Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso do Sul Comarca de Campo Grande 7ª Vara Cível de Competência Residual

Transcrição

1 fls. 105 Vistos e examinados os presentes autos de Ação de Indenização por danos morais e materiais, sob o nº , etc. Izabel Ramos Queiroz, brasileira, portadora do documento de identificação RG nº SSP/MS e inscrita no CPF/MF sob o nº , residente nesta Capital na Rua Tietê nº 19, Vila Sobrinho ajuizou a presente Ação de Indenização por Danos Morais e Materiais contra Oceanair Linhas Aéres S/A - Avianca, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o nº / , com sede na Avenida Washington Luís, nº 7059, Campo Belo, São Paulo - SP, relatando, em síntese, que adquiriu passagem aérea da empresa ré via internet, com itinerário de ida Campo Grande/Cuiabá e de volta Cuiabá/Campo Grande, com partida programada desta Capital no dia 10/10/2014, às 7 horas e chegada às 8 horas e volta marcada para 21/10/2014, com partida às 21:10 horas e chegada às 22:10 horas. Narra que por ocasião da volta, em 21 de outubro, foi informada no aeroporto, no guichê da empresa aérea, que seu voo (66383) havia decolado às 19 horas. Não fosse o prejuízo já suportado foi repreendida pelo funcionário da ré e informada que poderia ser encaixada somente no voo do dia seguinte, às 6:05 horas da manhã, de modo pernoitou, juntamente com sua neta de 1 ano de idade, no saguão do aeroporto, sem que a ré tivesse oferecido qualquer tipo de acomodação. Diante desses fatos, pede a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais e danos materiais relativos à alimentação no aeroporto. No mais, requereu a inversão do ônus da prova, os benefícios da justiça gratuita, a citação da parte requerida, protestou a produção de provas, deu valor à causa e juntou documentos.

2 fls. 106 Deferidos os benefícios da justiça gratuita, a ré foi citada (fls ). Na sequência, foi certificado o decurso do prazo sem apresentação de defesa (fl. 27). Requereu a autora o julgamento antecipado da lide com aplicação dos efeitos da revelia (fls ). Sobreveio a contestação da ré às fls Arguiu preliminar de nulidade de citação argumentando que o aviso de recebimento da carta de citação foi assinado por pessoa sem poderes para tanto, insurgindo-se assim contra os efeitos da revelia. No mérito, alegou que a empresa aérea não conseguiu entrar em contato com a autor para avisá-la sobre a antecipação do voo; que providenciou a acomodação da autora no voo do dia seguinte; que a autora não aceitou a acomodação para pernoitar oferecida pela ré. Sustentou a inexistência de dano moral a ser indenizado. Insurgiu-se contra a inversão do ônus da prova. Ao final, pugnou pela improcedência dos pedidos iniciais. Em impugnação à contestação a autora defendeu a regularidade da citação, reiterou os termos da petição inicial e a condenação da ré por litigância de má-fé (fls ). É o relatório. Decido. Tratam os presentes autos de Ação de Indenização por danos morais e materiais proposta por Izabel Ramos Queiroz contra Oceanair Linhas Aéres S/A - Avianca. O feito comporta julgamento antecipado uma vez que a matéria discutida nos autos prescinde de dilação probatória, a teor do disposto no artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil. Após certificado o decurso de prazo sem apresentação de defesa (fl. 27), a ré ofereceu a contestação de fls arguindo preliminar de nulidade da citação, argumentando que o AR da carta de citação foi recebido por pessoa sem poderes para tanto. Com efeito, o Código de Processo Civil privilegiou a citação por carta em detrimento da citação pessoal, isto em consideração aos princípios da economia e celeridade processuais.

3 fls. 107 Exigir que a citação por carta seja válida somente quando entregue em "mão própria" do réu, ou no caso dos autos, do representante legal da empresa, mormente no caso de empresa do porta da ré, subtrai desse instituto as razões de sua existência. Ou seja, lhe retira toda a característica de maior celeridade, simplicidade e economia. Nesse raciocínio, é necessário reconhecer, até que se prove que a carta não lhe chegou às mãos, a validade da citação da pessoa jurídica com a entrega do AR no endereço por ela conformado como sendo o da sua sede, assinado e carimbado por funcionário, principalmente quanto não alega que essa pessoa não é seu funcionário. Nota-se que em momento algum a ré afirmou que a carta foi entregue em endereço diverso do local da sua sede, tampouco comprovou que a carta não chegou em suas mãos. Por essas razões, reputa-se válida a citação de fl.26 e certidão de decurso do prazo sem apresentação de defesa de fl. 27. Em consequência, nos termos do artigo 344, reputam-se verdadeiros os fatos articulados na inicial, relativamente à antecipação do horário do voo sem aviso prévio à autora e à falta de assistência com alimentação e pernoite por parte da empresa ré no período excedente nove horas que a autora passou no aeroporto. Com efeito, a relação existente entre as partes é de consumo por isso regida pelo Código de Defesa do Consumidor. A responsabilidade é objetiva, na qual basta a comprovação do dano e do nexo de causalidade. O fato descrito na inicial configura evidente falha na prestação do serviço, que gera nos termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor o dever de indenizar. Inegáveis os transtornos causados à passageira em decorrência de conduta injustificável da ré que sequer prestou assistência à consumidora relativamente à alimentação e acomodação, como presume-se de sua revelia. Tal falha na prestação do serviço causam danos que vão além do mero aborrecimento e merecem ser reparados, conforme fortemente já decidido pelos Tribunais:

4 fls. 108 AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. Transporte aéreo. Atraso de voo. Falha na prestação de serviço realizada pela companhia aérea. Ocorrência. Responsabilidade objetiva do transportador. Inteligência do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor. Dano moral configurado. Verba fixada com moderação, com observância dos critérios da razoabilidade e da proporcionalidade, de modo que não comporta redução. RECURSOS PRINCIPAL E ADESIVO NÃO PROVIDOS. (TJSP; APL ; Ac ; Presidente Prudente; Décima Oitava Câmara de Direito Privado; Relª Desª Carmen Lucia da Silva; Julg. 20/06/2017; DJESP 19/07/2017; Pág. 1937) APELAÇÃO CÍVEL. TRANSPORTE AÉREO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. CANCELAMENTO DE VÔO. PROBLEMAS METEOROLÓGICOS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. ATRASO DE MAIS DE NOVE HORAS. DANO MATERIAL. DANO MORAL CONFIGURADO. JUROS DE MORA. Incontroverso nos autos o cancelamento do voo, tendo as autoras embarcado apenas no dia seguinte, trinta horas após o previsto. Responsabilidade objetiva do transportador pelos danos causados aos transportados. É de ser mantida a sentença de procedência do pedido de indenização por danos morais, pois inegáveis os transtornos causados às passageiras em decorrência de conduta injustificável da demandada. No caso em apreço, a ré não logrou demonstrar causa excludente de responsabilidade. Indenização majorada para R$ 7.000,00 (sete mil reais) para cada autora, pois adequado e proporcional. Dano material, consistente nos valores gastos com hospedagem e transporte, que restaram comprovados pelas autoras, que devem ser ressarcidos. Juros de mora que devem fluir a contar da citação, considerando que a responsabilidade da ré decorre de relação contratual. Apelo parcialmente provido. Recurso adesivo provido. Unânime. (TJRS; AC ; Santa Cruz do Sul; Décima Segunda Câmara Cível; Rel. Des. Pedro Luiz Pozza; Julg. 13/07/2017; DJERS 17/07/2017) Resta-nos, então, fixar o valor da indenização, tarefa que, ante a inexistência de parâmetros legais, fica ao arbítrio do julgador, que deve agir com cautela e bom senso. Sobre o tema preleciona Caio Mário da Silva Pereira: "Quando se cuida de dano moral, o fulcro do conceito ressarcitório acha-se deslocado para a convergência de duas forças: caráter punitivo, para que o causador do dano, pelo fato da condenação,

5 fls. 109 se veja castigado pela ofensa que praticou; e o caráter compensatório par a vítima, que receberá uma soma que lhe proporcione prazeres como contrapartida do mal sofrido" (Responsabilidade Civil, Ed. Forense, Rio, 3ª edição, 1992, nº 45, p. 55). Acrescenta ainda que: "O ofendido deve receber uma soma que lhe compense a dor ou o sofrimento, a ser arbitrada pelo Juiz, atendendo as circunstâncias de cada caso, e tendo em vista as posses do ofensor e a situação pessoal do ofendido. Nem tão grande que se converta em fonte de enriquecimento, nem tão pequena que se torne inexpressiva" (ob. cit. Nº 49, p. 60). Apontam os doutrinadores para outros elementos que devem ser levados em consideração para a fixação do dano moral, quais sejam: a gravidade objetiva do dano, a personalidade da vítima, a gravidade da falta, a personalidade do autor do ilícito, etc. Assim, levando em consideração estes elementos, confrontando-os com as provas produzidas nos autos e especialmente o fato e que a reparação por dano moral não pode gerar um enriquecimento ilícito, hei por bem fixar o valor dos danos morais em R$ ,00 (dez mil reais). A mesma sorte, contudo, não assiste ao pedido de indenização por danos materiais. Com efeito, cabe à parte autora instruir a inicial com documentos comprobatórios de suas alegações. A revelia da ré não isentou a autora desse ônus. No caso dos autos, verifica-se que a autora pede indenização por dano material consistente nas despesas com alimentação e outros. Todavia, não descreve na inicial as despesas e os respectivos valores, sequer informa que despesa representa a expressão "outros". Também não instruiu a inicial com nenhum documento, nota fiscal, ticket ou recibo dessas despesas. Desse modo, não especificando a inicial as despesas e os respectivos valores do alegado dano material e diante da absoluta ausência de documento do alegado gasto, o pedido de indenização por dano material deve ser julgado improcedente.

6 fls. 110 Pugnou a autora, em sua petição de impugnação à contestação, a condenação da ré por litigância má fé. Contudo, não merece acolhida a pretensão da autora em ver a ré condenada por litigância de má-fé, pois a defesa apresentada, embora extemporaneamente, assim como os argumentos utilizados pela ré, não caracterizam as condutas previstas no art. 80 do CPC/2015. Diante do exposto e de tudo mais que consta nos autos, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, resolvo o mérito da lide e julgo procedente o pedido de indenização por dano moral e condeno a ré ao pagamento de R$ ,00 (dez mil reais), atualizado pelo IGPM a partir desta data e acrescido de juros de mora simples de 1% ao mês a partir do evento danoso. Outrossim, julgo improcedente o pedido de indenização por danos materiais. Em consequência, com fundamento no artigo 85, 2º, do Código de Processo Civil, condeno a ré ao pagamento das custas processuais e honorários de advogado no valor correspondente a 10% sobre o valor da condenação. Certificado o trânsito em julgado, arquivem-se os autos, com observância das formalidades legais. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Campo Grande, 25 de julho de Gabriela Müller Junqueira Juíza de Direito (assinado por certificação digital)