Caracterização estrutural da Ponte da Praia do Ribatejo sobre o Rio Tejo
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- Aníbal Vilaverde Castilho
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1 Caracterização estrutural da Ponte da Praia do Ribatejo sobre o Rio Tejo Eduardo Júlio ICIST e DECivil IST UTL, Lisboa Daniel Dias-da-Costa DEC FCTUC, Coimbra Jónatas Valença ICIST e DEC ISEC IPC, Coimbra Carlos Rebelo ISISE e DEC FCTUC, Coimbra RESUMO: Constância é uma vila situada na confluência dos rios Tejo e Zêzere. A jusante deste ponto encontram-se lado a lado duas pontes, uma rodoviária e outra ferroviária. A primeira é provavelmente uma das cerca de vinte e cinco pontes que o Eng.º Gustave Eiffel projectou em Portugal e encontra-se fora de serviço. Como esta situação causa um enorme transtorno à população, foi decidido efectuar uma análise de risco e um projecto de reabilitação da ponte. Neste artigo descreve-se o estudo realizado para efectuar a caracterização estrutural da ponte, o qual consistiu na obtenção experimental de extensões, deslocamentos, frequências próprias e modos de vibração, através da realização de ensaios de carga e de ensaios de medição da vibração ambiente. 1 INTRODUÇÃO A ponte objecto de estudo terá sido construída no ano 1888 para o caminho-de-ferro, tendo sido adaptada no início da década de 1980 para tráfego rodoviário, nomeadamente através da execução, a meia altura das treliças principais, de uma laje em betão armado com uma espessura de cerca de 15cm, apoiada nas longarinas secundárias que anteriormente serviam de suporte à linha férrea. O estudo apresentado neste artigo teve por objectivo a obtenção experimental de extensões, deslocamentos, frequências próprias e modos de vibração, através da realização de ensaios de carga e de ensaios de medição da vibração ambiente, de forma a permitir efectuar a caracterização estrutural da ponte. A metodologia aplicada consistiu na caracterização estrutural da ponte; definição dos parâmetros a medir, assim como os métodos e equipamentos a utilizar; processamento e tratamento dos resultados obtidos com os dois tipos de ensaios; e análise dos resultados e conclusões. 2 BREVE DESCRIÇÃO DA PONTE A ponte apresenta um comprimento total de 501.5m, repartidos por nove tramos contínuos, à excepção do primeiro que é simplesmente apoiado (ver Figura 1). Os 287
2 apoios, encontros e pilares, são em pedra calcária aparelhada e fazem um ângulo de aproximadamente 60º com o eixo da ponte. Figura 1. Alçado longitudinal e planta (desenhos fornecidos pelo requerente). A estrutura da ponte é constituída por duas treliças planas principais, com uma altura de cerca de 6.0m, organizadas em módulos com um afastamento entre montantes de 5.0m, nos vãos, e de 2.5m, sobre os apoios. Estas treliças estão contraventadas, no plano transversal, por carlingas constituídas por treliças planas verticais (Figura 2a) e, longitudinalmente, por treliças planas horizontais, posicionadas à cota do banzo inferior das treliças principais (Figura 2b) e ao nível das longarinas. Figura 2. Secção transversal da ponte; Contraventamento horizontal inferior. 3 INSTRUMENTAÇÃO 3.1 Grandezas medidas Foram medidas extensões nos banzos superior e inferior das treliças principais em seis secções transversais distintas situadas nos segundo, terceiro e quarto tramos (em relação à margem esquerda), tendo-se excluído o primeiro por ser de menor vão. Dada a significativa influência que a acção da temperatura tem sobre a estrutura, decidiu-se medir igualmente o efeito desta grandeza ( 3.2). Em virtude de o leito estar seco desde a margem direita até sensivelmente o meio do rio, optou-se por medir deslocamentos nos sexto, sétimo e oitavo tramos (em relação à margem esquerda), tendo-se excluído o último por ser de menor vão ( 3.3). A avaliação das frequências próprias de vibração da ponte e a determinação dos respectivos modos de vibração foram efectuadas nos segundo, terceiro e quarto tramos (em relação à margem esquerda), ( 3.4). 3.2 Extensometria Foram instrumentadas seis secções transversais da ponte, nos segundo, terceiro e quarto tramos (em relação à margem esquerda), situando-se as secções S1, S3 e S5 288
3 sobre apoios e as secções S2, S4 e S6 nos meios vãos dos tramos referidos (Figura 3). Em cada uma das secções indicadas foram colados pares de extensómetros resistivos TML PFL nos banzos superiores e inferiores de cada uma das treliças principais, de acordo com o esquema da Figura 4, os quais foram ligados a um datalogger TML TDS 303. Figura 3. Identificação das secções instrumentadas (vista de jusante) Jusante Montante Figura 4. Localização dos extensómetros em cada uma das seis secções instrumentadas. Atendendo às características da estrutura instrumentada, considerou-se necessário proceder a dois tipos de compensação das leituras registadas com os extensómetros resistivos: (i) compensação do comprimento dos cabos porque, sobretudo para as secções mais afastadas do datalogger, S1 e S6, a distância é considerável; e (ii) compensação devido à temperatura, uma vez que durante a realização dos ensaios de carga era de prever um efeito muito significativo desta acção. Relativamente ao comprimento dos cabos, efectuou-se previamente um teste em laboratório para avaliar a influência do comprimento do cabo nos valores medidos das extensões, tendo-se concluído que um cabo de 100m (valor inferior ao máximo utilizado) introduz um erro da ordem dos 3.5%. Em todo o caso, decidiu-se corrigir esse efeito individualmente, i.e., para cada um dos 48 extensómetros colados. Em relação à temperatura, optou-se por uma estratégia combinada: (i) medição da temperatura durante o (primeiro) ensaio de carga; (ii) compensação do efeito isolado da temperatura durante o (segundo) ensaio de carga, através da medição deste em chapas de aço retiradas da ponte, tendo-se colocado uma à sombra e outra directamente exposta ao sol; e (iii) medição do efeito isolado da temperatura durante uma semana. A partir da medição da temperatura durante o primeiro ensaio de carga, constatouse que o período de tempo em que o ensaio decorreu coincidiu com o maior aumento de temperatura (13.9ºC num intervalo de 4h). A modelação do efeito da temperatura na estrutura da ponte permitiu verificar que as extensões originadas são da mesma ordem de grandeza das produzidas pelo camião underbridge utilizado no (primeiro) ensaio de carga. A correcção dos valores totais das extensões, medidos durante o (segundo) ensaio de carga, tendo em conta o efeito isolado da temperatura, permitiu concluir que esta 289
4 correcção não é suficiente, atendendo a que a estrutura da ponte não se deforma livremente sob a acção da temperatura (ao contrário das chapas de aço utilizadas). A medição do efeito isolado da temperatura durante uma semana, indiciou que, tal como no primeiro ensaio de carga, também durante o segundo ensaio é provável ter havido uma variação (neste caso, diminuição) significativa de temperatura. Face ao atrás exposto, adoptou-se uma estratégia de processamento dos resultados obtidos com os extensómetros resistivos, descrita em detalhe em 4, relativos aos ensaios de carga. 3.3 Fotogrametria Foram utilizadas três câmaras digitais do tipo Single Lens Reflex (SLR) no levantamento fotográfico do (primeiro) ensaio de carga: duas câmaras Canon 400D, com uma resolução de imagem do sensor de pixéis, e uma câmara Nikon D200, com pixéis. Com as câmaras Canon foram captadas imagens com distâncias focais de 18 e 55mm, enquanto que, com a câmara Nikon, as distâncias focais usadas foram de 28 e 70mm. As menores distâncias focais (18 e 28mm) foram adoptadas para captar o conjunto dos três tramos monitorizados, enquanto que as maiores distâncias focais (55 e 70mm) foram utilizadas no levantamento de cada um dos tramos isoladamente. Foram utilizadas miras de elevada precisão, permitindo detectar o centro do alvo com uma precisão inferior a 1 pixel, as quais foram coladas nos tramos a monitorizar. Os tramos em que se decidiu monitorizar os deslocamentos através de fotogrametria terrestre foram o sexto, sétimo e oitavo tramos (em relação à margem esquerda), tendo sido definidos em articulação com o requerente (ver Figura 5). O nono e último tramo foi excluído por apresentar características desfavoráveis ao método fotogramétrico, nomeadamente, por não haver campo de visão adequado. (c) Figura 5. Miras do: tramo 6; tramo 7; e (c) tramo 8. Desconhecendo-se, à partida, a exactidão do processo fotogramétrico na medição de deslocamentos no (primeiro) ensaio de carga a realizar, optou-se por recorrer igualmente a um método topográfico tradicional. Esta decisão foi tomada com o duplo objectivo de: (i) validar ambos os procedimentos, verificando-se serem coincidentes os resultados redundantes; e (ii) verificando-se ser a exactidão do método topográfico superior à do processo fotogramétrico, utilizar o primeiro para corrigir o segundo (naturalmente, na situação contrária, fornecendo o método topográfico informação relativa a um número muito inferior de pontos, serviria apenas para cumprir o primeiro objectivo de validação de resultados). As leituras topográficas foram efectuadas com uma estação total Leica TS02, a qual permite medir distâncias até 400m sem a utilização de um reflector, tendo sido colocados na ponte alvos de elevada precisão. A estação foi estacionada num tripé, por não existir um suporte apropriado nas proximidades do local, posicionado no areal a montante da ponte. Esta posição foi seleccionada por permitir visar a totalidade dos alvos colados nos sexto, sétimo e oitavo tramos (em relação à margem esquerda). 3.4 Análise modal As medições de vibrações foram efectuadas através do sistema de medida PULSE Type 3560/D de dez canais da firma BRÜEL & KJAER. Consiste num PC com 290
5 interface LAN, software PULSE de oito canais e um condicionador de sinal para aquisição, amplificação, digitalização e gravação do sinal de dez canais. Os cinco transdutores de aceleração utilizados nas medições são do tipo PCB 393B12 com uma sensibilidade nominal de 10V/g, o que permite medir acelerações a partir de 10-5ms -2. Com o objectivo de caracterizar o comportamento dinâmico dos segundo, terceiro e quarto tramos (em relação à margem esquerda), decidiu-se realizar medições de aceleração em 23 pontos, representados esquematicamente em planta na Figura 6. A metodologia seguida consistiu na aquisição do sinal induzido pela vibração ambiente fixando dois dos acelerómetros para referência e rodando os restantes três acelerómetros em consecutivas configurações até cobrir todos os pontos de medição referidos. A extracção modal foi feita posteriormente com base em metodologias no domínio da frequência enhanced frequency domain decomposition e no domínio do tempo stochastic subspace identification Ponto de medição fixa Margem Ponto de medição Figura 6. Representação esquemática dos três tramos medidos junto à margem esquerda do rio Tejo. 4 ENSAIOS 4.1 Ensaio de carga I No ensaio de carga, realizado no dia 11 de Setembro, o veículo utilizado foi um camião underbridge, com 38.5 ton, o qual nos dois dias anteriores deu apoio à instrumentação da ponte, nomeadamente, à colocação dos extensómetros resistivos e à colagem das miras. O esquema de carregamento foi definido em estreita articulação com o requerente. Primeiramente, foram carregados os segundo, terceiro e quarto tramos (em relação à margem esquerda), ou seja, os tramos instrumentados com extensómetros resistivos. De seguida, foram carregados os sexto, sétimo e oitavo tramos (em relação à margem esquerda), ou seja, os tramos onde se decidiu proceder à medição de deslocamentos. No sentido de facilitar a interpretação dos resultados, a informação proveniente dos extensómetros foi filtrada, eliminando-se os troços que correspondem a movimentação do camião underbridge (ver Figura 7). A análise destes gráficos permite verificar a existência de variações significativas do valor das extensões em alguns tramos e em alguns intervalos de tempo. Este facto só pode ser devido ao efeito da temperatura, atendendo a que o valor das restantes acções que actuaram sobre a ponte no intervalo de tempo do ensaio (camião e peso próprio) não variou. Para facilitar a interpretação dos resultados, estes são apresentados em formato de gráfico: na Figura 8a, apresenta-se o diferencial das extensões nas diferentes secções, com o veículo posicionado nos vãos (gráfico da esquerda) e nos apoios (gráfico da direita); e na Figura 8b, a média das extensões nas diferentes secções, para as mesmas posições do veículo. 291
6 Figura 7. Extensões médias superiores e inferiores, ao longo do tempo, com o camião parado. Figura 8. Extensões para cada posição do veículo em cada secção: diferencial; média. Da análise da Figura 8, é de realçar o andamento inesperado de algumas das curvas do diferencial das extensões mas, sobretudo, os valores imprevistos da média. 292
7 Conforme referido anteriormente, o efeito da temperatura é muito significativo, não sendo possível corrigi-lo na ausência de um modelo numérico devidamente calibrado para este parâmetro. Assim, assumindo que o camião underbridge não introduz esforços na ponte quando está posicionado sobre um apoio e atendendo a que o intervalo de tempo entre posições consecutivas do camião foi pequeno, utilizou-se a média dos valores antes e depois dos registados em cada vão para minimizar o efeito da temperatura. Na Figura 9a, apresenta-se o diferencial corrigido das extensões nas diferentes secções, com o veículo posicionado nos vãos; e na Figura 9b, a média das extensões nas diferentes secções, para as mesmas posições do veículo. Figura 9. Extensões corrigidas para cada posição do veículo em cada secção: diferencial; média. No Quadro 1, apresenta-se uma síntese dos deslocamentos medidos por fotogrametria, validados por topografia, nos pontos e para as situações em que os resultados são fiáveis. Quadro 1 Deslocamentos medidos (mm). Veículo e desl. vert. Tramo 6 Veículo e desl. vert. Tramo 7 Painel Mira Fotogrametria Desl. Vert. Precisão Topografia Desl. Vert. 57B B B 6a b B B B Ensaio de carga 2 No ensaio de carga, realizado no dia 16 de Setembro, o veículo utilizado foi um camião cisterna dos bombeiros com 42 ton. O esquema de carregamento foi o mesmo do primeiro ensaio, ou seja, foram carregados os tramos instrumentados com 293
8 extensómetros resistivos (os segundo, terceiro e quarto tramos em relação à margem esquerda). Foram medidos os valores médios das extensões nos quatro extensómetros colados nos banzos superiores e nos quatro extensómetros colados nos banzos inferiores das treliças principais, em cada uma das seis secções instrumentadas. De referir que estes valores foram medidos com compensação do comprimento dos cabos, assim como com compensação do efeito da temperatura através de extensómetros colados em chapas de aço retiradas da ponte, tendo-se colocado uma à sombra e outra directamente exposta ao sol. De notar que o efeito da temperatura nas chapas metálicas (com deformação não restringida) nada tem a ver com o efeito da temperatura na ponte (com a deformação restringida). De facto, constatou-se que o primeiro dos efeitos é desprezável. À semelhança do procedimento adoptado no tratamento dos resultados do primeiro ensaio de carga, no sentido de facilitar a interpretação dos resultados, apresenta-se a informação filtrada, eliminando-se os troços que correspondem a movimentação do camião cisterna (Figura 10). Figura 10. Extensões médias superiores e inferiores, ao longo do tempo, com o camião parado. Tal como no primeiro ensaio, a análise destes gráficos permite verificar a existência de variações significativas do valor das extensões em alguns tramos e em alguns intervalos de tempo. Do mesmo modo, este facto só pode ser devido ao efeito da temperatura, atendendo a que o valor das restantes acções que no intervalo de tempo do ensaio actuaram sobre a ponte (camião e peso próprio) não variou. Os resultados 294
9 são apresentados no formato de gráfico: na Figura 11a, apresenta-se o diferencial das extensões nas diferentes secções, com o veículo posicionado nos vãos (gráfico da esquerda) e nos apoios (gráfico da direita); e na Figura 11b, a média das extensões nas diferentes secções, para as mesmas posições do veículo. Figura 11. Extensões para cada posição do veículo em cada secção: diferencial; média. Da análise da Figura 11, é de realçar novamente o efeito da temperatura nos resultados (já observado no ensaio 1). Assim, é efectuada uma correcção idêntica tendo em vista a minimização do seu efeito. Na Figura 12a, apresenta-se o diferencial corrigido das extensões nas diferentes secções, e na Figura 12b, a média das extensões nas diferentes secções, ambas com o veículo posicionado nos vãos. Figura 12. Extensões corrigidas para cada posição do veículo em cada secção: diferencial; extensão. 4.3 Ensaio dinâmico O sinal obtido resultou de medição na direcção vertical nos pontos de medida assinalados na Figura 6. No Quadro 2 são fornecidos os resultados modais da análise do sinal medido e, na Figura 13 e 14, são representados os modos de vibração correspondentes. 295
10 Quadro 2 Modos, frequências e amortecimentos medidos. Modo Frequência [Hz] Amortecimento [%] Modo Modo Modo Modo Modo Figura 13. 1º modo de vibração; 2º modo de vibração. (c) Figura 14. 3º modo de vibração; 4º modo de vibração; e (c) 5º modo de vibração. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS O estudo realizado cumpriu os objectivos definidos, na medida em que foram obtidos, através da realização de ensaios de carga e de ensaios de medição da vibração ambiente, valores fiáveis de extensões, deslocamentos, frequências próprias e modos de vibração. As grandezas medidas permitiram ao requerente calibrar e validar o modelo numérico da ponte e, deste modo, efectuar uma análise de risco, estudo igualmente apresentado neste congresso e publicado nas actas. 296
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