INTERESSADA: CÂMARA MUNICIPAL DE IRACEMÁPOLIS SP At.: Dr. Rafael

Transcrição

1 CONSULTA/5923/2013/TR INTERESSADA: CÂMARA MUNICIPAL DE IRACEMÁPOLIS SP At.: Dr. Rafael Administração Municipal Cargo em comissão Art. 37, inc. V, da Constituição Federal Exigência de nível superior de escolaridade para o preenchimento do cargo comissionado Necessidade de lei Compatibilidade entre os graus de responsabilidade e complexidade das atribuições dos cargos de provimento em comissão e o nível de escolaridade, especialidade ou habilitação profissional de seu titular Observações pertinentes. CONSULTA: Objetivo: Parecer Jurídico. Assunto: Cargo em comissão Constituição Federal - Art. 37 Inciso II -..., ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração Inciso V -...,e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento. Caso Concreto: O Tribunal de Contas do Estado de São Paulo está exigindo que os cargos em comissão sejam preenchidos por pessoas que tenham nível superior. Qual é a opinião ( )? Obs.: Não há previsão legal para tal exigência. Entretanto, não se pode admitir que a Administração Pública tenha em seu quadro, servidores efetivos ou não, sem o mínimo de qualificação.

2 ANÁLISE JURÍDICA: Diante do que nos foi proposto, procederemos a algumas considerações iniciais sobre o inc. V do art. 37 da CF/88, versículo que contempla a figura da função de confiança e do cargo em comissão, vejamos: Art V - as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento;(redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998). Anote-se que o cargo em comissão e a função de confiança possuem como característica em comum a livre nomeação e também a possibilidade de demissão ad nutum dos respectivos ocupantes, tanto deste como daquele, não podemos perder de vista, por outro lado, que ambos não se confundem. Assim nos parece, pois com o advento da Emenda Constitucional nº 19/98, que modificou a redação da norma contida no inc. V do art. 37 da CF/88, passou a existir uma restrição imposta aos agentes públicos que figurem como autoridade nomeante, para os fins de escolha dos ocupantes de cargo em comissão e função de confiança Com efeito, para as funções de confiança passou a ser exigido que o respectivo ocupante seja também servidor ocupante de cargo efetivo, ou seja, as funções de confiança deixaram de ser acessíveis àqueles estranhos aos quadros da Administração Pública No que se refere aos cargos em comissão, passou-se a exigir que o seu preenchimento se dê somente por servidores de carreira, havendo a possibilidade de que lei local fixe um porcentual a ser preenchido por pessoas estranhas aos

3 quadros da Administração, a ser destinado exclusivamente aos exercícios de atribuições de direção, chefia e assessoramento. Nesse sentido, vale transcrever a lição do professor Diogenes Gasparini: (...) os cargos de provimento em comissão são próprios para a direção, comando ou chefia de certos órgãos, para os quais se necessita de um agente que soube ser de confiança da autoridade nomeante se disponha a seguir sua orientação, ajudando-a a promover a direção superior da Administração. Também destinam-se ao assessoramento (art. 37, V, da CF). (...) Mas, por certo, não se pode criar somente cargos em comissão, pois outras razões existem contra essa possibilidade. Tal criação, desmedida e descabida, deve ser obstada, a todo custo, quando a intenção evidente é burlar a obrigatoriedade do concurso público para o provimento de cargos efetivos. De sorte que os cargos que não apresentam aquelas características ou alguma particularidade entre seu rol de atribuições, como seu titular privar da intimidade administrativa da autoridade nomeante (motorista, copeiro), devem ser de provimento efetivo, pois de outro modo cremos que haverá desvio de finalidade na sua criação e, por conseguinte, possibilidade de sua anulação. Por esses motivos são em menor número. Diga-se, por fim, que a CF, no art. 37, V, com a redação dada pela EC n. 19/98, procura limitar o poder de escolha dos titulares de cargos de provimento em comissão, à medida que dispõe que serão preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei (cf. in Direito Administrativo, 17ª ed., Saraiva, São Paulo, 2012, p. 328) (grifos nossos). A professora Lúcia Valle Figueiredo, citando Márcio Cammarosano, esclarece que: (...) realmente, o cargo pode ser em comissão quando sua vocação for para tal efeito, ou seja: o elemento que vai se investir no cargo deve gozar da mais absoluta confiança daquele com quem vai trabalhar. Se assim é, não há possibilidade de qualquer cargo ser em comissão, mesmo que a lei disponha dessa forma. Haveria, a nosso ver, possibilidade de contestação judicial, e seria lícito ao Judiciário verificar

4 se o cargo é de molde a ser provido em comissão ou, de revés, poderia ser pertencente ao quadro de cargos de carreira (cf. in Curso de Direito Administrativo, 9ª ed., Malheiros, São Paulo, 2008, p. 606). Para Regis Fernandes de Oliveira, (...) é indispensável enfatizar, no entanto, que será inconstitucional a lei que criar cargos em comissão para funções simplesmente burocráticas ou operacionais. Desde que o perfil deste cargo foi delineado na própria Constituição, a fuga aos seus elementos intrínsecos de caracterização permitirá supor uma tentativa de burlar preceitos de integração e coerência do Texto Maior. Márcio Cammarosano exemplifica: admite-se que a lei declare de livre provimento e exoneração cargos de diretoria, de chefia, de assessoria superior mas não há razão lógica que justifique serem declarados de livre provimento e exoneração cargos como, os de auxiliares administrativos, fiscal de obras, enfermeiro, médico, desenhista, engenheiro, procurador e outros mais, de cujos titulares nada mais se pode exigir que o escorreito exercício de suas atribuições, em caráter estritamente profissional, técnica, livre de quaisquer preocupações ou considerações de outra natureza (Provimentos de Cargos Públicos no Direito Brasileiro, 96). Em seguida, assevera não ser possível fazer que a regra seja de cargo de livre provimento e exoneração. Ao contrário, o adequado é que sejam criados cargos efetivos e providos mediante concurso (cf. in Servidores Públicos, Malheiros, São Paulo, 2004, p. 18) (grifos nossos). Convém lembrar que os cargos ou empregos de provimento em comissão são vocacionados para serem preenchidos por aquele que usufrui a intimidade administrativa da autoridade nomeante, ou seja, são, por excelência, cargos ou empregos de confiança. Ademais, não se pode perder de vista que para a admissão do servidor para o exercício de determinado cargo em comissão, deve haver o preenchimento dos requisitos básicos e especiais legalmente exigidos. Por tal razão, essa exigência, in casu, que os cargos de provimento em comissão sejam preenchidos por pessoas que tenham nível superior de escolaridade, só poderá ser

5 feita se houver previsão em lei, seja na lei geral dos servidores, na lei que criou os respectivos cargos ou ainda em lei municipal específica. Isso porque, caberá à lei estabelecer os requisitos básicos e especiais para o ingresso nos cargos públicos do Município, sendo que os requisitos básicos são sempre os mesmos, a saber: nacionalidade brasileira, maioridade civil, prova de regularidade com as obrigações militares e eleitorais, nível de escolaridade, aptidão física e mental. Outrossim, nada impede que como requisito especial para investidura no cargo ou emprego público sejam estabelecidas limitações como o nível de escolaridade. Nessa mesma linha de pensamento, temos ainda decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que assim dispõe: A garantia constitucional de acesso geral a cargo público pode subordinar-se a requisitos que, portanto, a delimitem. Mas requisitos estabelecidos por lei. Não por ato administrativo: e tanto menos por simples edital, que não tem autoridade alguma para atribuir, negar ou restringir direitos (ApCv nº , in RJTJ/SP 133/123). Todavia, não se pode negar que tal exigência deve estar fundamentada na compatibilidade entre os graus de responsabilidade e complexidade das atribuições dos cargos de provimento em comissão e o nível de escolaridade, especialidade ou habilitação profissional de seu titular. Nesse sentido, conclui-se que, somente se as atribuições do cargo em comissão, de chefia, assessoramento e direção exigirem nível superior de escolaridade, será legal incluir o referido requisito especial, não nos sendo cabível a exigência indiscriminada, sem fundamentos para tanto. Portanto, conforme as considerações acima e de acordo com o disposto no art. 37, inc. V, da CF/88, não vislumbramos óbice de que haja nomeação de servidor em comissão para as funções de chefia, direção e assessoramento, exigindo-se para o preenchimento do cargo determinado grau de escolaridade, desde que de acordo com as atribuições do respectivo cargo.

6 Por fim, essas são as considerações que nos parecem pertinentes à consulta formulada, sem embargo e demonstrando, desde já, o nosso respeito às eventuais opiniões divergentes que possam existir sobre o tema aqui abordado, aproveitando para nos colocar à disposição para eventuais dúvidas e mais complementações sobre a matéria. São Paulo, 16 de setembro de Elaboração: Tatiana Rigorini Navarro OAB/SP Aprovação da Diretoria NDJ Angelo Iadocico Superintendente