AVALIAÇÃO DO CICLO DE VIDA DOS PRODUTOS: UMA FERRAMENTA DE CONTROLE AMBIENTAL
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- Célia Gusmão Cesário
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1 Resumo AVALIAÇÃO DO CICLO DE VIDA DOS PRODUTOS: UMA FERRAMENTA DE CONTROLE AMBIENTAL Fabiana Takahashi (UFMS) Frank Morais (UFMS) A dinâmica competitiva do mercado globalizado impõe necessidades cada vez mais rigorosas de qualidade e controle de produtos e processos. Neste contexto, a análise do ciclo de vida do produto (ACV) surge como uma ferramenta de controle com ampla aplicabilidade. O ACV é uma ferramenta de análise de desempenho ambiental de sistemas de produção utilizada como estratégia para inserção no mercado. As etapas de avaliação são divididas em: i) definição de objetivo e escopo, ii) a análise do inventário, a avaliação de impacto e iii) a interpretação, onde são desenvolvidos entre outras atividades a definição e limitação do processo, procedimentos e obtenção e seleção de dados. A ACV tem como principal objetivo analisar o impacto que os parâmetros ambientais influenciam no meio ambiente, porém como limitação a ferramenta não mede qual o processo ou produto é mais eficiente, mas detecta o impacto ambiental potencial, servindo também como indicador para tomada de decisão. Palavras-chave: ciclo de vida, impacto ambiental. 1. Introdução O desenvolvimento tecnológico e a crescente sofisticação dos processos de produção possibilitaram a existência de diversas alternativas para produtos ou serviços com finalidades semelhantes. Em particular, desde a primeira crise do petróleo (no início da década de 70), o mundo intensificou a busca de formas alternativas de energia e a melhoria dos processos para otimizar a utilização dos recursos naturais. Com esse intuito, diversos estudos e iniciativas foram empreendidos naquela época. Embora a maioria desses estudos tivesse focalizado a questão energética, alguns deles chegaram a considerar, ainda que de forma superficial, vários aspectos ligados à questão ambiental, incluindo estimativas de emissões sólidas, líquidas ou gasosas. A sociedade foi atribuindo cada vez mais importância às questões ambientais. Isto promoveu a necessidade de desenvolvimento de abordagens e ferramentas de gestão que possibilitassem às empresas, assim como, de uma maneira mais geral, às diversas partes interessadas da sociedade, como governo, institutos de pesquisas e outros, avaliar as conseqüências ambientais das decisões adotadas em relação aos seus processos ou produtos. Um dos primeiros problemas surgidos foi como comparar produtos ou processos distintos, do ponto de vista das suas conseqüências ambientais, sendo que comparar as conseqüências ambientais apenas do processo de produção não era suficiente, era necessário
2 levar em consideração as conseqüências ambientais de todas as outras fases da vida do produto. Diante deste contexto, o objetivo do presente artigo é discutir sobre a análise do ciclo de vida dos produtos - ACV, apoiando-se no arcabouço teórico disponível sobre o tema. 2. Conceito e evolução da avaliação de vida dos produtos Segundo a IBICT (2006), a Avaliação do Ciclo de Vida é uma técnica para avaliação dos aspectos ambientais e dos impactos potenciais associados a um produto, compreendendo as etapas que vão desde a retirada da natureza das matérias-primas elementares que entram no processo produtivo até a disposição do produto final, abordando parâmetros como: produção de energia, fluxograma das atividades, transporte, consumo de energia não renovável, impactos relacionados com o uso ou aproveitamento de subprodutos, reuso do produto e questões relacionadas a disposição, recuperação ou reciclagem de resíduos e embalagens. Segundo CHEHEBE (apud VALT, 2004) a Análise do Ciclo de Vida (ACV) estuda a complexa interação entre um produto e o ambiente, utilizando para tanto a avaliação dos aspectos ambientais e dos impactos potenciais associados ao ciclo de vida do produto. Romm (apud SANTO & KRUGLIANSKAS, 2000), afirma que a avaliação do ciclo de vida do produto constitui-se como um aspecto central na busca de sustentabilidade pelas empresas, conduzindo à eficiência energética, e à alta produtividade dos locais de trabalho, bem como é crucial para fabricação de produtos ambientalmente responsáveis, que utilizem processos de produção limpos. A ACV permite a identificação de oportunidades de melhorias dos aspectos ambientais considerando as várias fases de um sistema de produção, contribuindo para a diminuição do consumo de recursos naturais e geração de resíduos (VALT, 2004). Segundo o IBICT (2006), o primeiro estudo realizado à cerca desta problemática, foi implementado pela Coca-Cola nos anos 70, a fim de comparar os diferentes tipos de embalagens de refrigerante e selecionar qual deles se apresentava como o mais adequado do ponto de vista ambiental e de melhor desempenho com relação à preservação dos recursos naturais. Tal estudo passou a ser conhecido como Resource and Environmental Profile Analysis - REPA. Nos anos subseqüentes, diversos consultores passaram a estudar a metodologia REPA, agregando novos critérios que permitiram melhor análise dos impactos ambientais. Porém, estudos sobre os mesmos produtos ou serviços foram realizados com modelos diferentes, encontrando-se resultados distintos, o que ocasionou confusão acerca da sua interpretação, pondo-se em questão a sua validade. Este fato foi agravado pelo surgimento e proliferação dos chamados Rótulos Ambientais. Inicialmente, estes eram atribuídos com base em apenas um aspecto ambiental do produto ou serviço, não levando em consideração todas as fases do ciclo de vida do produto. Tais fatores conduziram à consideração da utilização da Avaliação do Ciclo de Vida como um dos critérios para o seu desenvolvimento. Em função disso, a Society of Environmental Toxicology and Chemistry (SETAC) iniciou os primeiros trabalhos de sistematização e padronização dos termos e critérios da ACV. Igualmente, em 1993, a International Organization for Standardization (ISO) criou o Comitê Técnico TC 207 para elaborar normas de sistemas de gestão ambiental e suas ferramentas. 3. Etapas da AVC As principais fases da ACV de um produto são: a definição de objetivo e escopo, a análise do inventário, a avaliação de impacto e a interpretação, conforme a Figura 1.
3 Figura 1 Etapas da ACV Fonte: VALT (2004) Definição do objetivo e o escopo Na etapa de definição de objetivo do trabalho são consideradas as principais razões para a realização do estudo e o seu público alvo. Na etapa de definição de escopo são estabelecidos o sistema a ser estudado, suas fronteiras e a unidade funcional adotada (CHEHEBE, apud VALT, 2004). Nesta fase do estudo deve-se considerar (IBICT, 2006): O sistema a ser estudado; A definição dos limites do sistema; A definição das unidades do sistema; O estabelecimento da função e da unidade funcional do sistema; Os procedimentos de alocação; Os requisitos dos dados; As hipóteses de limitações; A avaliação de impacto, quando necessária e a metodologia a ser adotada; A interpretação dos dados, quando necessária e a metodologia a ser adotada; O tipo e o formato do relatório importante para o estudo e a definição dos critérios para a revisão crítica, se necessário Análise do inventário A segunda etapa da ACV é a análise do inventário, quando são efetuadas a coleta e a quantificação de todas as variáveis envolvidas durante o ciclo de vida do produto, processo ou atividade. Esta etapa também é responsável por relacionar os dados coletados à unidade funcional adotada (MATTSSON, apud VALT, 2006). Nesta fase, é importante considerar (IBICT, 2006): A necessidade de uma estratégia cuidadosa na preparação para a coleta de dados; A coleta de dados; O refinamento dos limites do sistema; A determinação dos procedimentos de cálculo; Os procedimentos de alocação.
4 Dados de um Inventário de Ciclo de Vida são informações que descrevem os balanços de massa e energia dos pontos críticos de um processo, que sejam ambientalmente relevantes. Possibilitando uma visão dinâmica do processo produtivo como um todo Avaliação do impacto do ciclo de vida A avaliação dos impactos ambientais visa determinar a intensidade com que os aspectos ambientais alteram o meio ambiente (MOURAD, apud VALT, 2004). Este passo da ACV é dividido nas etapas de classificação, caracterização e valoração dos dados coletados. Na etapa de classificação, os dados são separados e agrupados de acordo com as categorias determinadas de impacto, como por exemplo, o esgotamento de recursos naturais, o aquecimento global e o efeito fotoquímico (KROZER apud VALT, 2004). Finalmente, na etapa de valoração as categorias de impacto são somadas de acordo com uma escala de importância previamente definida, obtendo-se um indicador único de desempenho ambiental para o produto (KROZER apud VALT, 2004). A norma ISO propõe uma estrutura para o processo de avaliação incluindo basicamente três etapas (IBICT, 2006): Seleção e definição das categorias: as categorias devem ser estabelecidas com base no conhecimento científico; Classificação: os dados são classificados e apurados nas diversas categorias selecionadas; Caracterização: os dados são modelados por categoria de forma que cada um possa ter o seu indicador numérico Interpretação da ACV Na última etapa da ACV os resultados obtidos nas fases de inventário e avaliação de impacto são analisados de acordo com o objetivo e o escopo previamente definidos para o estudo (CHEHEBE apud VALT, 2004). As conclusões obtidas após a análise dos resultados possibilitam a identificação de pontos críticos do ciclo de vida do produto que necessitam de melhorias, permitindo a implementação de estratégias de produção, como a substituição e recuperação de materiais e a reformulação ou substituição de processos, visando a preservação ambiental. Segundo o IBICT, a interpretação dos resultados de ACV (ISO 14043) é uma das etapas mais sensíveis, pois as hipóteses estabelecidas durante as fases anteriores, assim como as adaptações que podem ter ocorrido em função de ajustes necessários, podem afetar o resultado final do estudo. 4. Limitações na elaboração da ACV A elaboração de estudos que utilizam a metodologia da Avaliação do Ciclo de Vida quase sempre acarreta em grande consumo de tempo, recursos financeiros e humanos. Dependendo da profundidade do estudo que se pretende conduzir, a coleta de dados pode ainda ser dificultada por várias outras razões. A não disponibilidade de dados importantes pode afetar o resultado final do estudo e, por conseqüência, a sua confiabilidade. Torna-se importante, portanto, uma avaliação criteriosa da relação custo-benefício para se atingir a qualidade desejada para o estudo, levando-se em consideração que tipo de dado deverá ser pesquisado, o custo e o tempo para sua coleta e os recursos disponíveis para a condução do estudo.
5 É importante se ter em mente que a ACV, por sua natureza, não é uma ferramenta capaz de medir qual produto ou processo é o mais eficiente tanto em relação ao custo quanto em relação a outros fatores, já que não mede, por exemplo, impactos reais ambientais, e sim impactos potenciais. Por outro lado, as informações resultantes da ACV podem e devem ser utilizadas como mais um componente de um amplo processo decisório que leve em consideração, outros fatores. A ACV é uma ferramenta técnica ainda em evolução. Por essa razão, análises comparativas de processos ou produtos devem ser evitadas. 5. Uso da ACV nas empresas As empresas têm utilizado essa ferramenta, entre outros, para os seguintes usos (IBICT, 2006): Desenvolvimento de uma avaliação sistemática das conseqüências ambientais associadas com um dado produto; Análise das trocas ambientais associadas com um ou mais produtos ou processos específicos para obter dos tomadores de decisão (estado, comunidade e outros) aprovação para alguma ação planejada; Quantificação das emissões ambientais para o ar, água e terra em relação a cada estágio do ciclo de vida ou ao processo que mais contribui; Avaliação dos efeitos dos consumos de materiais e das emissões ambientais sobre o meio ambiente e sobre o homem; Identificação de áreas de oportunidade para uma maior eficiência econômica na concepção e desenvolvimento de produtos. Segundo a IBICT (2006), a ACV facilita o gerenciamento ambiental na indústria, uma vez que sistematiza as questões associadas ao sistema de produção, melhora a compreensão do processo de produção e facilita a identificação de prioridades para tomadas de decisão. É importante ressaltar ainda que uma pequena ou média empresa talvez não tenha condições de conduzir um estudo deste tipo. Porém, ainda assim, a idéia e o conceito da ACV podem ser aplicados pelas pequenas e médias empresas ao conceberem e desenvolverem os seus produtos ou serviços. A ACV, também conhecida como Life Cycle Thinking, possibilita que as pequenas e médias empresas levem em consideração não apenas os aspectos ambientais da sua fase na cadeia de fornecimento, mas também das fases anteriores e posteriores, fornecendo produtos ou serviços melhores do ponto de vista ambiental, com os conseqüentes benefícios diretos e indiretos daí advindos. A ACV é uma ferramenta muito utilizada para implantação de políticas públicas, ecodesign 1, rotulatagem de produtos (rótulo ambiental) como forma de diferenciação na competitividade. 6. Considerações finais A sociedade cada vez mais se preocupa com a exaustão dos recursos naturais e com a degradação ambiental. Muitas empresas têm respondido a essas preocupações elaborando produtos e utilizando processos cada vez mais verdes. A performance ambiental dos produtos e processos tem se tornado uma questão-chave para o sucesso. Por essa razão, de uma forma crescente, as empresas vêm concentrando esforços para pesquisar novas formas de minimizar seus impactos sobre o meio ambiente. ACV nesse 1 Integração entre aspectos ambientais no desenvolvimento de novos produtos.
6 contexto é uma ferramenta importante de aprimoramento do processo produtivo e dos produtos de uma empresa. Sua abordagem de todo o ciclo de vida do produto permite a identificação e avaliação das fases críticas do processo industrial ou do produto ou serviço. A ACV permite a estimativa dos impactos potenciais cumulativos resultantes de todos os estágios do processo produtivo, freqüentemente incluindo impactos não considerados nos outros processos tradicionais de análise. A inclusão desses impactos permite uma visão mais abrangente dos aspectos ambientais dos produtos ou processos e um quadro mais apurado das efetivas trocas ambientais na seleção de produtos. Dessa forma, a ACV ajuda os tomadores de decisão a selecionar seus produtos e processos de forma a causar o menor impacto ao meio ambiente. Essas informações podem ser usadas juntamente com outros fatores, tais como custos e dados de performance, para a seleção dos produtos e processos. Os dados da ACV identificam as transferências dos impactos ambientais de um meio para outro (por exemplo, a eliminação de uma emissão para o ar acarretando uma emissão de efluentes para a água) ou de um estágio do ciclo de vida para outro (por exemplo, do uso ou reuso do produto para a fase anterior de aquisição de matérias-primas). Assim, a ACV, embora em fase de desenvolvimento, deverá, inevitavelmente, ganhar cada vez mais espaço nas atividades de gestão ambiental empresarial, pois permitirá a estas empresas melhorar suas práticas sociais e ambientais. 7. Referências IBICT Instituto Brasileiro de Informação, Ciência e Tecnologia. Avaliação do ciclo de vida. Disponível em: Acesso em 06/2006. MARINO, M.; KIPERSTOK, A. Ecologia industrial e prevenção da poluição: uma contribuição ao debate regional. Análise & Dados. v.10, n.4, p , Salvador Ba, PINTO, C.; LOPES, V.; Gestão de Resíduos Estudo do Impacte Ambiental associado a diferentes cenários de Gestão. Instituto Superior Técnico Licenciatura em Engenharia do Ambiente. Lisboa, POLI/USP. O Edifício e o Ambiente. DEC/Universidade de São Paulo, SANTO, A. E.; KRUGLIANSKAS, I. Avaliação ambiental do ciclo de vida do produto: uma abordagem a ser desenvolvida. In: III SEMEAD, 2000, São Paulo. Anais...São Paulo: USP, CD-ROM. VALT, R. B. G. Análise do ciclo de vida de embalagens de pet, de alumínio e de vidro para refrigerantes no brasil variando a taxa de reciclagem dos materiais Dissertação (Mestrado em Engenharia), UFPR, Curitiba, 208 pg. VIGON, B. W.; TOLLE, D. A. CORNARY, B. W. LATHAN,H. C.;C. HARRISON, L.; BOUGUSKI, T. L.; Hunt R. G.; Sellers, J. D. Life Cycle Assessment: inventory guidelines and principles. Environmental Protection Agency - Risky Reduction Engineering Laboratory. Cincinnati, U.S, 1993.
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