Historical Atlas of Central Europe: From the Early Fifth Century to the Present. Londres: Thames & Hudson, p.220.

38 ORGANIZAÇÃO ECLESIÁSTICA DAS IGREJAS ORTODOXAS Uma vez examinada a relação entre as comunidades étnicas em diáspora na cidade de São Paulo e as suas áreas de origem, falta apresentar a estrutura eclesiástica das Igrejas Ortodoxas de São Paulo, que se inserem em uma rede global de Igrejas. Com relação à Igreja Apostólica Armênia, o Catholicos é o líder supremo da Igreja, no entanto, existem dois Catholicos: o Catholicos Armênio da Cilícia, que vive na Sé de Antelias no Líbano, e o Catholicos de Etchmiadzin, na atual República da Armênia, capital religiosa desse Estado. Durante muito tempo foi o Catholicos da Cilícia que teve a primazia entre as igrejas Armênias ao redor do mundo. Porém, desde o fim da União Soviética, da qual fazia parte a República da Armênia, a Sé de Etchmiadzin, por conta de sua importância histórica na formação do cristianismo apostólico (ou ortodoxo) armênio, começou a liderar 25. No caso da cidade de São Paulo, nos últimos trinta anos, houve mudanças significativas na estrutura eclesiástica da Igreja Apostólica Armênia, como aponta AO: Até 1980, a Diocese do Brasil estava ligada à Diocese da Argentina, ou melhor, à Diocese da América do Sul, cuja sede diocesana estava instalada em Buenos Aires. Mas no ano de 80, foi necessário separar as dioceses da América do Sul e por ordem do Cathólicós, Patriarca 25 BAILEY, Betty Jane; BAILEY, J. Martin. Who are the Christians in the Middle East. Cambridge: William B. Eerdman s, p.68.

39 38 Supremo dos Armênios, quando visitou a América do Sul ele instalou os três países com suas próprias dioceses, ou seja, Argentina, Brasil e Uruguai. A Argentina cuida também do país Chile onde temos uma pequena comunidade e o Uruguai também tem sua própria diocese e Brasil também tem sua própria diocese. 26 Pelo depoimento é possível observar a importância que possui a comunidade armênia da Argentina, e isso não ocorre somente no caso da Igreja Apostólica Armênia. Grande parte das Igrejas Orientais Paulistanas tem como lideranças locais os membros do clero de suas Igrejas localizadas na Argentina, indicando que naquele país houve grandes diásporas de cristãos orientais, às vezes maiores que no Brasil. No entanto, o depoimento também aponta a importância da comunidade apostólica armênia no Brasil, que, por ordem do Patriarca Supremo dos Armênios, o Catholicos de Etchmiadzin, ganhou uma diocese independente a partir da década de 80. Essa reorganização das dioceses da América do Sul ocorreu no mesmo período de fortalecimento do Catholicos da República da Armênia, em detrimento do Catholicos da Cilícia. Esse fortalecimento institucional e eclesiástico da Igreja Apostólica Armênia no Brasil continuou durante a década de 1980, pois, como aponta AO: E no ano 84, o sacerdote que estava indicado aqui como representante da Igreja Armênia, como chefe da Igreja Armênia da comunidade, foi ordenado como bispo e foi o primeiro bispo diocesano de São Paulo Depoimento de membro do clero da Igreja Apostólica Armênia da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 08/02/ Depoimento de membro do clero da Igreja Apostólica Armênia da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 08/02/2010.

40 39 Assim, a Igreja Apostólica Armênia ganhou um bispo próprio, representante do Catholicos de Etchmidzin na cidade, mostrando a preponderância desse Catholicos em São Paulo. Na entrevista AO também fala da importância de certas instituições para a manutenção da comunidade na cidade: E hoje ao lado da Igreja existe também a escola que tem 81 anos essa escola, e mantém sua missão para a nova geração da comunidade. Ensinando junto com o ensino brasileiro, a língua portuguesa, o armênio também. Uma instituição colegial em São Paulo. Neste momento no Brasil, existem mais ou menos 35 a 40 mil armênios, cujo 95% estão em São Paulo. 28 AO observa a importância de uma escola para manter a missão para as novas gerações, para preservar o que seria uma cultura armênia necessária para conservar a fé cristã apostólica armênia. Como na metáfora do Iconostasis Paulistano, o membro do clero está no lado voltado para o altar do Iconostasis, local da necessidade de manutenção da identidade cultural e da fé. No entanto, a contingência da cidade obriga-os a repensar estratégias para a manutenção desses elementos, e uma escola é uma estratégia. O apontamento sobre a longevidade dessa instituição escolar mostra o orgulho do membro com o sucesso de sua estratégia para manter os elementos, que ele acredita serem necessários, do cristianismo apostólico armênio. 28 Depoimento de membro do clero da Igreja Apostólica Armênia da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 08/02/2010.

41 40 Outro fator citado nesse trecho do depoimento de AO é com relação à quantidade de armênios no país e sua distribuição. Observa-se que a comunidade armênia no Brasil possui aproximadamente 40 mil membros e que está fundamentalmente localizada na cidade de São Paulo 29, sugerindo que, diferentemente das comunidades árabes ou ucranianas, esse grupo de cristãos orientais no país é essencialmente paulistano. Outra Igreja Ortodoxa não Calcedoniana na cidade é a Igreja Ortodoxa Sirian. Essa Igreja tem sua sede localizada na cidade de Damasco, na Síria, e a denominação de seu líder é Patriarca de Antioquia. Será observada no presente trabalho a reivindicação do título de Patriarcado de Antioquia pela liderança de todas as Igrejas de origem árabe na cidade: Católica Melquita, Católica Maronita, Sirian Ortodoxa e, é claro, a Igreja do Patriarcado Ortodoxo de Antioquia. Isso sugere uma disputa de uma memória identitária entre essas Igrejas, como também os diversos conflitos ocorridos entre elas. A Igreja Sirian Ortodoxa desenvolveu-se em oposição às Igrejas Melquita e Maronita, que são católicas, e a Igreja do Patriarcado Ortodoxo, que é Calcedoniana. Essa Igreja, diferentemente de sua irmã Apostólica Armênia, está espalhada de forma diversa no território nacional, conforme indica o depoimento de SO: Mas temos aqui em São Paulo duas Igrejas, a Igreja Sirian Ortodoxa Santa Maria e a Igreja Sirian Ortodoxa São João Batista, e temos em Campo Grande a Igreja São Jorge, e em Belo Horizonte a Igreja São Pedro Além da comunidade na cidade de São Paulo, existe uma comunidade numerosa no município de Osasco, na Grande São Paulo, especialmente no bairro de Presidente Altino. Fora de São Paulo há uma pequena comunidade em Campo Grande - MS. 30 Depoimento de membro do clero da Igreja Sirian Ortodoxa da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 12/02/2010.

42 41 Figura 4 - Igreja Ortodoxa Sirian de Santa Maria na rua Padre Mussa Tuma. 31 O depoente cita uma diversidade de comunidades ligadas à Igreja Sirian Ortodoxa estabelecidas no Brasil, no caso, além de São Paulo, Mato Grosso do Sul e Minas Gerais. Na cidade de São Paulo, a Divina Liturgia dominical é celebrada na igreja São João Batista e os casamentos, na igreja Santa Maria. Outro elemento de destaque, como aponta SO, na formação dessa Igreja na cidade de São Paulo é a preservação dos restos mortais de Musa Tuma, homenageado com o nome da rua onde se localiza a igreja de Santa Maria: Começou a história do nosso povo aqui em São Paulo e o primeiro pároco que veio foi o padre Musa Tuma, o falecido padre Musa Tuma, e onde nós temos os restos mortais na Igreja Sirian Ortodoxa Santa Maria Autor: Felipe Beltran Katz. Data: 16/9/ Depoimento de membro do clero da Igreja Sirian Ortodoxa da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 12/02/2010.

43 42 Musa Tuma seria um indivíduo de importância para a memória dessa comunidade e também como fundador desta. A preservação de seus restos mortais em uma das igrejas da comunidade seria indício disso. A presença dessa relíquia seria um elemento de busca da preservação dessa fé e identidade sirian ortodoxa, ou seja, mais uma estratégia desses membros do clero para cumprir a função que muitos deles assumem de guardião dessa identidade e fé específica. Além das Igrejas Apostólica Armênia e Sirian Ortodoxa, há a terceira Igreja paulistana da família das Ortodoxas não Calcedonianas: a Igreja Ortodoxa Copta, a mais nova a estabelecer-se na cidade. Essa Igreja tem sua sede no Cairo, capital do Egito, e seu Patriarca denomina-se Patriarca de Alexandria. Segundo CO, a relação entre ela e a comunidade egípcia na cidade, de início, não pareceu muito proveitosa: O povo egípcio veio aqui muito tempo atrás, na época do presidente Gamar Abdel Nasser. Nós chegamos aqui muito tarde, só... A maioria deles foi casado com brasileiras, morando em vários Estados aqui no Brasil. Tentei com eles várias vezes para aparecer, alguns deles apareceram. Só tenho amizade com eles por telefone, ou na maioria eles não aparecem. Porque você sabe, o Brasil está muito livre e a maioria não se interessa pela Igreja mais Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Copta da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 22/08/2010.

44 43 Nesse trecho do depoimento encontram-se alguns elementos acerca da existência da Igreja Copta na cidade de São Paulo: a ocorrência de uma comunidade cristã oriental egípcia no país e sua pouca relação com a Igreja recentemente instalada na metrópole. No entanto, parece que a relação que essa Igreja tem com a cidade é distinta daquela verificada na maioria das Igrejas Orientais instaladas em São Paulo. É importante ressaltar o descontentamento de CO em relação ao que ele denomina de muito livre, o Brasil seria um país muito livre. Mais uma vez está presente o compromisso do membro do clero com sua missão como guardião dessa cultura necessária à manutenção da fé. Essa indignação com a liberalidade excessiva do país é uma reclamação sobre as contingências que vive essa Igreja e a comunidade copta egípcia à qual ele está estreitamente relacionado. Todavia, a maneira de aproximação da Igreja Copta com os habitantes da cidade de São Paulo, como será apresentado no próximo item, está bem distante da relação entre ela e sua comunidade egípcia original. Agora será dada ênfase às Igrejas Ortodoxas Calcedonianas da cidade de São Paulo, começando com a Igreja Ortodoxa Grega. Sobre essa Igreja pode-se ressaltar que não possui relação eclesiástica com a Igreja Ortodoxa Grega na Grécia; ela está inteiramente associada ao Patriarcado Ecumênico de Constantinopla: Nós pertencemos à Igreja Grega, Grega, não da Grécia. Porque a Igreja da Grécia é uma Igreja autônoma, ela tem um Arcebispo Primaz que hoje chama Ieronymos... Aliás a Igreja Grega até, por incrível que pareça, ela como Igreja autocéfala ela é jovem. A Grécia foi libertada, ou se libertou dos turcos em 1821, um ano antes da nossa independência aqui de Portugal; mas parece-me que a independência da Igreja Grega como Igreja autônoma se deu em 1850 parece, ela é

45 44 jovem, como Igreja que tem um sínodo próprio que tem um arcebispo chefe Primaz. 34 Essa criação de uma Igreja Grega independente do Patriarcado de Constantinopla deve-se às lutas nacionalistas ocorridas no início do século XIX 35. Contudo, segundo GO, o Patriarcado Ecumênico possui jurisdição sobre algumas regiões na Grécia e a diáspora grega ao redor do mundo: Pois bem, ou seja, os gregos fora da Grécia eles obedecem ao Patriarca Ecumênico, os gregos na Grécia obedecem o arcebispo de Atenas, exceto os gregos do norte da Grécia... Apesar de ser uma terra antiquíssima, vamos dizer: Tessalônica, Macedônia, aquela região toda ali. Mas como, uma vez independente a Grécia dos turcos, aquele território ainda ficou sob o regime turco. Depois que veio a liberdade, a libertação... Como também as ilhas, vamos dizer: Rodes, não sei o que. Então estas terras, apesar de serem antiquíssimas, mas como liberdade são terras novas, então as terras novas, ou seja, Tessalônica e todo o norte da Grécia, Monte Athos, Agios Oros, também, pertencem ao Patriarca Ecumênico [...]. 36 A liderança regional dessa Igreja em São Paulo é exercida pela diocese Ortodoxa Grega de Buenos Aires, apontando mais uma vez para o fato de que é na Argentina que muitas sedes das Igrejas Orientais Paulistanas estão localizadas. No Brasil, segundo GO, a Igreja possui representações nas principais capitais do Centro-Sul: 34 Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Grega da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 17/08/ No processo de independência grego, o Patriarca de Constantinopla estava associado ao Estado Otomano, portanto, o clero que apoiou o movimento de autonomia grego organizou uma Igreja Grega nacional. BINNS, John. An Introduction to the Christians Orthodox Churches. Cambridge: Cambridge University Press, p Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Grega da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 17/08/2011.

46 45 Muito bem, agora nós temos em Brasília, temos uma comunidade, temos em São Paulo a catedral na rua Bresser 793, temos aqui no Cambuci, que é a paróquia dedicada à missão de Nossa Senhora, a Mãe de Deus, Theotokos, na rua Albuquerque Maranhão 211, Cambuci [entrevistado se identifica]; temos em Vitória, Rio de Janeiro, Paraná, Santa Catarina, Florianópolis, agora estão abrindo uma outra comunidade em Joinville, e Rio Grande do Sul. 37 A outra Igreja na cidade de São Paulo associada a um Patriarcado Ortodoxo Calcedoniano é a Igreja do Patriarcado de Antioquia. A sede mundial dessa Igreja se localiza em Damasco, na Síria, e a sede nacional está na própria cidade de São Paulo, na famosa igreja de cúpula dourada no bairro do Paraíso. A Igreja do Patriarcado Ortodoxo da Antioquia talvez seja a Igreja Ortodoxa mais bem representada no país, com paróquias no interior do Estado de São Paulo, Sudeste, Sul e Centro-Oeste do país, acompanhando a imigração sírio-libanesa nessas regiões. Sobre as relações eclesiásticas entre os Patriarcados Ortodoxos Calcedonianos de Constantinopla e de Antioquia, PO relata: Da parte da Igreja Grega, o que há, por causa do Patriarcado de Constantinopla, é o um primado de honra, não há um primado de jurisdição. Então a nossa relação com os gregos é a mesma que com todos os outros ortodoxos que estejam presentes no Brasil, onde quer que haja também a nossa Igreja Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Grega da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 17/08/ Depoimento de membro do clero da Igreja do Patriarcado Ortodoxo de Antioquia da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 07/07/2010.

47 46 PO destaca um assunto já há muito tempo debatido, que é a relação hierárquica entre os Patriarcados Ortodoxos Calcedonianos (da qual, em última instância, o Papa de Roma faria parte como o Patriarca de Roma). Para PO, a relação entre sua Igreja e o Patriarcado de Constantinopla é marcada por uma subordinação relativa à honra, ou seja, simbolicamente, Constantinopla seria superior à Antioquia. Isso, segundo PO, não implica uma sujeição pela jurisdição, ou seja, Antioquia não está subjugada aos interesses de Constantinopla. Entretanto, como será observado mais adiante, a relação da hierarquia dos Patriarcados Calcedonianos na diáspora é conturbada. A Igreja Ortodoxa Ucraniana na cidade de São Paulo também está sob a jurisdição do Patriarcado de Constantinopla, diferentemente do que ocorre na Ucrânia, pois lá se encontram Patriarcados Ucranianos. Essa Igreja está fundamentalmente associada à diáspora ucraniana na América do Norte 39 e tem sua sede no Brasil na cidade de Curitiba, no Paraná, onde a comunidade ucraniana ortodoxa é bem maior do que em São Paulo. Outro elemento de destaque é que todas as igrejas dessa comunidade estão localizadas no município de São Caetano do Sul: a igreja de São Valdomiro, a principal, e a igreja de Proteção de Nossa Senhora, onde ocorre a Divina Liturgia. A Igreja Ortodoxa Russa no Exílio vive uma situação eclesiástica distinta. Esse complemento no Exílio denota um elemento que a difere da Igreja Ortodoxa Russa na Rússia. Não há relação entre essas Igrejas. Além disso, a sede eclesiástica dessa Igreja encontra-se em um país que há poucos anos não possuía boas relações com a Rússia. Segundo 39 A origem dessa Igreja está nas áreas cristianizadas da planície do Volga que ficaram longe do alcance da Igreja Ortodoxa Russa e seu patriarca, portanto, estavam sob a jurisdição do Patriarca de Constantinopla. Quando, no século XIX, esses grupos emigraram para a América do Norte (em maior parte) e América do Sul (menor parte), a jurisdição continuou, enquanto que na Ucrânia os cristãos ortodoxos foram absorvidos na Igreja Ortodoxa Russa. Com o fim da União Soviética, muitas das Igrejas Ucranianas da diáspora estão se estabelecendo na Ucrânia. PARRY, Ken (et. al.). The Blackwell Dictionary of Eastern Christianity. Oxford: Blackwell, p

48 47 RO: Sim. A sede é nos Estados Unidos, o nosso metropolita, o cabeça da nossa Igreja é nos Estados Unidos. A sede aqui no Brasil da Diocese Brasileira, aqui na Rua Tamandaré. 40 Como aponta RO, a sede de sua Igreja está localizada nos Estados Unidos, especificamente na cidade de Nova York. Isso seria aparentemente antagônico, no entanto, como mais tarde será abordado, as relações entre essa Igreja Ortodoxa Russa no Exílio e a Igreja Ortodoxa Russa na Rússia (ou do Patriarcado Ortodoxo Russo) explicam por que ela escolheu um país rival da Rússia como local de sua sede. A representação da Igreja Ortodoxa Russa no Exílio no país é essencialmente paulistana, pois as demais comunidades russas no Brasil estão associadas à Igreja do Patriarcado de Moscou, com sede no Rio de Janeiro e com sua sede latino-americana em Buenos Aires 41. Isso sugere uma especificidade do cristianismo ortodoxo russo de São Paulo. Com esses apontamentos, pode-se obter um entendimento mais claro de como estão organizadas de forma eclesiástica as comunidades cristãs ortodoxas da cidade de São Paulo, suas relações com o cristianismo de seus locais de origem e como essas Igrejas fazem parte de uma comunidade global, à qual estão associadas por laços de afinidade em intensidades variadas. Com esse primeiro olhar tem-se a impressão de que essas Igrejas agem de acordo com esses laços internacionais, como se recebessem ordens de seus superiores mundiais ou latino-americanos. Porém, esse seria apenas um lado do movimento dessas Igrejas na sua vivência paulistana. Essa é a metáfora do Iconostasis Paulistano, ou seja, estar num espaço intermediário entre seguir as diretrizes impostas pelos superiores eclesiásticos e adaptá-las à realidade paulistana, o poder de mediar relações que essas Igrejas possuem. 40 Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Russa no Exílio da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 24/02/ Depoimento de membro do clero da Igreja Russa Católica da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 14/02/2010.

49 48 Desse modo, será importante ressaltar os dois lados desse processo: a trama global em que essas Igrejas estão inseridas; e, posteriormente, a adaptação à especificidade paulistana. Assim sendo, torna-se necessário compreender como essas comunidades diaspóricas deixaram seus lugares de origem e se estabeleceram nessa cidade, procurando, por intermédio dos membros do clero, reestruturar e realocar no horizonte paulistano essas Igrejas Ortodoxas. 1.4 FORMANDO UMA κοινóτητα PAULISTANA Nos depoimentos dos membros do clero das Igrejas Ortodoxas de São Paulo emerge o tema do restabelecimento das comunidades imigrantes cristãs na cidade. Nesta parte do estudo, como em outras deste capítulo, será dada ênfase às Igrejas Ortodoxas, pois, diferentemente das Igrejas Católicas Orientais, elas não tiveram o apoio da Igreja Católica Romana para se estabelecerem na cidade, muito embora os fluxos imigratórios dessas comunidades cristãs ortodoxas estejam relacionados com as comunidades católicas orientais, como no caso de armênios e ucranianos. Na fala dos membros do clero sobre esse tema é possível mais uma vez notar o papel que esses indivíduos atribuem a si próprios de guardiões de uma identidade e fé do grupo diaspórico que representam. Uma memória que guardaria a experiência de reorganização desses grupos na capital paulista. Grande parte dos cristãos ortodoxos chegou à cidade em busca de um ambiente político mais favorável ou, em casos mais extremos, procurando preservar a sua própria existência. Diferentemente dos fluxos imigratórios mais reconhecidos, esses grupos cristãos ortodoxos deixaram seu país de origem a partir do início do século XX até pouco mais da

50 49 segunda metade do século XX. Salvo os grupos árabes, que imigraram a partir do século XIX, como a maioria das grandes imigrações ocorridas na cidade. Esse grupo cristão ortodoxo, como já dito, tem origem nas áreas do Oriente Médio e Europa Oriental. Esses locais passaram por mudanças radicais ao longo do século XX. Sofreram a influência de movimentos nacionalistas, socialistas e nazistas, e isso marcou de forma indelével as comunidades que ali viviam. Para muitos grupos, isso significou banimentos e perseguições políticas e até mesmo genocídios, e talvez os grupos cristãos ortodoxos e orientais em geral tenham sido o alvo principal de muitas das atitudes desmedidas vistas no passado e no presente nessas regiões. Quando chegaram a São Paulo, procuraram restabelecer vínculos antigos, uma certa coesão, ou reorganizar a κοινóτητα (koinótēta), palavra grega que significa comunidade : Então sempre todas as colônias, elas sempre construíram um templo, e no templo desenvolvem tudo. Tanto é que se chama koinótēta, uma comunidade aonde ali se reúne, ali eles falam a língua, ali fazem as festas, festas religiosas, festas cívicas, enfim, é um ponto de encontro. 42 O depoimento de GO apresenta esse conceito caro aos cristãos orientais na cidade. Mas, por mais que tentem manter a koinótēta original, os membros do clero devem mediar a realidade paulistana que os rodeia. Os cristãos ortodoxos armênios são um grupo cuja trajetória permite ter uma ideia de quão trágica foi a causa da vinda de muitos desses grupos cristãos ortodoxos à cidade de São Paulo. Segundo AO, 42 Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Grega da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 17/08/2011.

51 50 A Igreja Armênia no Brasil começou no princípio do século 20, principalmente depois do Genocídio Armênio que aconteceu na Turquia, de onde os armênios fugiram de todas as partes do mundo e uma pequena parte veio também para o Brasil. E na década de 20 do século XX, começaram a se reorganizar os armênios que se radicaram no Brasil. 43 Neste depoimento é citado algo que está no horizonte dos membros do clero das Igrejas Orientais Armênias da cidade de São Paulo e talvez do mundo, um acontecimento que marca profundamente a trajetória dos armênios: o Genocídio Armênio ocorrido em Foi esse evento que, segundo AO, fez com que armênios de várias partes do mundo emigrassem para o Brasil, principalmente para São Paulo, na década de 20 do século XX. Esses elementos apontam para o fato de que essa imigração armênia foi mais uma forma de preservação desse grupo. AO continua a falar sobre a imigração armênia: A primeira preocupação dos Armênios foi instalar uma escola para manter a língua, a cultura e as tradições armênias. Mas os Armênios, que são todos em sua totalidade cristãos porque foi também a primeira nação que adotou o cristianismo como religião de Estado no ano 301, não podiam ficar sem a Igreja. Através da fé, através da língua, através da cultura e da história milenar, eles resistiram e resistem até hoje Depoimento de membro do clero da Igreja Apostólica Armênia da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 08/02/ Depoimento de membro do clero da Igreja Apostólica Armênia da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 08/02/2010.

52 51 Com este relato pode-se notar a relação forte que os membros do clero oriental paulistano percebem entre fé, identidade cultural e a koinótēta. Segundo os apontamentos de AO, a primeira preocupação é a manutenção e preservação das tradições armênias e da fé. A reiteração de AO em afirmar a qualidade cristã da comunidade armênia sugere que esse elemento é importantíssimo na construção da memória do grupo. Assim sendo, ele destaca o pioneirismo armênio em escolher a fé cristã como a sua, afirmando que há uma história milenar desse cristianismo armênio. Uma história de resistência, como afirma o membro do clero. O Genocídio Armênio teria sido mais uma prova de resistência que os armênios tiveram de enfrentar para manter sua fé e cultura, e mais uma vez foram vencedores, pois, como o depoente afirma, [...] eles resistiram e resistem até hoje. A sobrevivência ao Genocídio com a imigração é uma conquista, pois a memória dessa comunidade caracteriza-se pela resistência. Outro elemento que denota a resistência armênia com o Genocídio é o entendimento de que este ainda não teria sido reconhecido totalmente: Graças à história milenar do povo armênio que os armênios têm uma fama no Brasil, como em outros países, como gente trabalhadora, como bons cidadãos e em toda parte os armênios são considerados bons cidadãos, e por isso que muitos países apoiaram e reconheceram o Genocídio Armênio. Ainda estamos com a esperança de que algum dia a nossa pátria Brasil também oficialmente reconhecerá a verdade e declarará, defendendo o direito dos armênios. Porque defender os armênios é defender os Direitos Humanos, não pertence só aos armênios, não é problema dos turcos, é um problema humano. Para que não se repita os genocídios, devem condenar ou aceitar os seus. Quando os turcos cometeram o Genocídio Armênio massacrando 1,5 milhão de armênios simplesmente porque eram armênios e cristãos. Mas o mundo cristão ficou calado, por motivos, cálculos políticos, até

53 52 hoje estão silenciosos, não deixaram nada defendendo os direitos dos armênios. 45 AO faz um apelo para que muitos países, inclusive o Brasil, reconheçam o Genocídio Armênio, quando 1,5 milhão de armênios foram mortos pelos turcos. Na avaliação de AO, o reconhecimento e a condenação do Genocídio não é somente uma condenação à morte dos armênios, mas sim uma condenação de todos os genocídios humanos, uma forma de defender os Direitos Humanos. O apelo de AO pelo reconhecimento do Genocídio Armênio reflete o poder que esse evento possui na construção da comunidade armênia na cidade de São Paulo, como também denota uma atitude de AO como membro do clero da Igreja Apostólica Armênia que entende sua posição como guardião dessa memória e da koinótēta. A Igreja Ortodoxa Sirian também foi vítima de perseguição. Segundo SO, A presença da Igreja Sirian Ortodoxa de Antioquia aqui no Brasil, podemos dizer que começou no início do século XX. Então a maioria do povo veio da Turquia, da Palestina, da Síria, do Iraque, do Líbano, da Jordânia [...]. 46 Isso ocorreu porque as comunidades sirian ortodoxas dessas regiões sofreram, pelas mãos dos turcos, o mesmo ataque que seus coirmãos armênios: 45 Depoimento de membro do clero da Igreja Apostólica Armênia da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 08/02/ Depoimento de membro do clero da Igreja Sirian Ortodoxa da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 12/02/2010.

54 53 As primeiras intimidações vieram com a repressão sangrenta dos Armênios em Os massacres, no entanto, não eram limitados aos Armênios, e os Cristãos Sirians da região também sofreram terríveis perdas. Os dados variam, mas um relato contemporâneo coloca o número de Sirians mortos em , incluindo queimados vivos na catedral de Edessa (Urfa), onde eles buscaram refúgio. Ainda mais terrível foram os massacres perpetrados de forma disfarçada pela Primeira Guerra Mundial em Uma vez mais, juntamente com o genocídio Armênio, Cristãos das igrejas Sirians pereceram em grande número. [...] Os dados fornecidos pelo Bispo (mais tarde Patriarca) Ephrem Barsaum em 1919 colocam os dados somente para as perdas dos Sirians Ortodoxos em mais de , mais de um terço de sua população no Oriente Médio. 47 Esse massacre, assim como o ocorrido contra os armênios, obrigou os grupos sirian ortodoxos a migrarem como estratégia de sobrevivência. No depoimento, SO pouco falou desse ocorrido, ao contrário de seu colega da Igreja Apostólica Armênia. Independentemente disso, é prudente ter em mente que esses acontecimentos mostram o trauma que essas comunidades e Igrejas levam consigo, e como isso as obrigou a imigrarem, preservando, porém, a koinótēta. A outra Igreja não Calcedoniana presente em São Paulo, que sofreu e ainda sofre com perseguições em seu local de origem, é a Igreja Ortodoxa Copta, a principal Igreja do Egito. Essa população cristã representa uma minoria no país. No entanto, é uma Igreja perseguida, tanto de forma oficial como extraoficial. O próprio atual líder dessa comunidade, Papa Chenuda III, sofreu perseguição oficial durante o governo do presidente egípcio Anwar Al Sadat, que governou o país entre 1971 e O'MAHONY, Antony. Syriac Christianaty in the Modern Middle East. In: ANGOLD, Michel (Org.). The Cambridge History of Christianity - Eastern Christianity. Cambridge: Cambridge University Press, p.512.

55 54 No dia 5 de setembro de 1981, após vários conflitos, o Presidente Sadat destituiu o Patriarca Chenuda III e nomeou em seu lugar um conselho Papal de cinco membros. [...] Em 23 de setembro de 1981 Sadat declarou oficialmente a destituição do Patriarca Chenuda III e juntamente com ele foram presos oito bispos e treze sacerdotes em um mosteiro no deserto. O reconhecimento novamente do Patriarca Chenuda III aconteceu somente em 1985 com o Presidente Moubarak. 48 Além desse momento apreensivo, os cristãos coptas do Egito vivem até hoje perseguição. Isso pode ser observado nos recentes acontecimentos ocorridos com essa comunidade naquele país, como o atentado à Igreja dos Santos em Alexandria na passagem do ano de 2010 para e os conflitos entre grupos muçulmanos e cristãos durante o delicado momento político do Egito no ano de Toda essa perseguição e violência contra esse grupo ratifica a importância da fomentação de missões coptas ao redor do mundo, inclusive na cidade de São Paulo. Segundo um depoimento gravado em vídeo pelo bispo da Igreja Ortodoxa Copta na cidade de São Paulo, Don Aghasson, na Igreja de São Marcos em Washington, nos EUA, a missão teria começado de forma particular. Ao contrário do que ocorreu com os outros párocos incumbidos de criar uma missão copta no Brasil, Don Aghasson recebeu somente uma passagem de ida para o país, ou seja, foi obrigado a ficar em São Paulo e criar a missão 51. O resultado foi satisfatório e hoje a comunidade conta com uma igreja própria. 48 KHATLAB, Roberto. As Igrejas Orientais Católicas e Ortodoxas: Tradições Vivas. São Paulo: AM Edições, p EFE. Hizbollah condena atentado contra igreja no Egito. Folha de São Paulo. Mundo. São Paulo, 01/01/ AGÊNCIAS DE NOTÍCIAS. Mortes em confronto entre cristão e muçulmanos no Egito chegam a 13. Folha de São Paulo. Mundo. São Paulo, 09/03/ GOOGLE VÍDEOS. On Mission in Brazil. Disponível em: < &hl=en#>. Acesso em: 11/8/2010.

56 55 Todavia, diferentemente das demais comunidades cristãs orientais em São Paulo, os cristãos coptas paulistanos não têm origem numa diáspora egípcia na cidade. Como CO relatou, houve muita dificuldade em contatar esse grupo quando do estabelecimento da igreja na cidade. Portanto, a missão foi direcionada a grupos não egípcios e prosperou. Essa atitude da Igreja Ortodoxa Copta de abrir-se inteiramente, abrangendo indivíduos fora do grupo cultural e religioso a que está tradicionalmente associada, seria uma forma de manter essa Igreja em áreas distantes do Egito, onde ocorriam perseguições. O detalhe sobre a passagem só de ida para o Brasil que Don Aghasson recebeu possibilita vislumbrar a importância extrema que a missão no país tinha para a cúpula da Igreja Ortodoxa Copta. Aumentar seus fiéis fora do Egito seria uma forma de a Igreja Copta preservar sua fé e sua identidade cultural específica. Expandir e criar uma koinótēta nova, distinta da copta egípcia. segundo GO, à: O grupo grego também emigrou devido às dificuldades sociais em seu país, ligadas, [...] guerra civil, com a queda do rei. Então, muitos fugiram porque estavam, vamos dizer, com correntes partidárias um pouco adversas, então fugiram. Muitos vieram para cá mesmo para o trabalho, porque empobreceu muito a Grécia, como hoje está, uma situação crítica, não somente a Grécia, mas também grandes países da Europa. 52 A Guerra Civil Grega da década de 1950, a queda da monarquia e a posterior instalação de uma ditadura na Grécia, nos anos 1970, motivaram a emigração desses grupos para São Paulo. GO também comenta sobre a atual situação econômica grega, apontando para uma possível nova emigração. 52 Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Grega da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 17/08/2011.

57 56 A comunidade sírio-libanesa que está associada à Igreja do Patriarcado Ortodoxo de Antioquia tem como motivo principal de sua imigração para São Paulo a busca de um refúgio, já que guerras assolaram a região do Levante durante todo o século XX, especialmente a Guerra Civil Libanesa, que durou quase 20 anos e devastou o país por completo. Segundo MK, membro da Igreja coirmã mais próxima da Igreja Ortodoxa de Antioquia: A maioria que estão aqui são de origem libanesa. Os sírios temos uma parte grande, mas não chega a ser comparada pelo número dos libaneses por causa da guerra, ou seja, da Primeira Guerra Mundial, Segunda ou última atual nos anos 70 no Líbano. Muitos libaneses acabaram viajando para países exteriores, inclusive o Brasil, que recebeu uma grande quantidade de pessoas. 53 A comunidade cristã oriental árabe, mesmo distribuída entre várias denominações, portanto, tem na busca de um refúgio ou na fuga desses conflitos uma motivação comum para sua vinda para São Paulo. Por sua vez, a Igreja Ortodoxa Ucraniana e os grupos ucranianos, assim como os demais cristãos orientais da metrópole, refugiaram-se na cidade tentando recuperar suas filiações culturais após a Segunda Guerra Mundial. Segundo UO: 53 Depoimento de membro do clero da Igreja Católica Melquita da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 20/05/2010.

58 57 Falando de modo geral, a comunidade Ortodoxa Ucraniana aqui em São Caetano são todos eles, digamos assim, fora os que nasceram aqui no Brasil, mas os primeiros que vieram, são pessoas assim, ditas da segunda imigração. Porque tem os imigrantes da primeira imigração, esses aqui de São Paulo são os ucranianos que vieram depois da Segunda Guerra Mundial, quando acabou a Segunda Guerra, o pessoal que estava na Alemanha, que os nazistas levaram para a Alemanha [...] Então, e alguns ainda remanescentes da imigração que veio depois da Segunda Guerra, outros nascidos na Alemanha e outros nascidos aqui no Brasil. 54 Esse grupo ucraniano no município de São Caetano é composto por famílias que foram usadas como força de trabalho compulsório pela Alemanha nazista, ou seja, esse grupo, somente pelo fato de ser ucraniano, foi cooptado pelos nazistas para realizar os mais ingratos serviços. UO indica que muitos indivíduos da comunidade nasceram na Alemanha, ou seja, muitos nasceram enquanto seus pais estavam realizando trabalhos forçados para os nazistas. Com o fim da guerra, decidiram se transferir para países com comunidades ucranianas significativas: Enfim, quando terminou a guerra, uns foram para o Canadá, outros para os Estados Unidos e alguns vieram para o Brasil. A comunidade daqui especificamente de São Caetano, são pessoas que vieram depois da Segunda Guerra e se estabeleceram aqui em São Caetano. Foi na década de 50 que começaram a construir, construíram essas duas igrejas aqui em São Caetano [...] Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Ucraniana do município de São Caetano do Sul, em entrevista concedida ao autor em 18/04/ Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Ucraniana do município de São Caetano do Sul, em entrevista concedida ao autor em 18/04/2010.

59 58 Figura 5 - Igreja Ortodoxa Ucraniana de São Valdomiro em São Caetano do Sul. 56 Essas Igrejas referidas são especificamente Igrejas Ortodoxas. Os grupos Católicos Orientais Ucranianos, que têm uma trajetória igual à do grupo ortodoxo, também possuem uma Igreja própria. UO explica o porquê da escolha de São Caetano como local para o estabelecimento dessa comunidade: Eles vieram aqui e se estabeleceram por causa do emprego. Se você for ver, todas as pessoas que são já aposentadas, todas elas, a maioria, trabalhou nas montadoras da época, antiga Vemag e outras que existiam. Então o trabalho aqui era farto realmente, então eles se estabeleceram aqui, eram pessoas pobres, que começaram do nada, mas construíram essas duas comunidades: a São Valdomiro e a Proteção de Nossa Senhora Autor: Felipe Beltran Katz. Data: 7/9/ Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Ucraniana do município de São Caetano do Sul, em entrevista concedida ao autor em 18/04/2010.

60 59 A nascente indústria da região paulista do ABC teria influído na ida desses imigrantes ucranianos para essa região, pois havia trabalho farto. Muitos desses imigrantes teriam se empregado na fábrica de filtros industriais Vemag, entre outras. Segundo UO, foi a partir da inserção no processo industrial da metrópole que esse grupo ucraniano ortodoxo, que começou do nada, pôde reestruturar sua comunidade, construindo suas Igrejas e tentando recuperar o que havia perdido. Essa situação da comunidade ucraniana na metrópole paulistana contrasta com a dos grupos ucranianos que vivem no sul, região que recebeu a maior parte dos imigrantes ucranianos no país: No sul, precisamente em Curitiba, região de Prudentópolis, e outros municípios daquela redondeza, como os próprios livros de História já nos mostram, eles são os descendentes, falando em ucraniano, Sperchi Immigraja, da primeira imigração, é o termo que se usa. [...] O restante, filhos desses primeiros imigrantes. O restante aqui em São Paulo todos, pelo menos que eu saiba, que eu conheça, imigrantes da chamada Segunda Imigração, que é quando acabou a Segunda Guerra. 58 O grupo sulista (ou paranaense) está associado à primeira imigração, ou seja, a uma imigração ocorrida na virada do século XIX para o XX, caracterizada por ser rural. A segunda imigração, a ocorrida em São Caetano, é uma imigração urbana, motivada pela perseguição e imposição sofridas pelas comunidades ucranianas durante a Segunda Guerra pelas mãos dos nazistas. Os russos ortodoxos, assim como os ucranianos, também sofreram destino parecido. 58 Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Ucraniana do município de São Caetano do Sul, em entrevista concedida ao autor em 18/04/2010.

61 60 A Igreja Ortodoxa Russa no Exílio, a representante do cristianismo ortodoxo russo na metrópole, é, como o nome revela, uma Igreja em refúgio. RC, membro do clero da Igreja Russa Católica, coirmã no cristianismo russo na cidade de São Paulo, fala um pouco das dificuldades enfrentadas pela Igreja Ortodoxa Russa no Exílio para buscar um espaço mais conveniente para o exercício de sua fé: [...] os outros da Vila Alpina, da Rua Tamandaré, porque são uma jurisdição que saiu da Rússia contra o Comunismo, ficou todo o tempo dando testemunho do Cristianismo fora [...] São pessoas que estão servindo, dão testemunho do Evangelho, mas eles querem segurar do jeito que eles tinham no tempo da Revolução, quando saíram foram para a Iugoslávia, para a Sérvia, quando o Comunismo dominou ali, foram para os Estados Unidos, e hoje é uma grande Igreja nos Estados Unidos. 59 Esse grupo ortodoxo saiu da Rússia em decorrência da Revolução Comunista naquele país, ou seja, fugindo daquele movimento. Isso reflete ainda hoje no cisma que há entre a Igreja do Patriarcado de Moscou e essa Igreja. Num segundo momento, como refere RC, esse grupo de Moscou instalou-se na Iugoslávia, para depois, com o avanço do Comunismo, refugiar-se nos Estados Unidos. O processo de perseguição e refúgio sofrido pela Igreja Ortodoxa Russa no Exílio é comentado pelo depoente a partir da relação de sua instituição com as demais Igrejas. No depoimento pode-se observar que essa relação é tensa, o que se percebe na crítica mencionada: [...] quer segurar do jeito que eles tinham no tempo da Revolução [...]. A relação entre os dois cristianismos russos na metrópole será examinada no terceiro capítulo, 59 Depoimento de membro do clero da Igreja Russa Católica da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 14/02/2010.

62 61 mas, como relata RC, a Igreja Ortodoxa Russa no Exílio é vista como muito conservadora por sua irmã Católica. Isso talvez ocorra pelo fato de ela ter sofrido com esse deslocamento, segurar as coisas como no tempo da Revolução é tentar manter aquele cristianismo que esses grupos acreditam ser necessário para manter a fé e a sua identidade após anos de perseguição. De modo geral, o trecho do depoimento de RO destacado a seguir mostra uma percepção que talvez seja compartilhada por muitos desses grupos cristãos ortodoxos que emigraram para a cidade de São Paulo: Logicamente as nossas Igrejas são pequenas, construções de templos reduzidos. Não no sentido de as Católicas Romanas são enormes e mesmo na Rússia aquelas catedrais enormes que contém quatro, cinco, seis, dez mil pessoas. Aqui não, as igrejas são pequenas porque não se tinha a noção de que isso fosse crescer. Era basicamente para manter a comunidade russa que se espalhou no mundo todo após a Revolução Russa, principalmente depois da Segunda Guerra Mundial, que foi a grande leva de fugitivos do regime. Nós não nos consideramos imigrantes, porque imigrante é uma pessoa que vem por livre e espontânea vontade, para progredir, talvez escolher um local melhor de vida. Eu era criança quando meus pais vieram para cá. As famílias que saíram da Europa fugindo do regime Comunista eram exilados políticos, eram fugitivos do regime Comunista, e o número também não era tão grande assim para se construir catedrais enormes. 60 Esses cristãos ortodoxos não seriam somente imigrantes, pois não teriam vindo por livre e espontânea vontade. Eles muitas vezes foram perseguidos e encontraram nessa emigração uma forma de se refugiar num local onde não seriam vítimas dessa violência. Os cristãos orientais paulistanos sugerem que, diferentemente de outros grupos mais 60 Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Russa no Exílio da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 24/02/2010.

63 62 reconhecidos, como italianos ou japoneses, chegaram ao país por imposição política. Isso é uma marca desses grupos. O que não significa afirmar que outros grupos imigrantes, como italianos e japoneses, não tenham emigrado por conta de discordâncias ou perseguições políticas. Mas essa é uma característica marcante na construção da memória feita pelos membros do clero. Muitas vezes imaginou-se que essa vinda seria temporária e que, quando a situação melhorasse, haveria a possibilidade de voltar aos seus locais de origem, o que em alguns casos não ocorreu. Isso não impediu que esses grupos construíssem Igrejas para manter a comunidade, manter essa relação que os membros do clero oriental acreditam ser necessária para a manutenção da sua identidade e fé. Sendo assim, deve-se tentar entender certos aspectos que marcariam essa manutenção da koinótēta, observando-se como esses grupos tentam reproduzir na cidade de São Paulo elementos que acreditam estar associados aos seus locais de origem. A memória criada por essas Igrejas por intermédio dos seus membros clericais nos depoimentos é indicio dessa preservação. Apontar as dificuldades sofridas por esses grupos também é uma estratégia de manutenção da koinótēta. Como se eles tentassem produzir uma mimese de sua cultura e suas relações na metrópole. No entanto, eles estão vivenciando o dia a dia da metrópole e, portanto, são obrigados a adaptar-se a essa realidade. O resultado não é somente a preservação da comunidade, mas a criação de uma koinótēta paulistana. No decorrer deste capítulo os membros do clero das Igrejas Orientais na cidade de São Paulo falaram de seus horizontes e perspectivas. Esses indivíduos, mais que quaisquer outros nessas comunidades, seriam os guardiões de memória e, portanto, seus depoimentos representariam um discurso quase oficial dessas Igrejas na realidade paulistana.

64 63 São eles que, de certa forma, estão intrinsecamente associados à metáfora do Iconostasis Paulistano. Entre a necessidade de manter e guardar a fé e a identidade da comunidade e, ao mesmo tempo, a necessidade de adaptar-se à nova situação vive esse grupo minoritário e em constante mudança. Nesse meio-termo é que estaria o membro do clero, como o Iconostasis está na Divina Liturgia, dividindo simbolicamente dois mundos: o necessário e o contingente. O próximo capítulo será dedicado a essa situação peculiar dos membros do clero oriental paulistano.

65 64 CAPÍTULO II DISCURSO, FÉ, MEDIAÇÃO E FORMAÇÃO DE IDENTIDADE NA METRÓPOLE PAULISTANA: CLERO ORIENTAL Este segundo capítulo se dedicará a analisar o caráter de guardiões de memória dos membros do clero oriental paulistano. Estes apresentam referências de subjetividade 61, e é nessa subjetividade que está um ponto fundamental em todos os seus discursos: a perspectiva de que eles teriam uma espécie de discurso oficial dessas Igrejas. Eles zelam pela manutenção da comunidade e, ao mesmo tempo, se deparam com a diversidade da cidade e o correr do tempo, que criam novas possibilidades. Aquela antiga identidade (que por si foi criada por intermédio do conflito com a contingência) tem de se adaptar às novas práticas e perspectivas do dia a dia, como no caso de AC: Nós temos consciência que trabalhamos na diáspora e a diáspora é grande formação dos armênios espalhados pelo mundo depois do Genocídio que iniciou-se em 1915, pelo Império Turco. Nós temos condições, consciência de que essa armenidade vai diminuindo. Temos consciência também que não é necessário um território para manter uma identidade nacional e cultural, mas é necessário escola. 62 AC preocupa-se em manter a identidade da comunidade armênia em diáspora, mas entende que a armenidade da comunidade, um termo que representa esse caráter de identidade necessária, está se esvaecendo, pois a circunstância se impõe. Assim, o projeto, a adaptação para essa contingência seria uma escola que procuraria mediar a realidade do cotidiano e as necessidades da armenidade. 61 PORTELLI, Alessandro. A Filosofia e os Fatos: Narração, interpretação e significado nas memórias e nas fontes orais. Tempo. Rio de Janeiro, vol. 1, n 2, 1996, p Depoimento de membro do clero da Igreja Católica Armênia da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 9/3/2010.

66 65 Ao longo do capítulo serão apresentadas as diversas maneiras como esses membros do clero trabalham suas intuições para melhor adaptarem-se às contingências da metrópole, e como guardam os elementos mais fortes de uma identidade. Isso através das angústias e orgulhos das Igrejas que eles representam. 2.1 MIMESE: MANUTENÇÃO E FORMAÇÃO DE IDENTIDADES Os membros do clero entendem que suas Igrejas funcionariam como uma espécie de local de mimese, de reprodução daquela identidade que está associada aos seus locais de origem. Isso aparece de forma oficial numa publicação da Igreja Apostólica Armênia na cidade 63, a qual diz que tem a prerrogativa de apresentar: A história milenar da Igreja Apostólica Armênia, sua doutrina, peculiaridades, tradições e ritos, bem como o papel no desenvolvimento da cultura armênia e na preservação do espírito nacional. 63 KARIBIAN, Datev. Ecos Ressonantes: noções gerais sobre a história, festas e santos mais populares da Igreja Apostólica Armênia. São Paulo, Publicação da Diocese da Igreja Apostólica Armênia do Brasil, p.8.

67 66 Figura 6 - Igreja Apostólica Armênia na Avenida Tiradentes. 64 O Rito é rezado na língua tradicional de cada Igreja e ele seria o elemento de mimese principal de toda essa encenação que é a Divina Liturgia. A Igreja como local de preservação da diáspora. A celebração apresenta um tempo ritual 65, um tempo que busca sempre as mesmas perspectivas: repetição, simetricamente idêntica, ou mimese das cerimônias do passado e dos locais de origem dessas Igrejas. Mas o tempo ritual, a mimese dos ritos originais, é apenas um dos tempos das Igrejas Orientais paulistanas. A reelaboração da comunidade mistura o tempo ritual com as múltiplas experiências das Igrejas na diáspora metropolitana. 64 Autor: Felipe Beltran Katz. Data: 16/9/ CONNERTON, Paul. Como as Sociedades Recordam. Oeiras: Celta Editora, p.81.

68 Ritos e Diáspora O Rito reforça a identidade e a fé, relembra a memória coletiva de uma comunidade, sendo motivo de orgulho e originalidade da comunidade: Com certeza. O Rito é diferente, as orações são diferentes, e temos alguma coisa excepcional, que nenhuma outra tem: as palavras de consagração rezamos sempre em língua siro-aramaica, que era língua de Jesus Cristo mesmo. 66 Essa foi a resposta de MN quando perguntado acerca da diferença entre sua Igreja e a Igreja Católica Latina. Ambas estão em comunhão, mas mantêm certas peculiaridades, que são reforçadas no Rito. MN relembra com orgulho que sua Igreja é excepcional, pois o as palavras de consagração são rezadas em siro-aramaico 67, a língua do próprio Jesus. MN marca a distinção entre sua Igreja e a Igreja Latina e relaciona sua identidade Maronita com sua fé. Fé e identidade são inseparáveis e necessariamente têm de ser mantidas e guardadas para que os Maronitas continuem Maronitas. Assim, a Língua Litúrgica, a língua do Rito, é importante para essa manutenção. Este item do estudo deve focar especificamente esse aspecto linguístico que perpassa todo o tema do Rito e a Diáspora. A Língua Litúrgica seria uma espécie de núcleo do Rito na Divina Liturgia e o domínio dela é essencial ao membro do clero. O lugar metafórico da Língua Litúrgica original dessas Igrejas é o lado voltado para o altar do Iconostasis, juntamente com os outros elementos necessários à fé cristã oriental. 66 Depoimento de membro do clero da Igreja Católica Maronita da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 3/2/ Língua semita falada na região do Levante antes da chegada do Islã. PARRY, Ken (et. al.). The Blackwell Dictonary of Eastern Christianity. Oxford: Blackwell, p.466.

69 68 Observa-se que essa relação permeia a totalidade das Igrejas Orientais presentes na cidade de São Paulo, ou seja, não é privilégio do grupo Ortodoxo. As Igrejas Católicas Orientais também têm esses elementos como preocupação no horizonte de seus membros clericais. Este capítulo dará ênfase às relações de mimese, às problemáticas e aos projetos futuros de todas as Igrejas Orientais paulistanas. A exceção ocorrerá no próximo item, em que será abordada a relação entre as Igrejas pela perspectiva dos membros do clero. Nesse caso, o destaque será dado somente às Igrejas Ortodoxas, pois o próximo capítulo, dedicado exclusivamente às Igrejas Católicas Orientais, tratará da relação entre estas e a demais Igreja Orientais. Essa divisão se deve ao fato de que todas as relações das Igrejas Católicas Orientais com quaisquer outros grupos religiosos são permeadas pelo peso da Igreja Católica Latina, instituição a que, em última instância, elas pertencem. Retomando a questão da mimese na metrópole, GO resume bem o que seria essa relação fundamental entre essas Igrejas e suas respectivas diásporas: Mas vieram e um grande segmento esteve aqui em São Paulo e sempre onde tem uma comunidade, de qualquer povo, eles se unem, é culturalmente para manter a língua, manter as tradições, manter os cânticos, manter também a comida, alimentação, porque eu acho que quando termina o cardápio, terminou um povo. O Rito também é importantíssimo, porque o rito, em qualquer igreja, é expressão também de uma fé, tem uma força grandiosa o rito. Então sempre todas as colônias, elas sempre construíram um templo e no templo desenvolvem tudo Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Grega da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 17/8/2011.

70 69 Figura 7 - Igreja Ortodoxa Grega no bairro do Brás. 69 GO relembra elementos essenciais dessa mimese, da reprodução da cultura e da fé grega na metrópole. A língua, os cânticos e, inclusive, a comida típica aparecem como recursos aglutinadores. Relembrar o cardápio, segundo GO, seria uma forma de refazer a experiência da comunidade, ao passo que esquecê-lo seria anular as referências do grupo. No entanto, mais uma vez, é o Rito que tem destaque como elemento fundamental dentro das Igrejas Orientais. Durante o Rito na Divina Liturgia existe a figura do coro. O coro é formado basicamente por membros da comunidade que cantam durante toda a celebração: 69 Autor: Felipe Beltran Katz. Data: 7/9/2011.

71 70 E todos os religiosos têm obrigação de aprender essa língua, Grabar, Armênio Clássico e todos os cânticos da Igreja... E outra coisa também, a Igreja Armênia pratica sua missa com um coral. Sem coral não se pode fazer a cerimônia da missa. Então todos os domingos praticam, celebram a missa cantada em Grabar, em Armênio Clássico. E o Rito como um Rito Oriental, como um Rito próprio Armênio, com cultura armênia, é bastante, digamos assim, dá motivo de inspiração ao ouvinte que está presente na missa, e nós temos muitos testemunhos quando realizamos casamentos, batizados, mesmo enterros, além das missas dominicais [...]. 70 O coro é indispensável para a Divina Liturgia. A língua utilizada, no caso, é o Armênio Clássico (Grabar), a Língua Litúrgica da Igreja Armênia. AO destaca o fato de que o membro do clero, o religioso, tem obrigação de aprender essa língua. No entanto, o coro, de certa maneira, também conhece a Língua Litúrgica, ou seja, o momento da Divina Liturgia também é um momento em que os féis colaboram em conjunto para a preservação da cultura da comunidade. Como guardião dessa identidade, AO afirma com orgulho o impacto que essa sua identidade causa nos brasileiros : [...] todos os brasileiros que assistem essas cerimônias admiravelmente expressam as suas admirações e parabenizam a nós. 71 Quando destaca isso em seu depoimento, ele estaria orgulhosamente sugerindo que seu papel dentro de sua Igreja é cumprido. Ele e sua comunidade são parabenizados por indivíduos que não pertencem a ela (os brasileiros ), pela manutenção de sua cultura e de sua fé. 70 Depoimento de membro do clero da Igreja Apostólica Armênia da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 8/2/ Depoimento de membro do clero da Igreja Apostólica Armênia da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 8/2/2010.

72 71 No final desse trecho do depoimento, AO retoma o fato de o coro ser um elemento importante na metáfora da Divina Liturgia, como fator de manutenção cultural promovido de forma coletiva pela comunidade: E para um armênio, para cada armênio, é um motivo de orgulho manter essa tradição que até hoje a nossa comunidade... Apesar que não entendem nada em armênio, eles exigem para nós manter essa tradição sempre, para manter a alma. 72 Mesmo que os fiéis não entendam o armênio clássico, eles ainda exigem a tradição para manter a alma, ou seja, muitos fiéis compartilham com o membro do clero a manutenção dessa fé e identidade, mesmo frente à contingência de não falarem mais armênio. A contingência impera sobre o Rito e causa situações problemáticas para muitas Igrejas. Entre as várias Igrejas Orientais na cidade há a Igreja Russa Católica. Como já mencionado, essa Igreja é a menor de todas as encontradas na cidade e não possui um pároco próprio, pois o último faleceu em Outras Igrejas Orientais auxiliam a Igreja Russa Católica, no entanto, RC lamenta: A única orientação que se tinha era do padre na missa, e o padre que morreu, padre João, ele, com três palavrinhas, o sermão dele, a Homilia não ia mais que dez minutos. E ele com aquela vozinha ele tinha dois ou três pontos que ele insistia, e que formava as pessoas. O que não acontece se a cultura não é a russa Depoimento de membro do clero da Igreja Apostólica Armênia da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 8/2/ Depoimento de membro do clero da Igreja Russa Católica, em entrevista concedida ao autor em 14/2/2010.

73 72 Se a cultura não for russa, dificilmente o poder dessa fé católica oriental chagará aos fiéis em plenitude. RC fala de como a simplicidade do falecido padre João, aliada a essa cultura russa, formava as pessoas. No entanto, recentemente, a Igreja Russa Católica conseguiu o auxílio da Igreja Ortodoxa Ucraniana, e os membros do clero desta passaram a ajudar na celebração da Divina Liturgia naquela. UO comenta: [...] foi essa a única oportunidade em que a gente esteve lá, mas fui muito bem-recebido, gostaram muito da minha celebração, minha não, não é o padre que celebra, é o padre juntamente com sua comunidade, mas fizemos uma celebração assim, como disseram algumas senhoras, que há tempos não tinha uma celebração realmente eslava, no Rito como deve ser. 74 UO reitera o fato de que a celebração é realizada em conjunto com os fiéis, indicando o papel da Divina Liturgia em unir a comunidade, os dois lados do Iconostasis na Igreja. UO também relembra o comentário que algumas senhoras fizeram a respeito da celebração realizada pelo pároco ortodoxo ucraniano na Igreja Russa Católica. Elas sugerem de forma saudosista que há muito tempo não havia uma celebração realmente eslava. Como RC já havia notado, a relação entre fé cristã e cultura russa havia se perdido com a morte do pároco de sua Igreja. Com a chegada do clero ucraniano ortodoxo, que possui também um Rito Bizantino-Eslavônico 75, essa relação pôde ser retomada, e a comunidade teve um Rito 74 Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Ucraniana do município de São Caetano do Sul, em entrevista concedida ao autor em 18/4/ O Rito Bizantino-Eslavônico é a base de todos os Ritos das Igrejas Orientais eslavas. Esse Rito, de certa forma, une essas Igrejas numa só tradição. A elaboração desse Rito deve-se aos esforços das missões de São Cirilo e São Metódio, sacerdotes gregos que, no século IX, evangelizaram os tchecos, macedônicos e búlgaros. Para facilitar o processo de evangelização, Cirilo e Metódio desenvolveram o alfabeto cirílico, adaptando o alfabeto grego à cultura eslava. Esse alfabeto ainda é utilizado pelos povos eslavos majoritariamente ortodoxos,

74 73 como deve ser. Os fiéis russos católicos puderam, de certa maneira, reestruturar a relação entre a fé e identidade cultural. O poder da contingência obriga os membros do clero a reelaborar os Ritos. As Igrejas Orientais paulistanas não são entidades sem história, elas estão inseridas numa trama de relações e vivências em transformação constante. Assim, é natural que o Rito, elemento necessário para a preservação da comunidade, que promove a mimese de uma memória coletiva na metrópole, passe por modificações devido à sua situação paulistana. Um elemento de reelaboração do Rito é o uso do português, a língua da contingência, na Divina Liturgia: As celebrações vão ter que ser só em português, agora a gente ainda faz meio a meio, um pouco ucraniano um pouco português [...]. 76 Esse aspecto pode ser percebido em todos os depoimentos dos membros do clero: Os ofícios são celebrados em português [...] 77. Isso aponta para o futuro desses grupos: E aqui, por exemplo, no Cambuci, tem uma comunidade, vamos dizer, de língua portuguesa, Igreja Ortodoxa Grega de língua portuguesa. 78 Os membros do clero pensam o uso da língua portuguesa na Divina Liturgia como o elemento que reuniria a comunidade nessa nova, mas necessária, maneira de mimetizar os antigos tempos. A mimese na metrópole ainda será realizada, cultura e fé armênia, russa, ucraniana, grega etc. ainda serão relembradas. No entanto, isso será feito com o uso do português, unindo necessidade e contingência, num meio-termo preciso. como o caso de russos e ucranianos. WARE, Timoty. The Orthodox Church. Londres: Penguim Books, p Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Ucraniana do município de São Caetano do Sul, em entrevista concedida ao autor em 18/4/ Depoimento de membro da Igreja Ortodoxa Russa no Exílio da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 24/2/ Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Grega da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 17/8/2011.

75 74 Além da mimese no Ritual, essas Igrejas compartilham outra função: tentar reproduzir a relação entre elas. Essas comunidades são marcadas pela sua fé cristã oriental, um aspecto em comum entre elas. Assim sendo, o vínculo entre elas deve ser destacado. Em seus locais de origem, essas comunidades e Igrejas mantêm relações com maior ou menor grau de cooperação. Na diáspora paulistana elas tentariam reproduzir essas relações como forma de mimese Relação entre Irmãs O fato de serem paulistanas permeia as relações entre as Igrejas, como também as suas escolhas e as tramas em que estão inseridas. O pertencimento a determinada família cristã oriental também pesa nessas relações. Portanto, este item do estudo dará destaque às relações entre Igrejas Ortodoxas, pois estas não possuem uma relação de poder com a Igreja Católica Romana, diferentemente das Católicas Orientais. Nos depoimentos dos membros do clero é possível notar o peso da Igreja Católica nas relações das Igrejas Ortodoxas com suas coirmãs Católicas Orientais. No entanto, torna-se mais prudente destacar essas relações no próximo capítulo, dedicado exclusivamente às Igrejas Católicas Orientais. Logo, neste primeiro momento serão abordadas exclusivamente as relações entre Igrejas Ortodoxas.

76 75 Figura 8 - Igreja Ortodoxa Copta no bairro do Jabaquara. 79 Dentro desse grupo Igrejas Ortodoxas, como já apontado, há também a família das Igrejas não Calcedonianas, com três representações na cidade: Igreja Apostólica Armênia, Igreja Ortodoxa Sirian e Igreja Ortodoxa Copta. Os discursos dos membros do clero dessas Igrejas são consensuais: Acreditamos, ou temos o mesmo dogma da Igreja, e inclusive no século V a Igreja Copta Ortodoxa e a Igreja Siríaca Ortodoxa de Antioquia ficaram juntas. Desde aquele tempo, as duas Igrejas são unidas, e com a Igreja Armênia Ortodoxa é a mesma coisa também. Nós temos o mesmo dogma. Mas em relação com outras Igrejas, nós temos sempre a nossa presença em qualquer atividade, ou congressos, 79 Autor: Felipe Beltran Katz. Data: 16/9/2011.

77 76 tudo isso nós temos relação forte, não só com a Igreja Armênia, ou a Igreja Copta. 80 O membro do clero procura manter esse consenso, uma vez que ele, sendo o guardião da comunidade, da mimese e de suas características na metrópole, deve zelar também pelas relações harmoniosas de sua Igreja com suas coirmãs da mesma família. Deve reproduzir um tempo ritual em que as Igrejas de uma mesma família vivem sempre em harmonia. No entanto, o consenso não é completamente harmonioso. Quando perguntado acerca das relações entre a Igreja Apostólica Armênia e a Igreja Ortodoxa Copta, AO comenta: Eu acho que é difícil que a Igreja Copta que eu conheci aqui através de seu bispo, eu frequentei essa Igreja uma vez quando chegou o Patriarca deles, o Shenouda do Egito, e percebi que a maior parte dos fiéis não pertencia à Igreja Copta. Eram brasileiros e brasileiras convertidos, e entravam na família da Igreja Copta. Porque, primeiro que em São Paulo eu acho, eu penso que não tem muitos coptos, egípcios cristãos. Mas existe a Igreja com seu sacerdote e faz tudo para manter a Igreja através de seus fiéis, mesmo sendo convertidos. 81 AO relembra a peculiaridade da Igreja Copta entre as Igrejas Orientais paulistanas: o fato de seus fiéis não serem originalmente membros de uma diáspora. Para AO, que tem em seu horizonte a preservação da cultura e fé armênia, é necessário que haja uma relação entre pertencer à Igreja Armênia e ser de origem armênia: 80 Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Sirian da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 12/2/ Depoimento de membro do clero da Igreja Apostólica Armênia da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 8/2/2010.

78 77 Igreja Armênia é uma exceção: ela considera seus filhos todos que são batizados na Igreja, que pertencem à Igreja nacional armênia e praticam todas as cerimônias na língua armênia e são descendentes dessa nação [...]. 82 Apesar desses apontamentos críticos acerca da Igreja Copta, AO é solidário com seu colega egípcio. Reconhece que, assim como ele próprio, o membro do clero copta faz de tudo para manter a Igreja. CO, representando a Igreja Copta, fala sobre a família de sua Igreja na cidade. A cooperação ocorre, pois AO, como verificado anteriormente, afirma que esteve na Igreja Copta durante a visita do Papa Shenouda. CO, por sua vez, aponta que tentou aprofundar a cooperação entre as Igrejas não Calcedonianas na cidade: Aliás, a Igreja Armênia e a Igreja Sirian são da mesma família nossa. Ou mesmo as outras Igrejas, eles não são da mesma família, mas temos muito respeito, tenho muito carinho para com eles e toda hora que tem festa tem um convite para uma ordenação, alguma coisa, eu sempre apareço, se estou aqui no Brasil eu apareço. Se eu não estou aqui no Brasil, eu mando o padre representante nessas festas. Eu tentei com eles no começo fazer outro clima, tipo de uma família ortodoxa aqui no Brasil. Dar palestras, eu chamei eles para dar palestras, mas eu falo de verdade, eu não vi ninguém interessado por isso. 83 No entanto, o projeto falhou. A cooperação entre as Igrejas existe, mas é marcada por particularidades de cada uma delas. Os membros do clero preocupam-se muito com suas próprias comunidades. Assim, a relação entre Igrejas, muitas vezes, torna-se secundária. 82 Depoimento de membro do clero da Igreja Apostólica Armênia da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 8/2/ Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Copta da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 22/8/2010.

79 78 Por vezes as Igrejas isolam-se, mesmo reconhecendo na cidade a existência das demais Igrejas Orientais. Isso ocorre com a Igreja Ortodoxa Russa no Exílio, como revela RO: E a nossa Igreja Ortodoxa Russa, chamada no Exílio, ou Fora da Rússia, ela é autônoma, independente, ela não é autocéfala; e não mantém contatos, nunca manteve, com o Patriarcado de Moscou [...]. E a nossa Igreja Ortodoxa Russa, desde que ela se formou, após a Revolução Russa, ela não é ecumênica, ela não mantém contatos litúrgicos com outras Igrejas, nem a Católica Romana nem a Ucraniana Autocéfala, nem essas outras Igrejas denominadas Ortodoxas atualmente. Já manteve anteriormente, antes de alguma dessas Igrejas não entrarem para o Movimento Ecumênico, como a Grega antes de entrar... A Antioquina também, antes de ela fazer parte do Ecumenismo, nós mantínhamos contato litúrgico. Mas atualmente, devido a essa tendência da maior parte deles já entrar nesse movimento, da união das Igrejas, o Movimento Ecumênico, a Igreja Ortodoxa Russa no Exílio não faz parte disso. 84 No depoimento é possível perceber que a Igreja Ortodoxa Russa em São Paulo reconhece a existência dos demais grupos cristãos ortodoxos na cidade, pois seu representante cita quase todos: gregos, ucranianos, a Igreja de Antioquia. No entanto, prefere não alinhar-se com esses grupos por conta do Movimento Ecumênico. RO também aponta para o fato, já mencionado, de que sua Igreja não mantém contatos com o Patriarcado de Moscou, que seria a Igreja Ortodoxa Russa na Rússia. Segundo o depoimento, essa opção da Igreja Ortodoxa paulistana se deve ao fato de não compactuar com o Movimento Ecumênico e a união das Igrejas Ortodoxas com não Ortodoxas. 84 Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Russa no Exílio da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 24/2/2010.

80 79 O isolamento dessa Igreja está associado à mimese das tradições desses grupos na diáspora. Como já foi verificado, a Igreja Ortodoxa Russa no Exílio é uma Igreja em diáspora e, desde a Revolução Russa, sua sede está localizada nos Estados Unidos. Ela está em diáspora pois não concorda com os rumos tomados pela Igreja Ortodoxa na Rússia após a Revolução. Rejeitar isso e marcar posição contra a Igreja Russa na Rússia é tentar manter, ao custo de isolar-se das demais Igrejas Ortodoxas paulistanas, elementos que fariam parte da essência de uma fé e cultura russa maculada antes da Revolução. Outro elemento que produziria essa mimese está na relação hierárquica entre as Igrejas. Como foi visto anteriormente, as Igrejas Ortodoxas Calcedonianas estão associadas ao Patriarcado de Constantinopla, que tem na cidade sua representação na Igreja Ortodoxa Grega. GO relembra em seu depoimento essa primazia do Patriarca Ecumênica no cristianismo ortodoxo calcedoniano: Nós temos o correspondente ao Papa de Roma seria o Patriarca de Constantinopla, que seria honorificamente, honorificamente, ele tem um poder de honra, de primazia, de primus inter pares também entre os demais Patriarcas e Bispos Primazes e demais bispos. 85 GO mantém que esse primado deva ser respeitado pelos demais grupos na diáspora, pois, nessa situação, o primado do Patriarca de Constantinopla deixa de ser honorífico e tornase jurídico: Agora, o que acontece todos... Deveria ser todos os ortodoxos ou todas as missões nas terras novas deveriam estar sob a jurisdição do 85 Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Grega da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 17/8/2011.

81 80 Patriarcado Ecumênico. Você me diria: "Ah, mas aqui no Brasil nós temos a Igreja Antioquina, que ele tem um bispo local, um bispo próprio, tem a Igreja Ucraniana, tem a Igreja Russa etc., todas com arcebispos, ou seja, várias jurisdições no mesmo território. Não deveria ser assim. Deveria ser vários povos várias tradições, até com bispos próprios, até falantes com a mesma língua, mas todos eles deveriam reportar ao Patriarca Ecumênico. 86 GO lamenta que na diáspora a jurisdição do Patriarcado Ecumênico não seja respeitada, também que os acordos feitos por esses grupos em seus locais de origem não sejam cumpridos. Aponta que não ocorre uma mimese dos costumes e leis cristãs ortodoxas calcedonianas na diáspora. No entanto, os anseios de GO seria m contrários aos de seus colegas ortodoxos calcedonianos na metrópole. Se eles modificassem as jurisdições de suas Igrejas na cidade, não poderiam reproduzir na diáspora a sua cultura e a fé tal qual em seus locais de origem. Portanto, não haveria a mimese que os membros do clero tanto desejam manter. A relação entre as Igrejas Ortodoxas na cidade sugere que elas têm conhecimento da existência de suas coirmãs, havendo diálogo, mas também disputas. O que mobiliza esses membros do clero é a preocupação com a situação de suas comunidades, mais que a elaboração de um projeto de cooperação do cristianismo ortodoxo paulistano como um tudo. Talvez isso nunca esteja no horizonte desses religiosos, pois o objetivo maior seria a manutenção de suas comunidades frente às diversidades que a cidade apresenta, sendo que a atualidade se mostra como um desafio hercúleo para esses membros do clero oriental paulistano. 86 Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Grega da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 17/8/2011.

82 IMPERATIVO DA CONTINGÊNCIA: FUTURO DO ICONOSTASIS A questão da mimese está profundamente associada ao lado voltado ao altar do Iconostasis. Metaforicamente, ela está relacionada com os elementos necessários das comunidades, a preservação dos Ritos e das relações eclesiásticas das Igrejas. A mimese está intimamente ligada ao membro do clero. No entanto, observar somente esse lado do Iconostasis é negar o fato de que essas Igrejas são objetos históricos, é como buscar uma essência imutável nelas. Isso é negar o Iconostasis Paulistano, as sutilezas particulares dessas Igrejas na cidade de São Paulo, especificidades da contingência da sua existência na metrópole. Metaforicamente, faz-se necessário atravessar os Belos Portões do Iconostasis, caminhar em direção à nave da igreja e integrar-se à situação da comunidade. Visitar o espaço da comunhão entre fiéis e membros do clero no cotidiano dos cristãos orientais paulistanos. A continuação do capítulo tem por objetivo analisar o lado voltado para a nave do Iconostasis, o local metafórico da contingência, o local do dia a dia dos membros do clero na perspectiva do futuro do Iconostasis Paulistano. Com os depoimentos é possível notar que as Igrejas Orientais na cidade de São Paulo, sejam Ortodoxas ou Católicas Orientais, vivem um momento de inflexão. Os membros do clero apontam os problemas diários que enfrentam neste momento delicado do cristianismo oriental paulistano. No entanto, ao mesmo tempo, elaboram novos projetos, que, muitas vezes, alteram radicalmente a composição dessas Igrejas. O presente trabalho não deve julgar se essas atitudes estão corretas ou não, nem prever os resultados desses projetos. O importante é apontar que as possibilidades que essas Igrejas encontram para resolver suas problemáticas denotam esse outro lado do Iconostasis

83 82 Paulistano: o poder e autonomia que essas Igrejas têm, ou buscam ter, para repensar-se. Portanto, é identificar que elas são verdadeiros objetos históricos, longe de qualquer exotismo, ou orientalismo, que imagine essas instituições como estanques no tempo e distantes da vida cotidiana. Deve-se compreender que esses membros do clero estão num entre lugar: Esses entre lugares fornecem o terreno para a elaboração de estratégias de subjetivação - singular ou coletiva - que dão início a novos signos de identidade e postos inovadores de colaboração e contestação, no ato de definir a própria ideia de sociedade. 87 Esses senhores buscam guardar as tradições de suas Igrejas em seus locais de origem, no entanto, não estão em seus lugares de origem, estão na metrópole paulistana, onde são minoria e sofrem a contingência das mudanças de suas comunidades. Portanto, são Igrejas Orientais gregas, armênias, eslavas, árabes, mas também paulistanas. Esse lugar intermediário é a sua danação, mas também seu trunfo. É nesses entre-lugares que a busca por novas inserções e novos movimentos de resistência ocorre. Pelo simples fato de estarem num meio-termo, os membros do clero oriental paulistano podem jogar com sua tradição e suas novas perspectivas. Combinadas, elas estabelecem a originalidade de suas atitudes perante os desafios de manter-se na metrópole Apontamentos de Problemáticas Segundo muitos membros do clero oriental paulistano, suas Igrejas estão num momento de inflexão. Passados quase 100 anos da vinda das diásporas que engendraram essas 87 BHABHA, Homi. O Local da Cultura. Belo Horizonte: Editora UFMG, p.20.

84 83 Igrejas, tudo parece estar se modificando rapidamente. Os movimentos imigratórios cessaram há quase 50 anos e isso, de certa forma, preocupa os membros do clero: A comunidade grega no Brasil é pequena, eu diria que não ultrapassa 20 mil pessoas. Pelo menos, eu perguntei ao cônsul esses dias: Ah, cadastrados são poucos. E a última imigração foi por volta do ano 60, de lá para cá, não teve, assim, significativa imigração, e com o tempo é como você disse: os velhos vão morrendo [...]. 88 GO ressalta também o envelhecimento dos primeiros imigrantes. Assim, são as famílias desses primeiros imigrantes que dão continuidade à comunidade. Porém, existem outras perspectivas que devem ser contempladas. A vivência dessas gerações numa diáspora tem de ser levada em conta. MK, da Igreja Católica Melquita, aponta para o fato de que há uma diferença entre as diversas gerações: A de primeiro tipo, a geração que chegou do Líbano, da Síria e embarcou no Brasil e começou a viver, essa primeira geração ela é muito rígida, antiga e segue muito as tradições. Temos uma outra, aquela que é descendente de sírio-libanês, esse ficou a tradição bem leve, porque ela acabou casando com terceira pessoa que não é mais de origem árabe e começou a abrir para o mundo brasileiro. Aqui começaram a perder um pouquinho. Terceira geração totalmente perdeu, não pertence mais ao Rito e as origens e os costumes orientais. E eles se sentem mais confortáveis vivendo na maneira brasileira, isto é o correto, isto é o certo. Porque já estão aqui, não é mais um, dois, dez anos, já estamos falando de trinta, quarenta anos de convivência Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Grega da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 17/8/ Depoimento de membro do clero da Igreja Católica Melquita da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 20/5/2010.

85 84 A primeira geração mais associada ao Líbano e à Síria estaria mais próxima da Igreja. A segunda geração, muitas vezes, acaba por associar-se com uma terceira pessoa que não é de origem árabe, portanto, os indivíduos tornam-se mais brasileiros. A terceira geração não possui mais os costumes orientais. Quanto mais distante da associação com o país de origem, mais próxima da cultura brasileira. No que diz respeito às Igrejas Orientais, isso também é um elemento de mudança religiosa. A assimilação cultural dessas comunidades na cidade de São Paulo pressupõe, muitas vezes, a conversão religiosa fora do cristianismo oriental. Isso está no horizonte dos depoimentos de MK e GO. Esses indivíduos, como membros do clero de suas Igrejas, sentem que isso dificulta a manutenção de suas Igrejas. A assimilação das novas gerações da comunidade e a não renovação da diáspora poderiam ameaçar a estabilidade dessas Igrejas. UO também está de acordo com seus colegas: Então, e alguns ainda remanescentes da imigração que veio depois da Segunda Guerra, outros nascidos na Alemanha e outros nascidos aqui no Brasil. Aí vem a pergunta: Por que tão poucos? A principal resposta é casamentos mistos. Casa com quem não é ucraniano, brasileiro, de outra... Daí não entendem o idioma, daí preferem ir na Igreja Latina, na Igreja aonde entende melhor, ou casa com católico, vai para Igreja Católica. Enfim, existe uma comunidade bem minúscula, realmente pequena. 90 UO aponta os casamentos mistos como forma de esfacelamento da comunidade, eles impulsionariam a desagregação da comunidade. Seria como se o fiel escolhesse deixar essa sua cultura oriental. O poder da Igreja Católica Latina é levado em conta. 90 Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Ucraniana do município de São Caetano do Sul, em entrevista concedida ao autor em 18/4/2010.

86 85 Diante dessas perspectivas, muitos membros do clero sentem que estão deixando de cumprir sua missão, ficam indignados com o aparente fim de suas comunidades e a suposta negligência de seus fiéis: A comunidade foi reduzindo cada vez mais. Em 50 anos. Por quê? Os russos ficavam aqui, muitos se integravam na comunidade brasileira [...]. Daí que a comunidade foi diminuindo [...]. Os católicos aqui não tinham muito o que fazer, porque um católico não segue a lei ortodoxa e nem a católico-ortodoxa, então o indivíduo está chupando bala e vai para a comunhão. 91 RC considera a suposta rigidez das celebrações das Igrejas Orientais como um dos motivos do abandono de muitos féis. A caricatura do indivíduo que está chupando bala e vai para a comunhão ilustra essa crítica. O catolicismo latino é encarado como elemento de aproximação com a comunidade brasileira, mas também como negligência dos membros da comunidade russa católica com sua Igreja. No depoimento de MK, a indignação com relação a certas atitudes dos fiéis também aparece: [...] temos aqui um centro cultural sírio que ensina às pessoas o idioma árabe, mostra para eles os costumes, a paisagem de lá, mas mesmo assim as pessoas não frequentam, quem mais frequenta são os brasileiros Depoimento de membro do clero da Igreja Russa Católica da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 14/2/ Depoimento de membro do clero da Igreja Católica Melquita da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 20/5/2010.

87 86 Figura 9 - Igreja Católica Melquita na Avenida Paulista. 93 Muitos dos fiéis melquitas não estariam mantendo a necessária cultura dessa comunidade. Então, MK, como membro do clero, buscou uma solução: manter um centro cultural sírio. Todavia, esse projeto teria falhado, mas há esses brasileiros, indivíduos à parte da comunidade cristã oriental original, que entram em contato com essa fé e cultura. A indignação desses membros do clero perpassa a sua função de guardiões da memória desses grupos diaspóricos e dessa fé cristã específica. O aparente fim das comunidades sugere que eles não estariam cumprindo sua missão. Porém, eles procuram reorganizar sua comunidade, pois muitos acreditam que seu papel não foi terminado. Entendem que representam culturas que devem ser valorizadas e propagadas dentro da metrópole. 93 Autor: Felipe Beltran Katz. Data: 16/9/2011

88 87 O fato de indivíduos de fora da comunidade original, os brasileiros, aproximarem-se dessas Igrejas parece ser uma nova tendência constituindo-se. Se por um lado as imigrações das comunidades originais não se renovam, a incorporação dos brasileiros torna-se uma nova perspectiva escolhida por muitas dessas Igrejas na cidade. O depoimento de GO é ilustrativo: Mas, realmente, está um pouco difícil a coisa. Também nós não fazemos proselitismo, nós não fazemos. Nem placa, eu não gosto, aqui fui forçado a colocar uma placa, coloquei uma de 30 x 15 [cm], que uma velha olhou domingo e disse: Padre, isso aqui é realmente para ninguém enxergar que o senhor colocou? Mas tem uma cruz enorme em cima, acho que o maior logotipo está em cima, para quê fazer esse fuá GO afirma que está um pouco difícil, referindo-se ao gradual fim da comunidade grega original. Ele afirma que sua Igreja não faz proselitismo, no entanto, foi obrigado a colocar uma pequena placa na porta de sua Igreja. Afirma que o maior logotipo de sua Igreja é a cruz em cima do templo. Mas GO reitera: Temos uma história Apostólica ininterrupta, ou seja, uma sucessão Apostólica ininterrupta, retilínea. Tanto quanto à origem como quanto à sucessão Apostólica e também quanto à doutrina. Então isso nos dá muita segurança e as pessoas nos procuram muito pelo amor à tradição e à conservação deste tesouro que não deve ser simplesmente trancado a sete chaves, mas abrir o tesouro, porque também ortodoxia não é propriedade nem de grego, nem de russo e nem de árabe. O Cristo mandou que os apóstolos fossem para o mundo inteiro: pregar, 94 Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Grega da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 17/8/2011.

89 88 fazer discípulos, discipular e batizar. Então nós tentamos seguir e fazer isso. 95 O relato sugere um caminho duplo do membro do clero entre dois mundos da metáfora do Iconostasis. GO tenta abrir sua Igreja para os brasileiros, para a contingência da cidade, colocando uma pequena placa na porta de sua igreja, identificando o crucifixo como logotipo, traduzindo parte do Rito para o português, asseverando que a tradição ortodoxa não é propriedade de gregos, russos ou árabes. No entanto, ele afirma categoricamente que não faz proselitismo, que não quer negar a sua identidade, mas prega, faz discípulos e batiza. Ele está criando um Iconostasis Paulistano, expondo a questão do entre-lugar. Ele está criando uma Igreja Ortodoxa Grega paulistana, associando a fé ortodoxa grega à realidade paulistana. Através dessa contingência, os membros clericais elaboram, cada qual à sua maneira, estratégias e projetos para responder a esses desafios específicos da cidade de São Paulo Projetos e Perspectivas Os projetos são variados. Diante da contingência da vida na metrópole, os membros do clero pensam as mais variadas estratégias. Seus horizontes, longe de serem uniformes, são múltiplos. A situação diaspórica dessas Igrejas impõe aos membros do clero a necessidade de tomar atitudes diversas para fazer frente a circunstâncias diversas. Em última instância, os projetos dos membros do clero passam por um processo de transculturação: não a integração completa da comunidade, mas o surgimento de comunidades 95 Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Grega da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 17/8/2011.

90 89 cosmopolitas 96. O estabelecimento dessas Igrejas na diáspora sugere a manutenção de Igrejas Orientais, mas também paulistanas. Algumas preferem se fixar na manutenção e auxílio às comunidades originais, como a Igreja Católica Armênia: Nós temos procurado, diante deste quadro, valorizar a Pátria Mãe, sabemos que ali é o futuro, nós estamos na diáspora, não para conquistar ninguém, mas para atender as nossas comunidades. Se um dia elas não existirem mais, não tem mais sentido. Nós não estamos procurando nada mais e não tem sentido... O Rito Armênio é para o povo armênio, na sua língua, nas suas tradições. 97 Em seu depoimento, AC sugere que a atenção e o futuro de sua Igreja estão na Pátria-Mãe, na República da Armênia. Ele indica que não quer conquistar ninguém na diáspora, pois o Rito Armênio é para o povo armênio. A estratégia usada pela Igreja Católica Armênia na cidade de São Paulo é manter sua comunidade até que ela termine. Sua coirmã, a Igreja Apostólica Armênia, também entende assim: Mas as outras Igrejas aceitam de todas as nações como seus filhos, como membros da Igreja, e, com esse sentido, a Igreja Copta aqui fica uma Igreja só com o nome Copta, mas com a língua portuguesa, como as outras Igrejas Ortodoxas também praticam hoje com língua portuguesa, e a Armênia é uma exceção HALL, Stuart; SOVIK, Liv (Orgs.). Da Diáspora: Identidade e Mediação Culturais. Belo Horizonte: Editora da UFMG, p Depoimento de membro da Igreja Católica Armênia da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 9/3/ Depoimento de membro do clero da Igreja Apostólica Armênia da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 8/2/2010.

91 90 AO usa como exemplo a Igreja Copta para contrapor os projetos da sua Igreja aos das demais Igrejas na cidade. Para AO, a abertura da Igreja Copta para os brasileiros, assim como a atitude das outras ao aceitarem todas as nações, estaria maculando o sentido dessas Igrejas. Assim sendo, a Igreja Apostólica Armênia coloca-se distante desse projeto de futuro e, como sua coirmã, dedica-se ao apoio de sua comunidade original. Os projetos de ambas as Igrejas Católica Armênia e Apostólica Armênia têm como intuito a manutenção das comunidades originais, com pouca abertura para fora da diáspora. O despontar do fim dessa diáspora não é encarado como o fim da cultura e fé necessária, mas apenas uma mudança de perspectiva. Como sugere AC, o futuro não estaria na contingência da cidade, mas fora dela: na Armênia. Mesmo assim, na sua estada na diáspora, as Igrejas Armênias pensam em sua situação paulistana, uma configuração cultural muito distinta de uma Igreja Armênia supostamente livre de transculturação. Entretanto, sendo os projetos dos membros do clero múltiplos, muitas vezes não há essa reflexão teleológica sobre o futuro: Agora, é que nem eu disse: só o tempo que vai nos dizer o que fazer. Pode ser que chegue um dia que não acabe a comunidade, mas que a comunidade seja composta só de pessoas brasileiras, e que estejam participando da comunidade ucraniana Ortodoxa, mas que não têm nada de ucraniano. Não sei, o tempo é quem vai dizer. 99 UO sugere que o elemento ucraniano de sua Igreja pode desaparecer, mas ele parece não ter um projeto claro, como muitos de seus companheiros. Ele acredita que o tempo irá 99 Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Ucraniana do município de São Caetano do Sul, em entrevista concedida ao autor em 18/4/2010.

92 91 dizer. O membro tem a perspectiva de um guardião da memória da diáspora ucraniana na cidade, porém, na sua percepção, o futuro de sua comunidade é algo distante. Na grande trama dos projetos para as Igrejas Orientais paulistanas existem aqueles membros do clero receosos quanto à abertura de suas instituições para fora da comunidade em diáspora, como também aqueles que não possuem um projeto hermético para o futuro. Existem membros do clero que têm em seus horizontes e subjetividades a manutenção de suas comunidades pela inserção profunda na contingência da metrópole, assumindo a formação de uma comunidade cosmopolita. Muitas vezes isso significa uma abertura à comunidade brasileira: Então, temos muitos fiéis brasileiros e aqui rezamos em grego e português exatamente para a gente se situar posteriormente no habitat no qual nós estamos. 100 Essas Igrejas tentam adaptar-se de forma radical a esse habitat. Esse habitat sugerido por GO é a situação de diáspora das Igrejas Orientais. O fato de estarem presentes em São Paulo faz com que elas sejam convocadas a se reestruturar a todo momento. A transculturação está presente sempre na subjetividade dos membros do clero, mesmo aqueles que somente têm a comunidade original no horizonte, como os armênios. Adaptar-se ao habitat é pensar estratégias e experiências dessa situação de transculturação. A presente dissertação foca essas questões das experiências, forças, subordinações, contradições 101, que apontam para a diversidade de perspectivas dos membros do clero. Não deve ser prudente sugerir definições fixas, tampouco compreender essas Igrejas como estáticas e associadas ao passado remoto. 100 Depoimento de membro da Igreja Ortodoxa Grega da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 17/8/ THOMPSON, Edward. A Miséria da Teoria. Rio de Janeiro: Zahar Editores, p.58.

93 92 No depoimento de RO observa-se todo esse processo de adaptação de sua Igreja na contingência da metrópole: Mas, com o tempo, justamente pelo fato de as pessoas não falarem o idioma local, os padres, principalmente, já eram pessoas de meiaidade para cima, não tinham possibilidade de aprender já a língua fluentemente; e não faziam o trabalho com relação, digamos, aos brasileiros aqui tendo em vista o Brasil especialmente. Então os casamentos mistos colaboraram para que houvesse uma força centrífuga entre os paroquianos e... Quando se deu conta disso já era um pouquinho tarde, começamos a trabalhar nesse sentido. 102 Figura 10 - Igreja Ortodoxa Russa no Exílio na Rua Tamandaré Depoimento de membro da Igreja Ortodoxa Russa no Exílio da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 24/2/ Autor: Felipe Beltran Katz. Data: 7/9/2011.

94 93 A contingência se impõe: os membros do clero e os fiéis envelhecem, os casamentos mistos ocorrem, muitos abandonam aquela fé e cultura. Assim, os membros do clero passam a considerar novas atitudes para adaptarem suas Igrejas: Hoje, 60% de nossos paroquianos são brasileiros. Os ofícios são celebrados em português, então nós temos hoje um reverso, nós temos brasileiros se convertendo [...]. Procurando, então, achando essa possibilidade na Igreja Ortodoxa, principalmente a nossa Russa, que mantém uma diretriz mais rigorosa com relação, digamos, a essas leis fundamentais Ortodoxas. Hoje a comunidade não é grande, é pequena, não é tão grande quanto nos anos 40, 50, 60, mas continua viva e estamos aqui. 104 Segundo RO, a Igreja Ortodoxa Russa na cidade de São Paulo optou pela abertura aos brasileiros, sendo que o proselitismo aparece como forma de transformação dessa comunidade. O resultado é visto na nacionalidade da maioria dos paroquianos da Igreja brasileira. No entendimento do membro do clero, a vinda desses brasileiros ocorre devido ao que seria uma diretriz mais rigorosa, ou seja, a própria cultura e fé russa, sendo mais um exemplo do Iconostasis Paulistano. Uma Igreja Oriental carregada de elementos de sua comunidade original, mas frequentada principalmente por fiéis brasileiros. Outra Igreja que tem como direção a incorporação dos brasileiros em seu projeto é a Igreja do Patriarcado Ortodoxo de Antioquia. Ela parece muito preocupada em divulgar a celebração de matrimônios em sua publicação oficial, que aponta ainda para o fato de que realiza, inclusive, segundas núpcias. Existe um projeto bem elaborado, com o objetivo de que esses novos casais, muitas vezes brasileiros, participem do dia a dia dessa Igreja, que está 104 Depoimento de membro da Igreja Ortodoxa Russa no Exílio da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 24/2/2010.

95 94 exemplificado no panfleto distribuído gratuitamente na catedral. Nele se encontra uma relação de compromissos dos noivos recém-casados com a Igreja: Aqueles que se casam na Catedral devem estar cientes de seu compromisso com a Igreja. 1 - Compromisso obrigatório de receber o Crisma e participar nas palestras para os noivos. 2 - Compromisso de batizar os filhos na Igreja Ortodoxa Antioquina. 3 - Compromisso de participar nas festas litúrgicas durante o ano nas celebrações da missa dominical. 4 - Compromisso de participação como membros da Igreja na contribuição anual. 105 A Igreja do Patriarcado de Antioquia parece ter como objetivo incentivar que os novos casais interajam com a Igreja. Os compromissos estabelecidos nesse documento sugerem a busca pela continuidade da Igreja, ao exigir, por exemplo, o batismo dos filhos desses casais nela própria. A incorporação da identidade brasileira é algo que está no horizonte dessa Igreja. Isso aparece claramente no discurso de PO: Todos que quiserem se unir a nós são bem-vindos, não importa a etnia, não importa origem, não importa cor, não importa idioma. A Igreja Ortodoxa, nas suas origens, os vários Patriarcados, eles se abriram muito e, embora com o passar do tempo tenham alguns se fechado por questões históricas, políticas, por toda uma história muito traumática, pela qual alguns grupos passaram, não é nosso ideal Texto retirado do material oficial da Igreja do Patriarcado Ortodoxo de Antioquia da cidade de São Paulo, distribuído gratuitamente aos visitantes de sua Catedral no bairro do Paraíso. 106 Depoimento de membro do clero da Igreja do Patriarcado Ortodoxo de Antioquia da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 7/7/2010.

96 95 Levando-se em conta que o membro do clero é quase um portador do discurso oficial da Igreja, PO admite a abertura de sua Igreja para os fiéis brasileiros. Diferentemente de seu colega AO, por exemplo. De todas as Igrejas Orientais paulistanas, a Igreja Copta talvez seja a mais aberta aos brasileiros. Como já abordado no capítulo anterior, a razão do estabelecimento dessa Igreja na metrópole foi a de criar uma comunidade cristã ortodoxa copta longe das pressões do Egito. CO discorre sobre esse projeto em seu depoimento: De todos, eu comecei esse tipo de missão aqui no Brasil começando essas pessoas me conhecendo na época que eu estava morando no mosteiro de São Bento, porque eu cheguei aqui em 93. Morei no mosteiro de São Bento no centro, um ano e meio. Eu conheci muita gente lá, eu conheci o povo no supermercado, nas ruas, no metrô. Comecei a batizar muita gente, e eles começaram a conhecer a nossa Igreja, ficou contente e ficou continuando, sempre aparece gente nova na nossa Igreja. 107 A missão, o projeto da Igreja Copta foi aumentar os seus fiéis pela aproximação de brasileiros. Com esse depoimento é possível identificar os membros do clero como indivíduos que guiam essas comunidades e criam projetos para a sua manutenção. CO e seus colegas são responsáveis pela construção de uma Igreja Copta na cidade de São Paulo, assim como os demais membros do clero são os responsáveis por pensar o futuro de suas Igrejas, aglutinando transculturações. 107 Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Copta da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 22/8/2010.

97 96 No entanto, os membros do clero por si só não podem construir essa diversidade das Igrejas Orientais na cidade de São Paulo. Isso porque os membros clericais das Igrejas Orientais, que seriam guardiões de uma cultura aparentemente estática, se deparam com diversas experiências; portanto, sua existência na metrópole está longe de sugerir um ambiente estático. A transculturação desses grupos na metrópole perpassa forças diversas, subordinações e contradições. Em seu depoimento, CO destaca outro ponto fundamental para as Igrejas Orientais paulistanas: o peso da Igreja Católica Latina nas relações com a cidade. Ele diz que se hospedou no mosteiro de São Bento, ou seja, dependeu da boa vontade dos monges católicos latinos para levar seu projeto adiante. O peso da Igreja Latina é notório nas perspectivas das Igrejas Ortodoxas paulistanas, mas é ainda mais notável nas relações das Igrejas Católicas Orientais paulistanas. Muitas vezes esse peso dificulta os próprios projetos dessas Igrejas. Desse modo, verifica-se que os membros do clero católico oriental devem medir de forma muito cautelosa as implicações da influência da Igreja Latina em sua função de guardiões de suas comunidades. O próximo capítulo será dedicado ao peso que a Igreja Católica Latina tem na existência e nos projetos das Igrejas Orientais paulistana, especialmente em relação às Igrejas Católicas Orientais.

98 97 CAPÍTULO III MEDIANDO TRADIÇÕES NA METRÓPOLE PAULISTANA: IGREJAS CATÓLICAS ORIENTAIS Entre os dois grandes grupos de Igrejas Orientais encontrados na cidade de São Paulo está o das Igrejas Católicas Orientais. Este capítulo tratará exclusivamente desse grupo. Essas Igrejas no passado eram parte indistinta das Igrejas Ortodoxas, mas, pelos mais diversos motivos, acabaram aceitando o Papa de Roma como sua máxima liderança. Hoje elas pertencem à Igreja Católica Romana e são canonicamente chamadas de Igrejas sui juris: A Igreja Católica é formada atualmente por 22 Igrejas, que o Código Oriental, dizendo mais precisamente, o Código dos Cânones das Igrejas Orientais define como Igrejas sui juris, palavras latinas que significam: de direito próprio. Naturalmente na unidade da fé, na unidade do governo do Santo Padre, na unidade dos Sacramentos, mas na diversidade dos Ritos, das línguas, da liturgia, da disciplina, e mesmo da espiritualidade. Essas 21 Igrejas Orientais, mais a Igreja Latina, a mais numerosa de todas, compõem hoje a Igreja Católica Apostólica Romana. 108 Segundo esse trecho do depoimento de AC, a Igreja Latina 109 é a mais numerosa de todas as Igrejas Católicas. Sua influência é profunda nas relações das Igrejas Católicas Orientais, e numa cidade como São Paulo, onde a Igreja Latina é extremamente influente, esse poder é notório. 108 Depoimento de membro do clero da Igreja Católica Armênia da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 9/3/ O adjetivo latino(a) sugere a origem dessa Igreja nas regiões ocidentais do Império Romano, de fala latina, em detrimento do grego, falado na parte oriental do Império. Latino passa assim a designar as formas cristãs da Europa Ocidental. PARRY, Ken (et. al.). The Blackwell Dictonary of Eastern Christianity. Oxford: Blackwell, p.292.

99 98 Por sua relação com a Igreja Latina e seu antigo pertencimento ao mundo cristão ortodoxo, as Igrejas Católicas Orientais são muitas vezes entendidas como desviadas das tradições: Enquanto os Ortodoxos são hostis aos Católicos Gregos, considerando que eles caíram à sedução da herética Igreja Romana, Católicos consideram que eles não são verdadeiramente Católicos, pois não seguem tradições Latinas." 110 Essa é a origem do nome que muitos cristãos ortodoxos dão a seus coirmãos católicos orientais: uniatas. Eles estariam em conluio com o Papa de Roma e subvertendo a ordem eclesiástica. A situação das Igrejas Católicas Orientais na cidade de São Paulo parece ser delicada. No entanto, como suas irmãs Ortodoxas, elas são capazes de mediar suas tradições na cidade. Mas, ao contrário das Igrejas Ortodoxas, elas encontram em seus horizontes o poder da Igreja Latina, o que faz com que tenham de ser ainda mais perspicazes. O presente capítulo tentará apontar alguns elementos dessa nem sempre fácil convivência dessas outras Igrejas Católicas paulistanas, bem como as relações que elas mantêm na cidade com as Igrejas Ortodoxas e, principalmente, com a Igreja Latina. As Igrejas Católicas Orientais situadas na cidade de São Paulo já foram apresentadas, no entanto, é importante relembrá-las: a Igreja Católica Maronita e a Igreja Católica Melquita, ambas associadas à comunidade árabe; a Igreja Católica Armênia; e as Igrejas Católica Russa e Ucraniana, ambas da comunidade eslava. Deve-se também ressaltar que essas Igrejas dividem suas comunidades em diáspora com as Igrejas Ortodoxas, ou seja, as Igrejas Católicas Orientais e as Igrejas Ortodoxas na cidade de São Paulo são muitas vezes compostas por membros de uma mesma comunidade imigrante residente na cidade. Assim sendo, o estabelecimento dessas instituições na cidade seguiu linhas semelhantes às das Igrejas Ortodoxas, mas existem algumas nuances. 110 BINNS, John. An Introduction to the Christians Orthodox Churches. Cambridge: Cambridge University Press, p.36.

100 OS OUTROS CATÓLICOS Essa relação com as Igrejas Ortodoxas faz com que as Igrejas Católicas Orientais sejam quase um duplo de suas coirmãs. Em outras palavras, as Igrejas Católicas Orientais reorganizaram suas tradições baseando-se nas Igrejas Ortodoxas a que pertenciam no passado. Portanto, não é coincidência que as comunidades imigrantes na cidade muitas vezes estejam associadas às duas Igrejas Orientais: uma Ortodoxa e uma Católica. Um exemplo irá tornar essas relações mais claras. A Igreja Católica Ucraniana divide com a Igreja Ortodoxa Ucraniana os membros da diáspora ucraniana na cidade. A Igreja Católica Armênia divide com a Igreja Apostólica Armênia os membros da comunidade armênia. Assim sendo, essa proximidade criaria uma relação especial entre Igrejas de uma mesma comunidade. Além das Igrejas mencionadas, existe uma relação especial entre a Igreja Católica Maronita e a Igreja Ortodoxa Sirian, a Igreja Católica Melquita e a Igreja do Patriarcado Ortodoxo de Antioquia e entre a Igreja Ortodoxa Russa no Exílio e a Igreja Russa Católica. A Igreja Ortodoxa Grega e a Igreja Ortodoxa Copta não possuem irmãos católicos na cidade de São Paulo. As influências dessas Igrejas nas suas comunidades variam, não há uma divisão igualitária entre fiéis ortodoxos e católicos. A Igreja Apostólica Armênia é muito mais influente na comunidade paulistana que sua irmã católica. Por outro lado, os católicos maronitas são muito mais numerosos do que os ortodoxos sirian na cidade e no país. Essas Igrejas Católicas Orientais têm uma organização própria que, muitas vezes, depende da hierarquia latina paulistana, mas o passado dessas comunidades e sua emigração para a metrópole as tornam próximas das Igrejas Ortodoxas.

101 100 A Igreja Católica Maronita está associada à comunidade árabe e intimamente relaciona à imigração libanesa. A associação entre o Líbano e a Igreja Maronita é antiga e está ancorada no mito de que os verdadeiros libaneses seriam membros dessa Igreja, os católicos orientais de tradição siro-aramaica, para muita contestação das demais comunidades culturais do Líbano. 111 As origens da Igreja Maronita remontam ao século V, quando os seguidores de São Marun fundaram, com o Imperador Romano, o Mosteiro de Beit Marun na atual Síria: Não foi por acaso que o imperador Marciano mandou construir o convento de São Marun um ano após o Concílio de Calcedônia. Constatando o poder de persuasão daqueles monges e sua influência crescente sobre o povo arameu da região, resolveu apoiá-los para receber em troca seu apoio nos domínios políticos e religiosos. 112 Numa história oficial, os Maronitas estão, desde sua fundação, associados a uma união com as Igrejas Calcedonianas e, em última instância, também com a Igreja Católica Romana. Essa antiga relação com Roma é algo, como será visto mais adiante, de suma importância para a criação de uma tradição Maronita. Essa associação com a Igreja Latina pode ser encontrada na organização da Igreja Católica Maronita na cidade de São Paulo. Ao contrário do que ocorre com muitas Igrejas Católicas Orientais na cidade, a Igreja Maronita está subordinada à Arquidiocese de São 111 MOOSA, Matti. The Maronites in History. Piscataway: Georgias Press, p EDDÉ, Emile. A Igreja Maronita e o Líbano. Vol.I. Rio de Janeiro: Edições do Centro Cultural de Missão Libanesa Maronita do Brasil, p.142.

102 101 Paulo 113. Assim, ela estaria subordinada à hierarquia Católica Latina da cidade. A Igreja Católica Melquita também divide esse destino. Figura 11 - Igreja Católica Maronita na Rua Tamandaré. 114 Os Melquitas 115 também estão ligados à imigração árabe na cidade, síria e libanesa. Por sua ligação profunda com o imperador bizantino, a Língua Litúrgica da Igreja Melquita era o grego, mas aos poucos o árabe foi tomando esse lugar 116. Diferentemente da Igreja Maronita, que tem como Língua Litúrgica o siro-aramaico (língua mais falada no Levante 113 Depoimento de membro do clero da Igreja Católica Maronita da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 3/2/ Autor: Felipe Beltran Katz. Data: 7/9/ A palavra Melquita tem origem no siro-aramaico malik, que significa senhor, rei, imperador. No início do cristianismo, no Levante, os cristão calcedonianos eram chamados assim, pois professavam a mesma doutrina religiosa do imperador romano/bizantino. Com o passar dos séculos, esse nome foi associado exclusivamente aos membros da Igreja Católica Melquita. SHOFANY, Saba. The Melkites at the Vatican Concil II: Contribution of the Melkites Prelates to the Vatican Concil II. Bloomington: Authorhouse, p Depoimento de membro do clero da Igreja Católica Melquita da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 20/5/2010.

103 102 antes da chegada do Islã). Ambas as Igrejas sofreram com as convulsões da região que culminaram com a Guerra Civil libanesa nas décadas de 1970 e Problemas políticos e econômicos, além das perseguições a esses grupos, provocaram a emigração dessas populações: O precário balanço de nações e religiões do Líbano foi testado durante o século XX. [...] Cerca de Cristãos dispersaram-se pelo conflito comparados com Mulçumanos; as consequências sociais e econômicas para todas as comunidades Cristãs foram imensas e levaram à uma generalizada emigração. 117 Maronitas e Melquitas dividem esse passado, como Igrejas de origem árabe e como Católicas Orientais. Outra Igreja que sofreu com as convulsões do Oriente Médio foi a Igreja Católica Armênia, que, como sua coirmã Apostólica Armênia, assistiu ao Genocídio Armênio 118. Com relação à organização da Igreja Católica Armênia na cidade, cumpre notar que ela é independente da arquidiocese, pois é um Exarcado 119 : Vindo a Igreja Armênia Católica na América Latina, em 1981 foi criado um Exarcado Apostólico para toda a América Latina. Exarcado na Teologia Oriental Eclesiástica significa uma diocese em formação e, para usar a terminologia oriental, uma eparquia em formação. Estende-se desde o México até a Argentina [...] na realidade nós temos 117 O MAHONY, Antony. Syriac Christianaty in the Modern Middle East. In: ANGOLD, Michel (Org.). The Cambridge History Of Christianity - Eastern Christanity. Cambridge: Cambridge University Press, p Ver Capítulo O Exarcado é uma divisão eclesiástica do cristianismo oriental que possui origem nas divisões provinciais do Império Bizantino. Ela denomina uma eparquia (diocese oriental) em formação, sua autonomia é limitada e está submetida diretamente à autoridade máxima da Igreja. PARRY, Ken (et. al.). The Blackwell Dictonary of Eastern Christianity. Oxford: Blackwell, p.195.

104 103 seis países somente com comunidade armênia católica. O México, a Venezuela, o Brasil, o Uruguai, a Argentina e o Chile. A Argentina, em 1989, foi elevada à categoria de diocese, ou seja, de eparquia e [...] naturalmente eu tenho uma sede para cada país, tem uma catedral em São Paulo na Avenida Tiradentes, no bairro da Luz, tenho outra em Montevidéu para aquela comunidade e na Argentina em Buenos Aires. 120 Esse Exarcado com sede em São Paulo está diretamente subordinado ao Papa de Roma. Pode-se perceber que a representação da Igreja Católica Armênia na cidade comanda as decisões das demais comunidades armênias católicas da América Latina, salvo a Argentina, que possui uma Eparquia 121 própria. As Igrejas Católicas Eslavas também não estão subordinadas à arquidiocese latina da cidade. A Igreja Católica Ucraniana em São Paulo, assim como a Igreja Ortodoxa Ucraniana de São Caetano do Sul, também é formada pelos grupos que imigraram após a Segunda Guerra Mundial: As Igrejas que tem aqui em São Caetano e na Vila Bela na realidade, elas foram feitas com a ajuda mais da segunda imigração, que foi depois da Segunda Guerra Mundial. Começou a chegar em 49, mais ou menos, até 52, que veio a grande maioria. 122 Tanto os grupos ucranianos ortodoxos como os católicos foram forçados a colaborar como força de trabalho para a Alemanha nazista 123. Com o fim da guerra, temeram sofrer 120 Depoimento de membro do clero da Igreja Católica Armênia da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 9/3/ Nome dado às dioceses no cristianismo oriental. 122 Depoimento de fiel da Igreja Católica Ucraniana da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 20/8/2011. O código de identificação desses entrevistados será F-UC. 123 Ver Capítulo 1.

105 104 represálias na União Soviética como desertores. Assim sendo, com a colaboração da Cruz Vermelha e das comunidades imigrantes do Canadá, conseguiram emigrar para países com comunidades ucranianas já estabelecidas (da Primeira Imigração), como o Brasil 124. A Igreja Católica Ucraniana em São Paulo depende de sua sede brasileira localizada em Curitiba, que, por sua vez, é subordinada à arquidiocese latina daquela cidade. O caso da Igreja Católica Russa é peculiar. Ela está intricadamente ligada à sua condição de paulistana, diferentemente das demais Igrejas Católicas Orientais na cidade, que muitas vezes estão associadas a uma trama de relações mundiais. O grupo de cristãos russos que compõem essa Igreja tem origem na cidade de Harbin, no norte da China. Esse grupo estabeleceu-se na cidade para evadir-se da perseguição religiosa ocorrida na Rússia logo após a Revolução de 1917: E quando o Comunismo chegou bem perseguindo mesmo, tudo, inclusive os ortodoxos. Nós temos canonizados agora mais de 2 mil entre bispos, sacerdotes, padres com suas famílias, mulheres e filhos e leigos, simples leigos, que estavam engajados na ortodoxia. Então, mais de 2 mil mártires, fora os confessores que foram torturados, mas não chegaram a morrer. Muitos foram para Harbin, na China. Foi uma verdadeira cidade russa, Harbin. Depois tinha também... Na China e em vários lugares, várias cidades... Xangai tinha. 125 Segundo RC, as revoltas socialistas na China após a Segunda Guerra Mundial fizeram com que padres latinos interviessem em favor dessa comunidade russa naquele país: 124 Depoimento de fiel da Igreja Católica Ucraniana da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 20/8/ Depoimento de membro do clero da Igreja Católica Russa da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 14/2/2010.

106 105 Quando o Comunismo chegou lá, aí havia padres relacionados com o Vaticano, aí que a globalização ajudou, porque um grupo foi encarregado de acompanhar russos. Creio eu, não propriamente para convertê-los ao catolicismo, mas para manter aquela cultura deles, a religião deles. Um deles era inglês; foi preso em Xangai, depois foi solto, veio parar aqui no Brasil. Trabalhou muito pelos russos. Não creio que ele tivesse intenção de dar coisas para os russos, para depois... Trabalho, atendimento, para depois trazer para a Igreja Católica. Isso está comprovado que não foi assim. Veio o primeiro, que foi reitor do famoso Colégio Russico, que preparava os padres que iam para a Rússia. Esse chama-se Felipe de Régis. Ele fundou uma igreja, um centro, em Buenos Aires e veio para o Brasil, outro centro. Tudo combinado com o governo brasileiro, governo argentino, diplomaticamente, para receber levas dessa população russa da China, que vinha para o Brasil e para Buenos Aires. E foi assim que começaram a chegar. Era Juscelino Kubistchek, dispensaram muitas exigências de imigração, que já havia na época, e vieram muitos. 126 No depoimento de RC sobre a fundação de sua Igreja na cidade destacam-se alguns aspectos: o patrocínio oficial do governo brasileiro, que trouxe esse grupo para o país, durante o governo do presidente Juscelino Kubistchek, e principalmente a atuação da Igreja Católica e seu ramo latino no apoio a esses imigrantes. Percebe-se no depoimento um cuidado de RC em não apontar nenhum tipo de proselitismo da Igreja Católica na direção desses grupos russos, que eram na sua maioria ortodoxos. No entanto, esses grupos russos vindos da China acabaram por associar-se, como será discutido mais adiante, a instituições criadas pela Igreja Católica no país. Isso, em última instância, criou na cidade uma Igreja Católica Oriental Russa, inexistente na própria Rússia. Esse tipo de projeto da Igreja Católica com as comunidades russas da China não ocorreu 126 Depoimento de membro do clero da Igreja Católica Russa da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 14/2/2010.

107 106 somente no Brasil, mas também em outros países como Estados Unidos e Austrália, para onde alguns membros da comunidade russa de São Paulo reemigraram 127. Figura 12 - Igreja Católica Russa ao lado do Museu Paulista. 128 Um indício de que esse apoio às comunidades russas da China foi encarado como proselitismo está nas queixas e atitudes da Igreja Ortodoxa Russa no Exílio presente na cidade em relação à sua coirmã Católica Oriental, como se nota no depoimento de RC: Não eram bem vistos pelos ortodoxos já existentes em São Paulo. Vocês vão converter, pois, olha, todos nós temos que nos converter, 127 Depoimento de membro do clero da Igreja Católica Russa da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 14/2/ Autor: Felipe Beltran Katz. Data: 7/9/2011.

108 107 mas não assim, que você vai deixar sua religião para passar para essa. Não estamos nessa vontade. 129 RC sugere a relação entre as Igrejas. A Igreja Ortodoxa Russa na cidade encara a atitude da Igreja Católica como proselitismo, a conversão de seus possíveis fiéis. Em contrapartida, RC afirma que não há proselitismo por parte da Igreja Católica. Mas, de fato, a comunidade russa vinda da China para a cidade de São Paulo, ou o pouco que restou dela, está firmemente associada à Igreja Católica Russa na cidade, e não à Igreja Ortodoxa Russa no Exílio. Isso é obra da influência da Igreja Católica no estabelecimento dessa comunidade específica na cidade. Esse é um pequeno exemplo da relação entre as Igrejas Orientais presentes na cidade, principalmente a relação entre Igrejas que dividem uma mesma comunidade. Muitas vezes, ela é cordial, mas esbarra na luta pela própria afirmação dessas Igrejas e na fabricação de uma memória coletiva que por vezes é usada para justificar a união de determinado ramo com a Igreja Católica. Alguns desses conflitos serão evidenciados a seguir. 3.2 ROSÁRIO E ICONOSTASIS: ORTODOXOS E CATÓLICOS ORIENTAIS As Igrejas Católicas Orientais estariam num lugar intermediário, entre a tradição Católica Latina, por conta de sua filiação ao Papa de Roma, e as tradições das Igrejas Ortodoxas. Elas passam por um processo de hibridismo 130. Não uma mistura de relações entre o moderno e o arcaico, mas um processo que nunca está completo, e propõe múltiplas 129 Depoimento de membro do clero da Igreja Católica Russa da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 14/2/ HALL, Stuart; SOVIK, Liv (Orgs.). Da Diáspora: Identidade e Mediação Culturais. Belo Horizonte: Editora da UFMG, p.71.

109 108 direções e experiências. Isso é evidente no depoimento de AC sobre a retomada do catolicismo armênio na República da Armênia após o fim da União Soviética: Veja, por exemplo, na Armênia Soviética, Geórgia etc. Os países da antiga União Soviética, terminado depois de 70 anos o Comunismo. Foi fácil reconhecer as cidades que eram Católicas, porque eles tinham o terço e rezavam o terço. A oração da Ave Maria e, consequentemente, o Rosário são tradições Católicas. 131 A identificação dos católicos orientais armênios era realizada observando-se o uso que esses fiéis faziam do rosário, diferente do uso entre os apostólicos armênios. Os católicos orientais possuem práticas culturais semelhantes às dos católicos latinos, ao mesmo tempo que partilham certas características com os ortodoxos, como o Rito, as denominações eclesiásticas e as comunidades imigrantes. São iguais, mas diferentes. Retomando o caso das Igrejas Russas na cidade, cabe notar que ambas têm uma característica singular: são basicamente paulistanas, levando em conta a situação brasileira. A Igreja Ortodoxa Russa no Exílio existe somente na cidade, já que as outras Igrejas Ortodoxas Russas do país estão associadas ao Patriarcado de Moscou. A Igreja Católica Russa nasceu a partir de uma comunidade russa que emigrou para a cidade com a ajuda da Igreja Latina. Talvez justamente por essa condição paulista o diálogo entre elas seja tão reduzido. cidade: RC aponta para a aparente disputa que há entre sua Igreja a Igreja Ortodoxa Russa na 131 Depoimento de membro do clero da Igreja Católica Armênia da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 9/3/2010.

110 109 Chegando aqui ao Brasil, esses padres começaram a divulgar. Divulgar a união, ainda que os ortodoxos não tivessem muita estima nossa, mas com o tempo eles adquiriram bastante estima. [...] Mas ficou um grupo que não se abriu, eles não admitem nada da Igreja Católica. Para eles, a Igreja Católica, os sacramentos não são válidos, a missa não serve e mandam rebatizar, é uma espécie de anabatista [...] então caíram nessa teoria e essa teoria está de pé até hoje. 132 A Igreja Ortodoxa Russa no Exílio, identificada aqui como o grupo russo que não se abriu, de certa maneira, entendeu que a vinda desses imigrantes russos da China com a ajuda dos padres latinos seria uma forma de trazer esse grupo para dentro da Igreja Católica. Isso seria uma afronta a esse grupo ortodoxo. Como RO afirmou 133, a Igreja Ortodoxa Russa na cidade de São Paulo é contra qualquer tipo de aproximação com as demais Igrejas, principalmente a Católica. O fato é que existe entre o cristianismo russo paulistano uma disputa pelos féis. Porém, as Igrejas Russas em diáspora ligadas ao Patriarcado de Moscou (como a do Rio de Janeiro e a de Buenos Aires) dialogam com os russos católicos de São Paulo e, inclusive, cooperam com esse grupo, uma vez que eles não contam nem com um pároco próprio: Por exemplo, vinha os padres ortodoxos para celebrar aqui, porque juntos não podem, eles mesmos têm suas leis. Fizeram... Esse padre que morreu aqui fez amizade na Argentina. O representante do Patriarcado de Moscou na Argentina é que comanda também aqui no 132 Depoimento de membro do clero da Igreja Católica Russa da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 14/2/ Ver Capítulo 1.

111 110 Brasil. Nós temos no Rio de Janeiro o padre [...] já veio fazer cerimônia. 134 Assim sendo, as filiações da Igreja Católica Russa estabelecida na cidade, no que diz respeito às relações entre russos em diáspora, são com comunidades fora da cidade. O que acarreta dificuldades para a comunidade e para a Igreja. Contudo, nem todas as aproximações entre as Igrejas que dividem uma mesma comunidade na cidade são tão antagônicas como a relação entre as Igrejas Russas. A aproximação entre a Igreja Católica Ucraniana e a Igreja Ortodoxa Ucraniana parece ser bem cordial. Os depoimentos são consensuais: É uma proximidade muito grande, são Igrejas irmãs, porque o povo que participa, o povo se conhece, se entende, se acolhe, se respeita, isso que é muito importante. E quando se fala da questão ucraniana, o que prevalece justo e que mais une é a nossa cultura. Tanto ortodoxos quanto católicos, eles se entendem muito bem e de modo especial quando se fala de representatividade da nossa cultura ucraniana, é um laço muito forte que identifica e aproxima. Então não existe naquele espaço distinção. 135 semelhante: Parece que tanto UC como seu colega UO, da Igreja Ortodoxa, mantêm um discurso Essa relação é uma relação bastante forte, bastante intensa porque, em primeiro lugar, eu acho porque temos um clube, uma sociedade aqui 134 Depoimento de membro do clero da Igreja Católica Russa da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 14/2/ Depoimento de membro do clero da Igreja Católica Ucraniana da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 16/6/2010.

112 111 em São Caetano, onde essa sociedade ela já existe desde a década em que os imigrantes vieram para cá, construíram a sociedade juntos. Então foi um elo que já desde o início uniu, ou seja, não existem divergências, não existem brigas, entre aspas, falando: Eu sou da Igreja Católica Ucraniana, Eu sou da Igreja Ortodoxa. Nesse aspecto, jamais pude ouvir que houve no passado, pelo contrário, as pessoas mais de idade sempre comentam que sempre trabalharam juntas, que tem o grupo folclórico inclusive atuante, eles se apresentam para fora, para até, inclusive, daqui de São Paulo e o grupo folclórico é composto pelas comunidades tanto Católica como Ortodoxa, então isso une bastante. 136 UO ratifica a forte relação entre os fiéis das duas Igrejas, inclusive citando a existência do grupo folclórico. Segundo os depoimentos, haveria uma identidade ucraniana que estaria acima das relações entre as Igrejas. No entanto, deve-se ter em mente que nos depoimentos os conflitos e diferenças entre essas Igrejas aparecem de forma sútil, salvo algumas exceções. Desse modo, deve-se dar atenção às sutilezas, principalmente no que diz respeito à construção da memória dessas Igrejas. Pois a diferenciação entre as Igrejas Católicas Orientais e suas coirmãs Ortodoxas perpassa a criação de um passado que legitime essas diferenças. Isso está presente no depoimento de PO acerca da relação entre a Igreja do Patriarcado Ortodoxo de Antioquia e sua coirmã Igreja Católica Melquita: Nós temos uma relação maior por causa da comunidade. Os árabes, sírios, libaneses e outros que nas duas Igrejas se conhecem têm os mesmos parentescos, então é natural que nós tenhamos uma relação dentro da própria comunidade sírio-libanesa. Mas, por outro lado, como Igreja nós os vemos como católicos, eles são Católicos 136 Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Ucraniana do município de São Caetano do Sul, em entrevista concedida ao autor em 18/4/2010.

113 112 Romanos de Rito Oriental. Não sentimos nem mais próximos, nem mais distantes. Para nós, são Católicos Romanos. 137 Segundo PO, existe uma relação próxima entre sua Igreja e a Igreja Melquita, uma vez que ambas, como já mencionado, dividem uma mesma comunidade. Entretanto, essa relação especial entre as duas Igrejas está condicionada à criação de uma memória que legitime o passado de uma Igreja como mais autêntico que o da outra. No depoimento de PO, os Melquitas são tratados como Católicos Romanos. Assim sendo, todas as características específicas da Igreja Melquita que são divididas com a Igreja do Patriarcado, como o Rito, são desvalorizadas pelo fato de a Igreja Melquita ser uma Igreja Católica Oriental. PO tem como objetivo sugerir que a sua Igreja é aquela que guarda verdadeiramente os preceitos de uma cultura religiosa greco-árabe. Para PO, a Igreja Melquita, por sua associação com a Igreja Católica, teria perdido essas características e se tornado meramente uma Igreja Católica. Essa memória construída aparece de forma sutil nos depoimentos, em que os membros do clero, invariavelmente, procuram valorizar a trajetória de sua Igreja. No horizonte desses religiosos está presente a luta por legitimar um passado. Eles, como guardiões da memória oficial de suas comunidades e Igrejas, têm por obrigação guardar e valorizar esse passado construído para lembrar a comunidade da ordem divina das coisas 138. Quando isso ocorre na relação entre Igrejas Ortodoxas e Igrejas Católicas Orientais coirmãs, a preocupação aprofunda-se. Como no caso da Igreja Católica Armênia e Igreja Apostólica Armênia. 137 Depoimento de membro do clero da Igreja do Patriarcado Ortodoxo de Antioquia da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 7/7/ LE GOFF, Jacques. História e Memória. Campinas: Editora UNICAMP, p.432.

114 113 Figura 13 - Igreja Católica Armênia de São Gregório na Avenida Tiradentes. 139 Na cidade de São Paulo a Igreja Católica Armênia tem como santo padroeiro de sua igreja principal São Gregório o Iluminador. A escolha desse santo é indício da disputa de memória que há entre as duas Igrejas armênias presentes na cidade. Segundo o depoimento de AC: O Apóstolo da Armênia, São Gregório, lembremos, não era armênio. Nasceu na margem do Mar Negro, no chamado Pontus, que nunca foi parte da Armênia [...]. 140 Segundo a tradição católica armênia, São Gregório não era armênio. O santo teria viajado à Armênia para converter os armênios ao cristianismo. Descoberto como cristão, teria sido jogado num poço. Passado doze anos, o rei da Armênia, Tiriades III, estava mentalmente doente: 139 Autor: Felipe Beltran Katz. Data: 16/9/ Depoimento de membro da Igreja Católica Armênia da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 9/3/2010.

115 114 Foi acometido de uma grande doença psicológica, que se julgava um animal e vagava pelos pastos, somente a irmã num sonho foi informada que só aquele Gregório, jogado no fosso, poderia curar o seu irmão. Haviam passado doze anos, e lá ele estava vivo, o tiraram e a segunda festa é justamente a saída do fosso. São Gregório curou o rei, e o rei, admirado, quis ter a mesma fé e se converteu, e com ele toda a nação. 141 O mesmo rei Tiriades III havia sido um grande perseguidor de cristãos, perseguira inclusive pretendentes cristãs enviadas de Roma: O rei cometeu vários crimes, inclusive perseguindo as virgens que vinham de Roma, fugindo da perseguição de Roma, e não querendo casar com o rei, as matou. Gaiane, Hripsime, grandes santas que hoje temos as primeiras igrejas na Armênia, foram para essas santas mártires que vinham de Roma. 142 Com a explicitação desse trecho, a intenção não é avaliar a veracidade dos fatos apresentados. A disputa de memória é construção, e a elaboração do passado dessas comunidades não é estática, ela perpassa a invenção e, muitas vezes, a obliteração de práticas culturais preexistentes 143. O que AC parece tentar evidenciar é que o cristianismo foi trazido de fora da Armênia, e que houve resistência à penetração deste naquela região. São Gregório foi jogado num fosso por doze anos por ser cristão. Gaiane e Hripsime foram mortas por serem cristãs. Com isso, o objetivo é apontar que a Igreja Católica Armênia: 141 Depoimento de membro da Igreja Católica Armênia da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 9/3/ Depoimento de membro da Igreja Católica Armênia da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 9/3/ HOBSBAWM, Eric J. Nações e nacionalismos desde 1780: programa, mito e realidade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, p.19.

116 115 Não tem nada de Igreja Nacional, isso surgiu por circunstâncias dos tempos e das circunstâncias políticas dos séculos. Então, é por isso que eu sustento e estou consciente de que nós católicos, embora poucos, 20%, somos aquele resto que permaneceu fiel à Igreja, não Nacional, mas Universal e Católica iniciada por São Gregório o Iluminador. 144 A Igreja Católica Armênia está associada a São Gregório, que levou o cristianismo para a Armênia e foi perseguido por isso. Associando a sua Igreja a São Gregório, AC sugere que sua Igreja é mais antiga que a Apostólica Armênia. Que sua Igreja possui mais legitimidade, pois não só é mais antiga, como foi perseguida pelos próprios armênios na busca por cristianizá-los. Então, em conclusão, o que eu estou convencido e afirmo que nós, armênios católicos, embora sejamos hoje 20% da população armênia no mundo, somos aqueles chamados na Bíblia o resto de Israel. Aqueles que ficaram fiéis ao Apóstolo São Gregório, chamado o Iluminador, por ter transmitido a Luz de Cristo ao povo armênio. São Gregório, ele não fundou uma Igreja nacional, e a Igreja Armênia Apostólica hoje, ela se declara Igreja Nacional [...]. 145 A Igreja Apostólica Armênia seria a Igreja criada por Tiriades, pelo rei, e, portanto, seria nacional. Um rei que, no passado, perseguira os cristãos. A Igreja Católica Armênia foi criada por São Gregório, que havia sido perseguido por Tiriades por tentar implantar o cristianismo na Armênia. Esse arranjo tem por objetivo legitimar uma Igreja Armênia em detrimento de outra. AC não retira a legitimidade da Igreja Apostólica Armênia, mas acredita 144 Depoimento de membro da Igreja Católica Armênia da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 9/3/ Depoimento de membro da Igreja Católica Armênia da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 9/3/2010.

117 116 que a sua Igreja é mais verdadeira, menos mundana, não necessita ser nacional, pois não nasceu na armênia, mas é maior, é universal. Outra disputa de memória existe entre a Igreja Católica Maronita e a Igreja Ortodoxa Sirian, ambas representantes do cristianismo sírio-aramaico. A Igreja Maronita, como já mencionado, está intimamente ligada à construção de uma identidade libanesa. O fato de os maronitas serem católicos orientais reforça essa identidade peculiar desse grupo em seu lugar de origem: Assim, para os Maronitas, Líbano e Maronismo tornaram-se sinônimos. Além disso, os Maronitas começaram a considerar a si mesmos como uma comunidade única, que, em relação à religião e cultura, era distinta de um mundo predominantemente Árabe Muçulmano. É este conceito de exclusividade da Comunidade Maronita que é o motivo primário da busca dos Maronitas por uma identidade distinta. 146 Para reforçar essa ligação entre as especificidades Católica, Maronita e libanesa, MN ressalta o papel dos Maronitas no Concílio de Calcedônia: O Concílio de Calcedônia no ano 451 e os principais defensores Orientais eram Maronitas. Principalmente era um importantíssimo bispo, esse bispo chamado Teodoreto de Siro. Ele com o Papa Leão Magno são os principais homens que trataram esse tema: Jesus Cristo, Deus e homem. Esse Concílio de Calcedônia que dá isso. Logo os discípulos de São Maron com Teodoreto de Cyro eram os grandes defensores deste dogma da Igreja. E, de outro lado, o Papa de Roma, 146 MOOSA, Matti. The Maronites in History. Piscataway: Georgias Press, p.2.

118 117 por esta razão, estava em contato contínuo com Leão o Grande, Papa de Roma. 147 MN preocupa-se em destacar o fato de que os Maronitas estiveram ao lado do Papa de Roma durante toda a discussão do Concílio de Calcedônia. Isso sugere uma união remota entre sua Igreja e a Igreja Latina, além de marcar a peculiaridade do maronitas na defesa da mesma concepção católica latina de cristianismo 148. Todavia, a tradição sirian ortodoxa apresenta um passado diferente para a Igreja Maronita. Segundo SO: Inclusive a Igreja Maronita saiu da Igreja Siríaca Ortodoxa no século VII, desde aquele tempo a Igreja Maronita, como era um povo da mesma Igreja, mesmo povo da nossa Igreja, continua celebrando e usando a língua aramaica ou a língua siríaca nos Ritos atuais e em todas as cerimônias. 149 No depoimento de SO, a Igreja Maronita está intimamente ligada à Igreja Sirian seus fiéis eram da mesma Igreja. Assim sendo, não haveria peculiaridades entre a Igreja Maronita e a Igreja Sirian, a não ser o fato de uma estar subordinada ao Papa de Roma e a outra, não. Além disso, SO sugere que a separação entre as Igrejas ocorreu no século VII, ou seja, muito depois do Concílio de Calcedônia. 147 Depoimento de membro do clero da Igreja Católica Maronita da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 3/2/ Tanto as Igrejas Ortodoxas Calcedonianas como a Igreja Católica aceitam as resoluções do Concílio de Calcedônia (451), que discutiu a natureza de Cristo. O Concílio decidiu que Jesus possui duas naturezas (physis): uma humana e outra divina. Os maronitas foram uma das poucas correntes siro-aramaicas do cristianismo que adotaram essa resolução, diferentemente de sua coirmã na cidade. Marcar essa distinção é uma forma de distinguir os maronitas dos demais grupos religiosos do Líbano. PARRY, Ken (et. al.). The Blackwell Dictonary of Eastern Christianity. Oxford: Blackwell, p Depoimento de membro do clero da Igreja Ortodoxa Sirian da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 12/2/2010.

119 118 Enquanto a Igreja Maronita destaca sua anterioridade como membro da Igreja Católica, sua peculiaridade como membro distinto do cristianismo aramaico, em última instância, como aponta Moosa 150, justificaria seu caráter libanês. Já a Igreja Ortodoxa Sirian apresenta uma Igreja Maronita cismática e sem tentas peculiaridades, retirando, de certa forma, o caráter libanês desta. A construção da memória tangencia problemáticas contemporâneas, como o recente conflito libanês. As Igrejas, de certo modo, são espaços de disputa dessa memória. No processo de relacionar passado com presente, a antiguidade de uma Igreja denota sua autoridade e grandeza perante as demais 151. Como já mencionado, as Igrejas Católicas Orientais estão associadas à Igreja Católica Latina. A ligação com esta instituição foi o principal fator de rompimento entre esses grupos e suas antigas comunidades ortodoxas, como sugere o que ocorreu com a comunidade russa católica na cidade. Assim, surgiram disputas de legitimidade pela memória e pelos fiéis. A penetração da Igreja Latina nas demais Igrejas Católicas é notável, destacando-se a cidade de São Paulo, onde a Igreja Latina tem um puder substancial e as outras Igrejas Católicas são minoria. O poder latino, então, se engrandece. 3.3 ENTRE O UNIVERSAL E O PARTICULAR: IGREJA CATÓLICA LATINA E CATÓLICOS ORIENTAIS A palavra grega καθολικόρ (katholikós) significa universal. A Igreja Católica pretende-se universal, afirmando o acolhimento de várias tradições numa Igreja. No entanto, as Igrejas Católicas Orientais possuem a denominação de sui juris, têm jurisdição própria, ou seja, possuem certos particularismos. A prerrogativa de sui juris não é dada à Igreja Latina. 150 MOOSA, Matti. The Maronites in History. Piscataway: Georgias Press, LE GOFF, Jacques. História e Memória. Campinas: Editora UNICAMP, p.221.

120 119 Nesse mundo universal e, ao mesmo tempo, particular é que se dá a existência das Igrejas Católicas Orientais na cidade, com a manutenção de certos particularismos dentro do que seria uma Igreja Universal. Mas a prática se mostra distinta das denominações eclesiásticas. Como já discutido 152, não existe uma renovação dos fluxos migratórios das regiões de origem das Igrejas Orientais na cidade. Assim sendo, ocorre a diminuição numérica dos fiéis. Diferentemente das Igrejas Ortodoxas na cidade, as Igrejas Católicas Orientais talvez possuam menos autonomia na busca de sua manutenção, pois estariam mais expostas à influência da Igreja Latina. A preocupação dos membros do clero é grande, diante das circunstâncias; eles temem perder seus particularismos e a sua forma de catolicismo: Porque a quantidade, ela vai, digamos, sobrepondo aos poucos. Então a gente também corre esse risco, devido à questão proporcional. Mas se... Em questão de perseverança, é algo assim que vai se prevalecer, e também se não houver, digamos, uma divulgação da nossa parte quando vem a questão cultura ucraniana católica, se a gente não fizer um trabalho em cima disso, eu creio que em pouco tempo, no máximo um século, a questão latina, ela vai prevalecer. 153 UC teme a concorrência da Igreja Latina em sua paróquia. Nesse trecho do depoimento pode-se entender o peso da Igreja majoritária no horizonte do membro do clero. UC aponta para a questão numérica, proporcional. 152 Ver Capítulo Depoimento de membro do clero da Igreja Católica Ucraniana da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 16/6/2010.

121 120 Figura 14 - Igreja Católica Ucraniana na Vila Prudente. 154 Essa situação de minoria na cidade preocupa muitos católicos orientais paulistanos. Porém, não é somente o fato de ser minoria que causaria o fim dos particularismos dessas Igrejas. Como mencionado 155, os casamentos mistos, muitas vezes, impedem a renovação dos fiéis. Muitos católicos orientais tornam-se latinos pelo casamento: Diminuíram porque muitos casamentos são feitos na Igreja, mas só o casamento, depois vão pelo mundo. Batizados, poucos batizados, quero dizer, o futuro da comunidade não é ter uma comunidade de russos porque eles vão se integrando. Aqueles que estão batizados ali... Eu mesmo tenho um afilhado que foi batizado aqui, mas vai casar na Igreja Católica [Latina] Autor: Felipe Beltran Katz. Data: 7/9/ Ver Capítulo Depoimento de membro do clero da Igreja Católica Russa da cidade de São Paulo, em entrevista concedida ao autor em 14/2/2010.

IMPÉRIO BIZANTINO. Justiniano e sua corte (mosaico) Chiesa di S. Vitale Ravenna

IMPÉRIO BIZANTINO. Justiniano e sua corte (mosaico) Chiesa di S. Vitale Ravenna IMPÉRIO BIZANTINO Justiniano e sua corte (mosaico) Chiesa di S. Vitale Ravenna 395 - Império Romano é governado pelos filhos do imperador Teodósio: Honório (imperador do Ocidente) e Arcádio (imperador

Leia mais

O ROSÁRIO E O ICONOSTASIS- AS MEDIAÇÕES CULTURAIS DAS TRADIÇÕES DAS IGREJAS CATÓLICAS ORIENTIAS PAULISTANAS.

O ROSÁRIO E O ICONOSTASIS- AS MEDIAÇÕES CULTURAIS DAS TRADIÇÕES DAS IGREJAS CATÓLICAS ORIENTIAS PAULISTANAS. O ROSÁRIO E O ICONOSTASIS- AS MEDIAÇÕES CULTURAIS DAS TRADIÇÕES DAS IGREJAS CATÓLICAS ORIENTIAS PAULISTANAS. FELIPE BELTRAN KATZ* O cristianismo paulistano é diverso. Dentre as várias denominações que

Leia mais

O Cristianismo É uma religião abraâmica monoteísta centrada na vida e nos ensinamentos de Jesus, tais como são apresentados no Novo Testamento; A Fé

O Cristianismo É uma religião abraâmica monoteísta centrada na vida e nos ensinamentos de Jesus, tais como são apresentados no Novo Testamento; A Fé O Cristianismo É uma religião abraâmica monoteísta centrada na vida e nos ensinamentos de Jesus, tais como são apresentados no Novo Testamento; A Fé cristã crer em Jesus como o Cristo, Filho de Deus, Salvador

Leia mais

Colégio Ser! Sorocaba História 7ºs anos Profª Marilia Coltri. Adaptado de Alex Federle do Nascimento

Colégio Ser! Sorocaba História 7ºs anos Profª Marilia Coltri. Adaptado de Alex Federle do Nascimento Colégio Ser! Sorocaba História 7ºs anos Profª Marilia Coltri Adaptado de Alex Federle do Nascimento Império Bizantino O Império Bizantino foi o Império Romano do Oriente durante a Antiguidade Tardia e

Leia mais

Império Bizantino. Disciplina: História

Império Bizantino. Disciplina: História Império Bizantino Disciplina: História Origem O embrião do Império Bizantino surgiu quando o imperador romano Constantino I decidiu construir sobre a antiga cidade grega de Bizâncio uma nova capital para

Leia mais

FORMANDO UMA KOINÓTETA PAULISTANA: FIÉIS CRISTÃOS ORIENTAIS EM SÃO PAULO E SUAS PERSPECTIVAS. FELIPE BELTRAN KATZ*

FORMANDO UMA KOINÓTETA PAULISTANA: FIÉIS CRISTÃOS ORIENTAIS EM SÃO PAULO E SUAS PERSPECTIVAS. FELIPE BELTRAN KATZ* FORMANDO UMA KOINÓTETA PAULISTANA: FIÉIS CRISTÃOS ORIENTAIS EM SÃO PAULO E SUAS PERSPECTIVAS. FELIPE BELTRAN KATZ* Dentre as várias denominações religiosas encontradas na cidade de São Paulo encontramos

Leia mais

INTRODUÇÃO / INTRODUCTION

INTRODUÇÃO / INTRODUCTION ANAIS DO I SIMPÓSIO NACIONAL DE TEOLOGIA ORIENTAL (RE)DESCOBRINDO AS IGREJAS ORIENTAIS, ORTODOXAS E CATÓLICAS NO BRASIL INTRODUÇÃO / INTRODUCTION As Igrejas Orientais formam um dos pulmões pelos quais

Leia mais

Prefácio dos organizadores... Introdução...

Prefácio dos organizadores... Introdução... SUMÁRIO Prefácio dos organizadores... XI SEÇÃO IX HISTÓRIA DA IGREJA NO SÉCULO XIX Kurt Nowak e Hubert W olf Parte A História da Igreja evangélica a partir da Revolução Francesa até o final da Primeira

Leia mais

Propriedades essenciais da Igreja: a unidade, a catolicidade, a santidade e a apostolicidade

Propriedades essenciais da Igreja: a unidade, a catolicidade, a santidade e a apostolicidade O Instituto de Educação a Distância, IEAD RCCBRASIL, oferece aos carismáticos a oportunidade de se aprofundarem na História da Igreja. O curso tem o objetivo de estudar os modelos eclesiológicos e missionários,

Leia mais

Capacete de um chefe saxão

Capacete de um chefe saxão Capacete de um chefe saxão Fivela de ouro (séc. VI, Museu Britânico, A Europa no início do século VI Londres, Inglaterra). 2 Fim do Império Romano do Ocidente Guerras civis. Descrédito do Imperador. Fixação

Leia mais

TEMA-PROBLEMA. A experiência religiosa como afirmação do espaço espiritual do mundo FENÓMENO UNIVERSAL

TEMA-PROBLEMA. A experiência religiosa como afirmação do espaço espiritual do mundo FENÓMENO UNIVERSAL TEMA-PROBLEMA A experiência religiosa como afirmação do espaço espiritual do mundo RELIGIÃO FENÓMENO UNIVERSAL Religião e as práticas religiosas têm sido uma constante ao longo dos tempos e têm influenciado

Leia mais

Cristão na Terra Santa: uma reflexão do P. Imad Twal

Cristão na Terra Santa: uma reflexão do P. Imad Twal Cristão na Terra Santa: uma reflexão do P. Imad Twal TERRA-SANTA Por ocasião da XIV Assembleia Geral do Forum Internacional do MIAMSI (Mouvement International des Lieux Sociaux Indépendants) organizado

Leia mais

A Disputa pelos Eslavos

A Disputa pelos Eslavos No Oriente, na Palestina e na África, os muçulmanos estavam estabelecidos. No parte ocidental da Europa, a Igreja Romana tinha conseguido abraçar os germanos. Restava aos bizantinos, até por questão de

Leia mais

Semana de Oração propõe diálogo e unidade dos cristãos Qua, 11 de Maio de :27 -

Semana de Oração propõe diálogo e unidade dos cristãos Qua, 11 de Maio de :27 - 1 / 5 O lema bíblico "Chamados e chamadas para proclamar os altos feitos do Senhor" (1Pe2.9) inspira a Semana de Oração pela Unidade Cristã 2016. Este ano, a atividade ocorre, no Brasil, de 8 a 15 de maio

Leia mais

Oriente Médio. Do surgimento as tensões atuais

Oriente Médio. Do surgimento as tensões atuais Oriente Médio Do surgimento as tensões atuais A Região A região do Oriente Médio é uma das áreas mais conflituosas do mundo. Diversos fatores contribuem para isso, entre eles: a sua própria história; origem

Leia mais

2º bimestre 1ª série 12 - Era Medieval Formação e consolidação da Igreja Caps. 3.2, 3.3 e 7. Roberson de Oliveira Roberson de Oliveira

2º bimestre 1ª série 12 - Era Medieval Formação e consolidação da Igreja Caps. 3.2, 3.3 e 7. Roberson de Oliveira Roberson de Oliveira 2º bimestre 1ª série 12 - Era Medieval Formação e consolidação da Igreja Caps. 3.2, 3.3 e 7 Roberson de Oliveira Roberson de Oliveira 1 Igreja na Era Medieval Importância: 1. Único poder universal. 2.

Leia mais

ARTE CRISTÂ PRIMITIVA ARTE BIZANTINA

ARTE CRISTÂ PRIMITIVA ARTE BIZANTINA 3º ano - ENSINO MÉDIO Aula dia 13/03/15 ARTE CRISTÂ PRIMITIVA ARTE BIZANTINA Professora Alba ARTE CRISTÂ PRIMITIVA Após a morte de Jesus Cristo, seus discípulos divulgaram seus ensinamentos, e a comunidade

Leia mais

Igreja de Hagia Sophia

Igreja de Hagia Sophia Igreja de Hagia Sophia Constantino (em 312) teve uma revelação através de um sonho onde durante uma batalha teria visto uma cruz luminosa no céu. Depois disto, a batalha teria sido vencida. Assim, adotou

Leia mais

A finalidade pastoral do Código de Direito Canônico. Tiago Nascimento Nigro. Pe. Luiz Henrique Bugnolo

A finalidade pastoral do Código de Direito Canônico. Tiago Nascimento Nigro. Pe. Luiz Henrique Bugnolo 1 A finalidade pastoral do Código de Direito Canônico Tiago Nascimento Nigro Pe. Luiz Henrique Bugnolo Faculdade Católica de Filosofia e Teologia de Ribeirão Preto. Durante o período de elaboração do novo

Leia mais

Unidade 2: História da Filosofia. Filosofia Serviço Social Igor Assaf Mendes

Unidade 2: História da Filosofia. Filosofia Serviço Social Igor Assaf Mendes Unidade 2: História da Filosofia Filosofia Serviço Social Igor Assaf Mendes Períodos Históricos da Filosofia Filosofia Grega ou Antiga (Séc. VI a.c. ao VI d.c.) Filosofia Patrística (Séc. I ao VII) Filosofia

Leia mais

Sumário. Prefácio... 13

Sumário. Prefácio... 13 Sumário Prefácio... 13 PARTE UM O LEGADO ISRAELITA 1. Cristianismo e judaísmo... 29 A separação dos caminhos... 29 O cristianismo e o cânone hebraico da Escritura... 40 O cristianismo e a interpretação

Leia mais

FÍSICA FILOSOFIA. Resumex JáEntendi 1. A FILOSOFIA NA IDADE MÉDIA. Características Fundamentais da Idade Média

FÍSICA FILOSOFIA. Resumex JáEntendi 1. A FILOSOFIA NA IDADE MÉDIA. Características Fundamentais da Idade Média FILOSOFIA FÍSICA Resumex JáEntendi 1. A FILOSOFIA NA IDADE MÉDIA O período histórico comumente chamado de Idade Média inicia- se no século V e termina no século XV. Portanto, ele representa mil anos de

Leia mais

O Cristianismo - Questionário

O Cristianismo - Questionário O Cristianismo Cristianismo é uma religião abraâmica monoteísta centrada na vida e nos ensinamentos de Jesus de Nazaré, tais como são apresentados no Novo Testamento; A fé cristã acredita essencialmente

Leia mais

O começo da igreja. Jörg Garbers Ms. de Teologia

O começo da igreja. Jörg Garbers Ms. de Teologia O começo da igreja Jörg Garbers Ms. de Teologia O começo da igreja primitiva (33-62 A.D.) Datas importantes 30 48 50-64 70 55-90 ~135 A morte de Jesus Concílio de Jerusalém Cartas de Paulo Destruição de

Leia mais

ARTE BIZANTINA PROFª MARIANA KAADI

ARTE BIZANTINA PROFª MARIANA KAADI ARTE BIZANTINA PROFª MARIANA KAADI História Em 395 o Imperador Teodósio divide o Império Romano em duas partes: Império Romano do Ocidente com capital em Roma Império Romano do Oriente com capital em Constantinopla

Leia mais

A Santa Sé DE SETEMBRO DE 2001 PROGRAMA. Sábado, 22 de setembro de CHEGADA ao aeroporto internacional de Astana.

A Santa Sé DE SETEMBRO DE 2001 PROGRAMA. Sábado, 22 de setembro de CHEGADA ao aeroporto internacional de Astana. A Santa Sé VISITA PASTORAL DE SUA SANTIDADE JOÃO PAULO II AO CAZAQUISTÃO E VIAGEM APOSTÓLICA À ARMÊNIA POR OCASIÃO DOS 1700 ANOS DE CRISTIANISMO NO PAÍS 22-27 DE SETEMBRO DE 2001 PROGRAMA ITÁLIA 08.30

Leia mais

1. Concílio de Niceia I 2. Concílio de Constantinopla I 3. Conhecendo a Igreja e suas ações.

1. Concílio de Niceia I 2. Concílio de Constantinopla I 3. Conhecendo a Igreja e suas ações. 1. Concílio de Niceia I 2. Concílio de Constantinopla I 3. Conhecendo a Igreja e suas ações. 2013 Vivaldo Armelin Júnior www.vivajesusbr.com Concílios Ecumênicos da Igreja Católica II Concílio de Niceia

Leia mais

No Calendário Litúrgico há um Memorial da Realeza de Maria em 22 de Agosto. Maria é invocada como : * Rainha dos Anjos. * Rainha dos Patriarcas.

No Calendário Litúrgico há um Memorial da Realeza de Maria em 22 de Agosto. Maria é invocada como : * Rainha dos Anjos. * Rainha dos Patriarcas. À Santíssima Virgem foi dado o título de "Rainha" pelo papa Pio XII durante o Primeiro Ano Mariano que foi de 8 de Dezembro de 1953 a 8 de Dezembro de 1954. No Calendário Litúrgico há um Memorial da Realeza

Leia mais

EJA 4ª FASE PROF. LUIS CLAÚDIO

EJA 4ª FASE PROF. LUIS CLAÚDIO EJA 4ª FASE PROF. LUIS CLAÚDIO CONTEÚDOS E HABILIDADES FORTALECENDO SABERES DESAFIO DO DIA DINÂMICA LOCAL INTERATIVA Unidade II As tradições religiosas e os textos sagrados. 2 CONTEÚDOS E HABILIDADES FORTALECENDO

Leia mais

ÍNDICE ÍNDICE. Apresentação... 3 O USO DO LIVRO DA LITURGIA DAS HORAS. O que é a liturgia das horas... 6 As edições da liturgia das horas...

ÍNDICE ÍNDICE. Apresentação... 3 O USO DO LIVRO DA LITURGIA DAS HORAS. O que é a liturgia das horas... 6 As edições da liturgia das horas... ÍNDICE ÍNDICE Apresentação... 3 O USO DO LIVRO DA LITURGIA DAS HORAS O que é a liturgia das horas... 6 As edições da liturgia das horas... 6 O CONTEÚDO DO LIVRO DA LITURGIA DAS HORAS 1. Os nomes deste

Leia mais

COPYRIGHT TODOS OS DIREITOS RESERVADOS - SABER E FÉ

COPYRIGHT TODOS OS DIREITOS RESERVADOS - SABER E FÉ Aviso importante! Esta disciplina é uma propriedade intelectual de uso exclusivo e particular do aluno da Saber e Fé, sendo proibida a reprodução total ou parcial deste conteúdo, exceto em breves citações

Leia mais

CAESP - Artes Aula 06-23/03/2017 BIZÂNCIO E O MUNDO ORIENTAL:

CAESP - Artes Aula 06-23/03/2017 BIZÂNCIO E O MUNDO ORIENTAL: CAESP - Artes Aula 06-23/03/2017 BIZÂNCIO E O MUNDO ORIENTAL: A Arte dos primórdios do Cristianismo: Para conhecermos melhor as artes produzidas no império bizantino, é necessário passarmos pela arte dos

Leia mais

Igrejas Ortodoxas na cidade de São Paulo: Discurso, Identidade Cultural e Fé na Metrópole

Igrejas Ortodoxas na cidade de São Paulo: Discurso, Identidade Cultural e Fé na Metrópole Igrejas Ortodoxas na cidade de São Paulo: Discurso, Identidade Cultural e Fé na Metrópole Felipe Beltran Katz mestrando da PUC-SP A- A Importância da Cultura: A Igreja Ortodoxa, ou as Igrejas Ortodoxas,

Leia mais

Todos os direitos reservados. 1. É proibido fazer cópia, editar, modificar, distribuir (mesmo a título de gratuidade), comercializar, publicar

Todos os direitos reservados. 1. É proibido fazer cópia, editar, modificar, distribuir (mesmo a título de gratuidade), comercializar, publicar Todos os direitos reservados. 1. É proibido fazer cópia, editar, modificar, distribuir (mesmo a título de gratuidade), comercializar, publicar (online ou em qualquer outra forma), inserir, utilizar fotos

Leia mais

COPYRIGHT TODOS OS DIREITOS RESERVADOS - SABER E FÉ

COPYRIGHT TODOS OS DIREITOS RESERVADOS - SABER E FÉ Aviso importante! Esta disciplina é uma propriedade intelectual de uso exclusivo e particular do aluno da Saber e Fé, sendo proibida a reprodução total ou parcial deste conteúdo, exceto em breves citações

Leia mais

1. As origens de Constantinopla

1. As origens de Constantinopla PROF. RICARDO GOMES Prof. Ricardo Gomes 1. As origens de Constantinopla Quando o imperador romano Constantino escolheu a região de Bizâncio para construir a sede da Nova Roma, a antiga colônia grega tinha

Leia mais

HOMILIA CATEQUEÉ TICA PARA A PAÁ SCOA DE 2016

HOMILIA CATEQUEÉ TICA PARA A PAÁ SCOA DE 2016 HOMILIA CATEQUEÉ TICA PARA A PAÁ SCOA DE 2016 DE S. S. BARTOLOMEU I, ARCEBISPO DE CONSTANTINOPLA-NOVA ROMA E PATRIARCA ECUMEÊ NICO PROTOCOLO Nº 450 BARTOLOMEU PELA MISERICÓRDIA DE DEUS ARCEBISPO DE CONSTANTINOPLA-NOVA

Leia mais

DECRETO UNITATIS REDINTEGRATIO. Coleção revisitar o Concílio. Elias Wolff. São Paulo: Paulinas, 2012

DECRETO UNITATIS REDINTEGRATIO. Coleção revisitar o Concílio. Elias Wolff. São Paulo: Paulinas, 2012 DECRETO UNITATIS REDINTEGRATIO Coleção revisitar o Concílio. Elias Wolff. São Paulo: Paulinas, 2012 Análise do Unitatis Redintegratio Trata-se de um novo modo de compreender o Cristianismo como um todo;

Leia mais

INTRODUÇÃO AO LIVRO ATOS DOS VISÃO GERAL DA IGREJA PRIMITIVA APÓSTOLOS. Jörg Garbers Ms. de Teologia

INTRODUÇÃO AO LIVRO ATOS DOS VISÃO GERAL DA IGREJA PRIMITIVA APÓSTOLOS. Jörg Garbers Ms. de Teologia INTRODUÇÃO AO LIVRO ATOS DOS APÓSTOLOS VISÃO GERAL DA IGREJA PRIMITIVA Jörg Garbers Ms. de Teologia CONTEXTO POLÍTICO Império romano A organização era muito eficaz. Roma era a capital e o centro. Todo

Leia mais

Igreja Universal do Reino de Deus

Igreja Universal do Reino de Deus 89 No entanto, a grande concentração de igrejas no bairro impede que existam quarteirões apenas com a presença da IPDA. A maior concentração de membros da IPDA está nas áreas mais pobres do bairro. Das

Leia mais

Clóvis de Barros Filho

Clóvis de Barros Filho Clóvis de Barros Filho Sugestão Formação: Doutor em Ciências da Comunicação pela USP (2002) Site: http://www.espacoetica.com.br/ Vídeos Produção acadêmica ÉTICA - Princípio Conjunto de conhecimentos (filosofia)

Leia mais

Católicos da Zona da Mata realizam Vigília Pascal no sábado de aleluia

Católicos da Zona da Mata realizam Vigília Pascal no sábado de aleluia G1 - Portal de Notícias da Globo - SP 18/04/2014-08:35 Católicos da Zona da Mata realizam Vigília Pascal no sábado de aleluia Fieis participam de Bênção do Fogo Novo e do Círio e de procissões. Confira

Leia mais

REFORMA PROTESTANTE. 1- CONTEXTO HISTÓRICO: 1.1- Início do século XVI no Norte da Europa.

REFORMA PROTESTANTE. 1- CONTEXTO HISTÓRICO: 1.1- Início do século XVI no Norte da Europa. REFORMA PROTESTANTE 1- CONTEXTO HISTÓRICO: 1.1- Início do século XVI no Norte da Europa. 1.2- Processo final de formação das monarquias nacionais absolutistas. 1.3- Grandes navegações: transformações econômicas,

Leia mais

ANIMAÇÃO BÍBLICA DA PASTORA: uma nova mentalidade

ANIMAÇÃO BÍBLICA DA PASTORA: uma nova mentalidade ANIMAÇÃO BÍBLICA DA PASTORA: uma nova mentalidade Tanto o Documento de Aparecida (248) como a Exortação Apostólica Verbum Domini (73) se referem à uma nova linguagem e a um novo passo na questão bíblica:

Leia mais

FILOSOFIA - 2 o ANO MÓDULO 08 A REAÇÃO DE ROMA: O CONCÍLIO DE TRENTO

FILOSOFIA - 2 o ANO MÓDULO 08 A REAÇÃO DE ROMA: O CONCÍLIO DE TRENTO FILOSOFIA - 2 o ANO MÓDULO 08 A REAÇÃO DE ROMA: O CONCÍLIO DE TRENTO Como pode cair no enem A Reforma protestante e a Contrarreforma envolveram aspectos ligados à doutrina da religião cristã e à forma

Leia mais

Três eixos temáticos. I. A alegria do Evangelho II. Sinodalidade e Comunhão III. Testemunho e Profetismo

Três eixos temáticos. I. A alegria do Evangelho II. Sinodalidade e Comunhão III. Testemunho e Profetismo Três eixos temáticos I. A alegria do Evangelho II. Sinodalidade e Comunhão III. Testemunho e Profetismo Um eixo transversal: A Igreja em saída na perspectiva ad gentes - Segue o método ver, julgar e agir

Leia mais

Lição 5 ATOS 1. Atos destinado a Teófilo período 63 d.c apóstolo Pedro apóstolo Paulo Atos do Espírito Santo que Jesus operou por meio da igreja

Lição 5 ATOS 1. Atos destinado a Teófilo período 63 d.c apóstolo Pedro apóstolo Paulo Atos do Espírito Santo que Jesus operou por meio da igreja Lição 5 ATOS 1. Atos O livro de Atos foi o segundo escrito por Lucas, também destinado a Teófilo. Acredita-se que originalmente não tivesse título, sendo inserido Atos ou Atos dos Apóstolos nos manuscritos

Leia mais

A Declaração de Jerusalém

A Declaração de Jerusalém A Declaração de Jerusalém Introdução Preocupados em estabelecer fundamentos sobre os quais a igreja deve buscar a expansão do cristianismo, representantes anglicanos de todo o mundo firmaram princípios

Leia mais

Solenidade de Todos os Santos

Solenidade de Todos os Santos Solenidade de Todos os Santos Solenidade de Todos os Santos: A Igreja militante honra a Igreja triunfante do Céu. Durante o ano, a nossa Igreja Católica dedica alguns dias em sua liturgia para homenagear

Leia mais

CONCLUSÕES DO ENCONTRO NACIONAL DOS SECRETARIADOS DIOCESANOS DE MIGRAÇÕES E CAPELANIAS DE IMIGRANTES

CONCLUSÕES DO ENCONTRO NACIONAL DOS SECRETARIADOS DIOCESANOS DE MIGRAÇÕES E CAPELANIAS DE IMIGRANTES Migrações: Presente e Futuro CONCLUSÕES DO ENCONTRO NACIONAL DOS SECRETARIADOS DIOCESANOS DE MIGRAÇÕES E CAPELANIAS DE IMIGRANTES De 4 a 8 de Julho na Casa Diocesana da Diocese de Aveiro, em Albergaria-a-Velha,

Leia mais

Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia Departamento de Teologia. Orientações para o Estágio Obrigatório Supervisionado

Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia Departamento de Teologia. Orientações para o Estágio Obrigatório Supervisionado 1 Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia Departamento de Teologia Orientações para o Estágio Obrigatório Supervisionado O Estágio Supervisionado se desenvolve ao longo dos três anos de teologia totalizando

Leia mais

CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA COMPÊNDIO

CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA COMPÊNDIO CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA COMPÊNDIO CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA COMPÊNDIO Copyright 2005 - Libreria Editrice Vaticana «Motu Proprio» Introdução PRIMEIRA PARTE - A PROFISSÃO DA FÉ Primeira Secção: «Eu

Leia mais

A IGREJA MEDIEVAL. Profª. Maria Auxiliadora

A IGREJA MEDIEVAL. Profª. Maria Auxiliadora A IGREJA MEDIEVAL Profª. Maria Auxiliadora Organização Interna da Igreja Católica Clero Secular (Alto Clero) Papa, bispos, padres (ocupavam-se das coisas terrenas bens materiais) Clero Regular (Baixo Clero)

Leia mais

ESCOLA: Dr. Solano de Abreu DISCIPLINA: HISTÓRIA ANO: 7º ANO LETIVO 2013/2014 ATIVIDADES ESTRATÉGIAS. Análise de informação do manual

ESCOLA: Dr. Solano de Abreu DISCIPLINA: HISTÓRIA ANO: 7º ANO LETIVO 2013/2014 ATIVIDADES ESTRATÉGIAS. Análise de informação do manual ENSINO BÁSICO Agrupamento de Escolas Nº 1 de Abrantes ESCOLA: Dr. Solano de Abreu DISCIPLINA: HISTÓRIA ANO: 7º ANO LETIVO 201/201 CONTEÚDOS PROGRAMÁTICOS METAS DE APRENDIZAGEM ATIVIDADES ESTRATÉGIAS INSTRUMENTOS

Leia mais

O Sacramento da Ordem - V Seg, 29 de Dezembro de :26 - Pe. Henrique Soares da Costa

O Sacramento da Ordem - V Seg, 29 de Dezembro de :26 - Pe. Henrique Soares da Costa Pe. Henrique Soares da Costa No artigo passado vimos em que sentido o sacramento da Ordem confere um modo especial de participar do único sacerdócio de Cristo. Veremos, agora como é celebrado este sacramento,

Leia mais

Religiões Proféticas

Religiões Proféticas Religiões Proféticas O QUE É RELIGIÃO? Religião é uma fé, uma devoção a tudo que é considerado sagrado. É um culto que aproxima o homem das entidades a quem são atribuídas poderes sobrenaturais. É uma

Leia mais

segunda-feira, 29 de abril de 13

segunda-feira, 29 de abril de 13 O problema da vela Karl Dunker, 1945 O problema da vela Karl Dunker, 1945 O problema da vela Karl Dunker, 1945 + dificuldade - dificuldade http://www.youtube.com/watch?v=47rqktpww2i De onde vem a nossa

Leia mais

Profissão de Fé o Credo Apostólico da Igreja O Creio

Profissão de Fé o Credo Apostólico da Igreja O Creio Profissão de Fé o Credo Apostólico da Igreja O Creio O Creio ou a Profissão de Fé é um ato de expressão da doutrina preservada e ensinada pela Igreja desde a Igreja Primitiva. É no Creio de proclamamos

Leia mais

PROFESSOR: CRISTÓVÃO 1 O IMPÉRIO BIZANTINO:

PROFESSOR: CRISTÓVÃO 1 O IMPÉRIO BIZANTINO: PROFESSOR: CRISTÓVÃO 1 O IMPÉRIO BIZANTINO: Império Romano do Oriente ou Império Grego. Constantinopla capital. Antiga Bizâncio, hoje Istambul (TUR). Local privilegiado estrategicamente contatos entre

Leia mais

Fiéis em cristo. Direitos e deveres dos fiéis leigos. Paróquia São Francisco de Assis Ribeirão Preto 05/08/2015

Fiéis em cristo. Direitos e deveres dos fiéis leigos. Paróquia São Francisco de Assis Ribeirão Preto 05/08/2015 Fiéis em cristo Direitos e deveres dos fiéis leigos Paróquia São Francisco de Assis Ribeirão Preto 05/08/2015 A igreja Necessidade de se fazer a distinção quando usamos o termo IGREJA. Quando falamos em

Leia mais

Prof. Alexandre Cardoso. História 5A. Bizantinos e Francos.

Prof. Alexandre Cardoso. História 5A. Bizantinos e Francos. Prof. Alexandre Cardoso História 5A Aula 14 Bizantinos e Francos. Crescente Fértil ORIENTE O IMPÉRIO BIZANTINO O IMPÉRIO BIZANTINO: Império Romano do Oriente. Constantinopla capital. Antiga Bizâncio, hoje

Leia mais

CAESP - Artes Aula 04-28/02/2019 BIZÂNCIO E O MUNDO ORIENTAL:

CAESP - Artes Aula 04-28/02/2019 BIZÂNCIO E O MUNDO ORIENTAL: CAESP - Artes Aula 04-28/02/2019 BIZÂNCIO E O MUNDO ORIENTAL: A Arte dos primórdios do Cristianismo: Para conhecermos melhor as artes produzidas no império bizantino, é necessário passarmos pela arte dos

Leia mais

SEMINÁRIO BATISTA DE TEOLOGIA

SEMINÁRIO BATISTA DE TEOLOGIA SEMINÁRIO BATISTA DE TEOLOGIA Rua Ursulina D'Angelo nº 23 - Itaquera - São Paulo - SP - CEP 08210-490. PLANO DA DISCIPLINA Disciplina: História Eclesiástica I Carga Horária 40 horas Professor: Haroldo

Leia mais

Às filhas da Terra. Ela conhece as lágrimas penosas E recebe a oração da alma insegura, Inundando de amor e de ternura As feridas cruéis e dolorosas.

Às filhas da Terra. Ela conhece as lágrimas penosas E recebe a oração da alma insegura, Inundando de amor e de ternura As feridas cruéis e dolorosas. Maria: mãe! Às filhas da Terra Do seu trono de luzes e de rosas, A Rainha dos Anjos, meiga e pura Estende os braços para a desventura, Que campeia nas sendas espinhosas. Ela conhece as lágrimas penosas

Leia mais

COPYRIGHT TODOS OS DIREITOS RESERVADOS - SABER E FÉ

COPYRIGHT TODOS OS DIREITOS RESERVADOS - SABER E FÉ Aviso importante! Esta disciplina é uma propriedade intelectual de uso exclusivo e particular do aluno da Saber e Fé, sendo proibida a reprodução total ou parcial deste conteúdo, exceto em breves citações

Leia mais

A AUTORIDADE E O EVANGELHO DE PAULO

A AUTORIDADE E O EVANGELHO DE PAULO A AUTORIDADE E O EVANGELHO DE PAULO Lição 2 para 8 de julho de 2017 Embora as cartas de Paulo fossem tidas como inspiradas por Deus, nem todos estavam de acordo com isto. Alguns irmãos na região de Galácia

Leia mais

Sumário. O propósito de Atos A obra missionária é a prioridade da igreja O Espírito Santo é o executivo da obra missionária...

Sumário. O propósito de Atos A obra missionária é a prioridade da igreja O Espírito Santo é o executivo da obra missionária... Sumário O propósito de Atos...17 Primeiro princípio A obra missionária é a prioridade da igreja...31 Segundo princípio O Espírito Santo é o executivo da obra missionária...39 Terceiro princípio A oração

Leia mais

COLÉGIO SALESIANO DOM BOSCO. ENSINO RELIGIOSO REVISÃO GERAL III TRIMESTRE 7ºs ANOS

COLÉGIO SALESIANO DOM BOSCO. ENSINO RELIGIOSO REVISÃO GERAL III TRIMESTRE 7ºs ANOS COLÉGIO SALESIANO DOM BOSCO. ENSINO RELIGIOSO REVISÃO GERAL III TRIMESTRE 7ºs ANOS Tema: Deus se mostra as pessoas: o simbolismo nas religiões. CAPÍTULOS 9 AO 12 DO LIVRO DIDÁTICO (RSE). Professor: Roberto

Leia mais

As transformações de saberes, crenças e poderes na transição para a Idade Moderna. Profª Ms. Ariane Pereira

As transformações de saberes, crenças e poderes na transição para a Idade Moderna. Profª Ms. Ariane Pereira As transformações de saberes, crenças e poderes na transição para a Idade Moderna Profª Ms. Ariane Pereira Introdução Na Idade Média a Igreja era fundamental na produção cultural e expansão da religião

Leia mais

Rede Nacional de Intercessão: A importância da oração pessoal do intercessor Seg, 26 de Setembro de :03

Rede Nacional de Intercessão: A importância da oração pessoal do intercessor Seg, 26 de Setembro de :03 Muitas vezes somos tentados a pensar que a intercessão não constitui um grande Ministério. Somos inclinados a julgar que o pregador que fala a milhares de pessoas, ou o missionário que alcança as nações,

Leia mais

Rede Nacional de Intercessão: A importância da oração pessoal do intercessor Seg, 26 de Setembro de :03

Rede Nacional de Intercessão: A importância da oração pessoal do intercessor Seg, 26 de Setembro de :03 Muitas vezes somos tentados a pensar que a intercessão não constitui um grande Ministério. Somos inclinados a julgar que o pregador que fala a milhares de pessoas, ou o missionário que alcança as nações,

Leia mais

Neste ano da Vida Religiosa Consagrada fomos motivadas pelo Papa Francisco a recordar o passado com gratidão, viver o presente com paixão e abraçar o

Neste ano da Vida Religiosa Consagrada fomos motivadas pelo Papa Francisco a recordar o passado com gratidão, viver o presente com paixão e abraçar o Neste ano da Vida Religiosa Consagrada fomos motivadas pelo Papa Francisco a recordar o passado com gratidão, viver o presente com paixão e abraçar o futuro com esperança. Como o testemunho de vida da

Leia mais

Império Bizantino Prof. Edmar Silva Ensino Médio - 1 série

Império Bizantino Prof. Edmar Silva Ensino Médio - 1 série Império Bizantino Prof. Edmar Silva Ensino Médio - 1 série Império Bizantino Início No ano de 330 d.c., a cidade de Bizâncio é conquistada por Constantino que muda seu nome para Constantinopla; A cidade

Leia mais

Mater Ecclesiae. Liturgia 2 Aula 14 Sacramentais

Mater Ecclesiae. Liturgia 2 Aula 14 Sacramentais Mater Ecclesiae Liturgia 2 Aula 14 Sacramentais Definição À imitação dos Sacramentos A santa mãe Igreja instituiu os sacramentais, que são sinais sagrados pelos quais, à imitação dos sacramentos, são significados

Leia mais

Como definir a Maçonaria?

Como definir a Maçonaria? 1 Como definir a Maçonaria? A Maçonaria define-se a si própria como uma «sociedade iniciática» e uma «organização filantrópica e de procura filosófica» cujos membros são recrutados por cooptação. Afirma-se

Leia mais

Há quatro pontos importantes nesse livro: o primeiro anúncio, a catequese, a vida das comunidade e a missão

Há quatro pontos importantes nesse livro: o primeiro anúncio, a catequese, a vida das comunidade e a missão O livro dos Atos dos Apóstolos é a 2ªparte do Evangelho de São Lucas. Neste livro o autor apresenta a atividade dos apóstolos como uma grande viagem que vai de Jerusalém até Roma, o centro do mundo daquela

Leia mais

Paulo é um dos grandes homens do cristianismo e um exemplo para todos nós: Sede meus imitadores, como também eu sou de Cristo (1 Co 11:1)

Paulo é um dos grandes homens do cristianismo e um exemplo para todos nós: Sede meus imitadores, como também eu sou de Cristo (1 Co 11:1) APÓSTOLO PAULO Paulo é um dos grandes homens do cristianismo e um exemplo para todos nós: Sede meus imitadores, como também eu sou de Cristo (1 Co 11:1) Mas o Senhor lhe disse: Vai, porque este é para

Leia mais

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E HUMANAS

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E HUMANAS (EMRC) (5ºANO) Unidade letiva 1 (Viver Juntos) Mudar faz parte da vida Os grupos a que pertenço Deus estabelece uma relação com a humanidade A aliança condição facilitadora da relação entre as partes A

Leia mais

Críticas à Igreja Católica

Críticas à Igreja Católica Reforma Protestante Críticas à Igreja Católica Vida desregrada dos cardeais, bispos e padres; Venda de cargos religiosos e de relíquias da Igreja; Venda de indulgências; Na França e na Alemanha o baixo

Leia mais

Para nós intercessores, ver o todo, significa conhecer os seguintes aspectos do nosso Movimento:

Para nós intercessores, ver o todo, significa conhecer os seguintes aspectos do nosso Movimento: Como obter a visão Visão é a capacidade para enxergar além daquilo que os olhos podem ver. Deus é um Deus de visões, e esta capacidade Ele também nos concede quando buscamos um relacionamento de intimidade

Leia mais

Conferência Doutrinária, Pastoral e Teológica 20º Concílio Geral. Palavra do Bispo Roberto Alves de Souza Bispo da 4ª Região Eclesiástica

Conferência Doutrinária, Pastoral e Teológica 20º Concílio Geral. Palavra do Bispo Roberto Alves de Souza Bispo da 4ª Região Eclesiástica Conferência Doutrinária, Pastoral e Teológica 20º Concílio Geral Palavra do Bispo Roberto Alves de Souza Bispo da 4ª Região Eclesiástica julho de 2016 Teresópolis RJ Bispo Roberto: Bom dia Bispo Adonias

Leia mais

As Igrejas Anglicanas Livres

As Igrejas Anglicanas Livres As Igrejas Anglicanas Livres No século XIX, descontentes principalmente com os rumos tomados pelo movimento Anglo Católico, alguns bispos anglicanos entenderam que a Igreja estava outra vez sendo "romanizada"

Leia mais

O MISSAL ROMANO. Missale Romanum

O MISSAL ROMANO. Missale Romanum O MISSAL ROMANO A reforma da Liturgia latina, decidida pelo Concílio Vaticano II, encontra a sua expressão concreta nos livros litúrgicos ou rituais. Os livros são oficialmente publicados pela Congregação

Leia mais

Igreja Batista Nacional da Palavra EBD - Escola Bíblica Dominical

Igreja Batista Nacional da Palavra EBD - Escola Bíblica Dominical Igreja Batista Nacional da Palavra EBD - Escola Bíblica Dominical Grade Curricular História da Igreja Formação do Estado de Israel e suas guerras Bibliologia Teologia Sistemática Básica - Doutrinas Bíblicas

Leia mais

Igreja, sacramento de salvação: a comunidade cristã como testemunha e continuadora da salvação de Cristo no mundo

Igreja, sacramento de salvação: a comunidade cristã como testemunha e continuadora da salvação de Cristo no mundo Felipe da Silva Braga Igreja, sacramento de salvação: a comunidade cristã como testemunha e continuadora da salvação de Cristo no mundo Dissertação de Mestrado Dissertação apresentada como requisito parcial

Leia mais

AS RELAÇÕES ECUMÊNICAS DA IGREJA CATÓLICA COM AS IGREJAS ORTODOXAS RELATÓRIO DO DIÁLOGO TEOLÓGICO EM BUSCA DA UNIDADE

AS RELAÇÕES ECUMÊNICAS DA IGREJA CATÓLICA COM AS IGREJAS ORTODOXAS RELATÓRIO DO DIÁLOGO TEOLÓGICO EM BUSCA DA UNIDADE ANAIS DO I SIMPÓSIO NACIONAL DE TEOLOGIA ORIENTAL (RE)DESCOBRINDO AS IGREJAS ORIENTAIS, ORTODOXAS E CATÓLICAS NO BRASIL AS RELAÇÕES ECUMÊNICAS DA IGREJA CATÓLICA COM AS IGREJAS ORTODOXAS RELATÓRIO DO DIÁLOGO

Leia mais

O Ano Santo é um tempo de paz, reconciliação e perdão. Ele começa quando o Papa abre a

O Ano Santo é um tempo de paz, reconciliação e perdão. Ele começa quando o Papa abre a Neste mês ocorrerá a abertura do Ano Santo da Misericórdia: O jubileu dedicado à misericórdia de Deus. O rosto da misericórdia é o título da bula pela qual o Santo Padre convoca toda a Igreja para viver

Leia mais

As relações entre o governo português e os muçulmanos de Moçambique ( )

As relações entre o governo português e os muçulmanos de Moçambique ( ) Cristiane Nascimento da Silva As relações entre o governo português e os muçulmanos de Moçambique (1930-1970) Dissertação de Mestrado Dissertação apresentada como requisito parcial para obtenção do grau

Leia mais

Agrupamento de Escolas CARLOS GARGATÉ

Agrupamento de Escolas CARLOS GARGATÉ CONHECIMENTOS, CAPACIDADES E ATITUDES O aluno deve ficar capaz de: Agrupamento de Escolas CARLOS GARGATÉ Departamento de Ciências Sociais e Humanas 2018/2019 Critérios de avaliação e programação Educação

Leia mais

IDADE DAS TREVAS? Problemas da Filosofia Medieval: a realidade, a alma, a verdade, os direitos humanos, a essência do Estado etc.

IDADE DAS TREVAS? Problemas da Filosofia Medieval: a realidade, a alma, a verdade, os direitos humanos, a essência do Estado etc. FILOSOFIA MEDIEVAL IDADE DAS TREVAS? A filosofia clássica sobrevive, confinada nos mosteiros religiosos. Problemas da Filosofia Medieval: a realidade, a alma, a verdade, os direitos humanos, a essência

Leia mais

Professor. Competências e Habilidades. Matriz de ref. do ENEM. Eixos cognitivos: Compreender fenômenos históricos e enfrentar situações-problema

Professor. Competências e Habilidades. Matriz de ref. do ENEM. Eixos cognitivos: Compreender fenômenos históricos e enfrentar situações-problema PLANO DE AULA Diversidade: bárbaro ou diferente? Disciplina(s) História Ano 6º conteúdo final Curso EF Professor N o de aulas no total 02 duas Nº de Aulas Tópicos Geradores Metas de Compreensão Competências

Leia mais

RESUMO. Apresentação abreviada Recapitulação breve = repetição do que foi apresentado Para transmitir uma ideia geral do que foi apresentado

RESUMO. Apresentação abreviada Recapitulação breve = repetição do que foi apresentado Para transmitir uma ideia geral do que foi apresentado UMA TENTATIVA RESUMO Apresentação abreviada Recapitulação breve = repetição do que foi apresentado Para transmitir uma ideia geral do que foi apresentado SÍNTESE Mostra e revela as relações entre elementos

Leia mais

Concílios Ecumênicos da Igreja Católica II 2

Concílios Ecumênicos da Igreja Católica II 2 Concílios Ecumênicos da Igreja Católica II 2 Para lembrar: Concílios do 1º Milênio: Latrão I (1123) 01. Niceia I em 325. 02. Constantinopla I em 381. 03. Éfeso em 431. 04. Calcedônia em 451. 05. Constantinopla

Leia mais

Trata-se, portanto, de um Preceito que obriga sob grave, em condições normais. Falando da obrigação do Domingo, o Catecismo da Igreja Católica diz :

Trata-se, portanto, de um Preceito que obriga sob grave, em condições normais. Falando da obrigação do Domingo, o Catecismo da Igreja Católica diz : O primeiro Preceito da Igreja é o da Missa dos Domingos e Festas de Guarda, com abstenção de trabalhos servis, conforme se pode ver no Catecismo da Igreja Católica : 2042. - O Primeiro preceito ("ouvir

Leia mais

QUAL O SIGNIFICADO DE RELIGIOSIDADE PARA VOCÊ?

QUAL O SIGNIFICADO DE RELIGIOSIDADE PARA VOCÊ? QUAL O SIGNIFICADO DE RELIGIOSIDADE PARA VOCÊ? COMO A FILOSOFIA ESPÍRITA DEFINE O PROCESSO DE ESPIRITUALIZAÇÃO DO SER HUMANO? QUANDO E COMO ELE COMEÇA? QUAL O REAL CONCEITO DE RELIGIÃO? A religião é caracterizada

Leia mais

Nome: nº. Recuperação Final de História Profª Patrícia. Lista de atividades 6º ano

Nome: nº. Recuperação Final de História Profª Patrícia. Lista de atividades 6º ano 1 Conteúdos selecionados: Nome: nº Recuperação Final de História Profª Patrícia Lista de atividades 6º ano Apostila 1 Tempo histórico, periodização da História, ocupação da América. Apostila 2 Egito, Mesopotâmia,

Leia mais

O Cristianismo no Império Romano

O Cristianismo no Império Romano O Cristianismo no Império Romano ORIGEM Palestina, região sob o domínio romano desde 64 a.c. Tem como origem a tradição judaica de crença na vinda de um Messias, o salvador, o filho de Deus, cuja vinda

Leia mais

A mente de Cristo. A sua formação em nós 1 Co.2:1-16

A mente de Cristo. A sua formação em nós 1 Co.2:1-16 A mente de Cristo A mente de Cristo A sua formação em nós 1 Co.2:1-16 Eu mesmo, irmãos, quando estive entre vocês, não fui com discurso eloqüente, nem com muita sabedoria para lhes proclamar o mistério

Leia mais