PROJETO IFÁ AYÁ

Tamanho: px

Começar a partir da página:

Download "PROJETO IFÁ AYÁ www.projetoifaaya.transiente.org"

Gabriela Dinis da Costa
8 Há anos
Visualizações:

1 PROJETO IFÁ AYÁ

2 Conversa com Maria Lúcia, Ekedi na Comunidade do Ilé Axé Yjexá Orixá Olufon, sobre compartilhamento dos saberes e educação. Sara: Tia Lúcia, pode se apresentar? Maria Lúcia: Eu sou Maria Lúcia, sou Ekedi numa Comunidade Tradicional de Terreiro da Nação Ijexá aqui na cidade de Itabuna no sul da Bahia Sara: como se dão os processos de formação no contexto da Comunidade de Terreiro? Maria Lúcia: dentro de uma Comunidade de Terreiro o ensinamento é desde que a criança nasce, ela cresce sabendo que os mais velhos têm que ser respeitados, que o meio ambiente tem que ser respeitado. É um processo natural, elas vivem no dia-a-dia conosco e saímos pelas áreas que temos ensinando o que elas precisam aprender: O respeito à água, que a água é um bem comum e que é um bem sagrado tratada como mãe e que por isso deve ser respeitada. O desperdício de água não é bom, é preciso que ele aprenda que a água é sua mãe por isso. A mesma coisa fazemos com a terra, a terra é um bem comum, é a grande mãe, dela viemos e pra ela voltaremos, tem que ser respeitada como

3 tal. As plantas, as árvores têm que ser respeitadas, não se tira uma folha da árvore sem pedir licença ou permissão a quem de direito para que ela seja retirada. Os mais velhos sentam em forma de roda, à noite, no fim de tarde, para contar histórias dos antepassados às crianças e adolescentes. Então é um processo natural de aprendizagem porque eles passam, na escola formal eles aprendem a ler e a escrever, mas a educação necessária não se faz na escola, é tratada em casa. E isso nós temos, um dos primeiros cuidados, eu já falei e volto a repetir, é atenção e o respeito, seja com os mais velhos, com os mais novos, às criações, aos bichos, às árvores, à água...tem que haver respeito para que eles aprendam e mais tarde, quando seus filhos vierem, aprenderem a respeitar. Sara: a senhora falou em educação, o que é educação? Maria Lúcia: educação para nós de Comunidade Tradicional de Terreiro é aquilo que você pode ensinar e repassar para a criança, aquilo seu de melhor que você pode e deve repassar para a criança, o adolescente e adulto. A educação formal que nós chamamos é aquela educação tratada pelos órgão

4 públicos, seja de escolas primarias e secundárias, seja de Universidades; porque a Universidade dá ao homem - homem no sentido amplo da palavra, homem e mulher - o conhecimento, mas o conhecimento cientifico, não dá o conhecimento normal, o conhecimento educacional e o conhecimento primário, porque sem o começo não há o fim. Sara: e como se daria, pensando, como essa educação da casa, essa educação que a senhora falou, como se daria no ensino formal. Porque para mim é estranho ter um ensino, uma educação nas escolas formais e outra em casa que não se conectam, necessariamente... Maria Lúcia: as politicas publicas federais já determinam que nas escolas se faça o ensino da Cultura Afro- Brasileira. Quando eles tocam em Cultura Afro-Brasileira eles estão também inserindo aquela educação que se faz na primeira infância e ou quando a criança nasce, o ideal seria que nós tivéssemos um governo com políticas publicas voltadas para que em cada comunidade houvesse uma escola formal com ensino afro-brasileiro... Sara: mas existe algo assim, não? Maria Lúcia: existe, existe a lei que

5 obriga que as escolas públicas façam esse ensinamento, mas o ensino que eles fazem ainda é tão preconceituoso, é um ensino muito formal que não ensina o que se deve ensinar às crianças, porque, na verdade, eles lá vão dizer que a capoeira é uma área desportiva, quando não é, é uma cultura afro, eles vão ensinar que história se lê em livros formais, quando não é, a história verdadeira é aquela passada de pai a filho e de mãe e filha. O aprendizado na Comunidade Tradicional de Terreiro se dá no dia-a-dia, desde que se levanta até a hora que vai se dormir, você aprende como lidar com tudo, em todos os momentos da sua vida, desde seu corpo até você falar, se dirigir a alguém, plantar, cuidar, preservar e são palavras que não existem dentro de uma escola formal. Sara: será possível pensar em uma reforma do ensino formal...será que agente transforma por dentro? Mas será que esse modelo político permite? Ou será que essa obrigatoriedade não deveria existir? É uma reflexão... Maria Lúcia: é uma reflexão interessante, o modelo político que ai está não tem interesse nenhum nessa mudança, até porque essa obrigatoriedade faz parte do modelo

6 politico que está ai, você tem que fazer vestibular para entrar na Universidade, você tem que ter formação se não você não tem emprego e não é bem isso, não é bem isso, esse mundo é nosso não é de poucos, é nosso, todos têm direitos. Além de colocar seus filhos na escola normal, formal, normal e formal, também comecem a ler pra ele, ensina-lo a ler desde cedo, mostrar a ele o interesse pela leitura para aprenderem as histórias de nossos antepassados e aprenderem com eles. ITABUNA, 2013

Documentos relacionados

Era uma vez, numa cidade muito distante, um plantador chamado Pedro. Ele

O Plantador e as Sementes Era uma vez, numa cidade muito distante, um plantador chamado Pedro. Ele sabia plantar de tudo: plantava árvores frutíferas, plantava flores, plantava legumes... ele plantava